Spencer estava muito feliz com o fato de que seria pai, Astrid mais ainda. Ela e Valka quase não aguentavam de tanta ansiedade e vontade de segurar seus bebês nos braços. Tanto que quando o fizeram quase não deixaram as enfermeiras os levarem para a incubadora.
O pequeno Jesse Horrendus Hofferson nascera lindo. Possuía poucos cabelos pretos, bochechas gordinhas com algumas sardas, orelhas avantajadas, que lhe renderam o apelido de Gnomo, e olhos tão azuis quanto os da mãe.
Já o irmão de Hiccup e Sarah nascera com características inesperadas, mas igualmente belo. Com cabelos castanhos, cútis negra, olhos pretos e cara de joelho, tal como qualquer recém nascido. Recebeu o nome de Ariel Horrendus Haddock e já começou a ser mimado pelos irmãos desde que saiu do hospital.
As duas crianças cresceram rápido, logo entraram em uma escola de ensino infantil e não se desgrudaram mais. Sarah se tornou uma bela adolescente, esquecendo que um dia teve algum amigo imaginário e conhecendo um garoto chamado Sam, que não largou mais da garota. O garoto era branquinho como neve, com suas madeixas loiras e orbes azuis.
Spencer se formou em Física, virou professor em um colégio perto da casa dos Haddock e já estava totalmente acostumado com sua prótese. Astrid cursava enfermagem e trabalhava como babá durante algumas noites. Os dois se esforçaram muito para estudar, trabalhar e ainda cuidar de Jesse, sendo pais de primeira viagem. Erraram muito em alguns assuntos, mas puderam contar com a ajuda dos sogros.
(...)
“Talvez seja melhor verde.”
“Eu não sei.” Murmurou a loira. “Preto parece melhor pra uma cozinha, Hicc.”
“Acho que preto é muito clichê, além de dificultar a visão durante a noite.” Discordou. “Jesse e Ariel estão crescendo tão rápido, se tornaram muito curiosos e tenho medo de algum deles se machucar por não ver algo de noite.”
“Isso não aconteceria, Jay e Ariel sabem decorado onde fica o interruptor. Além disso, eles nunca viriam mexer em algo da cozinha de madrugada, muito menos se isso puder machucar.” Fez pouco caso da preocupação de Spencer. “Precisa ser uma cor que combine com os móveis daqui.”
“Combinar? Como se combina uma parede com móveis?”
“A geladeira é branca, então branco não ficaria bom.” Apontou para o eletrodoméstico, tentando explicar. “Seria muito de uma mesma cor, além de ela quase sumir em meio a parede.”
“Os armários são pretos.” Coçou o queixo, confuso. “Por que a parede não pode ser da cor da geladeira, mas pode ser como os armários?”
“Porque ela é totalmente branca. Os armários tem algumas partes em prata e branco, então daria para identificar melhor o móvel.”
“Ainda não entendi como funciona essa coisa de combinar cores.” Fez uma careta enquanto pensava, tentando compreender o assunto.
“Vou resumir pra você, Hicc.” Diz ao revirar os olhos. “Não podemos repetir muito uma cor, porque isso deixaria o móvel quase invisível. Também temos que achar um tom que não fique estranho com as outras cores aqui, como seria com uma parede verde e uma porta roxa. Precisamos achar alguma harmonia entre as cores aqui e deixar que os móveis fiquem visíveis a olho nú.”
“Então acho que seria melhor ter mais opiniões sobre o assunto.”
Estavam sentados em frente ao balcão enquanto tentavam decidir de qual cor poderiam pintar as paredes da cozinha. Com o passar dos anos, conforme Jesse e Ariel cresciam, as paredes conseguiram alguns desenhos incompreensíveis e a tinta já havia começado a desbotar. Vendo como não havia mais jeito para aquela pintura antiga, os Haddock decidiram que estava na hora de mudar um pouco a decoração da casa e dividiram os alguns dos cômodos para cada morador ali e a cozinha havia ficado como uma das responsabilidades de Astrid e Spencer.
Viram os dois Haddock’s mais novos correndo pela casa, junto ao novo amigo de Sarah, Sam. Os três estavam brincando de pega-pega a manhã inteira, desde a chegada de Sam e, quando menos esperavam, os adultos enxergavam o trio de crianças em sua correria pelos cantos da casa. Os chamaram rapidamente, antes que sumissem de vista mais uma vez.
“O que foi, papai?” Perguntou o pequeno Jesse ao frear seus passos apressados de repente, o que quase lhe ocasionou uma pequena queda quando se chocou contra as costas de seu tio.
“Ah, filho, não sabemos que cor usar nas paredes da cozinha. Vocês teriam alguma sugestão?” Acariciou os fios escuros, que se encontravam encharcados de suor.
Um pouco ofegantes, os três jovens de apenas sete anos, observaram ao redor. Se reuniram em uma pequeno círculo e começaram a cochichar entre eles. Virando novamente para os adultos ali presentes, o Hofferson mais jovem corou levemente e se encolheu receoso.
“Pode ser rosa, mamãe?” Indagou quase inaudível. Tinha medo se ser repreendido pela escolha de uma ‘cor feminina’.
“Claro que pode, bebê.” Riu, apertando as bochechas gordinhas. “Seu tio e o Sam estão de acordo?” Olhou para as duas crianças um pouco mais atrás de seu filho.
Com sorrisos inocentes, ambos concordaram. Tendo respondido a pergunta de seus pais, Jesse foi liberado para voltar a brincar com seus amigos. O garoto deu um beijo em sua mãe e acenou para o pai, saindo correndo novamente , acompanhado na mesma hora por seus amigos.
“Compre duas ou três latas de tinta rosa antes do jantar e amanhã de tarde pintamos.” Sorriu para o ruivo.
“Tem certeza, Asty? Você sabe que eu não entendo sobre cores, para mim é tudo igual.” Lembrou-a com um sorriso divertido.
“É, talvez seja melhor ir contigo.” Riu fraco. “Prefiro não correr o risco de você comprar vermelho, no lugar de rosa.”
“Esse seria um erro absurdo demais, até para mim.” Garantiu, o rosto contorcido em uma careta indignada.
“Vamos fingir que eu acredito, Hicc.” Deu-lhe um selinho e bagunçou seus fios já assanhados, um sorriso ameaçando tomar seus lábios.
(...)
“Você já contou para seus pais sobre aquele assunto?” Questiona Sam, sentado entre Jesse e Ariel na cama.
Os garotos haviam corrido a tarde inteira por toda a residência dos Haddock e o loiro pedira aos pais para dormir com os amigos naquele dia, então resolveram fazer uma pausa para assistir algo. Reuniram-se no quarto do moreno, ocupando sua cama com vários travesseiros e uma colcha quentinha, conversando enquanto Astrid fazia um pequeno lanche para as crianças.
“Não. Eu tenho medo do papai reclamar.” O garoto brincava de vestir uma de suas bonecas, usando de muitos acessórios para enfeitá-la. “Ele já acha estranho eu ter bonecas e não carrinhos.”
“O senhor Spencer não parece incomodado com isso, Jesse. Eu o escutei dizer, semana passada, que gosta de comprar suas bonecas, porque assim te deixa feliz.” Coçou o queixo, confuso. “Deve ser coisa da sua cabeça.”
“É, Jay. Todo mundo sabe que o Spencer adora te mimar, por isso tem tanta coisa de garota no seu quarto.”
“Não são coisas de garota, Ariel.” Reclamou Sam, dando-lhe um peteleco na testa. “São brinquedos e brinquedos não tem gênero.”
“Mas meninas brincam com bonecas e eu sou um menino, Sammy.” Murmurou Jesse, logo ficando com um bico triste nos lábios.
“Isso não te impede de gostar delas. Além disso, nem todas as meninas se interessam por bonecas.” Lembrou-o.
“Eu não sei.” Negou com a cabeça. “Não acho seguro contar pra o papai agora.”
“A gente fica com você na hora.” Oferece Ariel.
“É uma conversa particular, seu bobo.” O loiro revirou os olhos. “Não podemos nos intrometer.”
“Eu conto pra eles se vocês forem comigo.” Declarou descendo da cama, pondo um fim a uma possível discussão entre os dois amigos. “Se não ficarem comigo, eu não falo pra os meus pais.”
Jesse encarou os outros garotos com um bico manhoso nos lábios e os olhos brilhando em uma súplica silenciosa.
“Tá bom.” Ditou o loiro dando-se por vencido. “Eu concordo em participar, mas o Ariel vai ter que ficar calado.” Lançou um olhar autoritário e repreensível à o rapaz ao seu lado.
“Eu prometo ficar o mais quietinho possível.” Fez um X com os dedos por sobre a boca e beijou a pele dos dois.
“Então vamos falar com seus pais.” Levantou-se da cama e calçou os sapatos, animado para a conversa que o amigo teria com os genitores.
“Agora?” Perguntou o dono do quarto temeroso, vendo o tio seguir Sam.
“É, agora.”
“A gente vai tá com você, Jay.” Ariel garantiu segurando sua mão.
“Então ‘tá bom.” Sorriu mais calmo e apertou a mão do amigo, segurando a de Sam também, para então puxá-los porta afora.
Ficando subitamente animado, Jesse descia os degraus de sua casa com pressa e gritava o nome da mãe. Quase caiu duas vezes, mas seus amigos lhe ajudaram antes que isso acontecesse.
“Mamãe?” Chamou ao pisar na sala de estar. “Onde você ‘tá, mãe?”
“Tia Astrid?” Sam falava não muito baixo baixo, mas evitava gritar como o amigo. Escutaram a voz da mulher vindo de algum cômodo perto e ela avisando que estava na cozinha. “Vamos, Jesse!” Puxou o garoto na direção certa, este arrastando o tio junto.
Ao chegarem no local encontraram a jovem devorando um grande pedaço de bolo, enquanto Spencer tomava um copo cheio de suco.
“Mamãe, eu quero contar uma coisa.” Avisou o pequeno Hofferson ao se aproximar.
“Diga, bebê.” Falou com a boca cheia.
“Eca!” Murmurou Sam olhando aquela cena, fazendo uma careta de nojo.
“Shiu, Sammy.” Reclama Ariel.
“Eu quero comprar roupa.” Declarou Jesse brincando com os dedos. “Roupas femininas.”
“Hum, ok.” Responde.
“Quando quer ir?” Questiona Spencer ao colocar o copo usado na pia.
“O senhor não ‘tá com raiva?”
Jesse estava surpreso, esperava alguma bronca e isto não havia acontecido ainda. Ao mesmo tempo em que ficava feliz em, aparentemente, ser tão bem aceito em sua escolha, tinha medo de seus pais estarem brincando consigo.
“Pra que eu ficaria irritado, filho?” Pergunta confuso.
“Porque é errado um garoto gostar de coisas de menina.”
“Quem disse isso?” Indaga Astrid com uma expressão séria.
“Os garotos da escola.” Murmurou tímido.
“Vem aqui, meu anjo.” Pediu a loira com um sorriso doce nos lábios.
Um pouco receoso, Jesse aproximou-se da mãe e sentou em seu colo. Ao arrumar o corpo da criança encima de suas pernas, Astrid abraçou o filho e iniciou um carinho em seus fios negros.
“Os garotos que falaram isso devem estar com inveja de como você ficaria lindo com roupas femininas.” Sussurrou-lhe, fingindo ser um segredo muito sigiloso. “Não ligue pra eles, são apenas um bando de cuzões.”
“Astrid, não diga isso na frente das crianças.” Repreendeu Spencer disfarçando o riso.
“Não repita essa palavra até a mamãe dizer que pode, ok? É um palavrão.” Pediu, vendo o garoto assentir. “Enfim, eles são mentirosos e você pode gostar de tudo.”
“São apenas roupas, meu filho, e se quiser usar um salto alto, nós te compramos um par.” Aproximou-se com um sorriso gentil no rosto.
“Só não use um até fazer quinze anos, porque dá uns calos desgraçados.”
“Então o papai e a senhora vão mesmo comprar roupa pra mim?” Perguntou ficando animado.
“Claro que sim.” A loira respondeu. Apertou o filho nos braços e encheu o rosto infantil de beijos estalados. “Meu bebê vai ser o garoto mais lindo que esse mundo já viu. Você vai ficar mais bonito que a Sarah, quando era criança.” Afirmou, causando alguns risos e um sorriso radiante em Jesse.
Muitos usuários deixam de postar por falta de comentários, estimule o trabalho deles, deixando um comentário.
Para comentar e incentivar o autor, Cadastre-se ou Acesse sua Conta.