Uma semana se passa desde que fui beijado pelo mal e cumpri mais um desafio da minha lista. Desde então, não risquei mais nenhum item. Não é porque eu sou covarde ou coisa do tipo, até porque, meus amigos, coragem é meu sobrenome!
E se você não concorda, discorda aí na sua casa.
Mas a verdade é que eu não estou com tempo desde que anunciaram o Festival Anual de Artes, um evento com duração de dois dias em que todos os estudantes de artes cênicas e artes visuais realizam apresentações para os outros alunos da universidade e, principalmente, para o público externo. O objetivo desse evento é atrair mais alunos e trazer mais visibilidade para a faculdade. A participação não é obrigatória, no entanto todos aqueles que fizerem a inscrição recebem horas complementares, certificados e a possibilidade de conseguir contato com alguma empresa do ramo artístico.
É uma oportunidade muito boa.
O evento é organizado pelos alunos, os professores apenas auxiliam e definem a ordem das apresentações. Como Jungkook e eu somos parceiros nas aulas e devido ao nosso excelente desempenho, fomos escalados como uma das principais apresentações. Eu odiei a ideia de trabalhar com Jungkook mais do que já sou obrigado, até pensei em formas de me livrar da professora por ter feito isso, mas acabei aceitando o terrível destino, já que estamos numa boa.
Posso ter me esquecido de mencionar, mas estamos numa espécie de trégua? Bem, é basicamente isso, e por incrível que pareça, foi tudo iniciativa do Jungkook. Não vou dizer que nos tornamos melhores amigos para sempre, com flores e purpurinas, mas admito que não estamos mais tentando nos matar vinte e quatro horas por dia, sete dias por semana. Até conseguimos conversar como seres humanos normais, acredita?
Segundo ele, essa trégua é necessária para que seja possível trabalharmos em nosso projeto, e preciso admitir que estou curioso para ver quanto tempo iremos aguentar sem desejar dar um chá de sumiço um no outro.
— Você tem algum compromisso depois da aula? — Jungkook pergunta enquanto seca os cabelos com uma mão e usa a outra para espalhar protetor solar no rosto.
— Acho que depois vou limpar o dormitório. A faxina desta semana é minha — respondo, passando requeijão no meu pão.
— Quer deixar a faxina para a próxima semana? Eu te ajudo. — Ele joga a toalha na cadeira da mesa e pega uma fatia do peito de peru que estou usando para fazer meu sanduíche, se esquivando quando tento bater nele com o pano de prato.
— Por que deveria mudar a data da limpeza?
— Eu pensei que talvez pudéssemos usar o horário da tarde para discutir sobre a música que iremos apresentar — explica, e quando tenta roubar mais uma fatia de peito de peru, eu acerto um tapa em sua mão, recebendo uma careta em troca.
— Você já tem algo em mente?
— Não, mas criei uma playlist. — Abre a geladeira e pega um suco de caixinha. — Coloquei só músicas que conhecemos.
— Me manda, eu posso escutar e dizer quais acho interessante. — Mordo um pedaço do meu precioso sanduíche e faço uma dancinha interna de felicidade com o sabor maravilhoso.
— Você vai morrer se tiver que passar uma tarde comigo?
— Meu alergista disse que preciso ficar longe da sua espécie.
— Engraçado, o meu falou a mesma coisa, e olha eu aqui dividindo dormitório com você. — Ele cruza os braços, e eu reviro os olhos.
— Acho bom você me ajudar na faxina, ou vou usar sua escova de dentes para limpar a privada.
— Você que manda, patrão! — Jungkook termina de beber o suco e manda um beijo voador, caminhando saltitante até o quarto. — Vou terminar de me arrumar, te encontro na aula.
Termino de tomar meu café e, como já estou arrumado, pego minha mochila e deixo o apartamento para ir em direção ao prédio da universidade. Como não estou atrasado, caminho sem pressa alguma. Durante o curto trajeto, esbarro com algumas pessoas da última festa de que participei, o que faz com que minha mente resolva voltar para o episódio do último desafio.
Depois que deixei o banheiro e voltei para a festa, fingi normalidade sobre toda a situação, e minha maior surpresa foi que Jungkook não fez uma piadinha sequer.
Será que ele gostou e ficou tão assustado quanto eu?
Ou será que eu beijo mal e ele preferiu não fazer piadinhas para não me envergonhar? Não, ele nunca perderia uma oportunidade dessas.
De toda forma, as duas hipóteses me assustam pra caralho. Prefiro fingir que tudo não passou de um delírio coletivo e seguir minha vida, afinal, minha prioridade no momento é pensar em uma boa música para performar com Jungkook.
Mas caso nenhuma ideia seja boa, nós podemos performar a "Dança Maluca" do Sid em a Era do Gelo II, na qual outras preguiças dançam e o nomeiam o Rei do Fogo. Ao fim da performance, eles amarram o coitado e o empurram para dentro de um vulcão como sacrifício. Nesse caso, Jungkook seria responsável pelo papel de Sid.
Uma pena não termos um vulcão...
Brincadeirinha, gente, claro que eu não vou servir meu adorável colega de dormitório como sacrifício. Vulcão algum merece esse tipinho de pessoa.
Logo que me acomodo no lugar de sempre, a professora chega acompanhada de mais alguns alunos, incluindo Jungkook, que, antes de se sentar ao meu lado, faz seu papel de político, cumprimentando nossos colegas de classe. A professora inicia a aula animada, como sempre, e decide gastar o primeiro período para falar sobre suas expectativas elevadíssimas em relação ao festival e sobre como seus alunos de dança vão arrasar com as ideias que ela irá sugerir.
E cada vez que ela menciona o bendito evento, eu sinto minha vontade de viver diminuir. Não é como se eu odiasse o assunto, longe disso, mas é cansativo ouvir a mesma coisa por quase uma semana inteira!
— Será que, se eu levantar os braços, Deus me leva? — Jungkook pergunta baixinho para que apenas eu escute.
— Com essa personalidade que você tem, acha mesmo que é Deus que vai te levar? — indago. — Óbvio que quem vai aparecer é o seu irmão, o carinha lá de baixo.
Jungkook me olha aparentemente com desgosto, e eu mordo meu lábio inferior para controlar a vontade de rir.
— Não fala mais comigo — diz. — Volte a falar só depois do fim da aula.
Dou risada do seu comportamento infantil e volto a prestar atenção na aula, bocejando quando percebo que o assunto não mudou.
Ao que parece, será um longo e cansativo dia.
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Sinto vontade de dançar e pular quando o sinal toca indicando o fim da aula. Juro por tudo nessa Terra que, se eu escutar a palavra "festival" mais uma vez, farei questão de trancar minha matrícula e me mudar para uma ilha para viver isolado de todos.
Como de costume, Jungkook desaparece no início do horário de almoço e eu sigo sozinho para o refeitório. Pego um ticket de almoço e, depois de quase vinte minutos na fila para pegar minha bandeja, finalmente caminho até a mesa em que meus amigos estão.
Estranho o fato de Yoongi estar ali, já que ele nunca sentou conosco. Talvez esteja esperando Jungkook, ou conversando com Taehyung sobre algo da aula, já que descobri que ele também cursa Música. De toda forma decido ignorar o motivo e foco apenas no bibimbap maravilhoso que tenho em meu prato. Nem mesmo paro para tentar entender o assunto que está rolando.
— Jiminie! — Taehyung chama minha atenção, e desvio meu olhar em sua direção. — Como estão os preparativos para o festival?
— Nem comecei ainda e já quero desistir — respondo.
— Estou com o mesmo pensamento — Yoongi diz. — Parece que esse é o único assunto que os professores têm!
— Eu soube que o número de inscritos deste ano foi bem fraco — Hoseok comenta. — Acho que eles estão tentando incentivar os participantes para que não desistam.
— Se esse é o objetivo, estão conseguindo o efeito oposto. Eu não aguento mais tocar nesse assunto — comento com sinceridade.
— Acho que sou o único da mesa que está ansioso — Taehyung fala, e Hoseok leva a mão até sua nuca para fazer carinho.
— É a primeira vez que você decide participar, amor. Por isso está tão animado — diz para o namorado, e meu amigo sorri.
— Vocês se apresentarão juntos ou solo? — pergunto para o casal.
— É meu penúltimo semestre, decidi focar no pré-TCC — Hoseok explica.
— Yoongi é a minha dupla — Taehyung informa. — Eu soube que você e o Jungkook foram escalados como a atração principal do seu curso.
— Sim, estou vibrando de felicidade por isso. — Reviro os olhos.
— Tente não ser preso, tudo bem? — Taehyung pede. — Não quero ficar sem meu melhor amigo.
— E pode contar comigo, Min. — Hoseok aperta meu ombro. — Como estudante de Dança, entendo a pressão de criar uma coreografia do zero para um evento em que somos a atração principal.
— Pode ter certeza que vou te chamar, a opinião de alguém que entende é sempre bem-vinda.
Decidimos mudar de assunto. Taehyung conta os boatos que estão rolando na sala dele sobre um aluno que está tendo um caso com o professor, e fico calado, comendo o resto da minha comida enquanto ouço a fofoca. Me distraio por um breve momento e olho ao redor do refeitório e encontro Taemin conversando animadamente com alguns garotos do Teatro. Como se sentisse meu olhar em sua direção, ele desvia os olhos para a mesa onde estou e acena com um pequeno sorriso nos lábios bonitos, e é claro que eu retribuo da mesma forma, lamentando internamente quando ele volta a atenção para os caras que o cercam.
Acho que a única coisa positiva da última festa foi o fato de que Taemin passou a me notar com mais frequência depois dos minutinhos que tivemos juntos. Além disso, ele também conversou comigo durante algumas aulas e até passamos o almoço juntos uma vez.
Na verdade, ficamos juntos por apenas quinze minutos, ele teve que sair para resolver uns negócios com a dupla dele, mas, de qualquer forma, já é um avanço, não é?
Sim, é.
Eu continuo observando-o de maneira discreta... Nunca vou me cansar de dizer o quão bonito ele é. O Criador realmente caprichou nesse homem.
Olhos escuros e brilhantes como uma pequena galáxia, cabelo preto levemente ondulado (que ele sempre dá um jeitinho de deixar bagunçado para dar um leve ar rebelde), rosto com traços bem marcados e, por fim, boca bem desenhada com o lábio superior mais fino e o inferior mais cheinho, tão vermelhinhos... Ah! Como pude esquecer? Ele tem um sorriso tão lindo que me lembra um coelho fofinho!
Lindo demais.
Espera um minutinho... Eu disse "coelho"?
— Oi, gatinho — Jungkook diz, parecendo animado. O que eu fiz para merecer isso, meu pai?
— O que você quer? — pergunto com todo o desgosto do mundo.
Agora está explicado por que eu estava descrevendo esse filhote de pombo!
Ele está sentado à minha frente bloqueando a visão que tenho do Taemin.
— Nem te conto, mas enquanto eu caminhava até a mesa, pisei em algo crocante, aí olhei e era o corpo do Taemin, seco como uma folha no sol — Jungkook fala e coloca a mão ao lado da boca como se fosse contar um segredo. — Você desidratou o menino de tanto que secou ele!
Ergo o dedo do meio para ele e escuto a risada dos demais que estão à mesa.
— Você é um mané! — Levo a última porção de bibimbap até a boca e, quando vou beber meu precioso suco, Jungkook pega a garrafinha e toma o último gole. — Você não tem amor à vida mesmo, né?
— Tá tudo certo para depois da aula, né? — pergunta, ignorando o que eu digo. — Mudou de ideia ou algo assim?
— Lógico que não!
— Então ok, me espera no estacionamento. Eu te encontro lá!
— Você não vai para as últimas aulas? — indago, e ele nega.
— Tenho umas coisas para resolver. — Se levanta e me entrega a garrafinha vazia. — Obrigado pelo suco, estava uma delícia! Tchau, galera! — Acena para os demais e logo se afasta.
Observo Jungkook caminhar até a saída do refeitório e dou de ombros, voltando minha atenção para os presentes à mesa. Aposto meu rim que está indo se encontrar com alguém.
Não que eu me importe, por mim ele pega quem quiser.
Enfim, não sei por que sempre acabo com meus pensamentos naquele cãoelho. Jungkook só pode ter lançado algum tipo de maldição sobre mim para que sempre acabe pensando nele, é a única explicação. Taehyung fica curioso sobre o que farei com Jungkook, e para que ninguém tenha ideias erradas, explico que apenas vamos resolver as questões do festival.
Quando nosso horário de almoço chega ao fim, retorno para a sala, e assim que me sento na cadeira, o professor entrega a avaliação que ele realizou na última aula, informando os pontos em comum que precisamos melhorar. Estou com um pouco de dificuldade em algumas técnicas e pretendo pedir auxílio para o Hoseok, já que ele é um dançarino mais experiente e pode me dar algumas dicas sobre como melhorar. Quando o período se encerra, guardo meu material para ir até o estacionamento onde o coelho do mal está à minha espera.
— Jimin!
Ah... essa voz.
— Oi, Taemin! — Tenho certeza que se estivesse vivendo dentro de um anime, esse seria aquele momento em que eu estaria com os olhos brilhando enquanto encaro o dono dos meus suspiros apaixonados.
— Você anda rápido, hein? Quase não te alcanço! — Ri e se encosta na parede. — Vai fazer algo agora?
— Vou encontrar o Jungkook para resolvermos umas coisas do festival. Por quê?
— Vocês são a atração principal! — Assinto, mesmo que não tenha sido uma pergunta, e ele se desencosta da parede para se aproximar de onde estou. — Eu ia perguntar se você não queria assistir um filme ou apenas ficar de bobeira. Não conversamos muito na última festa e essa semana foi puxada.
Ouuuuu!
Vocês viram isso, produção?
Ele quer sair comigo! Euzinho, Jimin! Se for um sonho, não me acorde.
Finalmente o universo está recompensando todas as rasteiras que me deu.
— Taemin, não vou negar que seria ótimo, mas hoje não posso mesmo... — Deixo um biquinho adornar meus lábios, e ele suspira, parecendo decepcionado.
— Responsabilidades primeiro, né? Mas podemos marcar outro dia?
— Claro!
— Me passa seu número, podemos ir combinando.
Trocamos nossos números e ele se despede com um beijinho no canto da minha boca, rindo baixinho com a surpresa estampada em meu rosto. Sinto minhas bochechas esquentarem e tenho quase certeza que estou parecendo um morango naquele momento. Estou tão feliz que é capaz de sair um arco-íris da minha bunda enquanto caminho até a saída.
A vida é uma maravilha!
Sigo radiante até o estacionamento e nem me importo com a cara de poucos amigos que Jungkook faz por conta do meu atraso.
Nada pode me abalar hoje.
— Por que está com essa expressão de quem acabou de gozar?
— O quê? — pergunto, alheio, e ele bufa.
— Esquece, prefiro ficar sem saber. — Destrava o carro, e quando eu abro a porta, percebo que tanto o banco do motorista quanto o do passageiro estão cobertos com um plástico.
— Por que os bancos estão forrados com plástico? — questiono e lembro que ele disse que iria resolver um "assunto" durante as aulas. Ele já estar no estacionamento quando eu cheguei só me fez chegar a uma conclusão. — Só pode ser brincadeira!
— O que foi?
— Você esteve com alguém em seu carro? Por isso os bancos estão forrados?
Me recuso a entrar aí! Sabe Deus que bunda encostou nesse banco.
— Você é maluco! — Ele gargalha. — Até parece que eu iria trocar o conforto da minha cama para fazer no carro. Você já viu o meu tamanho? É bem desconfortável — diz como se fosse óbvio e aponta para o carro. — Entra logo, seu pirado.
— E pensar que eu dormi na sua cama... eca! — Chacoalho os ombros com nojo. — Credo.
— Haha, muito engraçado você. — Abre a porta do motorista e se acomoda no banco. — Por que demorou? Nunca se atrasa.
— Estava conversando com Taemin — respondo, todo bobo.
— É por isso que você chegou igual a Barbie Butterfly?
— Exato!
Ouço um suspiro deixar seus lábios, em seguida ele bate a porta com força. Depois eu que sou o maluco.
— Sinceramente, cara...— Jungkook arruma o cinto e coloca a chave na ignição.— Não sei o que você vê nesse garoto. Desde que entrou aqui, ele nunca te deu bola, então ele te vê em uma festa, bebendo e se divertindo, e do dia pra noite se aproxima. — Dá partida no carro. — Achei que esse tipo de cara só existisse em filmes e livros. — Balança a cabeça em negativa, e eu bufo com seu comentário.— Pensei que você fosse mais esperto, gatinho...
— Eu não sou idiota, ok? — esclareço, um pouco incomodado com sua fala. — Nós conversamos e ele disse que tinha receio de se aproximar porque eu sempre fui mais reservado nas aulas.
— Quem quer arruma um jeito. Quem não quer arruma uma desculpa. — Jungkook para em um sinal vermelho e me encara. — Escuta, não quero dizer com quem você deve ou não se relacionar, só... sei lá. — Balança a cabeça e volta a encarar a rua. — Esquece. Nada disso é da minha conta.
Isso tudo é preocupação?
Acredito que não. A última vez que Jungkook se preocupou comigo foi quando existia uma amizade entre nós. Tenho certeza que toda essa preocupação é só medo de ele perder nossa aposta.
— Você tem razão, não é da sua conta. E só para você saber, eu nem gosto dele — digo para que ele entenda de uma vez por todas que não sou idiota e sei no que estou me metendo.
— Não gosta?
— Eu vejo ele todos os dias, mas não posso criar um sentimento só por aparência. Eu preciso conhecer mais profundamente para afirmar se gosto ou não de alguém. — Dou de ombros e o vejo assentir. — No momento, só sinto uma forte atração, nada mais que isso.
— Entendo... — fala, parecendo pensativo. — Que bom, então! — Sorri, e eu arqueio uma sobrancelha.
— O que tem de bom nisso?
— É bom perceber que você é inteligente para algumas coisas.
— Meu anjo, eu sou inteligente para muitas coisas. O único momento em que não fui inteligente foi quando aceitei ser seu amigo.
— Tá achando que é fácil assim ser meu amigo? — ele pergunta sem tirar os olhos da rua. — Nem me pagaram o suficiente para aceitar sua aproximação. Só aceitei a mixaria que me ofereceram porque tive pena de você.
— Vem aí o plot twist que ninguém te contou: pagaram para que eu me aproximasse de você.
Jungkook dá risada, e percebo que, apesar dos desentendimentos que tivemos instantes atrás, essas provocações não têm o objetivo de irritar um ao outro. Estamos apenas nos divertindo.
Ok, isso é assustador.
— Posso ligar o som? — Jungkook pergunta, e eu concordo com a cabeça.
Ele espera o próximo sinal vermelho e pega o celular no bolso da calça, conectando no Bluetooth do carro. O sinal abre novamente e ele encaixa o celular no suporte, deixando a música tocar no aleatório.
— Amo essa música! — exclamamos ao mesmo tempo quando Boom Clap, da Charli XCX, começa a tocar. Continuamos cantarolando de modo animado e desajeitado. Nossas risadas se misturam à batida contagiante, tornando o momento ainda melhor.
— Vamos começar a decidir as coisas do festival? — pergunto, balançando a cabeça no ritmo da música.
— Vamos, mas achei que seria legal fazer isso em um lugar diferente.
— E esse lugar é...?
— Você vai descobrir, ruivinho. Relaxa aí, aproveita o som. — Jungkook pisca e volta sua atenção para a rua.
Desvio meu olhar para a janela, tentando reconhecer as ruas que passamos, mas no fim acabo desistindo e fico observando as diversas casas e comércios, percebendo que cresci em Seul, mas não conheço nada por conta de toda a restrição dos meus pais.
Tudo seria muito mais fácil se eles entendessem que eu sou filho deles, não um objeto que pertence a eles.
Jungkook começa a cantar a música que toca no carro. Sem que ele perceba, eu deixo um sorriso escapar com as lembranças que me invadem, sentindo meu peito apertar com saudades daqueles tempos.
Era bem comum acordar e encontrar Jungkook na cozinha preparando nosso café da manhã enquanto cantava e dançava alguma música que tocava em seu celular.
Já me perguntei diversas vezes por que ele escolheu dança em vez de canto. Não que Jungkook seja mau dançarino, ele é incrível também. Para falar a verdade, não consigo lembrar se existe algo em que ele é ruim. Jungkook sempre se esforça muito em tudo que decide fazer, e isso é uma das coisas que admiro nele.
E ele nunca vai me escutar admitindo isso.
— Chegamos! — anuncia quase uma hora depois, e saio dos meus pensamentos, observando que estamos em um parque grande e verde.
A vista é simplesmente... surreal!
— Que lugar é esse? — pergunto, saindo do carro e sendo recebido pelo aroma gostoso das plantas.
— Parque Namsan — responde e vai até o porta-malas do carro, retirando uma sacola grande. — Ainda não acredito que você não conhece esse lugar. Seus pais nunca fizeram um piquenique com você aqui? Você nunca andou de bicicleta com um amigo?
— Eu não tinha tempo — explico e aponto para a sacola em suas mãos, tentando mudar de assunto. — O que é isso?
— Acho que é o nosso jantar. As pessoas jantam às quatro da tarde?
— Geralmente tomam café da tarde — eu digo enquanto sigo pelo parque. Sério, que lugar lindo!
Paramos em um lugar que eu percebo ser reservado apenas para piqueniques e Jungkook abre a sacola, retirando uma grande toalha verde. Enquanto ele organiza tudo, aproveito para andar e explorar um pouco, ficando ainda mais surpreso com o tamanho que o parque aparenta ter.
— Jimin! — Jungkook chama, e eu vou até ele. — Vamos comer primeiro, depois te mostro parte do parque.
— O que tem nessas vasilhas? — Aponto e me sento na toalha.
— Tem bulgogi, arroz, kimchi, um pouquinho de kimbap... — informa, indicando cada recipiente — Eu trouxe suco de laranja e de uva e, para a sobremesa, jujuba! — Sacode o frasco que contém as balinhas de goma colorida. — Uma vez você comentou que costumava comer isso nas festas da família do Taehyung. Não garanto que o gosto esteja tão bom quanto o que a mãe dele costuma fazer, mas juro que me esforcei para preparar tudo que você gosta.
— Você fez tudo isso?
— Sim! — Jungkook responde, parecendo orgulhoso. — Achei que você fosse encontrar o kimchi na geladeira, preparei no início da semana.
— Você realmente preparou tudo? — pergunto, ainda em choque. — Não comprou nada no restaurante?
— Eu fiz... — confirma, mas sem a empolgação de antes.
— Eu acredito em você, só estou... surpreso.
Não consigo acreditar que Jungkook se deu ao trabalho de preparar todas as minhas comidas favoritas. Eu nem me lembro de ter contado isso!
Não sei como me sentir sobre isso.
— Vamos comer! — digo para quebrar o clima, e ele me entrega um prato e um par de jeotgarak. — O cheiro está maravilhoso, tenho certeza que o sabor está tão bom quanto. Obrigado! — Levanto as tampas com um sorriso enorme em meu rosto.
— Não poderíamos falar sobre o trabalho de barriga vazia, não é mesmo? Além disso, esse festival está me irritando tanto que, se eu morrer de nervoso, espero que seja de barriga cheia!
Concordo, acompanhando-o na risada.
— Você não vai comer? — pergunto quando vejo que ele já se serviu, mas está me encarando.
— Estou nervoso para saber se você vai gostar. — Coça a nuca.
— Ok, vou provar.
Experimento um pouquinho de cada coisa e controlo minhas reações cada vez que levo uma porção até a boca. Eu tinha razão, o gosto está tão bom quanto o cheiro, e tudo que eu quero é comer essa comida para sempre.
— Então? — Jungkook questiona, e noto que ele parece ansioso pelo jeito como mexe as mãos e balança o pé.
— Hmm... — Mastigo mais um pouco e forço uma careta, quase engasgando com o riso quando ele arregala os olhos.
— Tá ruim? — Seu tom de voz é baixo, como se a esperança dele estivesse se esvaindo aos poucos.
— Então... — Respiro fundo.
— Tá ruim, certeza! — exclama. — Quer comer um dogão? Tem umas barracas por aqui.
— Está uma delícia — admito com uma risada. Posso ver que um peso enorme sai dos seus ombros.
— Puta que pariu, achei que estava horrível por causa da sua careta.
— Eu tava tirando uma com a sua cara. Isso aqui tá uma delícia. Tô falando sério.
— Agora posso comer em paz. — Jungkook seca o suor imaginário da testa e pega um par de jeotgarak, levando um kimbap até a boca e mastigando calmamente. — Tá bom mesmo — diz com a boca cheia.
Comemos em silêncio, mas está longe de ser desconfortável. Na realidade, é bem aconchegante, principalmente com a brisa gostosa do parque. Eu não consigo me lembrar da última vez em que comi uma refeição ao lado dele sem brigar, mas confesso que senti falta disso, é bom ter um momento de paz.
Percebo que estávamos com muita fome quando noto todos os recipientes vazios, restando apenas o potinho com as balas de goma que Jungkook estende em minha direção.
— Vamos dividir. — Removo a tampa e coloco a vasilha entre nós.
— Você está doente? — Jungkook indaga, e eu arqueio uma sobrancelha.
— Não, por quê?
— Você está dividindo a sua preciosa jujuba comigo! Da última vez que eu comi, achei que você fosse arrancar meus órgãos com as mãos!
— Você preparou todo o almoço, nada mais justo do que dividir a sobremesa. — Pego algumas jujubas e estendo para ele. — Pode comer, prometo que não vou tentar te matar.
— Vou acreditar em você. — Jungkook pega os doces e leva até a boca. — Você quer conversar sobre as músicas enquanto andamos pelo parque?
— Pode ser. Você tem fones de ouvido? — pergunto, e ele pega a caixinha no bolso. — Ótimo, vamos arrumar tudo.
Organizamos todas as coisas na sacola e Jungkook conecta o fone Bluetooth no celular, me entregando um dos lados. Enquanto a canção é reproduzida no fone, nós exploramos o parque em silêncio, fazendo um comentário ou outro sobre quais músicas podemos considerar e quais devemos remover.
Fico surpreso com a quantidade de atrações espalhadas pelo parque e com os animais que vivem por ali. Durante nossa caminhada, o único desejo que tenho é de retornar aqui com mais tempo para conhecer cada cantinho.
Quase uma hora depois, Jungkook diz que quer me mostrar um lugar. Percebo que a grama fica "crocante" ao longo da caminhada e, quando olho para o chão, noto diversas folhas rosas e secas pelo sol, um "tapete" rosa que só vai ficando com a cor mais intensa, quase como um dégradé.
Jungkook para de andar, e eu ergo a cabeça para olhar onde estamos, arregalando os olhos, surpreso, quando vejo a quantidade de cerejeiras.
— Isso parece um sonho! — comento, tocando em uma das árvores.
— Dois dias atrás teve a Festa das Cerejeiras aqui no parque — Jungkook explica.— A florada dura pouco tempo, acho que estamos com sorte de encontrar as árvores assim.
— Poxa, eu não acredito que perdemos esse evento. — Me deito no chão assim como algumas outras pessoas estão fazendo e olho para cima, suspirando apaixonado pela visão que tenho.
— Acontece sempre, você pode se programar para o próximo ano — ele diz e se deita ao meu lado. — Quase sempre tem um evento legal aqui. Pode não parecer, mas o parque é enorme, tem bastante coisa para se divertir.
— Pode ter certeza que vou voltar. — Viro a cabeça para encarar Jungkook e dou um sorriso sincero. — Obrigado por me trazer aqui, eu adorei de verdade.
— Pode contar comigo sempre que quiser conhecer um lugar novo.
— Isso é engraçado. Você saiu da Inglaterra para morar em Seul quando tinha sete anos e conhece a cidade melhor que eu.
— Eu gostava de conhecer lugares e pessoas diferentes, me ajudava com o coreano.
— Você teve muita dificuldade em aprender o idioma?
— Eu demorei para aprender, e até hoje tem palavras que tenho muita dificuldade para pronunciar, mas durante a infância era pior. Em casa, só meu pai fala coreano e minha mãe fala com bastante dificuldade já que ela é inglesa, mas a convivência com meus primos coreanos e as festinhas de criança que eu frequentava me ajudaram muito.
— Que bom que a sua família te ajudou a aprender os dois idiomas. Acho legal que você seja próximo deles.
— Você é próximo dos seus? — Jungkook pergunta, parecendo curioso. — Agora que percebi, não sei muito sobre os seus pais, mesmo depois de quase um ano e meio que moramos juntos.
Fico um pouco desconfortável com a pergunta, sabendo que é uma área da minha vida que prefiro não explorar. Rapidamente, desvio o olhar das cerejeiras acima e viro meu rosto em direção ao horizonte do parque, tentando disfarçar a tensão que começa a surgir.
— Minha relação com eles não é... muito boa — comento e o encaro. Jungkook percebe minha mudança de humor e o tom mais sério em minha voz.
Sua expressão se suaviza em compreensão.
— Me desculpa se toquei em algum assunto delicado. Não precisa responder mais nada se não quiser — ele me assegura.
— Não, tudo bem. É só que... não é uma história muito fácil de contar. — Respiro fundo e forço um sorriso, tentando retomar o clima leve que tínhamos momentos atrás. — A música parou?
— Coloquei em pausa, não queria atrapalhar nossa conversa.
— Faltam muitas músicas para a playlist acabar?
— Mais umas três. Posso colocar?
Aceno que sim, e Jungkook coloca a playlist para tocar novamente. As últimas três músicas passam enquanto assistimos ao pôr do sol. Antes de ficar escuro, decidimos voltar para o carro, debatendo sobre as músicas que escolhemos.
— Acho que Close, do Nick Jonas, é a melhor opção — digo, me acomodando no banco do passageiro. — A melodia é envolvente e a letra é boa, as pessoas serão impactadas.
— E sabe o que é engraçado? Eu nem tinha planejado adicionar essa música na playlist, coloquei por engano e é a nossa melhor opção. — Ele dá de ombros e tira a jaqueta, jogando no banco de trás do carro. — O dia de hoje está bem agradável — comenta enquanto dá partida no carro.
— Também acho. Não está nem frio, nem calor. — O céu estava azulzinho durante a tarde, não tinha uma nuvem, e agora que está anoitecendo, tem uma brisa bem gostosa. Completamente agradável!
— Não estou falando apenas do tempo — Jungkook diz. — O que eu quis dizer é que está agradável entre nós dois. — Me olha rapidamente e volta a atenção para a rua. — Não brigamos, conversamos tranquilamente, almoçamos juntos e até demos algumas risadas. Isso é bom, eu gosto disso. — Ele sorri e respira fundo.— Senti falta dessa paz entre nós.
— Eu também — admito e noto que seu sorriso se alarga, deixando visível o par de dentes que o faz parecer um coelho, me levando a rir também. — Música?— pergunto, erguendo meu celular, e ele confirma.
Conecto o dispositivo no som do seu carro e viro o rosto para encarar a rua pela janela, aproveitando a música e o clima agradável.
Eu só queria que os dias voltassem a ser assim entre nós. Tenho medo de acordar amanhã e perceber que tudo isso que ele está fazendo é apenas um plano para que eu desista da nossa aposta.
Jungkook não seria capaz disso, né? Prefiro não pensar.
Fico tanto tempo imerso em meus pensamentos que, quando Jungkook desliga o carro, eu tomo um susto, pensando que já chegamos à república estudantil. Removo o cinto e, ao olhar para a frente, percebo que estamos em uma rua que não conheço.
— Onde estamos?
— Um lugar bem legal — responde e estende a mão para mim. — Me dê sua jaqueta, seu celular e esvazie os bolsos.
— O que é isso? Um assalto?
— Vou te levar para um lugar e é melhor deixar essas coisas aqui no carro. Confie em mim.
— Você está me pedindo algo muito difícil.
— Jimin, por favor!
Ainda desconfiado, entrego o que me foi solicitado, e ele coloca tudo em uma sacola, jogando no banco de trás.
Jungkook sai do carro e eu faço o mesmo, seguindo seus passos com desconfiança ao mesmo tempo em que uma pequena voz dentro de mim questiona se tudo isso é uma boa ideia. Uma brisa suave faz as folhas das árvores balançarem e me deixa ainda mais ansioso.
Ele caminha até a lateral de um prédio imenso, sua confiança evidente quando empurra um pedaço solto da tela de alambrado que cerca uma quadra de futebol. O som metálico ecoa, e eu olho ao redor para ver se não tem alguém por perto.
— Um campo de futebol? O que estamos fazendo aqui? Eu não quero ser preso.
— Você não vai ser preso, Jimin. — Revira os olhos e atravessa a cerca,
segurando para que eu possa passar também. — Esse clube de esportes é da universidade, os atletas treinam aqui.
— E por que não entramos pela porta da frente?
— Porque o clube está fechado — explica.
Jungkook começa a caminhar pelo gramado, e por um momento, eu hesito, meu olhar alternando entre ele e o campo à nossa frente. Ele está se afastando, cada vez mais distante, e a incerteza me prende por um instante. Mas então tomo uma respiração profunda e corro em sua direção, meu coração batendo mais rápido com a mistura de emoções.
Ele parece à vontade, como se essa fosse a coisa mais natural do mundo. Seus passos são firmes, e ele continua a avançar pelo campo com determinação. Eu me sinto como sua sombra, seguindo seus passos com curiosidade e um pouco de apreensão. À medida que nos afastamos do prédio, meu olhar se volta para o outro lado do campo, onde posso distinguir algumas portas. Elas se destacam contra o fundo escuro da noite, e fico imaginando o que estaria por trás delas. Um pavilhão coberto, talvez?
Finalmente, chegamos às portas. São tão grandes e impressionantes quanto pareciam de longe. Jungkook empurra a maçaneta e permite que eu entre primeiro. Arquibancadas se estendem ao redor de uma piscina enorme, a água cintilando sob a luz suave. A área está iluminada de maneira difusa, as arquibancadas estão vazias e silenciosas, mas a piscina parece convidativa.
Eu não acredito que ele fez isso.
— Eu vou te matar, Jungkook! — Olho ao redor e não o encontro em nenhum lugar. — Jungkook? — Caminho em direção à piscina e cruzo os braços. — Se você estiver se escondendo para me dar um susto, eu juro que vou te castrar no chute! — ameaço e noto a blusa vermelha e a calça preta dele jogadas no chão.
Meu Deus, será que esse lugar é amaldiçoado e ele virou um sapo? Talvez uma lagarta?
Me aproximo das peças e percebo que não tem nenhum ser vivo ali. Certo. Ele pode ter virado pó, é uma hipótese.
— Ei, Jimin! — ouço sua voz e o procuro na direção do som, encontrando-o no trampolim.
— O que que você está fazendo aí, caralho? — exclamo, irritado.
— Vou pular, não é óbvio? — Jungkook dá um sorriso enorme.
Meus olhos estão fixos nele, parado no trampolim, usando apenas uma cueca. Isso é inesperado, mesmo para os seus padrões.
Ele sorri de maneira desafiadora e dá um passo para trás, preparando-se para saltar. Meus olhos percorrem seu corpo, sua postura confiante combinando com a ousadia da situação. Sinto meu rosto esquentar ligeiramente.
— Você enlouqueceu de vez? — Minha voz está carregada de incredulidade.
— Só se vive uma vez, gatinho.
Jungkook começa a saltar no trampolim, seus movimentos fluidos e controlados. Cada vez que ele se lança no ar, sinto meu coração pular junto, uma mistura de preocupação e admiração.
— Isso é perigoso, Jungkook! — grito, embora ele pareça não se importar.
Ele ri no ar, uma risada cheia de empolgação, e finalmente mergulha na piscina como uma bola de canhão, espirrando água em minha direção.
— Você é um louco, Jungkook, sabia disso? — digo quando ele volta para a superfície. — Sai dessa piscina agora! — exclamo, nervoso, e olho para os lados. — Vamos ser expulsos da universidade!
— Você não vai entrar? A água está morna. O último treino deve ter acabado há pouco tempo.
— Eu não vou entrar aí! Tem câmeras aqui!
— Se eu me lembro bem, você tem um desafio de nadar pelado, então aproveita a oportunidade e entra aqui comigo... — Ele sorri, ignorando tudo que estou dizendo, e tenho vontade de entrar na piscina apenas para afogá-lo.
— Jungkook, tem câmeras nessa merda! Sai logo antes que você seja preso e eu também como cúmplice!
Ele se move um pouquinho na água, e penso que vai nadar para sair, mas a única coisa que faz é segurar um tecido azul escuro nas mãos e jogar em mim, atingindo meu rosto.
— Eu não acredito que você jogou sua cueca em mim! — esbravejo, irritado, e ele ri, ou melhor, gargalha alto.
— Vai, Jimin, entra logo e cumpra o desafio, não vai aparecer ninguém aqui — diz, e eu cruzo os braços. — Se não apareceu até agora, é porque não tem ninguém observando.
— Já disse que não vou!
— Então eu vou sair e te pegar. — Ele sorri. — E eu estou pelado, gatinho...
— Se você não sair daí, eu vou pegar seu carro e voltar para o dormitório.
Ele revira os olhos e joga água em mim, ignorando o que eu digo. Começa a nadar tranquilamente, me deixando mais nervoso a cada segundo. Vou até a porta que leva para a saída e verifico se não tem ninguém do outro lado, então volto para a piscina e evito encarar Jungkook.
Ok, eu só preciso nadar. Tiro a roupa, dou um mergulho e pronto! Desafio cumprido! Vamos para casa!
O que eu tinha na cabeça quando escrevi essa merda na lista?
— Tudo bem! Vou entrar! — declaro, e ele sorri.
Jungkook se vira para me dar privacidade, e removo minhas roupas com tanta pressa que o Flash ficaria com inveja. Coloco o pé na água para testar a temperatura e percebo que de fato não está fria, e sim bem morninha, quase quente, o que me deixa mais tranquilo para entrar. Quando a água cobre metade do meu abdômen, eu me inclino e retiro a última peça que cobria meu corpo, jogando próximo das minhas roupas. Dou um mergulho e, ao voltar à superfície, me assusto com Jungkook parado quase na minha frente.
— Satisfeito? Mergulhei peladão na água. Podemos ir?
— Que eu me lembre, o desafio é "nadar pelado", e não "mergulhar pelado"— diz com um tom debochado. — Vamos nadar dessa borda até a outra, o que acha? Ida e volta.
— O que ganho em troca? — Cruzo os braços.
— Um pacote de jujuba tamanho família, o que me diz?
— Topo. O que você vai querer em troca?
— Só o prazer de te ver perdendo.
— Sinto muito, mas já ganhei. — Jogo os cabelos para trás e vou até a borda da piscina.
— É o que veremos! Está preparado? Assinto e damos início à contagem.
No "três", nadamos como dois desesperados até a borda, voltando logo em seguida. Puxo a perna de Jungkook algumas vezes e ele fez o mesmo, mas no fim empatamos. Quando ele sugere uma revanche, eu aceito sem nem hesitar.
— Isso foi divertido! — comento com um sorriso e jogo os cabelos que estavam em meus olhos para trás.
— Também achei! — Ele faz o mesmo e se aproxima. — Calma aí, acho que tem alguma coisa no seu cabelo... — Jungkook olha para minha cabeça e se afasta minimamente. — Ah, são só seus chifres mesmo. — Dou um tapa no braço dele e reviro os olhos.
— O único aqui com chifres é você. — Rimos e eu olho para cima, respirando fundo. — Vamos embora?
— Vamos, sim. — Ele aponta para a escadinha da saída da piscina e nadamos até lá. — Será que tem toalhas por aqui?
— Espero que sim, odeio vestir roupa com o corpo molhado.
Jungkook se vira novamente enquanto eu saio da piscina, e pego minha pilha de roupa no chão, usando-a para me cobrir. Ele também sai da piscina e pega as roupas no chão, fazendo a mesma coisa que eu.
— Vamos procurar o vestiário masculino, deve ter toalhas lá.
Escutamos um barulho na porta principal e instantes depois entra um fiscal com um punhado de chaves na mão, acredito que conferindo se está tudo vazio para trancar. Ficamos parados no lugar por conta da situação, e assim que o homem nos encara e percebe que não estamos usando o típico traje de banho da universidade, ele arregala os olhos e provavelmente chega à conclusão de que somos invasores.
O que não é uma mentira.
— Acho melhor você correr — Jungkook diz e pega na minha mão, me puxando para a porta por onde entramos.
Escutamos o fiscal gritar e correr atrás de nós, mas eu nem mesmo olho para trás, apenas corro pelo gramado do campo de futebol como se minha vida dependesse disso.
Jungkook puxa o pedaço de tela por onde passamos, e não sei o que acontece comigo, mas começo a rir descontroladamente enquanto corro pelado, com o pau balançando para todo lado, em direção ao carro. Jungkook destrava as portas depressa, e enquanto eu coloco o cinto, ele já está dando partida, rindo assim como eu.
E só depois que o carro já está em movimento que eu entendo o lance dos plásticos nos bancos. O filho da mãe estava com tudo planejado!
Rimos o caminho inteiro, nos lembrando da cara do fiscal quando olhou em nossa direção e nos viu perto da piscina completamente pelados. Eu queria ter tido a oportunidade de registar esse momento. Foi impagável!
E sabe, preciso admitir que, apesar desse perrengue, essa foi uma das melhores experiências da minha vida. Não consigo me lembrar de um momento em que eu ri tanto como hoje.
Não é algo que pretendo repetir, mas com certeza é um momento que vou guardar e, se um dia tiver filhos, contarei para eles.
Chegamos ao estacionamento da universidade e agradeço internamente por estar vazio, mas acho que grande parte disso é por conta do horário. Jungkook pega duas toalhas no banco de trás do carro, e só nesse momento percebo que ainda estamos despidos, com nossas roupas amontoadas no colo. Aceito a toalha e enrolo em minha cintura com um pouco de dificuldade por ainda estar dentro do veículo.
— Pronto para correr de novo? — Jungkook pergunta, me entregando o resto dos nossos objetos, que estavam no banco de trás, e eu assinto.
Saímos do carro com nossos pertences em mãos e ele ativa o alarme, olhando ao redor para se certificar que estamos sozinhos.
Jungkook faz a contagem, e quando chega no "três", saio em disparada para nosso bloco. O medo de algum segurança nos ver nessas condições é grande, mas a adrenalina que sinto em minhas veias é sem igual. Chegamos ao apartamento ofegantes, e a primeira coisa que faço é despencar no sofá e rir como um idiota.
— Puta merda. — Dou risada, sentindo minha respiração normalizar aos poucos. — Foi a melhor e mais assustadora experiência que já tive.
— Nunca mais vamos repetir isso — ele comenta e se levanta para ir até a cozinha. — Quer água?
— Por favor!
Jungkook abre a geladeira e joga uma garrafinha em minha direção, pegando outra para si.
— Quem vai tomar banho primeiro? — pergunto após tomar alguns goles.
— Pode ir primeiro se quiser. Vou lavar as coisas que usamos no piquenique. — responde e caminha até seu quarto.
— Obrigado. Estou sentindo o cloro da piscina na minha pele e é incômodo pra cacete.
Caminho até a porta do meu quarto e encaro Jungkook encostado na porta do dele. Quando ele me encara de volta, me sinto um pouco tímido.
O quê?
Que merda de reação é essa?
— Espero que tenha gostado do dia de hoje — ele diz.
— Eu amei, me diverti muito!
— Fico feliz em saber disso. — Sorri e se aproxima para afastar alguns fios de cabelo que caem em meus olhos.
Ele afasta a mão, mas seu olhar fica fixo nos meus por longos segundos de uma forma bem intensa.
Eu pagaria qualquer valor para descobrir o que está se passando na cabeça dele nesse instante e por que o castanho dos seus olhos parece mais intenso.
Jungkook abre a boca como se fosse dizer algo, porém desiste e desvia o olhar, sorrindo como se o momento de segundos atrás não tivesse acontecido.
— Vou tomar banho, toda essa correria me deixou cansado — digo para quebrar o clima.
— E a louça me espera. — Ele se aproxima e deixa um beijo em minha bochecha, caminhando apressadamente para a cozinha. — Boa noite!
— Boa noite... — sussurro e entro no meu quarto.
Solto o ar que nem notei estar segurando e fecho a porta, encostando minhas costas na madeira.
Por que esse beijo pareceu ter tanto... carinho?
Acho que engoli água com cloro. Estou ficando louco e imaginando coisas.
Deixo as roupas sujas no cesto e pego peças limpas antes de ir até o banheiro com a mente repleta dos momentos de hoje. Foi tão incrível, eu nunca, nunca me diverti tanto assim. Tudo que vivi no dia de hoje foi diferente do que estou habituado. Talvez essa aposta com Jungkook não seja tão ruim quanto imaginei, eu estou me divertindo pra valer e, ao mesmo tempo, estou me descobrindo. Acho que posso ter momentos como esses e ainda me tornar um excelente profissional. Não preciso ser como meus pais.
Saio do chuveiro me sentindo mais leve e satisfeito em chegar a essa conclusão. Sei que não será uma mudança da noite para o dia, mas estou disposto a me esforçar e me libertar dessa prisão que eu mesmo criei. Quero começar a fazer as coisas de que tenho vontade sem me preocupar com o que meus pais pensarão sobre mim
Preciso ter em mente que eles deixaram de se importar há muito tempo.
De banho tomado e com roupas limpas, caminho para meu quarto e fecho a porta. Me jogo na cama soltando um gemido de alívio por poder descansar de toda aquela correria e pego o celular para responder a algumas mensagens de Taehyung, contando brevemente sobre o meu dia. Quando decido dormir, meu celular vibra mais uma vez, indicando uma nova mensagem, e desbloqueio a tela pensando que pode ser Taehyung.
Jungkook����:
acho que essa deveria ser a nossa música
▶️
[22h47]
Clico no vídeo que ele me mandou e vejo que Jungkook está dublando Boom Clap em meio ao amontoado de cobertores na sua cama. Mordo o lábio inferior para conter o sorriso e digito "É oficialmente a nossa música" como resposta, bloqueando o celular em seguida para poder dormir.
A última coisa que passa pela minha mente antes de me entregar aos braços de Morfeu ou qualquer outro deus do sono e sonhos é o sorriso bonito de Jungkook e todos os momentos inesquecíveis que ele me proporcionou nesse dia.
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