Capítulo 23
Prova de amor
ANNE
- Diana, o que você tem em mente para o seu aniversário? Está próximo, não é? – Anne perguntou a amiga. Ambas estavam no quarto da ruivinha, jogando conversa fora e comendo pipoca em uma tarde de sábado ensolarada. Diana jogou os longos cabelos negros para trás e respondeu:
- Sim, é daqui a duas semanas. Não quero nada grandioso, pensei em algo íntimo somente para os amigos e alguns familiares.
- O que sua mãe pensa disso? Sei que ela adora festas tanto quanto adora vestidos. - Anne pensou na mãe de Diana sempre vestida na última moda, os cabelos impecavelmente arrumados, maquiagem perfeita e elegante. Ela era uma mulher que sempre vivera em sociedade, conhecia metade do mundo, pois viajara a vida inteira, antes com os pais mineradores, e depois com o marido empresário. Falava de maneira correta, se comportava como uma grande dama e exigia o mesmo tipo de atitude da filha. Mas Diana era o oposto da mãe. Também gostava de festas e de vestidos, mas não era grande amante de viagens longas, preferindo pequenos passeios nos arredores de Avonlea, valorizava as amizades verdadeiras, não se importando se tinham berço aristocrático ou não. Embora soubesse se comportar corretamente, pois fora educada assim desde que nascera, odiava ficar presa a convenções. Queria ser livre e agia como tal, por isso era alvo constante de reprovações de sua mãe.
O pai de Diana era completamente diferente da esposa. Como ela fora criado em meio à pessoas influentes, tivera uma ótima educação, estudara nos melhores colégios, mas não se importava tanto com as aparências. Para ele, o que o homem tinha de mais valioso era o seu caráter, por isso, relevava o jeito da esposa em querer moldar Diana a sua semelhança, mas não concordava com ela. Um casamento de prestígio nem sempre era garantia de felicidade,e o que ele queria era que Diana fosse feliz, não importava de que maneira ela escolhesse viver e com quem.
Anne interrompeu sua linha de pensamento para prestar mais atenção ao que Diana dizia:
- Ah, Anne. Você conhece minha mãe. Nunca perde uma oportunidade de me exibir para a sociedade como se eu fosse uma peça de leilão. É óbvio que ela não gostou da minha ideia.
- Você me disse que ela tinha aceitado seu namoro com o Jerry. Ela mudou de ideia novamente?- Anne esperou pela resposta da amiga enquanto se servia de mais pipoca.
- Ela aceitou sim, mas creio que no fundo ela tem esperanças que eu mude de ideia. Eu sei muito bem que ela preferiria me ver casada com um fazendeiro bem sucedido do que com um estudante com pretensões de ser advogado. - Diana respondeu rindo. – Minha mãe ainda não percebeu que eu e ela não temos nada em comum.
- Você é uma pessoa maravilhosa, Diana. Não mude nunca essa parte de você. Orgulho-me muito de ser sua amiga. - Anne beijou a amiga no rosto.
- Obrigada, Anne. Também te admiro muito. Na verdade, você é quem me fez abrir os olhos para novas perspectivas. Tenho aprendido muito com você. Antes eu era só uma garota do interior, vivendo uma vida que os outros planejaram para mim, mas quando você chegou aqui me ensinou o verdadeiro sabor da liberdade, de poder escolher por mim mesma os caminhos que quero seguir, e descobrir tudo o que sou capaz de fazer. Tudo isso eu devo a você.
Anne sorriu feliz para Diana. Ficara surpresa em saber que a menina a via como um modelo a ser seguido, logo ela, uma garota que até outro dia era desprezada por ser órfã. Era muito bom inspirar pessoas de maneira positiva, , pois isso lhe mostrava que apesar dos percalços pelos quais passara, conseguira se tornar uma pessoa decente, de bons sentimentos, sem rancor no coração. Poderia seguir em frente, sabendo que naquele mundo tão grande existiam inúmeras possibilidades para explorar e ela fazia parte dele.
- Você vai encontrar o Gilbert hoje?- Diana quis saber.
- Fiquei de ir para a fazenda dele mais tarde. Mary vai receber uma sobrinha que vem visitá-la para o fim de semana, e ela quer nos apresentar.
- Ela mora aqui por perto?
- Não. Ela mora bem longe daqui. Mary me disse o nome da cidade, mas não consigo me lembrar..- Anne franziu a testa, em uma tentativa de recordar o que Mary havia lhe dito sobre a sobrinha.
- Bem, vou para casa. Jerry ficou de aparecer por lá e quero chegar antes dele. –Diana disse lambendo o restinho de sal que ficara em seus dedos por causa da pipoca.
- Está bem. Precisamos conversar mais sobre o seu aniversario. -Anne falou acompanhando a amiga até a porta.
- Claro. Você pode me ajudar com os detalhes depois. Até logo, Anne.
- Até logo, Diana. Nos vemos mais tarde.
Anne observou Diana caminhar até o portão de saída de Green Gables, se virar e acenar para ela antes de desaparecer completamente na curva da estrada que a levava até sua casa.
Anne voltou para o seu quarto, pensando na tarde que passaria na fazenda de Gilbert. Combinara de aparecer às seis da tarde para o jantar em família, pois a sobrinha de Mary chegara naquela manhã, e Anne queria dar tempo para que elas colocassem sua conversa em dia e não se sentissem interrompidas por uma visita fora de hora.
Marilla tinha ido com Matthew até o centro de Avonlea para comprar linhas para suas costuras e alguns tecidos, por isso, Anne estava sozinha em casa. Ela então decidiu fazer uma sobremesa para levar para o jantar na casa de Gilbert, pois aprendera com Marilla, que toda vez que fosse convidada para algum evento na casa de alguém, nunca deveria ir de mãos vazias. Assim, decidiu fazer um mouse de maracujá, o que a lembrou imediatamente de seu passeio com Gilbert em Charlotte town. A recordação daquele dia lhe trouxe um sorriso aos lábios, mas ela logo tratou de se concentrar no que estava fazendo, pois não dispunha de muito tempo pra fazer tudo que precisava antes de começar a se arrumar para ir até a casa de Gilbert.
Mas tinha que admitir que estava curiosa para conhecer a sobrinha de Mary. Como ela seria? Mary disse que a menina era muito estudiosa e era o orgulho da família, pois tinha 17 anos e acabara de entrar para a faculdade de enfermagem. Mas nada tinha sido fácil para ela. Vinha de uma família simples e sem posses, por isso, tivera que se esforçar muito para conseguir estudar. Até no ultimo ano, trabalhara como caixa em um supermercado, e nos fins de semana, como garçonete em uma lanchonete para pagar as mensalidades da Faculdade que cursava durante a noite. Somente dois meses atrás conseguira um trabalho como secretária em um consultório médico, com um salário melhor e horário mais flexível, sobrando-lhe mais tempo para se dedicar aos estudos.
Valia a pena conhecer alguém assim, tão jovem, mas tão cheia de energia para correr atrás de seus sonhos, pensou Anne. Ela também pensava em ir para a Faculdade, arrumar um emprego e ser independente. Embora tivesse sido adotada por Matthew e Marilla, e legalmente eles fossem responsáveis pelo seu bem-estar físico e financeiro, não queria sobrecarregá-los com despesas extras. Ela era jovem e forte, e tinha grande disposição para ganhar seu próprio sustento, e era o que faria quando tivesse meios para isso.
Anne olhou para o relógio, e viu que ela tinha duas horas para deixar tudo pronto. Colocou o mouse na geladeira, guardou o restante dos ingredientes no armário e foi para seu quarto escolher o que vestir e tomar banho. Em uma hora estava pronta. Trajava um vestido branco que era marcado na cintura por uma fita azul escura. Prendera os cabelos em um rabo de cavalo no qual colocar um laço também azul para combinar com o vestido, e calçava sapatilhas brancas. Desceu as escadas e foi direto para a cozinha. Checou o mouse na geladeira e percebeu satisfeita que ele estava no ponto. Colocou-o dentro de uma cesta com cuidado, e então, se lembrou das rosquinhas que Gilbert tanto gostava, e resolveu levar algumas delas para ele.
Saiu de casa e foi caminhando até a fazenda do namorado. Quando chegou lá, bateu na porta e quase que imediatamente, Gilbert veio atendê-la.
- Estava esperando por você. Que bom que finalmente chegou. - ele a beijou rapidamente no rosto, pegou a cesta que ela lhe entregou e a levou para dentro.
- Oi, Mary. Como você está se sentindo hoje? – Anne perguntou assim que entrou e viu a esposa de Sebastian sentada na sala.
- Estou muito bem. Quase não enjoo mais.- Mary disse sorrindo.- Deixe-me te apresentar.Esta é minha sobrinha Munisse.
- Que lindo nome. Como vai? Eu sou Anne. -.a ruivinha apertou a mão da sobrinha de Mary sorrindo, no que foi prontamente retribuído por ela.
- Olá, Anne. Muito prazer em conhecê-la. Minha tia falou muito de você.. Por favor, sente-se conosco. Estávamos conversando sobre nossas famílias. Faz tanto tempo que não nos vemos que os assuntos para colocar em dia são inúmeros.
- Bem, agora que vocês estão devidamente apresentadas, vou ver se Sebastian precisa de minha ajuda na para terminar o jantar. Hoje ele resolveu que será o cozinheiro da noite. – Gilbert explicou para Anne. - Volto logo. - Gilbert beijou Anne nos lábios e desapareceu pela porta que levava até a cozinha.
Anne se sentou no sofá ao lado de Mary e ficou observando Munisse enquanto ela conversava com a tia. Algumas vezes a menina se virava para ela e lhe fazia alguma pergunta, a qual Anne respondia e se calava novamente. Não sabia por qual razão se sentia tímida na presença de Munisse. Ela era maravilhosa e era tudo que Anne não era. Tinha cabelos negros ondulados que lhe chegavam até a cintura e brilhavam como ônix, dando-lhe um ar exótico que fez Anne se sentir miseravelmente comum..Olhando para si mesma, a ruivinha se sentiu tão patética naquele vestido branco sem nenhum adorno a não ser a fita azul na cintura, que teve vontade de se esconder. Munisse ao contrário, usava um vestido azul marinho que lhe caía tão maravilhosamente bem, dando-lhe graça e elegância, e deixando seu colo moreno à mostra. Para completar, ela tinha olhos negros incríveis e brilhavam de alegria e animação naquele momento, enquanto ria divertida de alguma coisa que Mary acabava de dizer.
Dez minutos depois, Sebastian entrou na sala e anunciou que o jantar seria servido.. Anne se sentou a mesa ao lado de Gilbert e Munisse sentou-se de frente com eles ao lado de Mary e Sebastian..Durante a refeição, todos conversaram animadamente, menos Anne, que se sentia estranha como se não devesse estar ali. O que não lhe passou despercebido, foi o fato de que tanto Gilbert quanto Munisse conversavam como se fossem velhos conhecidos. Riam da piada um do outro, caçoavam um do outro, e Anne não pôde deixar de notar que em alguns momentos, Gilbert olhava para a menina com certo interesse, e essa constatação a atingiu como se fosse uma agulha a perfurar-lhe o coração..
Seu desconforto foi aumentando, conforme o jantar prosseguia, e Anne mal percebeu o que comia ou bebia. Mary notou esse detalhe e perguntou a ela:
- Anne, está tudo bem? Você mal tocou na comida..
- Não se preocupe. Mary. Só estou sem apetite. - Anne respondeu. Diante da explicação da menina, Mary franziu a testa, mas não disse mais nada.
Todos elogiaram a sobremesa que Anne trouxera, e Gilbert a agradeceu pelas deliciosas rosquinhas que já eram suas favoritas. Ao final do jantar, Munisse e Gilbert se encarregaram de tirar a mesa e lavar a louça, e Anne acompanhou Mary e Sebastian até a sala de estar onde ficaram conversando. Anne se esforçava para prestar atenção no que diziam, mas sua cabeça estava em outro lugar.Inquietava-se por Gilbert e Munisse estarem sozinhos na cozinha, e em um dado momento, não mais aguentando sua ansiedade, Anne se levantou e disse a Mary:
- Estou com sede, vou até a cozinha tomar um copo de água.
- Claro, querida. Fique a vontade. – Mary disse sem perceber a tensão na voz de Anne.
Ao chegar na porta da cozinha, Anne ouviu Gilbert dizer algo engraçado e Munisse rir com gosto do que ele dissera. Então, viu que suas cabeças estavam tão próximas que quase podiam se tocar. Anne não queria admitir, mas estava com ciúme, e era um ciúme tão feroz que fazia seu estômago se contorcer. Não suportando mais, saiu da cozinha sem que nenhum dos dois percebesse que estivera ali. Quando entrou na sala novamente ela olhou para Mary e disse:
- Mary, eu preciso ir para casa. Você poderia, por favor, avisar ao Gilbert?
- Aconteceu alguma coisa Anne?- Mary perguntou, querendo entender por que a menina parecia tão aflita.
- Não aconteceu nada. Só estou com dor de cabeça.
- Por que não espera mais um pouco. Quer que eu chame o Gilbert?
- Não. Ele está ocupado e não faz sentido atrapalhá-lo por uma bobagem.
- Deixe que eu te leve até Green Gables, então. - Sebastian se ofereceu.
- Obrigada, Sebastian, mas não é necessário. Prefiro caminhar, pois o ar fresco vai melhorar a dor de cabeça. - Anne disse fingindo despreocupação. – Até logo, Mary. Diga a Munisse eu adorei tê-la conhecido. – deu um beijo no rosto de Sebastian e sua esposa, e saiu antes que insistissem no assunto.
Anne caminhou até Green Gables como se pisasse em brasa quente. Dentro dela a raiva fervia.,me sabia bem porque estava tão furiosa. Odiava a ideia de ver Gilbert perto de outra garota, ainda mais uma tão atraente quanto a sobrinha de Mary. Mas havia ainda outro motivo para sua ira. . Munisse, com toda sua beleza, inteligência e jovialidade a fizera se sentir insegura, ainda mais porque percebera que essas qualidades atraiam Gilbert, e Anne não podia aguentar tal pensamento.
Chegou em casa, e viu o bilhete de Marilla avisando que ela e Matthew tinham ido se recolher mais cedo, devido ao cansaço da viagem, mas que se ela quisesse comer algo havia comida na geladeira. Anne foi para o quarto e teve o cuidado de fechar a janela. Não queria ver Gilbert naquela noite, não estava em condições de falar com ele, se despiu e foi para a cama cobrindo a cabeça com a colcha de retalhos feita por Marilla. Ouviu quando pedrinhas atingiram a janela, e tinha certeza que era Gilbert. Não se levantou e nem acendeu a luz, esperou na escuridão ate que o barulho cessasse e respirou aliviada. Depois de horas com o olhar perdido no escuro do quarto adormeceu, mas todo o tempo manteve os punhos cerrados, como se inconscientemente lutasse nas sombras contra seus próprios fantasmas.
GILBERT
Gilbert ouviu uma porta de carro bater e espiou pela janela. Viu uma moça alta e esguia descer do banco do passageiro, com uma mala de viagem em uma mão, e a outra apoiava Mary, ajudando-a a caminhar até a varanda. Ouviu Sebastian dizer alguma coisa, Mary ralhar com ele e a menina rir alto divertida. Com certeza aquela era a sobrinha da qual a esposa de Sebastian vinha falando sem parar nos últimos dias.
Mary estava muito ansiosa pela chegada de Munisse, se ele não estivesse enganado, era esse o nome dela.pois não via a menina há bastante tempo e estava com muitas saudades.Munisse era um dos poucos parentes de Mary que viviam perto de Avonlea. Os outros estavam espalhados pelo mundo, e Mary não tinha esperanças nenhuma de tornar a vê-los um dia. Por isso, ter Munisse em sua casa tinha um significado especial para ela. Era como ter contato com suas raízes novamente, e recordar de tempos felizes de outrora onde toda a família se reunia para organizar grandes festas. Com o passar dos anos, a vida mudara bastante. Mary deixara a casa dos pais cedo para ganhar a vida, e nunca mais conseguira retornar. Foram anos difíceis,de muito trabalho, solidão e desapontamento, até que Sebastian aparecera e a salvara de uma vida desesperançada.
Gilbert conseguia entender a alegria dela, e via com prazer que até mesmo o desconforto da gravidez parecia menor com a perspectiva da chegada da sobrinha. Mary desabrochara naqueles dias, estava ainda mais bonita e alegre, e até mesmo Sebastian exibia um semblante mais leve ao notar a animação da esposa, e isso lhe aliviava a preocupação com a saúde de Mary..
- Olá, Gilbert. Estamos de volta. - o menino ouviu Mary dizer ao entrar pela porta da sala com Munisse pendurada em seu braço. - Ah, você, está aí. - ela disse ao ver Gilbert. – Esta é minha sobrinha Munisse. Ela não é linda? – Mary perguntou radiante.
- Olá, Munisse. Sou Gilbert. Prazer em conhecê-la.
- O prazer é todo meu. Mary me falou tanto de você que sinto que já o conheço a muito tempo. – Munisse apertou a mão de Gilbert e depois lhe deu um abraço carinhoso.
- Ela também me falou de você. – Gilbert falou. Mary não tinha mentido. Munisse era realmente uma linda moça e parecia ser bastante simpática também. Seus olhos inteligentes brilham enquanto falava com ele., e se tornaram ainda mais vivos quando Gilbert lhe disse que queria ser médico.
- Que ótimo Gilbert. Eu estou na faculdade de enfermagem e creio que teremos muito assunto para conversar..
- Claro. Quando você quiser. – Gilbert disse simpático.
- Vamos, Munisse. Vou mostrar seu quarto. - Sebastian disse subindo as escadas seguido pela menina.
- O que achou de minha sobrinha, Gilbert?- Mary perguntou assim que se viu sozinha com Gilbert.
- Parece ser uma moça muito inteligente, além de muito simpática. - Gilbert respondeu.
- Munisse é uma menina de ouro, sempre preocupada com o bem-estar dos outros. Ela não poderia ter escolhido carreira melhor. A enfermagem lhe cai como uma luva. - Mary comentou. - Tenho certeza de que você e ela vão se dar muito bem.- Gilbert sorriu concordando.
Assim, nas horas seguintes, Gilbert e Munisse falaram muito sobre as profissões que queriam seguir e perceberam que tinham muitos pontos em comum. Gilbert lhe mostrou seus livros de estudo, e fez várias perguntas sobre a Faculdade da menina. Quando a hora do chá da tarde chegou, ambos sentiam que já eram velhos amigos e enquanto conversavam, a menina percebeu que Gilbert não desviava o olhar da porta.
- Gilbert, você me parece ansioso. Posso perguntar por que olha para a porta a cada cinco segundos? Está esperando alguém?
- Sim. – Gilbert respondeu simplesmente.
- Deixe-me adivinhar. É uma garota?
- Sim,mas não é uma garota comum. É a minha namorada. – Gilbert respondeu, deixando transparecer certo orgulho na voz.
- Qual é o nome dela?- Munisse quis saber.
- Anne. - Gilbert disse o nome da menina enfatizando cada letra. Adorava aquele nome, Era simples, mas especial, e combinava plenamente com a dona.
- E como é sua Anne?
Gilbert pensou um pouco antes de responder, tentando encontrar as palavras certas para descrever a ruivinha.
- Ela é uma combinação de muitas coisas, que juntas formam o ser humano mais formidável que tive o prazer de conhecer.- Gilbert sorriu ao se lembrar de Anne .Parecia que podia vê-la ali em frente a ele.
- Que lindo Gilbert! Estão apaixonados há muito tempo? – Munisse perguntou interessada na história do menino.
- Tivemos um começo difícil, mas posso dizer com certeza que me apaixonei por ela no primeiro momento em que a vi.
- Você é um rapaz admirável, Gilbert. Um homem que diz o que sente sem se envergonhar de seus sentimentos é muito raro hoje em dia.
- E por que eu me envergonharia de algo tão bonito? Anne foi a melhor coisa que me aconteceu. Ela mudou a minha vida, e não tenho palavras para descrever o quanto ela me faz feliz.
- Preciso conhecer essa criatura maravilhosa. Por suas palavras posso imaginar que ela seja alguém realmente especial.
- Você vai conhecê-la ainda hoje, pois a convidei para jantar conosco.
- Magnífico! – Munisse batia palmas animada.
- O que é tão magnífico assim?- Mary acabara de entrar na sala seguida por Sebastian, vindo da cozinha e ficou curiosa por saber por que a sobrinha estava tão alegre.
- A namorada de Gilbert vem jantar conosco, e estou animadíssima para conhecê-la.
- Ah, então ele já te falou da Anne. - Sebastian disse rindo. – Eu estava me perguntando quando é que ele ia te contar sobre ela. Este garoto está tão apaixonado que não consegue falar duas palavras sem tocar no nome da menina.
- Não exagere, Bash. As coisas não são bem assim. - Gilbert protestou discordando das palavras do amigo.
- Dessa vez vou ter que concordar com meu marido. - Mary falou olhando para Gilbert.- Você precisa ver Munisse, a felicidade desse garoto quando Anne e ele estão juntos. Acho que nunca conheci um garoto de dezessete anos tão apaixonado quanto este aqui.- Mary apontava para Gilbert rindo.
- Parem com isso, vocês dois. Estão me deixando encabulado. - Gilbert protestou novamente sem jeito.
- Já disso que isso é lindo, Gilbert. Não precisa ter vergonha. - Munisse sorriu para o menino. Tocando seu ombro de leve como um sinal de encorajamento.
- Bem, toda essa conversa está boa, mas creio que devemos começar a cuidar do jantar- Mary disse já se encaminhando para a cozinha.
- Quer ajuda, tia Mary?- Munisse perguntou solícita.
- Não, querida.Sebastian se ofereceu para ser o cozinheiro da noite, e eu aceitei.- Mary olhou para a sobrinha e murmurou entre lábios.- Que Deus nos ajude.
- Hey, eu ouvi isso, Mary. Está querendo dizer que sou um cozinheiro ruim?- Sebastian perguntou fingindo estar indignado pelo comentário da esposa.
- Estava brincando, querido. Você sabe que adoro sua comida. - Mary disse, beijando Sebastian nos lábios.
- Que bom saber disso. Venha, Blythe. Você pode me ajudar a descascar as batatas. - Sebastian colocou o braço em volta do ombro de Gilbert, e o levou para a cozinha com ele.
Um tempo depois, ouviram uma batida na porta e Gilbert foi correndo atender, constatando feliz que Anne acabara de chegar e tinha uma cesta na mão. Então disse a ela sorrindo.
- Estava esperando por você. Que bom que finalmente chegou. - beijou-a nos lábios, pegando a cesta que ela lhe oferecia e levou-a até onde Mary e Munisse estavam..Deixou-as conversando por alguns instantes e foi até a cozinha levando a cesta que Anne trouxera com o mouse de maracujá e suas rosquinha favoritas.
Logo que o jantar ficou pronto, ele e Sebastian foram chamar as três mulheres para se juntarem à eles na cozinha. Anne e Gilbert se sentaram lado a lado enquanto Munisse se sentou na outra ponta da mesa, com Sebastian e Mary como suas companhias. Jantaram e conversaram, tudo ao mesmo tempo, e Gilbert se divertiu bastante naquele momento, pois Munisse era uma garota fácil de se conversar,além de tratá-lo como um irmão mais novo,fazendo-o rir de suas piadas e brincadeiras.
Em certos momentos, ele percebeu que Anne se mantinha estranhamente calada. Desde o momento que chegara parecia estar incomodada com alguma coisa. Talvez se sentisse tímida por causa da presença de Munisse, que era alguém que ainda não conhecia. Quem sabe depois de algum tempo de conversa com a menina, ela se sentisse mais a vontade e começasse a falar daquele seu jeito tão peculiar, e cheio de curiosidade por coisas novas, e encheria Munisse de perguntas?
Com esse pensamento animador, Gilbert continuou conversando com Munisse e não percebeu que Anne mal tocara na comida. Logo passaram para a sobremesa que Anne trouxera, e o namorado aproveitou para agradecer a ruivinha pelas rosquinhas. Assim que terminaram o jantar, Mary e Sebastian levaram Anne para a sala, deixando a louça suja do jantar a cargo de Munisse e Gilbert. Desta forma, ambos passaram a meia hora seguinte organizando a cozinha, em meio a uma boa conversa e risadas, pois Munisse era uma ótima companhia quando se tratava de trabalhar em equipe.
Quando voltaram para a sala, Gilbert deu por falta de Anne, e viu o rosto apreensivo de Mary e o olhar sério de Sebastian. Ficou preocupado e perguntou:
- Onde está Anne?
- Ela foi para a casa. – Mary respondeu demonstrando que também estava preocupada.
- Ela, o que? Por que ela foi embora sem me avisar?- ele olhava para Sebastian e Mary sem compreender o real motivo de Anne ter ido embora.
- Eu esperava que você pudesse nos contar. Ela foi para a cozinha tomar água e voltou dizendo que estava com dor de cabeça e queria ir embora. Vocês discutiram ou aconteceu alguma outra coisa?- Mary perguntou.
- Não, eu nem a vi entrar na cozinha. E você? – Gilbert perguntou a Munisse., e diante da negativa da menina ele falou quase como se fosse para si mesmo.- Eu não compreendo.
- Gilbert, você pensou na possibilidade de que talvez Anne esteja com ciúmes? – Mary perguntou com um arquear de sobrancelhas.
- Ciúmes? Do que?- Gilbert perguntou ainda sem entender.
- De Munisse. - Mary respondeu.
- De mim? Como assim? – agora era a vez de Munisse ficar espantada.
- Eu vi o olhar de Anne durante o jantar enquanto vocês conversavam. E minhas suspeitas se confirmaram depois que ela veio da cozinha dizendo que estava com dor e cabeça, e que queria ir embora. Ela não me deixou te avisar e muito menos deixou Sebastian levá-la quando ele se ofereceu. - Mary contou para Gilbert e Munisse.
- Mas isso não faz sentido. Ela sabe que não tenho olhos para outra garota a não ser para ela.
- Gilbert, uma mulher com ciúmes é capaz de ver coisas onde não existem. Talvez ela tenha se sentido colocada de lado ou ameaçada por Munisse ser alguém desconhecido por ela sei lá. Nós mulheres somos irracionais, ás vezes.
- Preciso falar com ela. - Gilbert disse, já se preparando para sair.
- Gilbert, já é tarde, por que não deixa isso para amanhã?- Mary falou preocupada, vendo o menino sair sem dar-lhe ouvidos.
- Deixe-o ir, Mary. - Sebastian disse colocando a mão no ombro da esposa, fazendo-a entender que Gilbert não escutaria ninguém.
Gilbert foi para Green Gables quase correndo. Não conseguia acreditar que Anne fora embora sem falar com ele, e ainda por cima com ciúme de Munisse. Aquilo era tão absurdo. Como ela podia pensar algo assim, depois de tudo o que ele lhe confessara? Ele só faltava beijar o chão que Anne pisava tamanha era sua adoração pela menina, e estava inconformado pela maneira como a menina agira. Se estava incomodada por que não falara com ele? Gilbert poderia ter acabado com todas as suas duvidas a respeito dele e da sobrinha de Mary em um instante. Mas pensando melhor, Gilbert entendera que Anne não lhe perguntara nada por ser orgulhosa. ele conhecia bem esse lado da menina, ela preferia morrer a deixar que alguém percebesse algum tipo de fraqueza nela, e confessar que estava com ciúmes de Gilbert era algo que Anne não gostaria de admitir nem para si mesma.
Chegou a Green Gables, e foi direto para perto do quarto de Anne, mas logo percebeu que a janela estava fechada. Ele atirou pedrinhas para fazê-la saber que ele estava ali ansioso para falar-lhe , mas Anne não deu sinal de tê-lo escutado, pois a janela continuou fechada e nenhuma luz se acendeu, o que fez Gilbert concluir que a menina já estava dormindo ou não queria falar com ele.Voltou para sua fazenda desolado,e quando entrou encontrou Munisse esperando por ele.
- Gilbert, conseguiu falar com Anne? - então viu o olhar triste que Gilbert lhe lançou,e concluiu.- Estou vendo que não.- Gilbert se sentou na sala com ela, mas não disse nada deixando Munisse aflita.
- Gilbert, me desculpe. Eu não queria causar nenhum problema entre você e Anne. Eu vou embora amanhã e não queria deixar uma má impressão para você de minha pessoa.
- Que isso, Munisse. A culpa não foi sua. O problema é a pouca confiança que Anne tem em mim. – o menino disse com os olhos perdidos em algum ponto da parede a sua frente.
- Não pense assim, Gilbert. Você deve saber que quando estamos apaixonados, somos um pouco incoerentes quando o assunto é a pessoa que amamos. Se coloque no lugar de Anne, e não a julgue tão duramente. - Munisse tentava fazê-lo raciocinar melhor a respeito das atitudes de Anne.
- Talvez você tenha razão, mas no momento não consigo pensar em mais nada a não ser no quanto me sinto mal com toda essa situação. Acho melhor eu ir para cama e tentar esquecer um pouco tudo isso.
- Está bem, Gilbert. Boa noite. - viu o menino se levantar de onde estava sentado, subir as escadas em direção ao seu quarto. O leve curvar de ombros lhe mostrou o quanto Gilbert se sentia triste com o que tinha acontecido.
Munisse tornou a sentar-se no sofá da sala. Iria embora ao dia seguinte e não queria deixar a casa da tia se sentindo responsável pelo o que ocorrera ali. Tinha que fazer alguma coisa, não podia partir deixando para trás um rastro de infelicidade, que com certeza tomaria conta de Gilbert e Anne se aquela situação não fosse esclarecida. Pensou por alguns segundos, totalmente concentrada em seu objetivo para encontrar uma solução para aquele problema, e foi aí que teve uma ideia.
GILBERT E ANNE
Anne acordara agitada naquela manhã de domingo, e por isso, resolvera fazer algo antes que ficasse maluca com tantos pensamentos sobre a noite anterior atropelando sua mente.
Começara por organizar seu armário de roupas e sapatos, sobre o qual Marilla vivia reclamando com ela pela bagunça. Depois, passara a arrumar todos os seus livros na estante do quarto. Já dissera em voz alta todo o alfabeto grego três vezes, e agora tentava se lembrar de todo o vocabulário de palavras francesas que aprendera nas aulas da Srta. Stacy, mas nada conseguia tirar de sua cabeça a imagem de Gilbert Blythe.
Estava a ponto de sair do quarto e ver se Jerry precisava de ajuda nos estábulos quando ouviu a voz de Marilla no andar de baixo chamando-a:
- Anne. Tem uma pessoa aqui querendo falar com você. Por favor, pode descer até aqui agora?
- Já estou indo Marilla. - Anne respondera, mas não sem antes se perguntar quem poderia querer falar com ela naquele momento. Desceu as escadas apressadamente, parando no último degrau ao ver surpresa quem a esperava.
- Munisse? O que a trás a Green Gables?Aconteceu alguma coisa?- Anne perguntou, notando com certo pesar que a garota era ainda mais bonita à luz do dia, em seu vestido rosa e chapéu combinando.
- Olá, Anne. Será que poderíamos conversar a sós por alguns minutos? – Munisse sorria simpática.
- Claro. Acompanhe-me até o meu quarto. - Anne concordou meio a contragosto, depois disse em voz alta para que Marilla, que estava na cozinha, a ouvisse. – Marilla, Vamos até meu quarto, está bem? – ouviu a velha senhora resmungar alguma coisa e ficar em silêncio novamente.
- Meu quarto é lá em cima. - Anne disse para Munisse, e as duas subiram as escadas até o quarto de Anne.
- Por favor, sente-se.- Anne ofereceu uma cadeira para que Munisse se sentasse, e ficou esperando a sobrinha de Mary se acomodar e dizer o que fora fazer ali.
- Bem, Anne. Creio que eu sou a última pessoa que você gostaria de ver neste momento, mas eu precisava falar com você antes de partir. - Munisse começou a se explicar. Como Anne não disse nada, ela continuou.
- Nós não conversamos muito ontem, e creio que seja natural que você tenha alguma desconfiança acerca de minha pessoa. - Anne começou a protestar, mas Munisse a interrompeu:
- Por favor, deixe-me concluir o que tenho a lhe dizer. Sei que você ficou muito chateada ao me ver conversando com Gilbert ontem, mas posso te assegurar que não existe nada entre a gente a não ser amizade. Gilbert é um garoto muito inteligente, e me simpatizo muito com ele, mas não passa disso. Por isso, você não tem motivo nenhum para sentir ciúmes. E tem mais. Acho que minha tia esqueceu de te dizer que sou noiva.- Munisse levantou sua mão direita para que Anne pudesse ver a aliança de ouro em seu dedo anular.- Meu noivo acabou de se formar em Medicina, e no próximo ano pretendemos nos casar.
Anne não soube o que dizer. Estava envergonhada pela maneira como agira. Comportara-se feito uma menininha ciumenta e fora injusta com Gilbert e Munisse. E agora? O que poderia dizer para remediar seu erro?
Munisse pareceu compreender instantaneamente o que se passava no intimo da menina. Assim, ela pegou a mão de Anne nas suas e disse:
- Anne, não se sinta mal pelo que aconteceu. Eu sei como se sente quando estamos apaixonados e sentimos nosso amor ser ameaçado de alguma maneira. Eu mesma já cometi alguns desatinos por causa do ciúme.
- Você? Mas é tão linda, por que teria motivos para sentir ciúmes.
- Você também é linda, Anne. Mas, isso não tem nada a ver com beleza. Está relacionado à maneira como nos vemos. No meu caso foi porque venho de uma família simples e Ronnie, meu noivo, é de família tradicional e de muitas posses. Quando começamos a namorar, eu não acreditava que ele era sincero quando dizia que me amava, pois eu pensava que se ele podia ter a garota que quisesse, o que ele ia querer comigo a não ser se divertir. Tivemos brigas históricas, até que eu conseguisse acreditar que ele estava sendo sincero a respeito de seus sentimentos por mim. Mas isso só aconteceu depois que ele me deu essa aliança, e me pediu em casamento.
- Desculpe, Munisse. Eu não podia imaginar isso, eu...- Anne tentava encontrar palavras para se desculpar, mas não estava conseguindo.- Munisse apertou a mão dela com simpatia e disse:
- Eu não estou chateada com você. Entendo sua posição e não a estou julgando. Mas, tem uma pessoa com quem você deveria conversar. – Anne assentiu e Munisse falou com suavidade. – Você não tem ideia do quanto Gilbert é apaixonado por você. Desde que cheguei ele não parou de te elogiar por um minuto sequer. Você deveria dar mais crédito aos sentimentos dele por você.
Anne ouviu cada palavra que Munisse estava dizendo de cabeça baixa, pois não tinha coragem de levantar o olhar. O que será que Gilbert estava pensando dela? Será que estava muito magoado? Queria perguntar a Munisse, mas tinha medo do que ela ia lhe dizer. Ela mais uma vez metera os pés pelas mãos, e colocara seu namoro com Gilbert em risco. Por que tinha que ser tão impulsiva e orgulhosa? Sua maldita insegurança por muitas vezes a colocava em situações extremas, e a fazia enxergar coisas que não existiam. Gilbert provara com palavras e ações que a amava sinceramente, então por que deixara que seu mau julgamento a deixasse cega a todas as provas de amor que ele lhe dera? Ela com certeza não o merecia.
Munisse parecia que conseguia adivinhar o que lhe ia no coração,por isso disse consolando-a:
- Não seja tão dura consigo mesma, Anne..Você precisa apenas confiar mais em si mesma e se deixar ser amada.- ao ouvir essas palavras, Anne finalmente conseguiu olhar para Munisse e sorrir.
- Obrigada. Você tem razão, fui uma tola. Não sei por qual motivo me coloquei nesta situação, mas vou procurar o Gilbert e esclarecer esse assunto o quanto antes.
- Eu tenho certeza que dará tudo certo.O amor de vocês é tão bonito, Anne.Confesso que fiquei muito impressionada com a maneira com que Gilbert fala sobre você. Aquele garoto te adora.
- Gilbert é tudo para mim, Munisse. Talvez por isso eu cometa tantas faltas com ele, por medo de perdê-lo. - A voz de Anne soou triste aos ouvidos de Munisse e ela sentiu seu coração se enternecer pela menina.
- Anne, você só vai perdê-lo se quiser. - Munisse tornou a dizer, tentando fazer Anne enxergar o óbvio. Logo em seguida ela disse:
- Bem, agora preciso ir. Meu trem parte em uma hora. Boa sorte, Anne. Espero que quando eu retornar a Avonlea você e Gilbert tenham se acertado. – deu um beijo em cada bochecha a menina, desceu as escadas e saiu em direção ao carro de aluguel que a esperava com Anne bem atrás dela.
- Até logo.- Anne conseguiu dizer,e Munisse acenou do carro em que entrara se despedindo
- Onde está a moça?- Marilla perguntou, trazendo as mãos uma bandeja com muitas guloseimas, chá e rosquinhas.
- Ela já foi, Marilla.- Anne respondeu.
- Que pena. Essa é a sobrinha de Mary sobre a qual você me falou?
- Sim.- Anne disse sorrindo.
- O que ela queria?- Marilla quis saber.
- Nada de importante. Veio apenas se despedir. - Anne não tinha contado a Marilla o que tinha acontecido no jantar no dia anterior, pois sabia que se falasse alguma coisa, Marilla iria lhe passar um sermão de pelo menos duas horas, e ela não estava sem paciência para isso.
- Espero que ela volte outras vezes. Pareceu-me ser uma moça muito simpática.
- Ela é sim.- Anne concordou antes de ver Marilla voltar para a cozinha..
Precisava falar com Gilbert e resolver toda aquela situação. Somente algumas horas tinham se passado, desde o último momento que o vira e já estava morrendo de saudades. Resolveu que não perderia mais tempo e iria procurá-lo. Voltou para seu quarto,despiu seu velho vestido de domingo e vestiu uma saia estampada e uma blusa preta que destacava seu cabelo ruivo. Avisou a Marilla onde estava indo, e percorreu toda a distancia de Green Gables até a fazenda de Gilbert em vinte minutos, tamanha era sua ansiedade em falar com ele. Todo o caminho foi pensando no que diria para se desculpar, se é que existiam palavras que fizessem Gilbert perdoá-la por sua estupidez.
Parou na frente da porta da casa e hesitou antes de bater, mas quando o fez, o som das batidas lhe pareceram desesperadas demais. Sebastian apareceu à porta e lhe sorriu simpático.
- Oi, Anne. Você melhorou de sua dor de cabeça?
- Melhorei sim, obrigada. O Gilbert está? – ela perguntou timidamente.
- Está sim. Por favor, entre. Mary está tirando seu cochilo da tarde, e Gilbert está no quarto dele estudando.
- Será que eu poderia subir e falar com ele?
- Claro que sim. Acho que não preciso levá-la até lá, pois você com certeza já conhece o caminho.- Sebastian disse em tom de brincadeira.
- Obrigada. - Anne disse também sorrindo. Em seguida, subiu as escadas e foi até o quarto de Gilbert. Quando entrou ele estava concentrado lendo um livro de biologia e não percebeu de pronto sua presença, mas então ele levantou a cabeça e olhou para ela seriamente, sem esboçar nenhum tipo de reação. Anne começou a se sentir insegura, pois não esperava que ele a recebesse tão friamente, mas tomou coragem e disse:
- Posso falar com você?
- Não sei se é uma boa hora. - Gilbert respondeu sem olhá-la nos olhos.
- Por favor, Gilbert. É importante. - Anne sentiu que sua voz tremia e tentou se acalmar sem muito sucesso.
- Por que quer falar comigo Anne? O que vai me dizer? Que não confia em mim apesar de tudo o que vivemos juntos? - Anne tentou falar, mas Gilbert a interrompeu.
- O que em nome de Deus te fez pensar que eu estava flertando com Munisse? – Anne ficou olhando para ele, sem conseguir responder àquela pergunta que tinha feito a si mesma nas últimas horas.. Quando Gilbert continuou a falar, seu tom de voz soou extremamente zangado.
- Anne, você sabe que o nosso amor é a coisa mais sagrada do mundo para mim. Então, por que eu macularia algo tão especial com um comportamento tão leviano quanto este? A sua atitude só prova que você não confia em mim, não acredita que tudo o que te digo é verdadeiro. Por que, Anne? Por que não é capaz de enxergar a verdade nua e crua dos meus sentimentos por você?
Naquele instante, Anne percebeu que tinha magoado Gilbert mais uma vez, e que não seria nada fácil aplacar a raiva que ele estava sentindo, mas resolveu insistir assim mesmo.
- Gilbert, eu não sei o que te dizer, eu estou envergonhada pelo modo como agi com você, por favor, não fique bravo comigo. – seus olhos marejaram, mas ela fez um esforço enorme para não chorar. Odiava não ter controle sobre suas emoções, pois isso fazia com que parecesse patética, por isso, mantinha seus sentimentos trancados a sete chaves, mas quando se tratava de Gilbert, isso não valia como regra, pois não sabia como agir, tudo se confundia em sua cabeça e acabava atingindo seu coração. Faltava-lhe a voz, as palavras certas não vinham, suas mãos tremiam e ela se sentia terrivelmente vulnerável, inadequada e perdida. Estava pensando no que dizer a seguir quando Gilbert começou a falar novamente:
- Eu não estou zangado com você, Anne. Só me sinto magoado pela sua pouca confiança em mim.- ele se virou e foi até a janela, mantendo seu olhar fixo na paisagem lá fora. Anne balançou a cabeça atormentada, precisava falar alguma coisa, porque se ela se mantivesse calada, poderia ser engolida por sua infelicidade, por esta razão,arriscou algumas palavras que soaram inseguras aos seus ouvidos:
- Gilbert, por favor, me perdoe. Eu não quis magoar você. Eu não sei o que eu estava pensando, eu... - Anne parou de falar assim que viu a expressão endurecida do menino, ao se virar para ouvi-la. Ele significava o mundo para ela, e sabia que não suportaria se ele não a perdoasse. A angústia tomou conta dela, e então sua dor se transformou em lágrimas, começou a soluçar sem querer, sabia que tudo aquilo era culpa dela e não tinha ideia de como consertar o que fizera.
Ao ver Anne chorar, a expressão de Gilbert se suavizou. Ele não suportava vê-la naquele estado, e queria fazê-la parar de soluçar daquele jeito que fazia o coração dele chorar com ela. Deu dois passos em direção à menina, estendeu os braços e disse:
- Vem cá. - a abraçou com carinho, e enquanto acariciava os cabelos dela, ele continuou a falar com Anne e a sentiu trêmula em seus braços.- Nunca mais faça isso comigo. Você me fez me sentir um canalha, mesmo eu não tendo feito nada que justificasse esse pensamento. Quase enlouqueci por ficar longe de você, mesmo que tenha sido somente por algumas horas. – Pegou o rosto dela entre as mãos e a beijou, como se quisesse provar o que acabara de dizer. Deus! Como amava aquela garota. Ela corria em seu sangue como se fosse adrenalina, era louco por ela de todas as formas.
Os lábios de Anne eram quentes e doces, e saboreá-los era como comer de um fruto proibido e descobrir que havia muito mais delicias a explorar. O corpo todo dela era um convite para as suas carícias, e assim, correu a boca pelo rosto inteiro dela, beijando aqui e ali como se precisasse sentir com seus lábios o gosto inebriante do amor que ela dizia sentir por ele.
Então, Anne se apoiou no corpo de Gilbert, sentindo cada extensão de sua pele ansiar pelo toque dele, ao mesmo tempo em que sentia dentro de si , o fogo da paixão invadir sua corrente sanguínea, e se transformar em chamas líquidas de um desejo sem igual. Amava aquele garoto, e tal pensamento fez com que suas mãos adquirissem vida própria e buscassem tocá-lo. Sem pensar mais um segundo, colocou-as debaixo da camisa dele, e deslizou – as suavemente pela barriga lisa, o peito largo, indo até as costas do menino, sentindo os músculos de Gilbert se ondular sob seu toque, e ficou maravilhada por conseguir afetá-lo daquela forma.
Gilbert fechou os olhos, sentindo toda sua paixão por Anne chegar ao extremo.. Como não desejar aquela garota até as raias da loucura? Ela acabava com toda a sua vontade de resistir quando o tocava daquele jeito. Precisava senti-la inteira em seus braços. Sua boca encontrou a dela em um segundo, deixando-a perceber no quanto ele a queria. O corpo dela se rendeu ao dele, parecendo se dissolver no calor de todos os beijos que trocavam.
Anne não conseguia pensar em nada, a não ser naquele momento de excitação dos sentidos. Gilbert a abraçou tão forte que Anne mal conseguia respirar, seu coração batia tão rápido que podia ouvir o som dele em seus ouvidos. Gilbert então aliviou a pressão do abraço, pegou a mão dela, levando-a aos lábios,e beijando cada dedo sem desviar os olhos de Anne. Ela, por sua vez procurou os lábios de Gilbert ansiosa por mais, sentindo as mãos dele deslizarem por todo o seu corpo. , e suspirou com a satisfação que isso lhe causou, triplicando mil vezes mais suas emoções, pois podia sentir através de todos aqueles beijos a força da paixão de Gilbert por ela, e se deixou queimar com ele naquele sentimento sublime que elevava sua alma e coração. E então, compreendeu exatamente naquele instante que acabara de descobrir que existia mesmo um paraíso, e ele estava nos braços de Gilbert Blythe.
Assim, suspirou novamente quando sentiu a suavidade de Gilbert ao abrir os dois primeiros botões de sua blusa, deixando beijos de fogo em cada parte da pele dela que seus lábios exploravam, estava a ponto de implorar por mais beijos e carícias como aquelas, quando ambos ouviram batidas insistentes na porta, fazendo com que se separassem surpresos.
- Anne, Gilbert, está tudo bem? Desculpem interromper, mas a Mary estava quase me deixando maluco com sua ansiedade por saber se vocês se acertaram. Por isso, ela me fez vir até aqui em cima me certificar pessoalmente.
- Está tudo bem, Sebastian. Ainda estamos conversando, mas logo nos juntaremos a vocês. – Gilbert respondeu com Anne ainda envolvida em seu abraço.
- Esperaremos por vocês, então. Vou preparar chá enquanto isso.
- Obrigado. - o menino agradeceu.
- Desculpe-me, Anne. Acho que me empolguei. - Gilbert disse ao ver a menina abotoar os botões da blusa que ele sem cerimônia nenhuma havia deixado semiaberta minutos atrás.
- Eu te amo, Gilbert. Isso é tudo que importa para mim. Cada minuto que passamos juntos, cada carícia ou beijo que compartilhamos me dá mais certeza dos meus sentimentos por você. - Anne disse, tocando o rosto de Gilbert com carinho.
- Eu também te amo tanto, que não consigo mais fazer coisa alguma sem ter você em meus pensamentos. E quando está em meus braços, é como se não fosse o bastante só beijá-la. Necessito tocá-la mais e mais para ter certeza de que não estou sonhando, e que você é realmente minha.
- Eu sou sua, Gilbert, completamente sua.- A voz de Anne soou rouca e excitou a imaginação de Gilbert novamente, e ele a puxou para seus braços, beijando-a com tamanha impetuosidade que fez com que a ruivinha correspondesse imediatamente. Logo em seguida, ele se afastou rindo e disse para a namorada.
- È melhor descermos ou eu não conseguirei mais deixá-la sair desse quarto.
- Tem razão. Vamos descer antes que Sebastian apareça aqui novamente e nos pegue assim..- Anne concordou.
Desta forma, desceram as escadas juntos e foram até a cozinha. Quando Mary os viu, logo percebeu a felicidade do casal, mas não quis parecer intrometida e por isso não disse nada. Sentaram-se a mesa para o chá, e enquanto conversavam, Gilbert olhava para Anne em alguns momentos e pensava, que ali estava a garota de seus sonhos, a musa de suas fantasias, a luz da sua vida, e que não havia mais nada que pudesse desejar, pois tudo estava perfeitamente em seu lugar, e o futuro nunca lhe parecera tão maravilhoso quanto naquele momento.
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