"Querido Diário,
É parece que agora vou ter que anotar todos os meus pensamentos aqui. Semana passada fui diagnosticada com Transtorno de Ansiedade e agora preciso fazer terapia para aprender a controlar isso. Ontem foi meu primeiro dia de terapia e me disseram que algumas pessoas se sentem bem melhor quando escrevem, porque conseguem organizar seus pemsamentos e, consequentemente, lidam melhor com eles. Então, acho que apartir de hoje você saberá tudo sobre mim. Só vou avisando que não sei como vou fazer isso, porque nunca consegui manter um diário navida, sempre ficava faltando coisas até que eu cansava e não escrevia mais.
Sabe, agora estava pensando e... acho que eu sempre tive ansiedade. Eu ficava nervosa quando tinha que falar com as outras pessoas. Sempre tive dificuldade para fazer amigos e não sei puxar assunto. Eu tremo de nervoso quando chego na escola e não vejo minhas amigas na sala. Vários pensamentos sobre os diversos rumos que minha vida podem tomar rodam pela minha cabeça: posso tropeçar na mochila de alguém, derrubar tudo, as pessoas vão rir de mim, vou ficar super vermelha, eles vão notar e rir ainda mais. Quando sento na cadeira sinto o coração bater na garganta e minhas orelhas pegarem fogo. No intervalo, quando preciso ir no banheiro entro em pânico. Como faço para atravessar aquele corredor cheio de pessoas me olhando como se eu estivesse em um desfile de horrores? Eu atravesso olhando para o chão evitando qualquer troca de olhares. As vezes minha amiga, que está em outra sala, reclama, porque eu passei direto por ela sem falar nada. Eu fico me sentindo péssima!
É... talvez escrever aqui realmente me faça algum bem."
- Liza, você vai se atrasar!
Ah, não! Por que eu fiquei tanto tempo escrevendo? Sabia que escrever de manhã não seria uma boa ideia. Ainda bem que já estou pronta, só preciso pegar a mochila e sair.
- Desculpa, mãe. Eu estava distraida, mas já estou pronta. - Falei passando correndo por ela e indo direto para a porta de casa.
- É melhor você correr, a Maria já deve estar aqui em baixo. - Respondeu mamãe dando um beijo na minha cabeça.
Despedi-me dela e entrei no elevador. Como minha mãe disse, Maria já estava em frente ao prédio. Ela é uma das minhas melhores amigas e como ela mora no prédio da frente, sempre vamos juntas para a escola. Porém, tem dias que meu horário é diferente do dela e eu entro mais tarde. Esses dias são deprimentes porque quando eu chego na escola as únicas meninas da minha sala ainda não chegaram. Já até pensei em chegar mais tarde nesses dias, só que o pensamento de chegar atrasada e ser notada por todos por conta disso me deixa aterrorizada.
- Como foi o final de semana? - Pergunta Maria com um sorriso animado.
- O de sempre: fazer dever de casa, estudar para o vestibular e chorar porque ainda não fiz a pontuação necessária no simulado. E você?
- O mesmo. Só que tive um tempinho de sobra e aproveitei para sair com o Roberto.
Roberto é o namorado dela, estão juntos a quase dois anos. Eles combinam em tudo, até na genialidade. Consigo ver os dois indo juntos para a faculdade enquanto eu faço um curso pré-vestibular porque não passei.
- Eu nem tenho mais tempo para ler meus livros. Sinto falta... era a única forma de fugir dessa realidade hostil. - Brinquei.
- Para de drama e vamos correr porque não estamos com muito tempo.
- Claro! Chegar atrasada é a última coisa que eu quero nesse momento. Minha cara esta toda empipocada hoje.
- O que houve? Alergia nervosa de novo?
- Sim. Desde que eu mudei de turma eu passei a ter essa dermatite direto.
Nossa escola divide os alunos por nota. Eu estava na turma A, que teoricamente é a turma dos melhores e agora eu estou na C, porque fui muito mal no bimestre passado. Sei que isso não significa nada, mas o ranking das turmas te faz pensar que se você não está sendo uma das melhores na escola, que era para ser algo fácil, você não vai conseguir passar no vestibular, que é algo muito mais difícil.
- Esquece isso! Sua nota e sua turma não te definem.
Apenas assenti. Para ela é facil dizer isso, afinal, ela continua na A. Quando chegamos na escola nos despedimos e fomos para nossas salas. Quando cheguei na sala, logo encontrei a Valentina, a Sarah e a Helena. Agradeci mentalmente por isso.
- Um milagre ver vocês três chegando na hora certa.
- Um milagre ver você quase chegando atrasada. - Disse Helena rindo.
A aula começou e o dia seguiu como o de costume até que a diretora entrou na sala e interrompeu a aula.
- Com licença, desculpa atrapalhar a aula. - Disse ela olhando para o professor de história. - Eu só vim aqui para chamar a Sarah.
E derrepente todos os olhares estavam fixos em minha amiga. Ela me encarou com os olhos arregalados de medo e saiu.
- O que vocês acham que aconteceu? - Sussurrei.
- Não faço ideia. Será que foi alguma nota? - Palpitou Valentina.
- Mas ela disse que estava indo bem. - Duvidei anotando o que estava no quadro.
- Acho que deve ser sobre aqueles grafites que ela anda fazendo nas ruas. Será que descobriram ela? - Sussurrou Helena.
- Mas ela sempre pede autorização para os donos do muro. Deve ser outra coisa. - Continuei desconfiada.
- Vocês três, parem de falar ou vão descer e fazer um teste disciplinar. - Reeprendeu o professor.
Então, a sala pareceu estar silenciosa de mais, conseguia ouvir meu coração bater rapidamente e meu rosto devia estar como um tomate de tão vermelho. Sequei minhas mãos suadas no jeans e abaixei a cabeça.
- O professor tem razão, vamos parar de falar. Talvez nem seja nada. - Disse Valentina depois que o professor se virou.
Assenti e voltei a copiar. Quando a aula estava quase acabando, Sarah entrou na sala e sentou-se em seu lugar.
- O que aconteceu? Estamos morrendo de curiosidade! - Perguntou Helena assim que Sarah chegou.
- Vocês não vão acreditar! - Respondeu ela parecendo animada.
- Desembuxa logo, garota! - Reclamou Valentina.
- Ela viu meus grafites no muro perto do prédio dela e... adivinhem!
- Eu ia dizer que ela te explusou, mas você está muito animada. - Disse Helena rindo.
- Claro que não! Por que ela faria isso? Eu sempre peço permissão para fazer meus desenhos. - Respondeu.
- Então o que foi? - Perguntei não aguentando mais de tanta curiosidade.
- Eles me chamaram para fazer um grafite na parede da entrada do colégio! - Respondeu batendo palminhas.
- Meu Deus! Parabéns, amiga! - Comemorei sorridente.
Sarah sempre amou desenhar e pintar e ela sempre fez obras lindas. Por conta disso, ela resolveu seguir seu amor pela arte como carreira e quer cursar Belas Artes. E eu, é claro, dou muito apoio e sempre estou comemorando suas conquistas.
- É incrível, não é? E ela disse que vão colocar fotos minhas e do meu trabalho em todas as redes da escola!
- E quando vai ser isso? - Perguntou Helena.
- Eles querem que eu traga três esboços até o final dessa semana, eles vão selecionar um e eu terei que pintá-lo na sexta de tarde junto com as crianças do primeiro ao quinto ano. E, bem como são muitas crianças eu perguntei se eu podia chamar vocês para me ajudarem também.
Nos entreolhamos por um instante. Eram todas as turmas, do primeiro ao quinto, com sprays de tinta. Claramente, isso não daria em nada bom. Porém, parecesse divertido.
- Por que não? Dizem que fazer bagunça é uma terapia anti-estresse, né? - Falei fazendo as meninas rirem.
No final da aula, estavamos planejando em almoçarmos juntas para comemorar. Quando estavamos saindo da sala, fomos paradas pela menina mais nojenta da escola, a Geovana e seu atual namorado, o bad boy da escola, Diego.
- O que aconteceu, flor? Foi chamada por causa das notas baixas de novo? - Perguntou Beatriz se aproximando de Sarah, como se ela fosse sua próxima vítima.
Sarah teve problemas com as notas no ano passado, mas nem sei como ela ficou sabendo disso. Percebi que minha amiga tinha ficado constrangida.
- Claro que não! Ela foi chamada para algo grande, muito grande. - Retrucou Valentina deixando escapar sua impaciência.
- Ah, não? Que ótimo! Mas o que é tão grande assim? - Questionou.
Franzi o senho, mas logo abaixei a cabeça ao percebe que seu comparça me observava.
- Você vai ver. - Respondeu Helena começando a sair dali.
- Estão misteriosas! Vou ficar ligada no projeto novo, Sarah. E Liza, o que aconteceu com seu rosto? Por que esta parecendo um porco espinho? Você precisa ver isso, hein? Essa pele não te favorece. - Continuou Beatriz impedindo nossa fuga.
Sério? Ela precisava tocar nesse assunto? O que eu fiz para ela? Eu estava quietinha na minha, nem olhei na cara dela direito! Sequei minhas mãos já suadas na calça e esperei algo vir em minha mente. Nada vinha. Branco! Branco total! DROGA! "Liz, isso é hora de travar? Pense em algo! Não posso começar a contar da minha doença para ela, de jeito nenhum, isso não é opção." Senti meu corpo comecar a tremer, então, fechei mãos para evitar que percebessem.
- É... é, eu... é que eu... eu fiquei com... - Gaguejei até ser cortada por Helena.
- Alergia! É isso ai, ela teve alergia. Alergia ao Sol. Algumas pessoas tem isso. Esqueceu o filtro solar e... boom! Alergia. - Respondeu ela de forma rápida. - Agora precisamos ir, tchauzinho.
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Estava calçando o tênis quando Sarah ligou. Atendi de maneira desajeitada enquanto terminava de amarrar o cadarço.
- Alô?
- Você não se esqueceu, né? A Valentina e a Helena já estão aqui.
- Claro que não. Eu já estou calçando os sapatos. Desculpa a demora, eu dormi mal essa noite e acabei acordando tarde.
- Então, corre! Acabei de descobrir que essas duas aqui são péssimas com crianças. Preciso de reforços.
- Aguenta firme, eu já estou chegando.
Desliguei e terminei de calçar o sapato. Peguei minha bolsa e sai de casa correndo. Enquanto andava pensava em como era estranho eu ter dificuldade para falar com pessoas mais velhas ou da minha idade, mas ser tão fácil para mim interagir com pessoas mais novas. Pode ser estranho, mas parece que as crianças julgam menos os outros, elas não são más. É evidente que existem crianças malvadas, mas é mais fácil lidar com elas do que pessoas da minha idade que são más. Também acho estranho o fato de eu não surtar antes de subir em um palco, ou de apresentar um trabalho na feira científica. Eu não sei se faz sentido, mas acredito que quando o público é maior, a chance de a maioria ali não estar prestando antenção em mim é maior do que quando eu preciso falar com um grupo de três pessoas ou com apenas uma pessoa.
- Finalmente! - Gritou Sarah ao me ver entrando na escola.
- Estamos ferradas! - Falei ao ver o mar de crianças.
O esboço do desenho já estava pronto, só precisávamos pintar. No entanto, haviam crianças correndo por todo lado e algumas estavam fazendo uma guerra de tinta.
- Helena e Valentina estão tentando acabar com a guerra, mas olha só... agora as crianças estão jogando tinta nelas!
A cena chegava a ser engraçada. Fui até o local da guerra colorida e chamei atenção das crianças:
- Oi, gente! Meu nome é Liza e eu estou aqui para ajudar vocês a pintar esse lindo desenho da Sarah. Quem aqui gosta de bolo levanta a mão.
Todas as crianças estavam com a mão para cima. Sabia que nenhuma delas ia recusar um doce.
- O que você está fazendo? - Coxichou Helena.
- Deixa comigo. - Sussurrei.
- Eu quero bolo! - Pediu uma menina ao meu lado.
- Eu também! - Gritou um menino.
- Todos vão ganhar bolo, mas só poderão comer depois de terminarmos o desenho. Então, acho que precisamos começar agora para dar tempo de comermos bastante bolo, certo?
- Certo!! - Eles gritaram.
- Então, cada um pega um spray e vem me ajudar. - Pediu Sarah.
- Acho que é melhor uma de vocês ir la loja aqui do lado comprar bolo. - Falei para Valentina e Helena que estavam cobertas de tinta.
- Desse jeito? - Reclamou Valentina.
- Ué?! Eu sou a única que sei lidar com eles e a Sarah que sabe como pinta isso de forma correta. Só sobrou vocês. - Brinquei.
- Não tem graça! - Disse Helena espirrando tinta em mim.
Ri e sai correndo. Estava ajudando algumas crianças a pintar quando vi uma menininha chorando.
- Continuem pintando desse mesmo jeito, ok? - Pedi e eles assentiram.
Fui até a menininha e perguntei o que tinha acontecido.
- Um grupo de meninas chatas falaram que eu não devia estara aqui porque eu não sei pintar e que eu ia estragar o desenho da Sarah. Depois elas disseram que eu etava ridícula com essa trança. - Contou ainda chorando.
- Não chora. Elas são apenas meninas chatas, como você mesma disse. E para falar a verdade, eu não pinto nem um pouco bem, mas estou aqui para me divertir com vocês. Além disso, essa atividade não é só para quem pinta bem. - Fiz uma rapida trança em meu cabelo. - E sobre a trança... eu adorei.
Ela parou de chorar e deu um pequeno sorriso.
- Qual o seu nome? - Perguntei.
- Nina. Bem, na verdade é Ana Carolina, mas meu irmão e todas as outras pessoas me chamam de Nina.
- Vamos pintar, Nina?
Passei o resto da atividade com Nina ajudando ela a pintar. Durante esse tempo descobri que ela tem sete anos, tem dois irmãos que se revesam para cuidar dela, já que seus pais morreram em um acidente de avião. Também soube que ela gosta de patinar e de comer pizza. Depois que terminamos o desenho que, inclusive ficou magnífico, fomos todos comer bolo. As crianças se divertiram muito, todas pareciam felizes e eu e as meninas ficamos orgulhosas com o resultado.
- Tchau, Liza. Meu irmão veio me buscar. - Disse Nina me dando um abraço bem forte.
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Na manhã do dia seguinte, fui para a praça andar de patins. Precisava de ar, ver a natureza e me sentir livre. Além disso, esportes diminuem a ansiedade. Quando já estava cansada de patinar, sentei-me em um banco para escrever um pouco.
"Querido Diário,
Trabalhar com as crianças ontem me fez um bem inesplicável. A arte é realmente uma terapia eficaz. Foi divertido fazer um pouco de sujeira e entrar, mesmo que por pouco tempo, no mundo mágico das crianças, onde nada de mal pode acontecer. Gostei da Nina, de certa forma me conectei a ela. Entendo como ela se sente, porque já passei por situações parecidas. Ela é uma menina forte, perder os pais em um acidente tão trágico... ela é tão pequena.
Bom, mudando de assunto... como aturar a Beatriz? Realmente, não sei como pude ficar calada daquele jeito e simplesmente aceitar tal tratamento. Ela se cha a rainha da escola! Fiquei tão constrangida com aquilo tudo... pelo menos a minha pele amanhaceu um pouco melhor, agora estou apenas com algumas acnes. Nem sei como encarar ela e o bad boy na segunda feira. Fico pensando, como o Diego aguenta ela. Quer dizer, não da para negar a beleza dela, mas garotos não sem importam com nada além disso? Como estar com alguém que não te entende e não fala nada de interessante, que não muda a sua vida? Acho que talvez o objetivo deles seja exatamente esse. Para quê conversar quando eles podem fazer outras coisas, não é mesmo? Talvez eu que seja a estranha, a diferente, a fora do padrão. Quando eu ter um namorado, quero que ele me entenda, quero ter conversas incríveis, que eu não conseguiria ter com mais ninguém, quero que antes de tudo ele seja meu confidente e descubra o mundo comigo. Sabe que esse é um dos motivos de eu estar evitando ir em festas? Não que eu seja chamada para muitas, mas estou fugindo das poucas que eu tenho. Penso que eu faço isso porque me sinto deslocada. Pessoas bebendo e se agarrando, ninguém nem liga mais para a pista de dança. Acho engraçado, porque me sinto até boba e infantil perto das outras meninas da minha idade. O que tem de errado comigo?"
- "O que tem de errado comigo?" Bem, muitas coisas, eu acho.
Congelei ao escutar o sussurro em meu ouvido. Assustada, fechei o diário com força.
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