Semana passada - primeiro dia do acampamento
─ Luz, Luz! Luz acorda! ─ chamava Augustus enquanto balançava os ombros da latina por vários segundos seguidos.
Nada. Luz não reagiu de forma alguma.
─ Se não fosse o ronco baixo eu podia jurar que ela tava morta ─ comenta Boscha, recebendo imediatamente um tapão no ombro. ─ Ai Park! Que diabos-!?
Willow sabia que a jogadora usou seus sobrenome por acidente, numa faísca muito rápida de raiva, mas a questão não era essa.
─ Não diga isso outra vez! ─ repreendeu com a voz vacilando de nervosismo. Tanto ela quanto Gus tinham péssimas lembranças quando Luz e morte estavam na mesma sentença.
─ Tá bom me desculpa, mas que mão pesada Willow. Já é a segunda vez hoje ─ resmunga a Thirdeye, e a jovem florista revira os olhos, mesmo desenhando um sorriso sem graça nos lábios.
─ Torça pra não haver uma terceira ou quarta.
─ Vamos Luz, acorda! ─ Augustus chamou outra vez, começando a ficar um pouco apreensivo.
Faltavam apenas alguns minutos para o trem chegar no destino final dos estudantes da Hexside, e considerando que a garota de cabelos num tom vinho esteve dormindo a viagem inteira até agora, era uma boa hora para que ela acordasse e eles começassem a se preparar para o desembarque.
O grande problema era que Luz não acordava de jeito nenhum.
─ Que caralhos de remédio a Kira deu pra ela?
─ Foi um calmante eu acho... ─ o garoto ia respondendo, até ser interrompido.
─ Ei crianças! ─ os três escutaram a voz da professora Eda de repente, se virando para a porta da cabine. O cheiro acentuado de álcool veio com tudo, e inconscientemente a sub-capitã de futebol apertou os lábios e franziu a testa. ─ O otário do seu treinador é um fracote pra álcool como sempre três-olhos, não aguentou nem 5 drinks hahaha!
─ Admito que não estou muito surpresa ─ Boscha responde.
Eda riu mais um pouco, ela claramente estava um pouco alterada e num estágio administrável de embriaguez, pelo menos. Mas então ela olha para sua protegida dormindo como uma pedra, e por um momento precisou se agarrar mais firmemente no puxador da porta da cabine com a breve sensação de estar caindo, antes de finalmente perguntar:
─ Hey, quando foi que ela dormiu?
─ Pouco depois de embarcarmos, a Kira do time de basquete deu à ela um calmante porque ela tinha ido no banheiro da estação alegando mal-estar, e talvez o remédio tenha reagido bem demais com o organismo dela. ─ Gus disse, ficando um pouco mais calmo com a presença da mulher ali.
─ Já tentaram acordá-la? Estamos quase chegando.
─ Estamos tentando há minutos! Gus já a balançou e chamou várias vezes ─ Willow declarou.
─ Balançar não ajuda em nada quando ela tá roncando, ela fica assim só quando está no penúltimo estado profundo de sono. É nessas horas que aquela buzina seria perfeita... ─ A Clawthorne mais velha trabalhou um pouco os pensamentos, apesar da pequena dificuldade que ia além da bebida. ─ Já sei. Vocês já vão se preparando, e garoto é bom você sair do lado dela quando eu voltar.
A professora saiu rapidamente, deixando apenas Boscha em estado de confusão. Willow e Augustus, sendo amigos de Luz há tantos anos, estavam mais do que acostumados com os jeitos estranhos e até questionáveis da professora de biologia. Os três adolescentes no fim fizeram o que ela tinha dito, e Gus ficou de pé dentro da cabine.
Eda voltou pouco tempo depois, trazendo um copo de plástico com água em temperatura ambiente, e antes que a jogadora de cabelo rosa pudesse perguntar o que diabos a mais velha faria com aquilo, teve sua resposta no instante que o líquido foi arremessado no rosto de Noceda.
Luz acordou num pulo com a água que entrou no seu nariz, tossindo com a queimação na faringe, sentindo o coração acelerado pelos estímulos repentinos.
─ Prontinho, criança acordada. ─ Eda sorriu satisfeita, enquanto Boscha só observava surpresa.
─ Mas o que-? O que tá acontecendo?? ─ Luz perguntou completamente atordoada, tossindo mais algumas vezes e expirando forte pra tirar o excesso de água do nariz.
─ Ainda bem que nunca dormi numa aula dela... ─ a Thirdeye murmurou baixo para Willow, que riu.
─ Por que jogaram água em mim? Tá frio! ─ a latina reclamou com a voz grogue, secando o rosto com a manga do casaco.
─ A gente tentou te chamar por vários minutos, estamos quase chegando e você não acordava de jeito nenhum! ─ Gus falou.
─ E bem, não tínhamos um spray buzina por aqui, tive que usar outros métodos ─ Eda complementou.
"Ainda bem que ela esqueceu aquele negócio endemoniado!" a morena concluiu com um certo alívio, agora apenas lutando contra os resquício de sono que faziam seus olhos pesarem.
Poucos minutos depois, o maquinista anunciou a chegada na estação das Montanhas Knee. O trem rapidamente teve uma esvaziada significativa, todos conferindo a posse de suas malas e pertences, como celulares e tickets de viagem.
E claro que Luz quase deixa o seu ticket no trem, mas ninguém - além dos seus melhores amigos e mentora - precisava saber disso, certo?
Com mais 15 minutos de viagem nos transportes particulares da administração dos chalés, todos os alunos e mestres finalmente chegaram no destino do Acampamento de Inverno.
─ Muito bem pessoal! Agora todos se juntem que vamos fazer a seleção de grupos!
Assim, os estudantes se amontoaram numa multidão organizada enquanto os professores e os assistentes dos treinadores de basquete feminino, natação e vôlei masculino - por estes estarem bêbados por conta da disputa de álcool com Eda e o professor de música - se reunindo para definir cada grupo por quem seriam responsáveis.
Cada treinador - e assistentes - ficou com um grupo de jovens compostos pela maioria de cada time respectivo, e para evitar "briga" com uma certa professora coruja, como sempre Eda ficou com a tutela da protegida, além dos amigos nerds, e surpreendentemente, Boscha.
"Isso vai ser divertido" Luz pensou com um sorrisinho atrevido quando ouviu o nome da ex-bullier na lista do grupo da professora de biologia. Olhou para sua melhor amiga de canto de olho, e viu Willow bufar com o rosto rosado.
Se elas ficassem no mesmo quarto seriam os 15 mais satisfatórios que receberia do melhor amigo.
E bem, foram de fato os 15 dólares mais prazerosos que ganhou numa aposta.
Mas melhor que isso foi ver o rosto de pimentão da sua sub-capitã. E ela dizia que era durona e insensível...
Hoje - uma semana de acampamento
_____*_____
Miss Blight<3: Noceda, são 22h da noite aí e aqui 21h.
"Você não tem outras coisas pra fazer além de perturbar?"
Me: Olha, ter eu tenho.
"Mas é muito difícil manter uma conversa com vc srta. Então quero que dure"
"Além disso, tenho certeza que se ñ gostasse já teria me mandado pro inferno e me bloqueado *cara convencida*"
...
"Blight? Ainda tá aí?"
Miss Blight<3: Estou, infelizmente.
"Não te devo satisfação, mas estava conferindo minha agenda dessa semana. Pelo jeito tenho só os trabalhos extras.
"E Noceda, não pense que só porque eu ainda não te bloqueei que eu não te mando ir se foder quase todos os dias.
Me: Onwt, pensa em mim todo dia? *emoji apaixonado*
Miss Blight<3: Vai se foder garota.
Me: Não se preocupe Srta. Blight, eu tbm penso em você
"Gosto da srta, é uma ótima companhia de madrugadas"
"Além disso... Acho que nunca me senti tão interessante pra você como agora."
"Eu gosto de conversar com vc, de verdade"
"E tbm, pode ser muito estranho ler isso mas... já sinto falta da sua presença"
Miss Blight<3: Hm. Você escreve demais.
"Mas eu entendi."
"Eu preciso ir agora, Noceda."
"Tenha uma boa noite."
Me: Oh, certo, tudo bem. Até mais Srta. Blight
_____*_____
Luz digitou a última mensagem feito o flash, saindo do chat em seguida e bloqueando a tela. Em seguida, ela deu um longo e pesado suspiro, com um pequeno sorriso retorcido que alcançava seus olhos.
─ Você parece piada Noceda ─ Luz riu de si mesma com frustração e um gosto amargo na língua.
Ficava cada vez mais estranho conversar com a Blight por mensagem... não era o mesmo de poder encarar os frios olhos dourados, a carranca adorável ou o movimento daquela boca pequena e delicada.
E por algum motivo estava com uma sensação estranha no peito, quase como se...
Estivesse faltando algo.
─ Luz, vai demorar muito aí dentro?
A latina se vira para a porta no mesmo momento quando ouviu a voz do amigo, e o tom nervoso não passou em branco. Desde o ocorrido da estação seus amigos tinham ficado um pouco mais cautelosos, principalmente Willow, e sentia que ela suspeitava que não tinha sido um mal-estar.
Mas só de lembrar sentia seu estômago se contorcer e revirar.
Deu uma última olhada em si mesma pelo espelho. Mesmo com seu ilustre pijama com estampa de Azura ela ainda não se livrava da touca para esconder seus aparelhos auriculares, porque naquela noite a festa do pijama no dormitório não seria apenas ela com seus melhores amigos e canecas de chocolate com marshmallows. Suas garotas dos times e Boscha também iriam participar.
E por mais que Boscha já soubesse dos seus segredos, as outras não sabiam e não tinha certeza de como elas iam reagir.
─ Estou saindo!
Destrancou a porta e a abriu, dando de cara com seu melhor amigo com uma expressão um pouco tensa, mas abrindo seu melhor sorriso de alívio disfarçado.
─ Finalmente, estava começando a pensar que estava com dor de barriga ou algo assim ─ mentiu o garoto. E Luz sabia que era uma mentira apenas para evitar qualquer tensão.
─ Foi mal, tava mexendo no celular e acabei me perdendo no tempo. ─ A garota desenhou um sorriso desajeitado, e sua fala não era total mentira.
─ Tava flertando com quem dessa vez? ─ ouviu a voz de Boscha no dormitório, e seus olhos vagaram pelo ambiente até encontrar a garota na porta do quarto com alguns lençóis nos braços. E ao seu lado claro, estava Willow com uma sacola grande de salgadinhos e pipoca.
Já fazia alguns dias, uma semana mais especificamente, que eles estavam nas chaleiras. O tempo se divergia entre passar rápido demais ou absurdamente lento, dependendo de qual fosse a atividade programada para o dia. Mas de modo geral as atividades eram bastante divertidas, e já haviam rendido altos momentos entre o trio de melhores amigos.
E naquela noite eles tinham combinado de fazer uma festa do pijama no dormitório de Luz e Gus.
O beliche já havia sido arrastado para um canto, com travesseiros e edredons grossos roubados do quarto de serviço da cabana espalhados no tapete, o laptop de Eda emprestado com muito esforço, e alguns jogos de tabuleiro – o primeiro e o último graça à ajuda do namoradinho de Gus, que era sobrinho do dono das chaleiras. Ainda faltava algumas coisas, mas tudo estava indo bem até agora.
Vendo aquelas duas tão próximas era quase impossível para Luz não querer soltar uma piadinha, bem ao estilo 'Liam', mas a noite nem sequer começou e não queria aborrecer Willow ainda cedo. Além disso, ela parecia estar um pouco desconfortável.
─ Eu não tava flertando com ninguém ─ respondeu fugindo do assunto, focando na sua amiga. ─ Você está bem Willow?
─ Hm? ─ a jovem florista saiu de seus pensamentos ao ser chamada. Ela estava bem pensativa, e seu corpo estava tenso.
─ Aconteceu alguma coisa? Você parece incomodada ─ Gus comenta, percebendo os sinais também.
─ Ainda pensando naqueles idiotas de hoje cedo? ─ Boscha perguntou, esboçando alguma irritação no fundo do seu olhar preocupado.
─ Que idiotas? O que houve? ─ a latina questionou.
─ Não foi nada, não é tão importante assim ─ Willow tentou escapar do assunto, não queria preocupar os amigos, principalmente Luz, com o que tinha acontecido mais cedo.
─ Diga isso pro soco que tá guardado pr'aquele ruivo babaca que se acha todo fodão ─ a garota de cabelos rosa-choque rosnou na defensiva, encarando a menor. ─ O filho da mãe te ofendeu e te assediou praticamente!
─ O quê??! ─ os dois amigos exclamaram assustados.
─ Boscha controla essa língua e cala a boca! ─ Willow diz, o pânico se misturando com a raiva por ter seu direito de privacidade violado. ─ Por favor gente, já aconteceu e ele não vai mais me perturbar okay? Não se preocupem com isso, eu estou bem!
Luz olhou pra Gus e o garoto olhou pra capitã, ambos com um olhar em comum e concordando silenciosamente com algo. Willow viu a troca de olhares e suspirou, mas deu um pequeno sorriso conformado. Ela sabia o significado daqueles olhares e não podia ficar brava por seus melhores amigos se preocuparem e cuidarem dela.
─ Tudo bem, confiamos em você. ─ Diz Gus assumindo o comando e Willow assentiu. Boscha observou a situação com cara de paisagem, mas prestando alguma atenção.
Ela achava legal o tipo de amizade que eles nerds tinham, parecia genuíno e confortável.
Depois disso resolvido, Willow ajudou Gus a conectar o computador de Eda na internet local e configurá-lo com o aplicativo de projeção do celular do garoto, enquanto Luz arrumava os lençóis que sua sub-capitã tinha trago.
E após alguns minutos, o quarteto de colegas de time de Luz e Boscha anunciaram sua chegada com batidas suaves na porta do dormitório.
─ Toc, toc. Foi aqui que recebemos a informação de uma festa do pijama secreta? ─ Kira brinca num tom baixinho quando as quatro jogadoras chegaram. Cat foi a última a entrar e fechou a porta com cuidado.
─ Que festa do pijama secreta? Isso aqui está totalmente permitido, só que mais ninguém quer fazer pra não levar bronca por incomodar outros hóspedes ─ Luz continua com a piada e um sorriso zombeteiro, fazendo suas colegas rirem da palhaçada. Então a latina cerra os olhos ao perceber o que tinha nas mãos de Amelia. ─ Amelia! Eu disse que isso tava fora! Onde vocês pegaram isso??
Skara, atrevidamente e contra qualquer recomendação da capitã, havia arrastado Amelia e Cat para furtar duas garrafas de bebida. Uma sendo da mala do treinador – que de acordo com ela, não sentiria falta - e outra da adega do hotel, como uma espécie de homenagem ao seu irmão mais velho que fracassou na tentativa dois anos antes. Ao mesmo tempo, Kira apenas tinha trago xarope de chocolate, uma garrafa térmica com leite quente e um saco de marshmallows.
─ A culpa é toda da Ska, ela que arrastou a gente! ─ Amelia rapidamente aponta e joga a bomba no colo da amiga. A platinada em resposta, dá um olhar indignado e ofendido pela traição descarada.
─ Sua maldita traidora! ─ A Baird exclama com falsa raiva, mas ainda estupefata.
______________
Amity ficou mais de 5 minutos encarando a tela bloqueada do celular depois que cortou a conversa com a Noceda. Por algum motivo desconhecido, seu pai bateu na porta e enfiou a cabeça pra dentro do quarto no momento em que planejava continuar a interação de alguma forma, então por impulso e no instinto de sobrevivência, digitou o mais rápido possível a despedida fria.
No final, o homem Blight apenas queria conferir se ela estava bem, o que era bastante estranho e suspeito vindo, de todas as pessoas, logo dele. Alador Blight não era do tipo de pai preocupado, e era fácil pra qualquer uma das crianças Blight contar nos dedos quantas vezes o viu durante um ano inteiro.
Quando ele foi embora, ela ficou aquele próximo minutos esperando.
Era idiota e ela sabia disso, Amiy quem cortou a conversa depois de toda uma confissão calorosa vindo de Luz sobre sentir sua falta – o que particularmente, na sua cabeça, não fazia sentido algum uma garota como ela sentir falta de alguém que diariamente a maltrata –, e agora esperava que desse na telha dela de ser idiota e insistir na conversa mesmo assim.
Mas Luz digitou tão rápido quanto ela uma despedida e ficou offline.
─ Por que eu tô me importando tanto com isso? ─ ela murmura com um bufo de irritação, deixando o celular na cômoda
"Você está mesmo perguntado isso?" ela ouve a vozinha irritante que passou a se alojar no seu cérebro nas últimas semanas. Um grunhido alto e irritadiço escapa da sua garganta.
─ Eu já não mandei você me deixar em paz?? Que inferno!
"É tão difícil admitir em voz alta o que nós duas já sabemos? Além disso, se você realmente se esforçasse não teria que debater com seus próprios sentimentos."
─ Eu não sei de nada, eu não tenho a menor ideia do porquê eu continuo me sentindo assim e não é como se uma voz na minha cabeça me ajudasse! E meus sentimentos estão sob o meu controle, isso de agora não é normal!!
"Ou é você que se recusa a aceitar que eles podem ser normais? Você está lendo romances, ainda não percebeu que isso..."
─ CALE A BOCA! Eu me RECUSO a continuar nisso, estou parecendo uma louca!!
"Então admita!"
─ Não é nada!
"Já foram meses e viu nela algo que nunca lhe mostraram antes. Admita!!"
─ Isso é impossível!!
"Não é e você sabe. ADMITA!!"
A garota pressiona as mãos contra as laterais do próprio rosto, balançando-se violentamente para afastar aquela voz e impedi-la de dizer o que estava escalando sua garganta desde o começo daquela discussão louca consiga mesma.
─ Eu não posso! Não posso, não posso, não posso!! Eu não estou com saudade daquela doce idiota!!
E mesmo assim, as palavras saíram.
Amity congela quando se dar conta do que realmente disse, seus olhos levemente arregalados de horror e um sabor agridoce invadindo sua língua.
O pior de tudo é que seus pensamentos finalmente tinha parado de ser tão barulhentos.
Sua respiração desregula e ela começa a ofegar momentaneamente, com a sensação do rosto e das orelhas esquentando num formigamento familiar. Aquilo não estava realmente acontecendo certo? Ela... Ela não poderia estar sentindo falta da presença de Luz.
Ela não estava sentindo a pele arrepiar de frio por sentir falta dela, não é?
Porra... Ela estava.
─ Como eu pude deixar você se aproximar tanto assim, Noceda? Por quê?
Aquela merda de por que estava a assombrando de novo.
Suas mãos partem das têmporas até a frente do rosto, deslizando-os duramente por sua face avermelhada enquanto suspirava e seus olhos vagaram pelo quarto até encontrar o livro quase escondido sob os travesseiros. Ela o pega e o deixa no colo, abrindo numa das páginas marcadas com um dos seus post-its exclusivo para leituras marcantes.
'A distância não é nada quando se tem um motivo.'
Aquela frase sozinha podia ser interpretada de maneiras diferentes, e não poderia ser mais estupidamente precisa quanto naquele momento.
Do que ela estava sentindo saudade se Luz parecia fazer questão de perturbá-la todos os dias? Por que ela tinha esperado que Luz mandasse outra mensagem se ela faria isso logo pela manhã?
O que estava realmente a afetando para que aquela distância fosse algo tão amargo?
Honestamente, ela não queria mais pensar sobre nada disso.
Com um suspiro pesado, Amity fechou o livro e o deixou na cômoda do outro lado da cama, deslizando o corpo pelo colchão com a intenção de finalmente ir dormir. A garota desliga a luz noturna e acomoda a cabeça nos travesseiros, olhando para o teto enquanto tentava acalmar as palpitações perturbadoras do coração.
Quando finalmente adormeceu depois do turbilhão confuso e da discussão idiota com o próprio cérebro, ela acabou sonhando com um dia normal de escola onde Luz estava ali.
As mãos pálidas se recolheram junto ao peito e um pequeno, discreto, porém existente, sorriso surgiu nos lábios da Blight adormecida.
Mesmo que Amity ainda não entendesse ou tivesse percebido, seu corpo sabia o que estava faltando.
E sonhar com aquela idiota de sorrisos fáceis era como ter aquele calor e segurança de volta ao seu alcance.
______________
─ Nada mal pra uma festinha do pijama improvisada, né? ─ indagou a Noceda com a voz levemente arrastada, se levantando aos tropeços para desligar e guardar o projetor e o computador para devolvê-los pela manhã.
Depois de várias músicas, jogos, desafios e confissões embaraçosas e dois filmes, o grupo finalmente tinha chegado ao seu limite.
Era 3h e pouco da manhã, Skara e as outras meninas estavam muito bem acomodadas sobre os endredons e travesseiros, e enroladas nos cobertores extras, com as quatro dormindo encostadas umas nas outras, e especialmente Cat, abraçando uma das garrafas vazias de bebida que Skara as arrastou pra furtarem.
Enquanto isso, Boscha estava num estado de limbo entre a total inconsciência, a embriaguez e um último resquício da sua sobriedade. Na verdade, é mais fácil dizer que ela alegava não estar dormindo quando era cutucada, quando estava praticamente roncando baixinho com a cabeça encostada no ombro de Willow e seus mindinhos entrelaçados.
─ Eu estava um pouco nervoso por causa das suas colegas de time, especialmente Boscha, mas até que foi legal conhecer elas melhor e acho que vou seguir alguns conselhos delas sobre o Matt ─ Gus admitiu timidamente, sentindo o rosto um pouco vermelho mesmo com os olhos começando a pesar de sono.
─ Concordo, só não vou perdoar as perguntas estranhas sobre nós três ─ a Park diz, e rapidamente seu melhor amigo concorda. ─ Mas achei estranho que nenhum 'deles acabou aparecendo. Nem mesmo o L, elu adora um verdade ou desafio ─ ela comenta, coçando os olhos com a mão livre e bocejando. ─ Você tá tomando os remédios, Luz?
─ Hm? Ah, sim. ─ As palavras saíram sozinhas dos lábios latinos, pois a garota não estava prestando muita atenção. Mas mesmo que estivesse, ela não responderia diferente.
Depois do pico de pânico no primeiro dia, 'Lun' debateu com ela para que tomasse os controlantes e seguisse rigidamente a prescrição dos anti-depressivos. Luz não quis aceitar, ela queria que 'eles' tivesse a chance de curtir aquela viagem como ela fez nos anos anteriores, pois não teriam essa chance no ano seguinte. Mas no fim a entidade intelectual a convenceu.
Ela não quis admitir o real motivo de não querer tomar os remédio, e agora a solidão era apenas uma consequência de se estar no controle.
─ Você não tomou eles recentemente, né? Você sabe que misturá-los com álcool faz um grande mal pra você e não quero que você tenha uma overdose ou algo assim.
A capitã estremeceu com a palavra, colocando um sorriso frouxo e desajeitado nos lábios logo em seguida, ─ só porque eu faço isso às vezes, por acidente, não quer que algo vá acontecer ─ ela brinca, provocando um par de cenhos arqueados dos seus amigos. ─ Ei, tá tudo bem. Juro que a última vez que tomei meus controlantes foi depois de voltar do esqui.
─ Mais de 10 horas, acho que tá tudo bem né? ─ Gus olhou para Willow, e a garota suspirou um pouco mais tranquila. Ela assentiu.
Luz não queria preocupar seus amigos com esse tipo de coisa, ela conhecia seu corpo compartilhado.
Com o equipamento desmontado e mantido num local seguro até de manhã, a morena latina ajudou a melhor amiga com Boscha, cutucando-a pra "acordar" e usando seu corpo para mantê-la de pé até se deitar nas camas extras do dormitório. Gus dormiria na sua cama do beliche assim como Luz, restando para Willow dividir a cama extra com a sub-capitã que eles tinham juntado para formar uma maior.
Mas mesmo com sono e a mente um pouco nublada, Willow permanecia com a mesma timidez e vergonha de ter que dividir a cama com a atleta de cabelo rosa.
─ Hey, podemos conversar rapidinho? ─ Luz a chama assim que a florista se senta na cama, e a Noceda se acomoda na borda ao seu lado. A de óculos assente, dando um novo bocejo. ─ Sei que você falou que estava tudo resolvido, mas o que foi esse caso com o tal garoto?
─ Luz...
─ Tá tudo bem, eu não quero insistir em nada, mas um dos dilemas da nossa amizade é sempre zelar pelo bem do outro. Eu e Gus ficamos preocupados. Só quero entender o que houve, vou deixar qualquer tipo de punição pro idiota com a Boscha mesmo ─ ela brinca, recebendo um soco leve no braço em resposta.
Mas então a Park suspira, ─ fui abordada por um trio de rapazes quando estava indo para o refeitório do prédio principal pras atividades de administração do hotel, o ruivo que Boscha mencionou parecia ser o líder deles. Acho que são uns dois anos mais velhos que nós. Eles começaram com aquela mesma palhaçada que o Zion faz com qualquer garota da escola e também começaram a me insultar, mas quando não dei atenção, me puxaram pelo braço e barraram minha passagem.
─ Eles realmente chegaram a tocar em você de algum jeito? ─ Luz perguntou com a voz calma, mesmo que o fato de ter bebido um pouco possa estar começando a afetá-la negativamente.
─ Promete não contar a ninguém? Não quero que o Gus tenha que colar em mim achando que isso possa acontecer de novo, e também não quero que Boscha surte desnecessariamente com isso. ─ As duas encaram a jogadora na outra ponta da cama. Ela agora realmente tinha apagado totalmente e nenhum sinal de acordar tão cedo. Com isso, a latina assente. ─ Eles chegaram a tocar em mim, e o ruivo principalmente estava num estranho impasse sobre me ofender pela minha estatura e elogiar minhas curvas.
─ Filho da mãe! ─ A capitã esportiva sussurra alto, mais estupefata do que com raiva. Até que sua amiga começou a rir baixinho e ela acabou por acompanhá-la. ─ Esse cara tem minhoca no lugar do cérebro.
─ Não é? Mas então eu estava prestes a me soltar e usar uma das técnicas que o Lexi me ensinou pra desviar deles, quando a Boscha chegou com o rosto vermelho e os punhos cerrados. Ela parecia pronta pra socá-los.
─ Não posso culpá-la, se 'Lexi, ou até 'Liam, vissem você nessa situação, 'elus' provavelmente não iriam se conter e chegariam os socando.
─ Se fosse eu não impediria, mas a Boscha já tem muito problema de raiva e está em observação num geral, então não queria trazer mais nenhum problema pra ela. Então ela gritou com eles e os ameaçou, e eu fazendo o meu melhor para impedi-la de avançar demais, até que eles deram as costas e foram embora.
─ E como você se sente sobre isso? Sobre eles?
─ Meus pais sempre me ensinaram a amar meu corpo, e mesmo crescendo sofrendo bullying por isso e outras coisas, sempre tentei me manter firme. E principalmente depois que nos tornamos amigas, eu vi que podia gostar de mim mesma do jeito que eu sou. ─ Luz sorriu com a conclusão da sua melhor amiga, encostando-se nela para abraçá-la de lado. ─ Mas foi um pouco desconfortável.
─ E está tudo bem, o importante é que você sabe o quanto você é foda, extremamente bonita e uma das melhores pessoas do mundo!
─ Luz você tá bêbada, cala a boca... ─ a garota de óculos resmunga, corando um pouco.
─ Eu tô feliz, isso é diferente. Eu estaria falando muito mais merda se estivesse bêbada, o que eu to falando é apenas a verdade. ─ Ela ganha outro soco leve, agora no ombro. As duas riem fraco, e a latina sorri no final. ─ Eu amo você Willy, sabe que é a melhor amiga que nós poderíamos ter.
─ Também te amo Luz, amo todos vocês.
A jogadora deixa um beijo amigável na testa da Park, saindo do abraço e se levantando. Willow fica pensativa por alguns segundos até que resolve chamar sua amiga de volta, mas antes que o fizesse, arqueou o cenho ao vê-la com um sorriso travesso nos lábios e pegando uma canetinha permanente do bolso.
Quando perguntada, Luz apenas responde que estava esperando por isso desde que anunciaram a viagem, e a garota de óculos tenta argumentar que Boscha ficaria extremamente puta e mal-humorada quando acordasse. A Noceda apenas deu de ombros e disse que ela não poderia bater em ninguém se não soubesse quem foi, e ela faria questão de esconder a canetinha.
Willow apenas revira os olhos, e depois de todo o trabalho artístico que a morena faz no rosto da Thirdeye e ainda tira uma foto antes de desligar os abajures, ela finalmente faz um pedido à amiga.
Um pedido que Luz atende com toda a satisfação do mundo, não sem antes verificar Gus e desejar um boa noite pro amigo já adormecido com um toque de mão suave.
E na manhã seguinte, a sub-capitã de futebol acorda se sentindo o puro meme. E de bônus, todos acordam no susto quando ela vai no banheiro pra molhar o rosto e grita de ódio.
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