Ainda lembro como se fosse ontem, de um dia que nossas mães nos levaram num parque aquático quando tínhamos oito anos. Normalmente a gente só saía com nossas mães, porque o pai do Jooheon trabalhava muito, e nunca passava tempo com ele, e o meu apenas não se importava, sempre dizia que estava cansado demais, ou que ia sair pra beber com os amigos.
– Honey, vamos no toboagua de boia? – estávamos na piscina de ondas havia algum tempo, e já era a décima vez que eu pedia pro garoto ir comigo no brinquedo.
Hoje em dia sei que a resistência é porque ele tinha medo desse tipo de coisa, assim como foi na montanha russa, quando ele finalmente me confessou que temia algo na vida. Mas na época eu não fazia ideia, afinal ele era quem sempre me protegia.
– Minhyukie, tá tão legal aqui nessa piscina.
– Só uma vezinha, por favoooor. – continuei insistindo, fazendo manha até ele ceder.
Corremos juntos até as escadas, chegando onde o instrutor nos dava as orientações, e uma boia grande e amarela com espaço para duas pessoas sentarem. Jooheon segurou minha mão com força quando o monitor nos empurrou, e descemos gritando até a piscina rasa que nos esperava embaixo.
Quando chegamos na água, eu estava rindo muito, pois adorava aquele friozinho na barriga, porém, meu amigo estava pálido e com os olhos arregalados.
– Que foi Honey? – eu segurei de novo a mão dele, achando que poderia estar passando mal.
– Acho que bati minha cabeça quando chegamos. – provavelmente aquela era só uma desculpa pra não assumir que era só medo, mas como era inocente, eu acreditei.
– Vem, vamos sair. – o puxei pela mão pra fora da piscina, indo até o gramado mais próximo. – Deita aqui, deixa eu ver se tá tudo bem.
Claro que eu não sabia o que estava fazendo, apenas estava preocupado com meu amiguinho, e fingindo que poderia cuidar dele, assim como ele sempre cuidava de mim.
– Ainda tá doendo? – coloquei as costas da minha mão sobre a testa dele. Não sabia o motivo de fazer isso, mas sempre que eu me sentia mal minha mãe fazia a mesma coisa, então só copiei o gesto.
– Só um pouco, continua assim. – ele apertou os olhos, segurando minha mão para que deixasse-a em sua testa.
Acho que essa foi a primeira vez que senti meu coração bater mais forte por ele. Desde que éramos menores, sempre achei o sorriso dele bonito, e sempre tinha vontade de sorrir junto, mas nesse dia, além de olhar pro seu rosto e achar ele bonito, meu coração pareceu mudar de ritmo, e senti minhas bochechas corarem. Era algo puro e inocente, um amor genuíno.
– Minhyukie, tem alguma coisa acontecendo na minha casa. – de repente ele ficou sério, e eu deitei ao lado dele na grama, entrelaçando nossos dedos.
– O que foi?
– Meu pai disse pra mamãe que não aguenta mais essa família. – eu não conseguia entender como uma pessoa poderia não querer sua família. – Disse que minha mãe não servia pra nada, que não estava me criando direito.
Essa também foi a primeira de muitas vezes que Honey ouviu seus pais discutirem, e seu pai dizer que ele não estava sendo criado como um homem de verdade, porque sua mãe não permitia que ele lhe batesse quando queria o castigar por qualquer coisa.
– Mas você é a pessoa mais legal do mundo, como ele pode achar que você não está sendo criado direito? – aquilo não fazia o menor sentido pra mim.
– Meu pai disse um monte de vezes que eu vou virar uma mariquinha por causa do jeito que ela me trata. – ele suspirou. – E eu nem sei o que isso significa.
– Eu vou descobrir e te conto.
– Vai descobrir como?
– Vou perguntar pra minha mãe. – respondi. – Ela é a melhor adulta do mundo. – de fato eu admirava muito minha mãe, e ela sempre explicou tudo que eu perguntava à ela. – Você já tá melhor? – perguntei sobre seu machucado.
– Sim, vamos naquela piscina que o balde gigante joga água na nossa cabeça. – ele levantou e saiu correndo, comigo no seu encalço.
Fiquei muito feliz por ter feito pelo Honey o que ele sempre fazia por mim. O escutei e tentei o proteger. Queria que as coisas tivessem se mantido assim até hoje...
[...]
Antes de voltar para o campus, eu e Shownu fomos junto com Kihyun levar os garotos no aeroporto. A despedida foi cheia de lágrimas por parte do Yoo, que mesmo em público nem se importou de encher IM de beijos.
– Eu vou sentir sua falta, seu idiota. – ao mesmo tempo que o beijava, socava seu peito, como se quisesse descontar a raiva por ter que ficar tão longe do rapaz. – Promete me ligar sempre?
– Vou te chamar no Skype todos os dias, não se preocupe. – Changkyun acariciou sua bochecha, limpando um pouco das lágrimas ali. – E o Shownu vai cuidar de você nesse tempo, não vai?
– Claro que vou. – o maior passou o braço protetoramente por cima do ombro de Kihyun. – Não vai se livrar mais de mim, baby. – sorriu para o pequeno, e aquele sorriso era tão fofo que eu podia ver tanto o Yoo, quanto o Im se derretendo por ele.
Assim que eles também se despediram de Jooheon, eu dei um abraço em Changkyun, para deixar o platinado por último.
– Se cuida lá tá bem? – pedi, tentando segurar as lágrimas que já umedeciam minhas pálpebras.
– Você também. – ele me abraçou de novo, dando um beijo em minha testa. – Sempre que puder, e se não for incômodo, me liga também, tá? – seu abraço era tão forte que parecia que não ia me soltar mais. – Sinto tanto pelo tempo que perdemos.
– Vamos esquecer isso, o que já foi, já foi. – disse de um modo meio confuso. – O que importa é daqui pra frente.
– Tá bom. – ele finalmente me soltou, para entrar na área de embarque. – Eu te amo Minhyukie.
– Também amo você Honey. – deixei finalmente as lágrimas escorrerem, assim que ele caminhou para longe de mim, mais uma vez.
Decidimos ir tomar um café antes de pegar o caminho para a Universidade. Shownu parecia contente, e eu gostei de saber que ele e Kihyun estavam tendo algo.
– Como você se sente sobre o IM também gostar do Kihyun? – o modo como eles se comportaram no aeroporto realmente tinha me deixado curioso.
– Antes eu achava que seria ruim, porque ele seria meu rival, e os dois são amigos a anos, então me sentia em desvantagem. – ele explicou, tomando um gole de seu café. – Mas no fim, acho que as coisas podem ser ainda melhores do que eu esperava.
– Que legal. Tô feliz por você.
– Mas e por si mesmo, você tá feliz? – ele me encarou, com um olhar inquisidor.
– Claro, fiz as pazes com o Jooheon depois de tantos anos.
– Mas ainda gosta dele? Digo, não só como amigo?
– A gente quase se beijou no meu quarto no outro dia. – confessei. – Mas eu resisti, nunca iria trair o Wonho, ele não merece isso.
– Sinto muito por você Minhyuk. – ele pegou minha mão em cima da mesa. – Ainda acho que deveria terminar. Você sabe que seu relacionamento esfriou, sabe que gosta desse Jooheon, mas você precisa passar um tempo livre, na minha opinião. Os dois moram longe de você, vá aproveitar um pouco sua juventude.
– Vou pensar sobre isso.
[..]
Durante um mês a minha rotina foi ir para as aulas, voltar pro dormitório, e passar no mínimo uma hora conversando com o Honey pelo Skype. Mesmo com a diferença no fuso horário, a gente dava um jeito de se falar, contávamos como foi nosso dia, o que estávamos fazendo de legal, eu reclamava das aulas chatas e ele reclamava dos americanos escrotos.
Já com Wonho, continuava sempre aquela dificuldade em marcar um horário que os dois estivessem livres, e apenas trocávamos mensagens no kakao. Ligação em vídeo era uma a cada três dias, se déssemos sorte. Todos os dias eu pensava sobre o que Shownu me dizia, pensava em terminar aquilo de uma vez, mas não tinha coragem. Meu medo era magoar o rapaz que sempre foi tão bom pra mim.
– Minhyuk, vamos pedir uma pizza? – Shownu tinha acabado de chegar, eram em torno das seis horas da tarde.
– Pode ser. – respondi sem ânimo. Estava jogado na cama, lendo um livro para um trabalho que eu tinha que fazer.
Depois de uns vinte minutos, a campainha tocou.
– Nossa, que rápido. – Shownu se assustou, achando que já era a entrega.
Mas para a sua surpresa, quando abriu a porta, era Wonho quem estava ali.
– Ah, oi. – disse meio sem jeito. – Ele já tinha visto o colega de seu namorado umas duas vezes, mas ainda não tinham intimidade alguma. – Desculpa vir assim sem avisar, mas o Minhyuk está?
– Quem é? – levantei da cama, me surpreendendo ao ver o Shin plantado na porta.
– Bem, eu vou dar uma volta, se a pizza chegar guarda a minha parte tá? – o maior decidiu me dar privacidade.
Assim que a porta se fechou, me jogei nos braços do moreno, o apertando forte, tamanha a saudade que sentia.
– O que faz aqui amor? – perguntei, ainda agarrado a ele. – Por que não me avisou que viria?
– Acabei resolvendo de última hora. – Wonho me deu um selinho, acariciando meu cabelo antes de me puxar para sentarmos na cama. – Me desculpe vir de surpresa.
– Imagina, eu estava com saudades, fico feliz que tenha vindo. – percebi que ele baixou a cabeça, meio entristecido.
– Também sinto muito sua falta. – ele falou tão serio, que comecei a me preocupar.
– O que foi?
– Eu vim porque precisamos conversar. – suspirou profundamente, parecendo tentar organizar as ideias.
– Essa frase nunca antecede coisa boa. – uma ruga se formou entre meus olhos, denunciando que eu estava intrigado.
– Meu amor. – ele entrelaçou nossos dedos. – Eu sinto muito sua falta, todos os dias. É difícil, dói demais. E eu imagino que seja igual pra você. Então... – mais uma vez ele suspirou fundo. – Não queria mais que a gente se sentisse assim. Nem eu, nem você. Acho que tentamos fazer isso funcionar no início, mas agora parece que tá tudo fora do lugar. Não acha que a gente parece que esfriou demais?
– Sim, eu acho. – respondi bem baixinho, como se não quisesse de fato confirmar aquilo.
– E não é culpa nossa, acredito que as circunstâncias nos levaram a esse ponto. Eu queria ter sido capaz de fazer isso direito, porque eu realmente amei muito você.
– Amou? – minha garganta doeu pelo bolo que se formou nela, juntamente com as lágrimas que se juntaram em meus olhos.
– Eu vim refletindo sobre o que sinto. – ele prosseguiu. – E percebi que estou confuso, meio perdido sem você do meu lado. Eu vim até aqui, porque acharia errado falar tudo isso por telefone, precisava ter coragem de olhar nos seus olhos e dizer pessoalmente, e também pra confirmar se os meus sentimentos são mesmo os que eu pensei. Mas acho que não dá mais Minhyuk, temos que terminar.
– Você não me ama mais? – as lágrimas acabaram escapando, mesmo sem eu querer.
– Você me ama? – ele devolveu a pergunta. – Me ama igual a quando começamos, igual me amava quando terminamos o ensino médio? Igual a quando perdemos a virgindade um com o outro?
– Não. – respondi com toda a sinceridade. – Não igual, mas ainda amo.
– Eu também, meu amorzinho. – ele selou minha testa. – Se não te amasse, já teria me deixado levar pelos desejos que tive por outras pessoas em todo esse tempo que ficamos longe. – era obvio que assim como eu, ele também teria flertes e oportunidades de ficar com outros. – Mas não é mais o mesmo amor. Quando parei pra pensar, percebi que te amo, mas como um amigo, não mais daquele jeito romântico. E essa saudade que eu sinto, me fazia querer brigar contigo todos os dias, igual você brigava comigo.
– Me desculpe pelos meus surtos, mas era realmente porque ficava triste sem você.
– Eu sei, lindo. Por isso mesmo eu segurava minha própria vontade de retrucar, senão a gente ia viver quebrando o pau. Mas viver na corda bamba, pisando em ovos, não está fazendo bem nem pra você, nem pra mim.
– Você tem razão. – no fim das contas, eu sabia que também já não me sentia igual sobre nós dois.
– Eu não quero que fique triste, quero que seja livre. – ele sorriu pra mim, mas seus olhos também lacrimejavam. – Eu te amo, e por isso quero que seja feliz.
– Então é isso? É assim que acaba? – era meu primeiro término de namoro, e eu me sentia muito triste, mas ao mesmo tempo aliviado.
– Acho que sim. – ele deu de ombros. – Só não me odeie, por favor.
– Nunca. – o abracei mais uma vez. – Eu não vou deixar de te amar. Você foi meu primeiro namorado, minha primeira transa... Sempre vai ser alguém especial.
– Engraçado que você não disse que fui seu primeiro amor... – ele riu sem humor.
Eu não sabia o que dizer, então o silêncio que se instalou parecia constrangedor, mas em nosso mundinho a gente conseguia se compreender.
– Você foi o meu primeiro amor, Minhyuk. – depois de uns minutos ele quebrou o climão. – Mas eu sei que o seu, era ele. Hoje, adulto, consigo enxergar melhor algumas coisas. E se você ainda sente isso, fala pro Jooheon. Eu quero mesmo que você seja muito feliz.
– Obrigado Hoseok. – agradeci com todo o meu coração. – Também quero que você seja muito feliz, você merece alguém especial.
A campainha tocou outra vez, e agora era a pizza. Mandei uma mensagem chamando o Shownu, e nós três jantamos juntos. Meu agora ex namorado foi para a casa dos pais dele, e eu me deixei chorar no colo do meu amigo. Mesmo que aquele término fosse algo esperado e necessário, ainda assim não era fácil. Eu me senti como se tivesse perdido uma parte de mim, e talvez fosse assim mesmo. Quando a gente namora alguém, nos doamos um pouco pra pessoa, e ela pra nós, e quando acaba, é como se um pedacinho da gente fosse embora com aquela pessoa.
Já era meia noite quando fomos nos deitar, e eu mandei uma mensagem para Jooheon. Ele não me respondeu, então fui dormir, esperando acordar com uma resposta, mas ela não veio. Assim que acordei, tentei ligar, no entanto, ele não atendeu. Talvez estivesse ocupado demais. Eu iria esperar até mais tarde, quando ele visse me retornaria, pelo menos era isso que eu pensava.
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