"Não importa quem foi meu pai, importa quem eu lembro que ele foi.”
Anne Sexton
Com a cabeça um tanto confusa por informações bombástica no dia de hoje eu fui atrás da Alice até a cozinha para ajudá-la a fazer café.
-Me explique melhor essa questão do seu tratamento. É a pulsoterapia que o Noah comentou comigo?
-Sim, sim. Serão alguns ciclos de 5 dias de corticoides em altas doses. Já comecei.
-Então por isso os enfermeiros?
-Sim, por isso e também para cuidar das feridas claro.
-Você anda bem cansada ultimamente, é por causa do coração?
-Não, estava assintomática até descobrir, na verdade ando cansada justamente por causa da pulsoterapia e os medicamentos para dor me deixam bem sonolenta, mas na prática os pontos de rejeição ainda não me causam sintomas.
-Seu cirurgião já sabe?
-Sim, tudo foi recomendação dele, e logo iremos para a América, preciso pelo menos consolidar a fratura nas costelas. Não suportarei um voo de quase 12 horas sentada e com fratura nas costelas.
-Só por isso resolveu me incluir na vida das meninas?
- E não é um bom motivo? Como você bem sabe, não. Procurei você e não tive uma boa resposta. Resolvi não te procurar mais, como pedido na carta que você me enviou juntamente com as fotos.
-Alice, não fui eu quem enviou aquilo.
-Adam, vamos nos focar no presente por favor.
-Às meninas não podem ficar órfãs se eu vier a partir. Claro que Noah e toda minha família jamais permitiriam isso, mas creio que elas mereçam conhecer e ficar com o pai e o irmão.
-Não diga isso.
-A morte é nosso único fim inevitável Adam, mas vou confessar que estou com um pouco de medo. Pelas meninas claro. Você viu a reação nada amistosa da Zara.
-Ela é um pouco temperamental pelo jeito.
-Você não viu nada ainda. Ela geralmente é muito calma, e tolerante, mas quando é provocada ela fica furiosa e raivosa, acho que ela puxou isso de você. E Alice deu um sorriso debochado para mim. Fiz cara de ofendido, mas caímos na gargalhada.
-Por falar nisso onde ela está? A Olivia está lá fora andando de skate o Tom está na sacada com a Mel e ela?
-Casa da árvore.
-Como você sabe? Elas tem uma casa na árvore?
-O segurança me disse. Elas tem sim, mas é mais o refugio da Zara do que da Olie.
-Devo ir falar com ela?
-Não, não! Dê tempo a ela. Certamente voltará logo, vai anoitecer e ela tem medo do escuro. E logo vão chegar visitas que ela ama.
-Noah?
-Também. Posso te pedir para pegar esse recipiente de vidro ai no alto?
-Claro. Peguei o vidro de café que Alice não alcançava.
-Obrigada.
-Será que foi uma boa ideia contar sobre mim justamente 1 dia antes do aniversário delas?
-Adam, não tem dia bom para isso, mas aproveitamos uma oportunidade e está feito. Não se martirize por isso.
Me afastei um pouco e só pensava em como iria me martirizar não só por isso, mas por tudo que fiz em relação a elas até hoje.
-Você pode me ajudar, por favor?
Alice fazia, ou melhor estava tentando fazer café, era fofo ver a sua tentativa de fazer algo com um único braço e com mobilidade reduzida devido a dor aos movimentos.
A ajudei nessa tarefa, tomamos um bom café, mas dessa vez em silencio, Alice parecia absorta em seus pensamentos.
-Preocupada com a Zara? Alice tomou um leve susto com minha observação.
-Não, sei exatamente onde ela está. Na verdade estava pensando na dinâmica de amanhã, teremos muitas crianças gritando por todos os lados e estava pensando em segurança para que ninguém se machuque, mas a empresa que fará o entretenimento é muito competente dará certo.
-Em que posso te ajudar?
-Lavando essas xícaras! Ela me olhou com olhos pedintes e rimos.
-Não se preocupe, já contratei esse empresa e sempre fazem tudo de forma primorosa. Será tudo muito simples Adam, piscina, alguns brinquedos e recreadores, bolo e comidinhas nada muito cinematográfico. Só acho que alguns adultos presente ficarão um tantinho excitados com sua presença.
-Ah! Quer dizer que serei o entretenimento adulto! Alice inclinou a cabeça de lado me olhou de cima a baixo e mordeu levemente o lábio e suspirou de leve, e pareceu cair na realidade e sacudiu a cabeça aparentemente afastando qualquer pensamento que tenha passado em sua mente.
-Para alguns sim Adam.
Fomos para a sala e Alice solicitou o seu medicamento para dor e solicitou ajuda para se acomodar.
Nos sentamos em cantos diferentes Alice com seu livro, mas parecia sonolenta e eu fui trabalhar um pouco fazendo planilhas e pesquisas, somente como ator meu trabalho era mais fácil, mas somando a produção do filme a coisa toda se tornou maior. Era ótimo trabalhar ali, era calmo, o clima ameno e bucólico, mesmo com a agitação das crianças tudo era aconchegante e familiar demais. A animosidade entre mim e Alice parecia que tinha diminuído ou pelo menos estava em standy bye.
Estava começando a luz natural a diminuir e o pôr do Sol por ali era lindo de se ver. A casa dela era no alto de uma pequena colina e todas as casas por ali tinham vistas esplêndidas para o pôr do sol no mar. A senhora que cuidava da casa e da cozinha trouxe biscoitinhos e uma saladinha de frutas, todos ali eram muito gentis. Logo ela chamou as crianças para um lanchinho, mas quando fui ajudá-la a recrutar aqueles pestinhas percebi que tinha uma mesa grande posta com várias guloseimas entre pães, biscoitos, bolos, e o cheiro de café estava invadindo a cozinha.
-Nossa! Tudo isso só para às crianças?
-Oh! Sr Driver não o vi, me assustou. Não, não é só para às crianças, logo teremos convidados. A Alice quer comer algo?
-Vou ver.
Alice estava no sofá com a cabeça encostada no encosto, o livro aberto descansando no colo e ela estava dormindo. Era linda demais. Não iria acordá-la, comecei a admirá-la, a olhar cada detalhe daquele rosto lindo, estava com os cortes no rosto se curando e os hematomas já estavam mais claros, como alguém pôde fazer mal a essa deusa. Aquele cabelo e seus cachos que convidavam a enfiar o rosto e se perder nos caracóis. Meus olhos desceram até aquela boca carnuda e pequena e nesse momento ela soltou um suspiro e se mexeu mudando de posição, mas ainda dormindo. Desci o olhar para o pescoço que agora estava mais estendido, ai que saudades de sentir o cheiro que vinha daquela pele. Continuei observar e a descer o olhar, pelo colo, e cheguei ao decote da camisa que ela usava, era branca de seda e ela estava sem sutiã. Não precisava de visão de RX para ter um belo vislumbre dos seios fartos e deliciosos dela. Ah! Que saudades!
Sai de perto dela e desviei o olhar ao ouvir a chegada de carros, pessoas saindo do carro e ouvi os gritos das duas meninas.
-Vovó!! Alice acordou e teve um breve momento para entender o que estava acontecendo.
-Noah chegou?
-Parece que sim, e não veio sozinho.
-Ah sim! Minha mãe e minha avó vieram para o aniversário das gêmeas.
Claro! Era óbvio que a família delas estaria presente. Ajudei a Alice a se levantar e fomos recebê-los, na verdade a Alice, eu fiquei na cozinha, fui ajudar a senhora a colocar o café a mesa.
Eu não sabia como seria tratado pela família de Alice, provavelmente não de forma amistosa e receptiva, afinal eu era o cara que a deixou grávida e sem suporte emocional. Não iria impor minha presença de forma tão marcante, resolvi me afastar e deixá-las matar a saudade. Ouvi o som de choro, uma das meninas estava chorando. Fui olhar pela janela era Zara.
Ela estava no colo do Noah, parecia que conversavam, mas ela só chorava.
Com Noah estavam duas senhoras. Uma por volta dos seus 65 anos, elegante com uma postura ereta e um olhar avaliador para tudo. Estava examinando Alice com o olhar, vendo cada ferida e hematoma, provavelmente era a mãe dela. A outra senhora era bem idosa, muito pequena como Alice, creio que menor devido à idade, deveria ser a avó da Alice e bisa das minhas filhas.
Alice abriu o sorriso mais iluminado que eu já vi quando viu e abraçou sua avó. Noah deu um beijo no topo da cabeça da Alice, e atrás dele estava uma pessoa que não via há 8 anos ou mais e na verdade não esperava ver ali naquele lugar, era o Dermoty Kennedy, agora mais famoso e com muitos sucessos na sua lista.
Entraram na casa e foram recebidas com café e sucos. Pareciam cansadas, mas ao mesmo tempo estavam eufóricas por estarem com suas netas e bisnetas. Zara continuava no colo do Noah.
Todos falavam em português até minhas filhas. Nesse momento o Thomas entrou com a Mel e a mãe da Alice virou e percebeu a presença deles. Ela perguntou em inglês dessa vez
-Quem é esse rapaz lindo com essa moça adorável?
-Ah! Mamãe esse é o Thomas e sua namorada Mel.
-Thomas? O menino Thomas que você tratou no passado?
-Sim mamãe.
-Thomas filho daquele...
-Sim, filho do Adam pai das meninas.
-Pai!! Sei.
-Mãe, quero te apresentar o Thomas a Mel e o Adam.
Estava logo atrás do Thomas. Todos me olhavam e pareciam me julgar, o Dermoty não estava naquela sala, mas as mulheres presentes me avaliavam de cima a baixo. Eu que já era tímido queria sumir daquela situação. Noah, veio até mim.
-Olá Adam, tudo bem? Como está? Gostando de Cornwall?
-Sim Noah, é encantador. Obrigado pela hospitalidade. Noah como sempre gentil como Alice, mas a mãe da Alice não parecia nada acolhedora, me olhava com ódio e desdém. Eu me aproximei com a mão estendida para mãe de Alice que se chamava Lia. Ela me ignorou absolutamente, se recusou a dar as mãos a quem ele falou algum xingamento em hebraico. Ok eu mereço, mas Alice a repreendeu principalmente por fazer isso na frente das gêmeas.
Certo, está claro que não tenho o apoio da mãe dela, e perdi o apoio do Noah, mas desse pelo menos recebo a gentileza. Por sorte as gêmeas estavam distraídas com o Tom, Zara estava no colo dele, saiu do colo do Noah para ficar com o irmão, Olivia como sempre andando de um lado para outro entre a cozinha e a sala. O que me causou certa curiosidade foi o comportamento da avó da Alice. Ela estava sentada olhando tudo de forma impassiva. A mãe da Alice, a SraªLia continuava a falar coisas em hebraico em minha direção e para Alice que respondia a altura. De repente ouvimos um CHEGA em inglês e todos pararam de falar e até mesmo de se mexer. A avô da Alice, Srª Alexandra havia se pronunciado, se levantou com a ajuda do Noah, e veio em nossa direção.
-Chega de discussões, esse não é o momento. É momento do jantar e vamos compartilhar uma refeição em família, e todos que estão aqui são da família. Sr Adam, o senhor é bem vindo sempre nessa família, já que parte de você está nelas, (apontou para as gêmeas).
-Obrigado senhora.
-Pode me chamar de avó. E vamos apreciar todos juntos esse jantar maravilhoso que nossa amiga fez.
Eu estava quase em choque. Todos daquela família obedeciam aquela pequena senhora. Todos se calaram a uma simples ordem dela. Estava ali o entendimento claro que naquela família o que predomina é o matriarcado. Eram mulheres fortes, combativas, dominantes e minhas filhas fazem parte desse matriarcado. Estava emocionado e esperava muito que minhas filhas fossem tão fortes, inteligentes, amáveis e gentis como suas ascendentes, principalmente Alice.
O jantar foi agradável, todas às vezes que a Srª Lia falava em outro idioma que não fosse inglês era repreendida pela Alexandra que posso chamar de avó. Ela não queria que eu não entendesse o que diziam e que fosse constrangido à mesa.
Após o jantar todos que chegaram de viagem se recolheram aos quartos para o descanso. Noah, Dermoty e Alice foram para a sala de leitura, onde tinham seus livros e instrumentos musicais. Ficaram por lá para conversar e colocar o papo em dia. Gentilmente fui convidado, mas estava cansado e não queria observar a interação entre eles. Zara já tinha adormecido no colo do irmão, Olivia já tinha se deitado com a bisavó. Eu queria colocá-las para dormir, queria fazer carinho em seus cabelos, mas creio que era um passo arriscado era tudo muito novo para elas. Zara nem com a mãe estava falando, ainda estava chorosa e parecia magoada, vamos lhe dar o tempo para digerir tudo isso, esse fato de que agora ela tem um pai.
-Pai, pode me ajudar com a Zara. Ouvi o Tom me tirando dos meus pensamentos.
-Claro! Peguei a não tão pequena Zara do colo do Thomas, ela estava exausta pelo que parecia, sentia o cheiro de maça verde que vinha de seus cabelos, ao pegá-la no colo seus cabelos imensos pareciam flutuar no ar como uma cascata densa e negra que eram idênticos aos meus, seu rostinho era de um anjo com aquele narizinho igual ao da mãe e ali naquele rostinho havia um caminho de lágrimas em suas bochechas, ali estava marcado o caminho de mais sofrimento que eu infringi aquela pequena criatura que estava mais que ferida.
Fui em direção ao quarto delas, iria pela primeira vez colocar uma das minhas filhas na cama e se possível dar-lhe um beijo de boa noite e estar atento para que nada atrapalhasse sua noite de descanso.
Entrei no quarto delas pela primeira vez, era enorme, decorado com a personalidade de ambas era adorável, e na cama descolada cheia de um estilo urbano estava Olie dormindo toda descoberta e atravessada na cama. Coloquei Zara em sua cama de temática “bailarina astronauta” e a cobri, nesse momento houve um gemido choroso, ela se moveu, mas não abriu os olhos. Falou algo que a principio não compreendi. Sentei ao lado da cama e a observei procurar o ursinho próximo e abraçar com força e balbuciou novamente e dessa vez pude compreender “mamãe não me mande embora” Choramingou um pouco, passei a mão sobre seus cabelos dei um beijo em sua testa e disse que tudo ia ficar bem.
Poderia observar ela dormir a noite inteira sem me cansar, mas ouvi uma movimentação discreta atrás de mim. Era Alice que observava aquele momento.
Ela entrou e foi em direção a Olie para cobri-la.
-É inexplicável tanto amor de forma tão instantânea né!
-Está ai há muito tempo?
-Tempo o suficiente para te dizer que tudo vai ficar bem entre vocês. Elas já te amavam antes de saber que você é o pai delas.
-Espero que sim. Em pensar que vocês estiveram sozinhas por 8 anos meu coração se despedaça de tanta culpa. Foram 8 aniversários, natais perdidos por total imbecilidade minha.
-Não estivemos sozinhas, tínhamos nossa família, apesar das perguntas infindáveis delas sobre outra avó e avô, sobre ter tios e primos, teve um tempo que era obsessão dessas duas as perguntas constantes sobre o pai, mas nos últimos anos isso parou, acho que se conformaram com a ausência.
Aquelas palavras e a imagem da Zara dormindo com as bochechas marcadas pelas lágrimas me fizeram cair em lágrimas ali mesmo, na frente da Alice. Eu senti sua mão sobre meus cabelos.
-Desculpe-me, não foi minha intenção te deixar angustiado. Como eu disse, tudo vai ficar bem entre vocês.
A proximidade da Alice me fez abraçá-la, mas imediatamente ela me empurrou.
-Eu disse que tudo vai ficar bem entre você e suas filhas, mas isso não me inclui. No que se refere a nossa relação de pais eu te respeitarei e estarei disposta a sempre conversar amistosamente em prol das meninas e seu crescimento, mas eu e você é um assunto encerrado.
-Você jamais será capaz de me perdoar? Alice ficou pensativa e quando abriu a boca para responder Olie a chamou.
-Mamãe, quero água.
-Seu pai pegará água para você. Alice saiu me deixando encarregado de dar água aquela pequena. Fui pegar água para ela, quando retornei ao quarto ela estava sentada sonolenta e descabelada esperando o copo d’agua. Dei-lhe o copo, ela bebeu tudo e se deitou.
Me certifiquei que estavam cobertas, a noite estava fresca demais para deixá-las descobertas. E quando fui colocar o boneco do Kylo Ren de volta na cama da Olie ela disse.
-Obrigada papai.
Foi o som mais doce que ouvi nos últimos tempos.
****************
Depois de sair do hospital em Cannes e ir direto para Cornwall como uma operação de refugio e segurança, por parte dos agentes do Mossad e uma cruzada pessoal do Noah, às investigações e por assim dizer “punições” do governo israelense estavam duras em relação ao governo da Jordânia, as relações diplomáticas nunca estiveram tão estremecidas.
Toda essa sequência de violência e brutalidade nunca foi o que idealizamos e sonhamos para a relação do nosso povo, nem para mim e nem para o príncipe herdeiro Hussein da Jordânia, mas nesse momento não poderia gastar minha pouca energia com esse assunto.
Descobri no começo da viagem que o Adam estava no mesmo avião que eu e havia sido convidado pelo Noah para passar o resto do verão em Cornwall se assim ele desejasse ou somente para buscar o Thomas. Naquele momento não tinha energia para contestar ou brigar com o Noah e me recusar a recebê-lo, e nem o faria, minha hospitalidade judaica falava muito mais alto do que qualquer animosidade e para ser muito honesta comigo mesma, essa situação da paternidade tinha que ser resolvida de uma vez por todas, com esse novo cenário da minha saúde preciso garantir uma completa harmonia entre as meninas e o Adam caso eu venha a partir.
A viagem foi tranquila, e chegamos ao meu refugio a minha casa na Inglaterra. Sempre passamos o final das férias de verão em Cornwall entre as praias tranquilas os cavalos do Haras e os cães, as meninas adoravam aquele espaço e era nosso cantinho particular. Poucos sabiam quem morava naquela casa e éramos apenas pessoas comuns, brasileiras que passavam um tempo em terras inglesas, éramos bem recebidos sempre pelo vilarejo e às crianças tinham amigos ali, que sempre estavam em nossa casa curtindo um dia de piscina ou na casa da árvore com às meninas, claro que sempre aprontando artes e traquinagens, nada muito grave além de pura arte infantil.
Eu estava exausta, com dor e com curativos que precisavam ser trocados, pois sangraram durante o trajeto de carro. Fomos recebidos por duas meninas que ficaram muito felizes com a presença do Adam e do irmão que já fazia companhia a elas ali em casa. Era muito ânimo para duas meninas e conter o ânimo delas seria impossível.
A casa apresentada ao Adam e devidamente instalado disse que poderia se sentir à vontade para conhecer a propriedade e o vilarejo que todos estavam à disposição para ajudá-lo, mas precisaria me retirar. Foram dias difíceis, todos os 5 dias que se seguiram do tratamento da pulsoterapia e trocas de curativos e medicamentos para dor que obnubilavam minha mente, os enfermeiros foram embora, dali para frente conseguiria lidar com as feridas com a ajuda da minha ajudante na casa e a dor já estava um pouco menos intensa.
O 5º dia comecei a conseguir sair da cama e socializar um pouco com meus hóspedes, além dos momentos que passava com as meninas me contando tudo sobre o dia delas com o Adam e com o irmão e a Mel. Estavam se divertindo, amando a presença deles, e sempre definiam para mim como o melhor verão da vida delas apesar da mamãe estar dodói, como gostavam de dizer.
Sai do meu quarto para fazer as refeições à mesa com todos, após um café da manhã, fui ler um pouco na sala de leitura/TV/música, quando percebi Adam se aproximando. Acho que seria uma boa hora para discutir os termos da relação do Adam com as meninas.
Assumi para ele que sim, ele era o genitor das gêmeas, o que me surpreendeu foi o espanto e emoção dele ao saber da verdade enfim revelada (ou não tão revelada assim) eu havia tentado contato há alguns anos atrás e fui absolutamente rechaçada da sua presença e negada as meninas a paternidade. Ele se mostrou chocado quando mostrei-lhe os envelopes que continham às cartas que enviei juntamente com fotos das gêmeas ao logo dos 5 anos de vida delas, e mostrou-se mais chocado ainda quando entreguei a carta que o próprio havia escrito pedindo afastamento de todo e qualquer contato.
-Eu não escrevi essa carta. Eu nunca recebi essas cartas e fotos.
-Ah Adam! Vai se fazer de desentendido agora? Eu fiquei intrigada, depois de ter devolvido todas as cartas e fotos esse interesse todo em reconhecer essa paternidade agora.
Me causou certa curiosidade esse espanto do Adam com a devolução das cartas e fotos que ele diz não saber da existência, quase me convenceu, mas não posso esquecer que ele é ator e dos bons.
Disse a ele minhas condições para aceitar oficialmente essa paternidade, questões financeiras também seriam discutidas, afinal ele vai querer incluí-las em testamentos e etc... Eu não quero, mas será quase impossível fazer com que ele desista de torná-las herdeiras e de querer compensar financeiramente sua ausência nesses oito anos, não quero que ele divida o que é o Thomas, ele precisará de todo apoio financeiro na sua ausência. Minhas filhas não precisam do suporte financeiro do Adam. Essa questão deixarei os advogados digladearem.
Um exame de DNA farei questão para registro adequado, engoli por muito tempo ofensas e dúvidas cretinas de pessoas que convivem com o Adam, mas será resolvido na América.
Se supostamente acreditasse na ignorância do Adam sobre a existência das cartas e fotos e acreditasse que nunca havia escrito aquela carta, quem poderia ter feito tal ato? Eu não precisei pensar muito, se tinha alguém capaz de qualquer coisa para ferir o Adam esse alguém seria o John, mesmo que o Adam jamais queira acreditar que seu agente, a pessoa que ele confiava e até mesmo tinha como amigo íntimo o traísse e até mesmo agisse de maneira tão vil em sua vida. Eu não tenho provas, apenas é o único ser que conheço no círculo de pessoas que o Adam convive que seria capaz de fazer algo tão podre.
Deixei Adam ruminando a existência de todo aquele conteúdo que mais parecia uma viagem direto a lembranças que ele jamais teria, era uma viagem que o acusava de tantas ausências e falhas, como pai, como amante e como ser humano. Eu não estava disposta a ficar ali e presenciar qualquer tipo de sentimento de arrependimento que para mim não passaria de remorso dissimulado.
Pedi licença para me retirar e descansar um pouco, aquilo havia tomado parte da minha energia e boa vontade. Fui para o quarto, me deitei um pouco, aqueles medicamentos me deixavam grade parte do tempo cansada. Meus olhos pesavam, mas não saia da minha mente, será verdade que ele nunca havia escrito aquela carta desprezando a mim e as meninas? Preciso investigar isso a fundo, mas meus olhos pesam, preciso descansar um pouco, mas preciso igualmente pedir a um agente investigar isso na América, mas meus olhos pesam tanto, será uma batalha perdida, vou dormir.
Acordei em tempo para o almoço que seria servido ao ar livre próximo a piscina, estava um lindo dia de Sol, ao longe ouvia os risos das meninas, os pulos na piscina. Será que repassaram protetor solar, ai meu Deus, se não repassaram vão chorar mais tarde queimadas de Sol, eram brancas como o pai, preciso levantar.
Sai do quarto, muito Sol entrando nas minhas retinas, mas o calor que vinha do Sol era inebriante e reconfortante.
Fui em direção ao pequeno grupo barulhento, mas também observei que Adam parecia um pouco ansioso e agitado, parecia que estava à beira de um ataque de nervos. Me aproximei e coloquei minha mão em seu ombro, ele parecia não ter notado minha aproximação.
-Não se cobre tanto.
-Como não! Eu falhei miseravelmente com você e com ela.
-Você não errou sozinho. Eu fiz algumas escolhas erradas também Adam.
-Você acha que elas são um erro?
-Não foi o que eu disse. Elas são o grande acerto da minha vida Adam, creio que das nossas na verdade, cometi erros no processo de protegê-las e errei com você também.
-Eu deixei o ciúme me cegar e não confiei em você e te deixei desamparada em meio a uma gravidez de alto risco.
-Adam nesse momento não foque no que passou, para aceretar com elas daqui para frente você vai precisar se concentrar no presente.
Comecei a interagir um pouco com o Adam, acho que pelas meninas precisava baixar a guarda e colocar nossa guerra particular em ponto de espera ou até mesmo findar esse assunto e essa mágoa em nome delas terem um pai presente no futuro delas.
Tivemos momentos agradáveis à beira da piscina com mesas fartas e alguma risada. Thomas parecia cada vez mais apaixonado pela Mel e parecia que os ânimos adolescente cheio de hormônios ia explodir a qualquer momento e aquele relacionamento virginal estava com os dias contados, principalmente porque estávamos na Europa e aqui como no Brasil a sensualidade não é condenada como na América.
Se o Thomas sair ao pai esse verão será intenso para esse casal que está descobrindo o mundo um do outro. Tom está grande, não tão forte como o Adam, mas alto, atencioso, charmoso em sua delicadeza e extremamente culto, era estudioso como havia estimulado ele a ser desde criança, estava focado nos mecanismo que o ensinei a usar para vencer as limitações de sua condição autista, estava mais funcional do que nunca, e isso me trazia uma felicidade absurda como se ele fosse meu, como se ele tivesse saído de mim como às gêmeas.
Um dos momentos após uma das refeições ao ar livre que fazíamos em nossa casa, convidei o Adam para conhecer nossos cavalos, coisa que sabia que ele adoraria já que havia visto uma entrevista dele dizendo que amava demais esses animais. O haras era particular, não aberto a visitação ou o atendimento ao público, nossos cavalos eram raridades árabes e mustangs, não queríamos ou precisávamos explorar nossos animais para gerar renda. Cuidávamos de alguns cavalos de alguns atletas do hipismo, mas também era muito pontual. Sabia que o Adam também gostaria de ver os cachorros que por lá tratávamos e cuidávamos era quase um canil para animais perdidos e abandonados e no momento tínhamos muitos filhotes em nosso cuidado.
Passamos um tempo entre os cavalos, gostaria de montar, mas por conta das fraturas e feridas era impossível, Adam e as meninas montaram por 1 hora e eu e o Tom ficamos para trás para uma bom bate papo.
-Tudo bem com você?
-Eu estou bem Tom, algumas fraturas, escoriações, mas nada demais. O que me machuca realmente são as vidas perdidas. Perdemos duas pessoas em nossa equipe, além de outros franceses que se foram e os feridos. O meu assistente/amigo o Filippe, está ferido e foi submetido a uma cirurgia, mas está bem, fora de perigo de morte.
-Isso é bom.
-Sim, muito bom. E o que achou da nossa casa aqui em Cornwall?
-Eu estou amando, tudo aqui é muito pitoresco a Mel também está achando tudo romântico.
-Por falar em Mel, como vocês estão?
-Acho que bem, sinto meu coração tão cheio dela, ele bate rápido e sinto tantas coisas que nunca senti antes, e que não sei explicar.
-Tesão?
-Acho que sim . E ele deu um sorriso tão cheio de verdade.
-Creio que vocês estão prontos para aproveitar sempre a companhia um do outro.
-Você quer dizer sexo Alice?
-Também, uma relação vai além do sexo, mas ele é importante sim, mas respeitar sua namorada é fundamental.
-Quando sei se estou pronto?
-Você vai saber pode acreditar, só se respeitem, sejam amorosos um com o outro e seja muito carinhoso com a Mel o resto acontece naturalmente. Nesse momento uma dor aguda me trouxe de volta a realidade cruel das lembranças da violência. Parei nossa caminhada para tentar voltar ao controle.
-Alice, você está bem?
-Estou, nada preocupante Tom, só uma dor aguda que logo passará, acho que me movimentei bruscamente agora ao tentar desviar dos cachorros.
-Vem, vamos nos sentar.
-Não se preocupe Tom está tudo bem. Nos sentamos para esperar os três voltarem da cavalgada pelo haras.
-Alice, posso te fazer uma pergunta?
-Claro, se irei responder não garanto. Tom me olhou com humor e deu um sorriso que iluminava o mundo.
-Você e meu pai não tem nenhuma possibilidade de reconciliação? Essa pergunta me atingiu como um soco no estômago.
-Thomas, não creio que você deva se preocupar com isso.
-Eu creio que seria melhor para as minhas irmãs se vocês estivessem juntos.
-Não necessariamente, podemos ser bons pais para elas sem ser um casal, basta nós dois nos respeitarmos.
-Mas Alice, acho que vocês se amam e você deveria...
-Thomas, não.
-Não se zangue comigo, desculpe.
-Não estou zangada, só creio que você não deva gastar energia com esse assunto, nem ter devaneios com algo que já está encerrado.
-Encerrado talvez para você, para ele não. Meu pai te ama muito e agora que sabe que é o pai da Olie e da Zara não desistirá.
-Sinto muito por ele e por você por alimentar essa fantasia, mas para mim é assunto encerrado.
Acho que foi a maior mentira que já contei, inclusive para mim mesma. Eu ainda sentia meu peito queimar na presença do Adam. Meu coração ainda palpitava ao som da sua voz, ainda sentia meu corpo se arrepiar ao som da sua voz, mas era muito mais fácil deixar tudo como está, não quero reacender algo para ser ferida e magoada novamente. Não suportaria novamente o desamor, o abandono e seria impossível dar um crédito de confiança a alguém que duvidou do meu caráter e afeto.
Enfim, aqueles três estavam retornando as baias com os cavalos. Enfim, poderia sair daquele assunto e insistência do Thomas naquele assunto, tentando ser uma espécie de intermediário entre um amor até então ferido, magoado e desacreditado em todos os aspectos. Não sei o que tem se passado na cabeça do Tom, porque esse assunto é recorrente em seus lábios, se essa ideia se quer passar pelos ouvidos das gêmeas não terei paz e provavelmente irá se instalar uma força tarefa para nos unir como uma Operação Cupido, aff, não poderei permitir, em tempo falarei com o Tom para jamais comentar tal assunto com elas. Eu preciso de paz em minha mente e ela mais clara do que nunca para seguir em decisões importantes para o futuro delas e para minha saúde, além de uma série de questões políticas que me esperam após esse período de recuperação.
-Meu Deus! Esses cavalos são um espetáculo Alice, vocês estão de parabéns, pelo cuidado e pelas aquisições. Adam, me tirou de meus pensamentos tecendo elogios aos nossos cavalos e aos cuidados do nosso veterinário/caseiro/faz tudo da minha máxima confiança.
-Obrigada, Adam. Ele me olhou nos olhos e senti meu rosto inteiro queimar de vergonha.
Ele e nossos filhos brincaram por um curto tempo com os filhotes de cachorro, enquanto conversava com o Jacob sobre alguns aspectos dos cuidados aos cavalos e a uma nova aquisição para o haras. Eu estava cobiçando mais dois cavalos para o haras um Puro sangue lusitano negro e um Frísio, e logo um potro de uma égua árabe que temos nascerá.
As gêmeas estavam ansiosas para ver o nascimento do potro e ver um “cavalinho” passeando pelo haras. Aquele lugar era nosso refugio, eu adoro aqueles animais e pelo jeito Adam e o Tom também adoraram o que viram por ali.
Maria e Jacob já estavam com planos de ir ao centro da cidade para resolver questões da casa e do haras e queriam muito levar as crianças, claro que permiti não seria problema algum, só me preocupava a tempestade que se formava no horizonte, estamos na Inglaterra e chover é mais que básico por aqui. Eu não tinha condições para ir junto, estava exausta, com dor e precisava me deitar. Adam parece que de igual forma não iria nessa jornada.
Voltamos a casa, eu fui para meu quarto, tomar medicamento para dor e dormir um pouco. Adam, não sei ao certo o que fez. Dormi um pouco, mas fui acordada por raios e trovões. A tempestade chegou. Se havia algo que eu tinha medo, não não, pavor era uma tempestade. Dos poucos medos que tenho em vida o medo de raios e trovões era limitante, me congelava, era algo que eu não conseguia disfarçar. Estudei sempre e sabia que tempestades eram fenômenos físicos e químicos, visitei laboratórios de meteorologia, tinha amigos que eram caçadores de tornados, mas nada disso me tirou o medo de raios e trovões.
Eu gritei, e fui ouvida e logo Adam entrou no meu quarto perguntando se estava bem. Claro que não estava, estava assustada e com medo, mas precisava fingir normalidade e esconder minha fraqueza, que foi desmascarada segundos depois com um raio muito forte. Me encolhi, Adam sentou ao meu lado e me deu abrigo. Passamos aquela noite em trégua, ele me ajudou com curativos, e cuidados, fez o jantar e tivemos uma boa conversa.
Teve algumas perguntas intimas do passado e afirmações de quanto ele ótimo de cama e ele se sentiu orgulhoso com certo saudosismo no olhar.
As crianças estavam bem, a Maria e o Jacob também estavam bem e a eles eu confiava minha vida e minhas filhas, eram como pais para mim e sei o quanto são responsáveis, quanto a segurança e bem estar das crianças estava despreocupada. E pelo que conheço das duas estão se divertindo e muito, e ao que se refere ao Thomas e Mel, algo me diz que para eles esse final de semana seria inesquecível.
O final de semana inteiro Adam me ajudou, cuidou das minha feridas, me alimentou, me ajudou nos banhos, algo que parecia ser o melhor momento do dia dele, mas não poderia me deixar levar por esses momentos. Não posso esquecer as feridas de um coração partido e humilhado. Temos que ser práticos para segurança das meninas.
Logo a segunda chegou e o conserto da ponte nos trouxe de volta minhas meninas e meu menino (agora quase um homem) de volta para casa.
Olie e Zay estavam frenéticas, queriam contar tudo e da mesma forma matar as saudades de dois dias longe da mamãe e do Sr Ren.
Olivia queira assistir Star Wars com o pai (coisa que não sabia até então). Sei como Adam não gosta de se ver em seus trabalhos, e tentei com todas as forças persuadir a Olivia a ver outra coisa, mas era quase impossível tirar da cabeça dela essa ideia e sei que quando ela quer algo seria quase impossível fazê-la desistir.
Adam pela primeira vez experimentou a determinação dessa pequena, ele cedeu e foi torturado por uma maratona de dois filmes seguidos de Star Wars.
Elas estavam animadas, felizes, envolvidas por estarem ali com o “Kylo Ren “ em pessoa, então achei que seria o melhor momento de falar sobre a paternidade do Adam.
Olie reagiu como sempre, quase indiferente até entender o assunto, minha preocupação sempre foi a reação da Zara, essa era rancorosa e até certo ponto dramática. Ela sempre calada, sempre analisa tudo a sua volta. Eu sabia o quanto a falta do pai a atingiu nesses oito anos, ela sempre perguntou, sempre quis entender o fato do pai nunca ter procurado por elas, ou simplesmente ter respondido às cartinhas que elas escreveram. Ela sempre me perguntou o que tinham feito de tão errado para seu pai nunca ter retornado para vê-las. Seria um momento difícil de contornar com ela. Sei que não reagiria bem, mas não esperava tanto drama e ofensas a mim e a visão de que eu seria capaz de abandoná-la deixando ela com o pai que no momento é um estranho para ela.
Adam ficou assustado com o comportamento dela, achou que jamais conseguiria atingir o coração dela, e ficou mais chocado ainda com o fato da rejeição ao coração transplantado, como se ele estivesse envolvido pessoalmente nesse procedimento no passado.
O acalmei, creio que nesse momento somente eu posso me desesperar mesmo que seja somente no meu íntimo.
Tirei o foco desse fato jogando e pedindo sua ajuda para o aniversário delas, outro fato que o pegou de surpresa. Ele ficou ao meu lado para um café e um bate papo mais sério. Me dispus a responder todas as perguntas que ele.
Adam estava apreensivo com a “fuga” da Zay para algum lugar que supostamente eu não soubesse, mas sempre sei de tudo, ou pelo menos quase tudo, tinham seguranças espalhados pela propriedade, eram quase invisíveis, mas eu sabia que estavam lá e que vigiavam a todos os movimentos em volta da casa. Já tinham me informado que a Zay estava na casa da árvore, assim fiquei mais calma para deixá-la ter o momento dela, quando escurecer ela voltaria para casa, principalmente porque em breve minha família estaria ali para comemoração do aniversário delas.
Seria um desafio, ter minha mãe, e avó no mesmo espaço que o Adam, seria a primeira interação entre minha família (que o odiava) e ele.
Se tem algo que tenho certeza é que o apoiarei nesse momento de conflitos, mas apesar de todos os erros do Adam em relação a mim, eu tenho mais que certeza que ele não erraria com a Olivia e com a Zara, ele sempre foi um pai fantástico para o Thomas e sei que será um pai excelente para as gêmeas.
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