Os olhos da loira arregalaram-se e ela ficou inerte. Será que ouviu direito? Ou será que estava enlouquecendo? Era o que se passava na cabeça dela. Seus olhos se moveram um pouco e pararam nos de Michael.
— C-Como?
— Sim, Liz. Ele está vivo. — Michael falou manso, mas, por dentro, estava sendo corroído pelo nervosismo. A reação de Elizabeth era de puro choque. Era apenas isso que ele conseguia identificar, não sabia dizer se ela estava com raiva ou feliz por trás de toda aquela expressão embasbacada.
Elizabeth engoliu seco e olhou para suas próprias mãos. Ela não sabia se Michael estava falando sério ou lhe pregando uma peça.
Mas ele não brincaria com algo tão sério assim, ela pensou. Michael não era de fazer piadas com coisas do tipo. Se a situação era séria, ele sempre levava a sério, ainda mais quando se tratava de seu pai. Então... Por que tanta surpresa? O que era aquele misto de sentimentos dentro de si? Estava feliz ou com raiva?
Tantas perguntas e nenhuma resposta cabível.
Ela deveria ficar feliz, certo?? Afinal, seu pai estava vivo e havia voltado para si! Só que... Ela não conseguia. Já sentia as lágrimas implorando para sair. Foi quando a primeira gota caiu, umedecendo sua bochecha pálida.
— C...Como você sabe disso? Como sabe que ele está de volta, ainda mais VIVO?!
— Eu vou explicar, Liz. Ele-
— V-Você sabia disso o tempo todo? E nos escondeu a verdade durante todo esse tempo, é isso?!
— Que? Não! Se acalma e me ouve, ok? — Tranquilizou a irmã, que respirou fundo e assentiu. Foi aí que Michael contou tudo, desde a garota na festa de John até o dia que Henry sofreu um princípio de infarto. E a cada revelação dada, Elizabeth sentia a bagunça em sua mente piorar. Não conseguia acreditar que seu irmão havia escondido tudo aquilo dela por tanto tempo; sentia-se enganada.
Por que? Por que Michael não havia dito essas coisas antes? Eles eram irmãos, certo? Não escondiam nada um do outro!
— Por que não me disse isso antes, Michael? — Sua voz já saia chorosa. Michael suspirou e a encarou.
— Eu não pude, Elizabeth.
— Como não?! Então quer dizer que não lembra da promessa que fizemos, huh?! De que tudo o que acontecesse conosco, não iríamos esconder nada! NADA!
— Elizabeth, eu lembro muito bem dessa promessa, okay? Não é necessário gritos aqui. Mas entenda também isso: nem tudo o que acontece comigo, eu vou precisar falar a você. — A sinceridade do mais velho pegou a garota desprevenida. Era forte ouvir aquilo, mas ele estava certo. Elizabeth só tinha quinze anos, era uma adolescente em desenvolvimento. Ela não saberia como ajudar o irmão com problemas daquele nível.
Ela sabia que ele estava certo, mas não queria aceitar isso. Olhou firme para ele e franziu a testa, deixando que as lágrimas caíssem.
— Você sabe muito bem a falta que ele me faz, Michael! Como teve a coragem de esconder que ele estava vivo?! Isso é covardia!
— Você fala como se eu tivesse escondido a verdade há anos. Foram apenas CINCO dias, Elizabeth! Tempo suficiente para eu me preparar pra contar tudo. Afinal, ainda que eu quisesse, não poderia esconder por muito tempo, pois, acredite, eu ia fazer isso.
— “APENAS”?! SE VOCÊ NÃO O CONSIDERA COMO SEU PAI, O PROBLEMA É SEU! AGORA NÃO QUEIRA ME ENVOLVER NISSO!
— Eu já disse que não é necessário gritar, Elizabeth! Meus ouvidos funcionam perfeitamente e não preciso que gritem para que eu ouça!
— EU GRITO A HORA QUE EU QUISER! — O rosto da loira estava vermelho e molhado por conta do choro. Ela encara o próprio irmão com raiva, mas logo o arrependimento bate. Michael, como sempre, permanece calado, já que percebeu que tentar acalmá-la seria perda de tempo.
Por fim, Elizabeth suspirou e relaxou o corpo antes tenso. A menina abaixou a cabeça, sentindo as lagrimas escorrerem já enfraquecidas. Michael observou cada movimento da irmã e só depois de perceber que ela havia se tranquilizado que ele abriu a boca para proferir algo.
— Elizabeth, eu consigo imaginar o que você está sentindo. Uma mistura de raiva e dor. Eu tenho uma noção do que é isso. Mas olha, eu nunca tive a intenção de magoar você. Me perdoe se inconscientemente fiz isso. — Começou, segurando gentilmente as mãos da menor. — Desde que ele havia desaparecido que eu tento fazer o possível para ver vocês dois felizes, mas... Vejo que falhei nisso. Na verdade, entendi que eu sou apenas um ser humano fraco e que não tenho como manter vocês livres de todo o mal... Enfim, eu nunca quis machucar você. E se escondi alguma coisa, com certeza, foi para não vê-la nesse estado.
Elizabeth ouvia tudo em silêncio. Não conseguia pensar em uma frase sequer e muito menos tinha forças para retrucar as palavras do mais velho. Estava triste, isso era óbvio. Seu irmão havia se aberto para ela, contando tudo o que vinha acontecendo com ele, e isso trouxe medo ao seu coração. Tinha medo de que Michael voltasse ao seu eu de alguns anos atrás. Não conseguia imaginar ver seu irmão numa cama de hospital novamente.
E depois de consideráveis minutos em silêncio, ela levantou a cabeça, fixando seu olhar ao dele.
— Por que a nossa vida é desse jeito, Mike? O que fizemos de tão ruim? Será que nunca viveremos felizes, sem todos esses problemas? Quando pensamos que tudo está bem, de repente, o nosso chão desaba... E as coisas ruins voltam a acontecer de novo e de novo... — Falava com a voz embargada. Seu peito apertava e ela não conseguiu conter os soluços que logo começaram a sair. Michael suspirou e puxou a irmã para um abraço. Sua mão esquerda acariciava as costas da garota, enquanto a direita afagava suas madeixas claras.
— Eu creio que um dia isso tudo irá passar, Liz. — Foi só o que conseguiu dizer. Os dois ficaram mais um tempo abraçados até que Elizabeth se acalmasse. E quando os choro cessaram, a menina foi a primeira a apartar o abraço.
— Você... Vai contar para o Dave agora?
— Sim... Eu preciso fazer isso...
— Mike... Você disse que, ainda que quisesse, não poderia esconder isso por muito tempo... O que quis dizer com isso? — Michael engoliu seco, mas não tardou em responder.
— Porque ele quer ver vocês. Se eu não conversasse com vocês, ele viria aqui e seria bem pior... E eu tive medo dele realmente fazer isso e tirar vocês de mim. — Confessou. — Eu também não quero prender vocês... Eu não tenho esse direito.
Elizabeth não conseguiu formar uma frase coerente, então optou por ficar calada. Seu estômago embrulhou, demonstrando claro nervosismo só de imaginar estando frente a frente com seu pai após seis anos. A adolescente suspirou e ficou de pé.
— Eu... Eu vou descansar um pouco, Mike... É muita informação e eu não tô conseguindo processar tudo de uma vez. Estarei no meu quarto. — E dito isso, deixou o cômodo do mais velho. Michael respirou fundo e jogou o corpo para trás, caindo de costas na cama macia. Seus olhos fitavam o teto, enquanto sua mente trabalhava em como daria aquela notícia ao Dave.
E foi só pensar no menino que ele surgiu na porta do quarto.
— Mike? — O mais velho se sentou novamente e encarou o menor. Suspirou mais uma vez e sinalizou para que o menino entrasse. — Tá tudo bem?
— Acho que sim. — Observou a criança sentar ao seu lado e engoliu seco. — Dave, eu quero contar uma coisa a você.
— É? O que?
— Lembra... De quando eu falei que o papai havia viajado e que passaria um bom tempo fora?
— Hmph! Claro que lembro! Inclusive, ele foi embora sem se despedir de mim! — Ele reclamou, cruzando os braços. Michael sorriu fraco.
— Pois bem... Ele voltou. — O mau humor de Dave se esvaiu num segundo, dando lugar a uma expressão de surpresa e alegria ao mesmo tempo.
— É sério?!
— Sim... E... Ele está ansioso para ver vocês dois...
— Eba!! Papai voltou! — E começou a dar pulinhos de alegria. — Onde ele está, Mike?! Eu quero vê-lo!
— Calma, Dave... Ele não está aqui em casa, se é isso que está pensando. Ele está numa outra casa e eu preciso ligar para ele primeiro... — Explicou, tentando acalmar o garoto eufórico.
— Então liga logo! Eu quero ver o papai, Mike, eu não lembro de nada dele! — Essa última frase apertou o coração de Michael, ao mesmo tempo que sentiu raiva.
— Okay, eu vou ligar, mas não agora. A Liz não está muito bem, então amanhã eu os levarei para vê-lo, sim?
— Hmph... Tá bom. Mas o que a Liz tem?
— Ah... Coisas de garota, lembra? — Inventou qualquer desculpa e logo viu a cara de espanto do menor.
— Oh! Então é melhor deixá-la quieta! — Michael não conseguiu evitar de dar uma risadinha. Era engraçado como Dave reagia a esse tipo de coisa.
— É, isso aí...
(...)
No final do dia, Michael ficou sentando em frente a sua residência. Olhava para o céu escuro onde a grande lua estava bem visível e brilhante como sempre foi. A cada fração de segundos deixava escapar um suspiro. Já havia falado a contragosto com seu pai pelo telefone fixo de sua casa e só lhe restou um vazio no peito. Não negava que estava com muito medo do que o homem poderia aprontar envolvendo seus irmãos, mas também reconhecia que nada podia fazer para impedir esse contato.
Fechou os olhos por alguns minutos, tentando afastar tais pensamentos. Foi quando ouviu um choro baixinho. Seu corpo se arrepiou dos pés à cabeça pelo susto que levou e olhou ao redor. Na lateral de sua casa, estava uma criança com metade do corpo escondido por trás da parede. Pôde ver que era ela a dona do choro. Estranhou aquilo e ficou de pé, se aproximando da criança.
— Oi... O que houve com você? — A medida que se aproximava, identificou que a criança era uma garotinha. Ela estava com um vestidinho rosa rasgado e bastante sujo, seus cabelos eram grandes e castanhos e sua pele era pálida.
Viu a menininha se esconder mais, tremendo de medo. Ele franziu a testa e parou de caminhar até ela.
— Onde estão seus pais? Você é muito novinha para estar na rua sozinha, pequena... — Se agachou e estendeu os braços para ela.
— E..Eu quero minha m-mamãe.. — Sua voz saiu fraca. Michael ergueu as sobrancelhas e sentiu um embrulho no estômago. Aquela menina era familiar e ele tinha certeza de que já ouviu aquela voz em algum lugar.
— Eu te levo até ela. Você lembra onde é sua casa? — Perguntou e ela negou. De repente a face da menina mudou para uma expressão de medo. Ela congelou no lugar e o encarou de um modo bizarro.
— Ele está aqui!
— “Ele”? Ele quem? — Olhou para trás, cismado, mas não viu ninguém. — Mas não tem ning-...
Quando tornou a olhar para a garota, ela havia sumido. Michael, achando aquilo tudo muito esquisito, ficou de pé e cogitou ir atrás da menina.
— Ei, cadê você? — Olhou por onde a menina estava há pouco tempo, mas não tinha nada ali. — Mas o que...
— Michael?
— AH! — O rapaz deu um pulo seguido de um grito de surpresa e olhou para seu lado esquerdo. — Nossa, Elizabeth, você me assustou!
— Desculpe... Mas é que eu não te vi em casa e vim ver se estava por aqui... Você estava falando sozinho?
— Que? Não, oras... Tinha uma criança aqui do lado, ela estava perdida. Tentei conversar com ela pra saber de onde ela veio, mas ela não soube dizer.
— Michael... Não tinha ninguém aí...
— Como não? Ela estava bem aqui! Usava um vestido rosa e rasgado, tava bem sujo também... Tinha cabelo castanho e a pele branca... Como você não viu? — Ao ouvir aquilo, Elizabeth franziu a testa, demonstrando preocupação, e se aproximou lentamente dele.
— Michael, eu juro... Não havia ninguém aí. Você estava falando sozinho... — Michael ficou bastante confuso. Essa confusão evoluiu para um medo misturado com nervosismo. Engoliu seco e respirou fundo, tentando não entrar em mais uma crise.
— Não acredito que isso aconteceu de novo... — Sussurrou.
— O que disse...?
— N-Nada... Não foi nada.
— Tá... Bom, vou entrar então... Você vem? — Michael apenas assentiu. Elizabeth suspirou e voltou para casa.
(...)
Dois meses depois...
Era Agosto, mês em que Michael iniciaria seu último período na faculdade. Lembrar disso o ajudou a aliviar a tensão que sentia desde que William havia voltado. Falando nisso, um dia depois que Elizabeth e Dave receberam a notícia de que seu pai estava de volta, eles se reencontraram. Dave era o mais alegre entre os irmãos. Elizabeth permaneceu relutante por mais três dias até ceder e dar o primeiro abraço em seu pai após seis anos longe dele. Com o passar do tempo, foram se acostumando e, agora, Elizabeth vivia grudada em seu pai. Tanto ela como Dave.
Michael era o único que não estava contente com isso. Ainda não confiava em seu pai e até conseguir isso levaria muito tempo.
No momento, o mais velho estava em casa, arrumando os materiais dentro da mochila, pois logo retornaria à faculdade. Sentia-se nos tempos de escola e era até engraçado toda aquela ânsia por parte dele. Enquanto os mais novos choramingavam o tempo inteiro por não quererem ir à escola.
Michael deixou tudo organizado na escrivaninha de seu quarto e suspirou. Lembrou também que fazia dois meses que não saía com seus amigos. Passou quase três semanas sem falar com eles e, quando resolveu dar um “oi”, se sentiu muito mal. Ele até entendia o motivo, mas doía ao pensar que ele quase estragou a amizade que tinha com o grupo. Continuava um pouco distante deles, mas ainda mantinha contato. Ainda conversava, mesmo que falasse pouco.
Saiu do cômodo, indo para a cozinha. A casa estava vazia, pois seus irmãos estavam com o pai. Michael esperava de todo coração que seus irmãos já estivessem a caminho da escola. Respirou fundo e optou por comer algo rápido, não queria se atrasar.
E em questão de minutos, já estava a caminho da faculdade. Naquele dia, o tempo estava abafado. Michael usava uma calça jeans escura e uma regata branca devido ao calor que fazia naquele dia. Seus cabelos castanhos estavam presos de um jeito desleixado em um rabo de cavalo alto. Bufou levemente irritado por conta do vento quente. O que Hurricane tinha de pequena, tinha de exagerada. O inverno era incrivelmente frio e o verão era insuportavelmente quente.
Na metade do caminho, ouviu seu nome ser chamado e ele parou de caminhar. Olhou para o outro lado da rua e se surpreendeu ao ver quem era.
— Mason... — Falou um pouco arrastado. O sol estava tão quente que havia levado toda sua energia.
— E aí, Michael! — O asiático o cumprimentou sorridente. — Nossa, mas que cara é essa? Tá todo vermelho.
— Então, né... Não tenho muita afinidade com dias quentes e o sol parece não gostar de mim. Aí qualquer coisa fico assim, vermelho igual um camarão! — Responde, revirando os olhos após terminar a frase. O mais velho riu de leve.
— É, eu tô vendo. Estava indo à faculdade?
— Ah, sim... Hoje começa o último período do curso...
— Oh, que bom! Eu estava indo à casa de uma amiga que fica próximo à faculdade, então... posso te fazer companhia?
— Sim, claro. — Respondeu com um sorriso singelo. Os dois caminhavam juntos, enquanto jogavam conversa fora. Ambos riam de algumas situações engraçadas que compartilhavam e o assunto ia mudando conforme o tempo. Até que começaram a compartilhar coisas sobre si e sobre suas respectivas famílias.
— Sabe, eu agora sou filho único.
— “Agora”?
— É. Minha irmã mais nova morreu com cinco anos. Eu tinha catorze, quando isso aconteceu. Susie, como era chamada, era uma menininha elétrica, não parava quieta um segundo sequer. — Ele falava com um sorriso fraco e um olhar entristecido. Michael apenas ouvia, sentindo um aperto no peito.
— Perdão a pergunta, mas como ela morreu? — Um segundo depois de ter feito a pergunta, o arrependimento bateu. Mason ficou calado, sem olhar para Michael. Era claro que ele não se sentia confortável em responder. — Me desculpe...
— Um dia eu te conto. Ainda não me sinto pronto pra isso. Susie era muito querida pela família... Principalmente por mim.
— Tudo bem, eu peço desculpas pela pergunta...
— Não precisa disso, Michael. — Tentou acalmar o outro, sorrindo em seguida. — Mas e com você? Desde que nos encontramos que você está estranho.
— Estou?
— Sim, você está.
— Hm... — Suspirou. Pensou se deveria ou não contar sobre a volta de seu pai. Afinal, ainda não tinha um bom nível de amizade com Mason, não sabia nem se podia confiar nele. Porém, sem querer, revelou: — Meu pai voltou.
Mason parou de caminhar inesperadamente. Michael notou e parou também, olhando para trás e observando a atitude estranha do rapaz.
— Seu pai.... O que?
— Ele voltou... Aconteceu alguma coisa? Você mudou de repente... — De fato, o asiático mudou. Até o olhar simpático que o rapaz trazia consigo se esvaiu de uma hora pra outra. Parecia assustado.
— Tá... Tá tudo bem, não se preocupe. — Sorriu pra disfarçar, mas isso não convenceu o mais novo. — Enfim, chegamos! Boa aula, Michael!
E se foi a passos acelerados. Michael franziu a testa, estranhando todo aquele comportamento.
“Ótimo... O show de esquisitice voltou...”
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