Faltava pouco para o amanhecer. A madrugada fria trouxe os primeiros flocos de neve que caíram na grama molhada, logo coberta por uma camada fina e branca de gelo. As paredes e até mesmo o teto da Casa dos Gritos parecia protestar sob o vento que uivava do lado de fora. A bruxa desceu a escada espiral que dava para a cozinha, no subsolo. Ela procurou uma caneca para a infusão diária de ervas. Sua líder insistia em que a casa era a única entrada clandestina para o castelo de Hogwarts.
E lá estava. Arabella Lambert. Uma bruxa de quase 500 anos presa em um corpo jovem, porém cansado. E com a missão infinita de evitar o fim do mundo.
Eu quero morrer.
A bruxa soprou de leve a água dentro da caneca. A magia fez uma fumaça espiralada sair instantaneamente, aquecendo-a. Sua expressão estava tensa quando colocou algumas folhas e inalou o aroma de funcho e hortelã. Bebeu um gole imaginando como seriam os próximos anos ali.
Anos. Nunca me acostumarei com o peso do tempo.
Pensou em Aberforth Dumbledore. Talvez ele tenha feito a escolha certa ao recusar o cálice da imortalidade. Ela disfarçou o choque na noite anterior, ao perceber nele as pálpebras caídas e a pele marcada por manchas do tempo e rugas. Apesar das marcas inquestionáveis da velhice, ele ainda era um belo homem. Ela sabia que o bruxo não havia se arrependido da escolha. Em um futuro próximo, Aberforth seria apenas um corpo sem vida sob uma lápide. Ele a deixaria. Era isso que Arabella não conseguia suportar. Ou perdoar.
Eu quero morrer.
Ainda perdida em pensamentos, ergueu os olhos e enxergou duas figuras humanas. Um barulho de vidro quebrando encheu o espaço. Não se importou que o chá derramado tivesse queimado seus pés quando reconheceu Alvo Dumbledore e Severo Snape parados lado a lado. Imediatamente conjurou uma corrente de fogo que serpenteou de sua varinha em direção aos dois bruxos. Snape fez um gesto rápido e lançou um protego maxima. No mesmo instante, a corrente se voltou contra a bruxa em forma de poeira. Ela ficou atordoada e recuou, enquanto pratos e copos caíram no chão, tinindo e estourando.
Dumbledore combinou seu feitiço com o de Severo e no mesmo instante havia uma barreira de proteção entre eles e a bruxa. Ela se tornou em uma névoa cinzenta e enlouquecida, rodopiando até perto do limite traçado. Lambert golpeava o escudo com violência ainda na forma de sombras. Mesas e cadeiras se juntaram à pilha de vidros quebrados no piso de madeira. Trovões ecoaram. E depois, o nada.
Raios iluminavam como flashes de luz e Snape reconheceu aquele maldito quarto no fim do corredor. Ele não estava mais na Casa dos Gritos. Um vento gelado e entorpecente atingiu sua pele ao visualizar a porta quebrada no chão e muitas lascas de madeira em volta. Uma luz no interior oscilava.
Quando atravessou o espaço e parou no batente da porta, viu o corpo inerte de Lilian Evans em sua frente. Cacos do abajur estavam em volta de seu corpo caído. A luz fraca iluminava o belo rosto lívido com olhos vítreos e opacos. Lilian olhava eternamente para o berço no canto do quarto em direção ao menino que chorava de forma convulsiva em plena agonia. Uma marca pulsava na testa da criança, tão viva e forte como se tivesse acabado de ser feita.
Lily morta. Aquilo era uma memória. E isso queria dizer que elas estavam em sua mente.
A luz prateada da corça lambeu o espaço como fogo líquido e quando Severo abriu os olhos, Dumbledore o encarava com uma expressão igualmente sombria.
────── •●• ──────
Ela andava rapidamente. De costas, era possível ver os contornos do chapéu pontudo e o casaco de mangas longas, feito com um tecido verde escuro e bordado de forma sóbria e elegante. Virou alguns corredores e subiu as escadas. Entrou por uma sala da sala de aula e se dirigiu a mesa no centro, depositando alguns livros. Os alunos prontamente ficaram em pé ao lado da carteira escolar.
— Sentem-se. Temos trabalho a fazer.
Eles obedeceram e a professora fez um movimento leve com a varinha. Conjurou um pedaço disforme de uma rocha no centro da mesa, um pouco maior que um livro. Eles observavam com interesse e curiosidade.
— Hoje vocês terão a oportunidade de colocar em prática qualquer tipo de feitiço, incluindo a transfiguração. Terão liberdade para agir de forma autônoma, dentro do limite permitido em nossas leis mágicas. Quero criatividade e técnica. Mantenham minhas expectativas altas.
A pedra era de tamanho médio e tinha a coloração cinza escuro. Aos alunos, ela parecia congelada no ar.
— Muito bem. Molly Prewett?
Uma ruiva que não deveria ter mais que 16 anos se levantou. Ela sorria satisfeita e ansiosa ao mesmo tempo. Molly se aproximou e subiu na elevação em que ficava a mesa da professora. Fez um aceno de varinha e disse em voz alta e firme:
— REDUCTO!
A rocha rapidamente se transformou em mini partículas escuras e finas, como poeira. Alguns alunos eram incapazes de tirar os olhos dos grãos finíssimos flutuando em câmera lenta no ar. A professora observava tudo com os olhos enigmáticos.
— Muito bem, Srta. Prewett. 10 pontos para a Grifinória.
Palmas foram ouvidas e a garota caminhou até o grupo de alunos que vestiam a mesma gravata vermelho-dourada, sob cochichos e parabenizações direcionadas a ela.
— Malfoy?
A professora se esgueirou, procurando com os olhos o dono daquele nome. O jovem tinha mechas loiro-acinzentadas, como pedra da lua. Ele se aproximou respeitosamente da professora e a cumprimentou com um aceno de cabeça. Ao sinal, ergueu a varinha e lançou um feitiço silencioso.
Aos poucos surgiu uma rosa com pétalas vermelho-vivo no lugar da pedra. Era tão atraente ao toque que alguns colegas suspiraram de admiração. Malfoy fez a rosa flutuar acima deles e todos acompanharam com o olhar a rosa se dirigir lentamente até uma garota adiante, alta e esguia com cabelos tão loiros quanto os dele. A garota a pegou encabulada. Gracejos e risadinhas eram compartilhadas e uma outra bruxa ao lado sorriu mais abertamente, os cachos negros e volumosos emoldurando o rosto sagaz e malicioso.
— Não perde a chance de se exibir, Malfoy. — a morena falou enquanto assistia a loira ao seu lado dar um sorriso tímido e cheirar as pétalas. Palmas foram ouvidas.
— Muito bem, Lucius. Um tanto extravagante, mas... muito bem executado. 10 pontos para Sonserina. — a professora disse de bom humor — Alguém mais gostaria de tentar?
Uma garota surgiu, abrindo espaço entre os outros até chegar à frente. Ela tinha os cabelos em ondas castanhas que incidiam com a luz que vinha das janelas, dando as mechas uma coloração dourada quase irreal. Os olhos castanhos eram marcados com um delineador escuro, da mesma cor do manto que cobria os ombros e revelava a gravata verde na frente do peito, expondo orgulhosamente o broche prata com a palavra "Monitora".
— Bellator, se sente melhor?
— Me sinto ótima, Senhora. — respondeu de modo educado e orgulhoso. Os outros alunos a encararam com evidente receio.
— Muito bem, pode começar. — a professora inclinou levemente a cabeça enquanto segurava cuidadosamente a varinha com os braços ao lado do corpo.
A jovem fez um movimento lento, sussurrando um feitiço, de modo sibilante. Alguns alunos se afastaram e uma luz púrpura atingiu a pedra, transformando-a em um anel com um brilhante solitário. Uma esmeralda.
Não houveram palmas. Os alunos murmuravam entre si quando a garota ousou pegar o anel e colocar em seu dedo anelar, olhando para a mão demoradamente. A pedra brilhava forte, hipnotizante. A professora e os demais assistiam com curiosidade enquanto a garota avaliava a joia em seu dedo.
— Formidável, Bellator. 10 pontos para sonserina. E..5 pela esmeralda. — sorriu forçadamente.
Então a imagem se apagou como fumaça. Primeiro ouviu um sussurro, depois palavras se tornaram audíveis e a última frase que disse no escuro:
"Você tem magia antiga em seu sangue, menina...vai vingar toda a dor sentida."
ELIZABETH!
Sentiu algo bater em sua bochecha por repetidas vezes e quando abriu os olhos, era o rosto tenso e pálido de Damien que estava próximo ao seu, mechas cobrindo a testa e os lábios crispados em um desespero contido. Elizabeth deu um pulo para trás ao mesmo tempo que empurrou o irmão, tremendo-se toda. Olhou em volta e enxergou pelo menos meia dúzia de pessoas ao redor dela. Reconheceu apenas Daphne e Damien.
— O que aconteceu?
— Você estava repetindo uma frase estranha, Liz. Tudo começou a ficar estranho frio...e eu...eu achei melhor chamar o seu irmão e a monitora.
Elizabeth reparou que todos vestiam pijamas. Ainda estava de madrugada. Uma garota mais velha se destacou e falou diretamente para Elizabeth:
— O Professor Snape não estará no castelo hoje, mas chamarei Profª Minerva quando amanhecer. Você está se sentindo bem?
Elizabeth assentiu em silêncio enquanto as imagens do sonho passavam vertiginosamente em sua mente. Rapidamente lembrou-se que deveria ter aula com Snape e deveria pegar o restante da poção que substituía seus remédios. Depois o choque daquele sonho a atingiu: pela primeira vez havia sonhado com sua mãe. A professora Mcgonagall...e o pai de Draco? Foi mesmo um sonho? Ou uma visão tal viva como das outras vezes?
"Você tem magia antiga em seu sangue, menina...vai vingar toda a dor sentida."
Aquela frase. Era a mesma que o chapéu seletor havia lhe dito... e que ela ignorara.
— Vem comigo. Vou te ajudar a se trocar. — Daphne se adiantou segurando Elizabeth pelo braço.
— Te esperarei lá fora. — Damien murmurou com preocupação e então soltou a mão da irmã, deixando que Daphne fosse com ela até o banheiro.
•●•
Damien estava parado, apoiado em uma das paredes do corredor do dormitório feminino. Elizabeth saiu um tempo depois, acompanhada de Daphne. O semblante tenso das duas fez o garoto automaticamente inspecionar Elizabeth com os olhos.
— O que você viu? — ele perguntou sem rodeios, segurando o braço da irmã, fazendo-a olhar em seus olhos.
Então Elizabeth contou todo o sonho em detalhes, os rostos, nomes e falas...Damien ouvia com atenção, ignorando completamente a presença de Daphne que se manteve calada o tempo inteiro. Um ar amedrontado pesou no rosto dele. Damien disfarçou mas Greengrass não se intimidou:
— Talvez eu possa ajudá-los.— declarou — Minha mãe falava algumas coisas sobre a sua mãe, sobre... — ela olhou para os lados, para ter certeza que ninguém ouvia e murmurou: — ... Sobre aquele-que-não-se-deve-nomear.
— O que ela falava? — Damien a fitou com interesse.
— Que ela era algo a mais... além de uma bruxa. Algo que não...fazia parte do mundo.
— Minha mãe é uma alienígena? — Damien retrucou.
Daphne olhou mais uma vez para todos os cantos antes de responder:
— Minha mãe falava que sua mãe era muito poderosa e tinha uma habilidade fora do comum para convencer qualquer um a fazer o que ela queria. Isso atraiu o...você sabe.
Elizabeth sentiu no peito um peso enorme. Como se algo pressionasse até que ela perdesse o ar. Damien ficou em silêncio.
— Me desculpe, talvez eu não tenha entendido direito. — Greengrass olhou para o chão. De súbito, encarou os dois irmãos e puxou o fôlego para perguntar: — Eu sei que não é da minha conta, mas... o que aconteceu com vocês? Porque não vieram para Hogwarts na mesma época que os alunos do sexto ano? Porque o chapéu seletor não cantou para Elizabeth? Quero dizer, todo mundo se pergunta sobre isso, ninguém sabe de absolutamente nada. Professor Dumbledore finge que isso é normal e pior, professor Snape também!
Damien não conseguiu disfarçar o ódio no olhar. Seus lábios eram uma linha fina e Elizabeth não reagiu, apenas olhava para a loira, esperando que ela falasse algo que pudesse dispersar aquele clima horrível que se instalou entre eles. O irmão levou ambas as mãos ao rosto e esfregou, virando-se de costas para Daphne. Ele soltou um suspiro pesado e encarou o teto escuro do corredor. Puxou o ar mais algumas vezes, tentando se acalmar. Chegou a sorrir. O que deixou tudo ainda pior.
— Eu não preciso saber de nada, na verdade eu agradeceria se eu não soubesse de nada porque...— ela olhou para as mãos de Elizabeth, cobertas pela luva. Bellator involuntariamente as escondeu. — Obviamente vocês escondem algo sinistro.
Damien então se virou. E quando encarou Daphne novamente, era a versão de um Damien Bellator explosivo e maldoso, o rosto desfigurado de raiva e escárnio que disse:
— É isso que você, Zabini e Draco conversam enquanto invadem puteiros e bebem sangue de unicórnio? Vampiros de Hogwarts, não é? — disparou — Que nome ridículo.
Sangue de Unicórnio. Elizabeth lembrou imediatamente das palavras de Sabine:
"Existem várias maneiras de manter viva uma pessoa que está a beira da morte, princesa. Talvez a forma mais perversa seja o sangue de unicórnio. Alguns bruxos o usa como uma espécie de alucinógeno, algo que faz a mente conhecer lugares desconhecidos e talvez sem chance de retorno. Se conseguir drenar um pouco do sangue desse sagrado animal sem matá-lo, talvez a deusa o poupe de uma morte horrível. Mas jamais beba de seu sangue. Mesmo que precise desesperadamente dele."
Greengrass piscou. Elizabeth a encarou procurando uma explicação.
— Não eu... Por favor...eu... — gaguejou.
— Cobrinha...— Damien mostrou os dentes para ela — Eu sei que você está fazendo intrigas aqui e ali... trocando informações, fingindo ser nossa amiga...interessada em algo. Só pra você saber: nunca daria certo. Eu e você. Não vai acontecer. — ele se aproximou ainda mais dela, sussurrando algo no ouvido da garota que nem mesmo Elizabeth conseguiu ouvir.
Mas ela viu como Greengrass reagiu. A loira arregalou os olhos em sua direção, pálida como um pergaminho. Seu queixo caiu de surpresa e medo. Depois a loira recuou, saindo dali a passos rápidos. Damien observou satisfeito a garota se afastar, seus passos pesados ecoando pelo corredor vazio naquela madrugada agitada. Ele colocou as mãos nos bolsos e fitou a irmã, o sorriso benevolente e amoroso que somente ele sabia dar em situações estranhas como aquela.
— Me acompanha até a biblioteca? — perguntou simplesmente, estendendo a mão para ela.
Elizabeth ficou em silêncio, mais uma vez esperando uma explicação.
— Ah, por favor... — ele inclinou a cabeça, a mão ainda estendida — Você não vai voltar a dormir. Me ajude a abrir aquela merda de diário. Venha.
— O que falou para ela?
Damien esboçou uma expressão de surpresa. Olhou para o nada, como se tivesse esquecido de algo. E então respondeu:
— Nada. Apenas... para não mexer com um Bellator. Se eles querem nos temer, então vamos fazer com que o medo seja uma das nossas armas. Não é isso que o velhinho sempre diz? Agora venha, eu...
Elizabeth se desvencilhou-se, batendo de leve na mão dele.
— Não falou sobre...isso? — ela apontou com o olhar para as próprias mãos cobertas pela luva — Falou?
— Claro que não. — sua voz mal saiu e Damien engoliu a seco — Venha, Liz. — estendeu novamente mão, agora mais sério — Venha comigo.
Elizabeth não estava totalmente convencida quando cedeu e pegou na mão do irmão, deixando-a conduzir até a biblioteca da comunal.
────── •●• ──────
Fortifique sua mente.
A voz de Dumbledore ecoava. Os olhos cinzentos do mago estavam escuros e pesados olhando à sua volta. Estavam novamente na Casa dos Gritos. Não havia janelas. O patrono que Snape conjurou havia cessado parte daquele vento frio e cortante que sentiu quando viu sua pior memória. Ele cambaleou para trás, ainda com a varinha em sua mão, vacilando por um momento. Ouvia os sussurros da bruxa, proferindo feitiços e o confundindo, penetrando e rastejando em suas vísceras.
Saindo das sombras, uma segunda bruxa surgiu. Ela vestia um casaco pesado de cor escura e caminhou devagar, vencendo uma pequena distância entre eles. Enquanto o fazia, afastava timidamente com o salto os pedaços de copos e pratos no caminho. Aquele espaço lembrava uma cozinha, mas não era como as cozinhas comuns. Havia uma longa e estreita mesa no centro com alguns bancos espalhados. De um lado, a parede inteira era coberta por armários de madeira antiga entalhada com runas e frases em outra língua. Havia também uma infinidade de ervas secas e ramos de plantas espalhados no teto, presos de cabeça para baixo por cordões invisíveis. Caldeirões estavam espalhados, como se prestes a serem usados.
– A anciã. – Dumbledore falou com a voz baixa e comedida, mas nada suave.
Embora com aparência diferente da primeira vez que a viu, a anciã tinha os mesmos olhos que avaliavam e julgavam. Naqueles olhos havia o peso de algo que ele não soube nomear. Snape tinha a varinha mirando no ponto exato do coração dela. Apenas a visão dele em posição ameaçadora, as vestes negras se confundindo com a pouca luz do ambiente era suficiente para despertar medo em muitos. Mas não ela. Não havia medo ali. A anciã parecia quase uma inofensiva senhora quando se abaixou na frente deles e pegou que seria o resto de uma xícara.
– Porcelana chinesa, presente de um imperador da última dinastia. – lamentou olhando os cacos em volta – Uma relíquia de valor inestimável e que nenhum feitiço de reparação pode realmente consertar. – ergueu os olhos cinzentos para Snape – Olá, guardião.
"Severo.. Tobias...Snape. O quão patético você é... Eva vai cozinhar os seus ossos por aprisioná-la."
Severo precisou controlar cada impulso para não lançar um feitiço de morte na bruxa. Não ainda.
Então a anciã se levantou, concentrando-se nos dois bruxos. Dumbledore permanecia ao lado de Snape, as mãos ao lado do corpo.
– Como se atrevem a nos caçar no momento em que estamos no auge do poder? – ela insistiu.
– Viemos em paz. – Dumbledore bradou.
A voz da primeira bruxa respondeu com uma risada, vindo de todos os cantos daquele espaço.
"Paz? O guardião quer nos matar, Dumbledore. Dumbledore...Os Dumbledores possuem tantos segredos..."
Severo pensou ter visto o lapso de um sorriso que surgiu nos lábios da anciã. Ele se aproximou dela, braço em riste enquanto se lembrava da voz funesta daquela estranha mulher, há tanto tempo atrás:
"A FONTE ERROU, ELE NÃO É UM GUARDIÃO!
— Meu nome é Odilia. — a anciã falou — É chegado a hora.
Odilia tinha o rosto calmo e os olhos que continuavam a perscrutá-lo. Severo odiou a forma como ela o encarava. Sem medo. Ela nem mesmo portava uma varinha, era apenas uma velha dona de casa com um casaco antiquado.
— Guardião. — Snape repetiu aquela palavra, com desprezo — Uma bruxa que perdeu a sanidade e decidiu que eu deveria proteger os filhos dela. Filhos que ela nunca deveria ter tido.
— E quem disse que você está destinado a protegê-los, Severo?
A terceira bruxa era tão silenciosa que o pocionista apenas soube que ela estava ali quando sua voz suave interrompeu. Era como a uma mulher que ele lembrava: Nyneve. Ela era pequena e morena, cabelos escuros trançados com perfeição. Descia as escadas para o pequeno cômodo e Severo sentiu o característico cheiro adocicado que vinha dela. Assim que a bruxa desceu o último degrau e olhou para ele, sentiu como se fosse atingido por um soco. Ele cambaleou e piscou, tomado por uma onda que o jogou para o fundo de um oceano escuro e vazio. Água enchia seus pulmões e agora estava afundando, incapaz de alcançar a superfície. Depois se afogou em um infinito de nada.
•●•
"Severo fez de suas memórias um grande labirinto repleto de lembranças lançadas ao esquecimento que repousavam nas profundezas de sua mente. Era uma armadilha para deter os invasores e fazer ele próprio encarar a realidade sem enlouquecer." As Bruxas da Noite - Cap 14
Abriu os olhos com força e a claridade o cegou. Agora estava em pé, olhando para o céu nublado. Sentiu as partículas geladas de flocos de neve em seu rosto. Em sua frente havia um jardim de lírios pequenos e uma solitária faia púrpura a distância. Embaixo dela, um garoto sentava e lia distraidamente Nem tempo estranho daquele lugar, onde todas as estações se encontravam, era o bastante para tirar sua concentração das páginas de leitura.
— É você?
Nyneve se aproximou e parou ao lado dele. Ela vestia uma túnica verde, as mechas negras salpicadas de neve. O sonserino se virou em um átimo e o manto negro de sua veste ondulou. Ele procurou a varinha mas sabia que não a encontraria. O cheiro insuportavelmente doce atingiu suas narinas. Olhou em volta e reconheceu aquele lugar.
— Como?
— Quis conhecê-lo, por isso vim. — Nyneve olhou em volta. — Achei que aqui seria ideal para conversarmos, eu pretendia lhe mostrar o quanto você perdeu nesses anos todos, mas... jamais imaginei que encontraria um lugar como este no final daquele labirinto em sua mente, príncipe mestiço. — ela ponderou por um instante. — Sua alma é...intacta? Então você nunca tirou uma vida antes? Eva nos disse que você é diferente dos outros.
Severo não aguentava olhar para o menino que lia alheio a tudo, embaixo da árvore. Então desviou o olhar para o horizonte tão grande que se perdia de vista.
— Saia da minha mente.
— A criança interior...Esse é o segredo do seu coração... — Nyneve falou mais para si mesma, ignorando-o — Você o guardou bem...tão bem que nenhuma de nós conseguiu ver antes. Nem mesmo Elise...e Voldemort. — olhou em volta e sua voz mudou de tom ao dizer o ultimo nome.
— Saia. — ele grunhiu.
Nyneve ficou em silêncio observando o menino embaixo da árvore. Comparada ao bruxo, ela era uma mulher franzina e pequena. Sem esperar que ela respondesse, Severo passou a andar, ganhando uma distância dela, caminhando a esmo para o lado oposto, sem saber o que encontraria. Ela não o seguiu.
— Lírios...— a bruxa se referiu às muitas flores no chão — Para Lílian Evans? Agora eu entendo o porque ela quis amaldiçoá-lo.
Ele parou.
— Ela sabia que morreria, Severo. — declarou — O mundo dos mortos se abriu para Lilian e seu sacrifício salvou a criança. — se aproximou dele, admirando a paisagem com olhos genuinamente curiosos — Harry Potter. Você foi leal ao seu coração. Elise jamais poderia amaldiçoar uma alma intacta.
Snape não respondeu. Ainda de costas, apertou os punhos para controlar o turbilhão de emoções que vinham à tona, tantas de uma vez e tão fortes que o fez soltar um suspiro breve, como se ele estivesse fisicamente fazendo a força para combater a magia da bruxa. Admitiu com com um lamento que era poderosa. Perigosa.
— Sabe, na noite em que nos conhecemos... — Nyneve prosseguiu, colhendo um lírios — Apesar de Elise ter certeza que você estava pronto, eu não poderia correr o risco de ser mais clara e nos expor. Acreditamos que o seu destino iria te guiar até nós. Mas você simplesmente se recusou a nos procurar. A saber quem éramos. Porque?
Ela não esperou que ele respondesse:
— Os Potter selaram o seu destino. Lilian o selou. — acrescentou — Talvez Elise Bellator estivesse certa todo esse tempo. Talvez você seja capaz de combater o Grande Fim.
Não era preciso dizer coisa alguma quando em seu rosto havia o início de uma negativa pesarosa, o medo da verdade. Ele mergulhou no fundo dos olhos da bruxa, despido de qualquer barreira, os braços soltos ao lado do corpo, a respiração presa pelo receio de saber o que ouviria em seguida:
— Você é um Guardião dos Mundos, príncipe mestiço. Um destinado. A alma antiga de um bruxo forjado na guerra antiga que impedirá o triunfo da morte.
Muitos usuários deixam de postar por falta de comentários, estimule o trabalho deles, deixando um comentário.
Para comentar e incentivar o autor, Cadastre-se ou Acesse sua Conta.