FLASHBACK ON
Havia uma testemunha. Uma jovem e inocente testemunha.
O homem suspirou entediado. Odiava deixar possíveis provas contra ele para trás. Sentou-se na cadeira junto à mesa de jantar da casa que estava e analisou a bagunça que ele mesmo havia feito: dois corpos no chão, sangue espalhado e... uma menina chorando.
“Uma pena que você viu tudo, nena”, comentava enquanto cortava ao meio uma laranja que pegou da fruteira sobre a mesa. Sentia o sabor cítrico da fruta à medida que a menina se lamentava sobre os cadáveres de seus pais.
Então, já cansado de toda aquela choradeira, ele jogou a metade da laranja que desfrutava no chão, conseguindo a atenção enraivecida da menor. Ela ergueu seus olhos azuis, com suas escleróticas bem avermelhadas, e encarou o adulto novamente de pé. Sentia fúria e tristeza como nunca havia sentido antes.
O mais velho se aproximava à medida que sua mão alçava um objeto para mirar na garota. Ela não se intimidou, apesar da idade, e continuou fitando o perigoso homem que friamente havia tirado o último ar de seus pais.
“Duermas bien, nenita”, desejou covardemente com o cano da arma apontada para ela.
E sem piedade alguma, disparou. A menina caiu desmaiada ao lado dos corpos sem vida de seus progenitores.
O homem e seus subordinados finalmente se foram deixando para trás o rastro de violência cometida contra àquela simples e humilde família.
FLASHBACK OFF
~
Olhava para o além através da janela de vidro da sala, esquecendo-se totalmente da presença de seus amigos em sua volta. Quase havia sido expulsa pela diretora por falsificação de documentos e identidades — já que ela mesma havia assinado uma autorização no lugar de seus supostos responsáveis —, mas milagrosamente a mulher francesa teve misericórdia e somente obrigou a mais nova a comparecer semanalmente na sala da terapeuta escolar. E mesmo Sarah se sentindo contrariada, ainda era melhor que a expulsão.
Escutava vozes distantes, apesar da proximidade, não conseguindo focar sobre o que tanto falavam. Abaixou o olhar para desbloquear o celular. O seu polegar se movia, fazendo a tela do aparelho deslizar por suas conversas virtuais.
Até que parou em uma que havia deixado de lado já há um tempinho... Apertou para abrir o conteúdo. A lateral esquerda de seus lábios se conteve para não se curvar em um sorriso bobo. Pelas conversas que tinham, elas pareciam se dar bem sem muito esforço... pelo menos até um tempo atrás.
Condenou-se pelo sentimento nada agradável, e incontrolável, que teve quando viu outra garota fisicamente próxima demais a ela. Como era horrível não ter o controle da situação.
Perguntou-se se havia sido dura com Quinn ao ignorá-la por vários dias... Afinal, a europeia não havia feito nada demais contra a latino-americana. Maldito orgulho! Arrependeu-se querendo voltar ao tempo para não obedecer aos idiotas conselhos de sua melhor amiga.
Ergueu a vista para passear nos rostos a sua volta. Ainda não entendia qual era o assunto, mas Ahri não parecia nada contente com Ezreal. O garoto gesticulava em uma tentativa de se justificar de algo, ao mesmo tempo que sorria em desafio para a líder da casa enquanto os outros amigos riam da ousadia do loiro.
Continuou observando os outros integrantes do lar; Seraphine se divertia de seu jeito inocente e alegre... ah, ela era uma garota doce demais para fazer parte daquele grupo. E então seus olhos pousaram no casal oficial da turma: Rakan e Xayah. E por mais que na maioria das vezes sentia vontade de trancafiá-los em uma gaiola, Sarah tinha que admitir que o relacionamento deles era um pouco invejável...
E pela primeira vez, desejou ter alguém para poder encher o peito e dizer que era seu e somente seu, sem precisar compartilhar com mais ninguém... Fortune nunca havia tido essa experiência e naquele momento se perguntou se não valeria realmente a pena tentar — contrariando tudo o que Ahri tentava lhe ensinar.
Será que estava carente mesmo com tanta gente a sua volta? Talvez.
Viu o olhar de Xayah pousar sobre o seu enquanto ainda refletia, então o desviou rapidamente voltando a sua atenção ao celular. Ainda não estava a fim de contato visual.
Juntou coragem para voltar a se comunicar com Quinn...
“Ei”, enviou.
Um, dois...
Oito, nove...
Quinze segundos e nada. Nenhum retorno.
Suspirou já desistindo de esperar uma resposta por mais alguns míseros segundos. Já ia voltar a guardar o aparelho quando o mesmo vibrou.
“Oi”
Ela respondeu. E sem perceber a caribenha esboçou um tímido sorriso pela disposição da outra em ainda falar com ela. Afinal, foi só um desencontro bobo de ideias — e desejos.
“Lo siento.”, arriscou. Tinha tanto orgulho que até para pedir desculpas, preferiu escrever em espanhol.
A belga sumiu. Com certeza estava colocando em um tradutor para entender a simples, mas significativa, frase da caribenha. Logo retornou à conversa.
“Não foi nada.”
“Podemos começar do zero?”, perguntou. Em seguida enviou outra mensagem antes que a europeia pudesse lhe responder: “Ir ao cinema, sei lá... que nem as pessoas normais”
“Eu adoraria”.
Um alívio interno tomou conta da porto-riquenha. Dessa vez tentaria fazer diferente, com mais calma, até porque estava precisando se distrair da maré de pensamentos ruins do passado que haviam retornado para atormentá-la.
— Traidor! Não é, Sarah?! — Ahri chamou sua atenção ainda indignada com Ezreal estar de amizadezinha com a loira francesa, segundo ela, esquisitinha.
A caribenha bloqueou seu celular e finalmente buscou contato visual com seus amigos. Sua expressão era indecifrável, deixando todos que a observavam tensos. Entretanto, como se tivesse ressurgido das cinzas, Sarah levantou-se do sofá com outro semblante: aquele que todos já estavam acostumados.
O grupo então ficou atento aos movimentos da porto-riquenha que arrancou sem piedade alguma uma folha de papel de um caderno colorido e cheio de figurinhas musicais que jazia sobre a mesa.
— Ai, meu caderno! — Com suas mãos sobre o centro de seu peito, Seraphine lamentou-se contida vendo aquela agressão contra o seu lindo e organizado pertence.
Miss Fortune pegou uma caneta e começou a anotar palavras rapidamente no papel.
— Que porra ela está fazendo? — Xayah perguntou e todos deram de ombros, tão atordoados quanto ela.
— Próxima semana é meu aniversário. — Finalmente disse algo jogando a caneta na mesa — Tá aqui a lista do que eu quero de presentes. — Entregou a folha para Ahri e todos se juntaram para ler a mini lista escrita.
— É sério isso mesmo?! — Rakan perguntou aturdido. Na verdade, não havia nem entendido a letra da amiga latina. — Sua letra é mais bonita, amor. — Concluiu olhando para a namorada ao lado.
— Claro que é sério, paspalho. E já que são os meus amigos, estão convidados a me agradarem.
Saiu em direção ao banheiro para um banho demorado enquanto os outros debatiam em como arranjariam os exigentes presentes daquela lista.
.
.
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A confusão começou porque Akali derrubou inesperado e propositalmente os materiais da namibiana que estavam sobre a mesa de estudos.
— Por que fez isso?! — Perguntou atordoada com a petulância da mais nova — Eu estou estudando!
— Foda-se. Eu vou usar a mesa.
— Você nunca usa essa mesa! — Protestou em indignação.
— Mas eu vou agora! Vaza!
Uma raiva tomou conta da mais alta, mas ela se controlou. Levantou-se da cadeira irritada e agachou-se para pegar os seus objetos friamente derrubados pela outra. Que humilhante ter que se submeter às atitudes pirracentas da japonesa só porque o quarto era dela.
Kai'sa jogou os seus materiais sobre a sua cama e sentou-se apoiando suas costas na cabeceira. Tentaria estudar lá... isso mesmo, tentaria, pois Akali fez questão de ligar o som em uma altura no mínimo perturbadora.
— Dá para abaixar?
A japonesa não lhe deu ouvidos, até porque não dava para escutar a voz da namibiana no meio daquela batalha sonora de rap.
Estressada, Kai'Sa levantou-se indo em direção à mais nova.
— Abaixa isso, por favor. — Pediu firmemente e próxima o suficiente da outra garota.
Akali esboçou um sorriso enquanto diminuía o volume do celular conectado ao som. A de cabelos castanhos exalou vagarosamente o ar preso em seus pulmões, já mais aliviada em pelo menos ter sido obedecida.
Doce engano.
Bastou a africana dar as costas que a asiática voltou a aumentar o volume do aparelho sonoro. Ah! Que garota insuportável! Então Kai'Sa retornou para perto da mais nova e sem cerimônia alguma, puxou o cabo do aparelho barulhento da tomada.
— Tá maluca?! — Akali vociferou.
— Devo estar, já que você deixa qualquer um louco! — Rebateu sem paciência alguma.
— Se manda do meu quarto antes que eu quebre a sua fuça, sua otária!
Kassadin se deu conta que estava ouvindo a voz de sua filha e de sua enteada ecoar pela casa depois do inesperado silêncio do som de rap vindo do quarto delas. E ambas pareciam alteradas. Fechou a tela de seu notebook de trabalho e subiu as escadas para entender o que estava acontecendo.
— Meninas, algum problema? — Perguntou no batente da porta aberta.
— Sim! — Falaram em sincronismo. — É ela!
Apontavam uma para a outra, com seus olhares enraivecidos.
Kassadin intrigou-se; ver Akali mal-humorada era normal, mas a sua filha?! Não, não... Então a coisa era séria.
— O que aconteceu? Tenho certeza de que uma conversa pode resolver...
— Impossível! — Voltaram a coincidir com as palavras.
O homem ficou entre a cruz e a espada. As garotas não pareciam estar se dando bem, apesar de ele achar que era só questão de tempo... Bem, nesse caso, o tempo só serviu para Akali sentir mais repulsa ainda da filha do sul-africano. E Kai’Sa já estava começando a compartilhar daquele mesmo sentimento da japonesa.
“Meu bem, as meninas estão brigando... o que eu faço?!”, Kassadin enviou uma mensagem urgente para a companheira. Realmente ele não sabia como agir naquela situação de rebeldia juvenil, já que sua filha nunca tinha agido assim.
— Devolve a tomada! — Akali voltou a exigir.
— Usa um fone de ouvido! — Rebateu firme.
— Não quero!
— Mas quando eu preciso te perguntar algo de repente você coloca um!
— Exatamente, bobona! Finalmente está entendendo como as coisas funcionam por aqui.
— Arrrgh! — Voltou-se para o adulto sem reação na porta — Pai! Ela não me deixa estudar em paz!
— Isso, vai choramingar pro papai, vai.
— Só parem, meninas. — O adulto pediu torcendo para que fosse ouvido. — Akali, por favor, deixa-a estudar...
— E com que moral você tem para me dizer isso, seu bundão? — Akali desafiou impaciente — Está vivendo sob o teto que o seguro do meu pai comprou!
— Tem razão e eu agradeço a vocês pela ajuda. — O homem não se abalou com a grande alfinetada recebida da mais nova — Mas eu pago as contas aqui e você sabe disso. Não é totalmente de graça.
— Aluguel é o mais caro, todo mundo sabe. Agora se quer mesmo agradecer, pega a sua filha e voltem para o buraco de onde vieram! — Explodiu em nervos, saindo de seu próprio quarto.
Dias depois...
Taliyah estava esperando no jardim do lado de fora da casa onde Kai'Sa estava vivendo. Haviam combinado de passearem pelo bairro asiático e aproveitarem para procurar livros nos sebos daquele lugar que oferecia de tudo. As duas garotas já se consideravam amigas, até porque se deram bem desde o primeiro dia de aula; compartilhavam vários assuntos em comum e se encontravam com frequência nas salas do colégio. E depois das briguinhas sucessivas que andava tendo com Akali, a namibiana necessitava urgentemente sair um pouco daquele ambiente hostil — mesmo a japonesa nem estando em casa naquele momento.
— Preciso citar as regras? — Kassadin perguntou já na porta aberta da frente depois de acenar para a garota que esperava em pé no gramado.
Gostava da nova amiga de sua filha. A paquistanesa parecia ser uma ótima influência e digna para andar ao lado de sua menininha. No fundo, achava melhor do que o gênio forte da filha de sua parceira.
— Não precisa, pai. Eu já sei...
— Eu vou citar mesmo assim. — Ignorou a resposta da mais nova — Taliyah venha aqui ouvir as regras também. — Chamou a amiga da filha para ouvi-lo.
— Sim, senhor Ka. — Aproximou-se se segurando para não rir da namibiana que ficou como um tomate de vergonha.
E depois de longos dez minutos de um intenso monólogo do mais velho, a última regra finalmente foi dita.
— ...E por último, e não menos importante, se virem várias pessoas desmaiando na rua ao mesmo tempo, afastem-se e chamem os bombeiros. Pode ser vazamento de gás. — Concluiu olhando para cada par de olhos das jovens a sua frente — Entenderam tudo?!
As garotas assentiram já entediadas. Então se despediram rapidamente antes que ele se lembrasse de mais alguma coisa.
— Ele sempre foi protetor assim? — Taliyah perguntou enquanto andava ao lado da amiga até a parada de ônibus deixando o mais velho para trás.
— Sempre. — Suspirou sem graça — Mas acho que piorou depois que minha mãe faleceu.
— Sinto muito, Kai. Quando foi isso?
— Quando eu tinha uns dez anos.
— Você era pequena ainda.
— É, eu era. Mas como ela ficou um bom tempo debilitada no hospital, a gente meio que se preparou para isso...
Taliyah colocou uma mão no ombro da namibiana em forma de consolo. Kai'Sa retribuiu sorrindo para a amiga; já havia superado a situação, apesar de tudo.
...
— Elas crescem tão rápido. — Kassadin comentou retornando para dentro da casa depois que sua filha e a amiga sumiram de sua vista no horizonte daquela tranquila rua. — E a Akali? — Indagou sentindo falta da energia de não bem-vindo que a garota lhe lançava.
— Deve estar nos Kinkou. — Mayym deu de ombros enquanto guardava objetos em sua bolsa — Uma hora ela aparece.
— Mas, querida, ela ainda é só uma garota... Você não acha que deveria ficar mais em cima dela? — Preocupava-se mesmo não sendo o pai da menina, até porque ele também tinha uma filha de mesma idade.
— Ela sabe se virar; foi treinada para isso. Aliás, você não acha que é muito protetor com a Kai'Sa? — Perguntou cautelosamente não querendo parecer intrometida na relação da família africana.
— Não mesmo. — Rebateu se achando cheio de razão. — Deveria até ser mais.
A mulher balançou negativamente sua cabeça para o pensamento do homem.
— A garota quer crescer, querido. Deixe-a.
Ah, mas isso ele não concordava com a parceira. Já havia decidido desde quando pegou sua menininha pela primeira vez em seus braços, logo que nasceu, que a consideraria como uma criança até ela completar trinta anos de idade. E depois disso, aí sim ela seria uma adolescente. Para ele, ela só seria uma adulta somente quando ele morresse.
Kassadin deu de ombros ignorando o comentário da mulher. Colocou-se por detrás da mesma envolvendo o pequeno corpo em um abraço.
— E que tal aproveitarmos que as meninas não estão? — Sugeriu beijando várias vezes a bochecha e o pescoço da menor.
— Ah, meu bem... Eu só tenho dez minutos.
— É o suficiente.
...
Taliyah e Kai'Sa divertiam-se olhando as vitrines dos variados comércios. Estavam no coração do famoso bairro asiático, onde de tudo se encontrava. O lugar era bem movimentado e Kai'Sa conhecia já uma parte daquele imenso bairro já que a parceira de seu pai fez questão de fazer um passeio ali logo quando chegaram na cidade.
As garotas aproveitaram para tirar fotos divertidas nos belos monumentos e jardins espalhados que ornamentavam a região. E no meio do imenso fluxo de turistas e cidadãos locais, a namibiana reconheceu a faixada do dojô de Shen no outro lado da rua em que estava. Arregalou as írises violetas ao também perceber a presença da garota insuportável com quem dividia o quarto e, ultimamente, a paciência.
Akali estava na calçada em frente ao estabelecimento de seu padrinho, vestida com uma roupa verde estilo Ninjutsu, mas sem nada cobrindo a sua face. A japonesa com certeza combinava com a temática daquela vestimenta. Kai'Sa sorriu achando no mínimo fofo o modo que a mais nova estava apresentada.
A namibiana cutucou o braço da amiga ao lado distraída com uma selfie.
— É a Akali. — Maneou a cabeça.
Taliyah abaixou o seu celular para poder focar na direção que a outra se referia.
— Ah, então aquela é a tal garota dos seus pesadelos... Acho que a vi dormindo na aula de geografia outro dia.
— É bem a cara dela — Deu uma risadinha imaginando a cena.
Logo voltou sua atenção para a garota do outro lado da rua e assustou-se com a loucura que o seu cérebro projetou ao ver a mais nova se aproximar de uma idosa com dificuldades motoras que esperava o sinal do cruzamento fechar.
— Essa não! Ela vai empurrar aquela senhora contra os carros! — Previu o pior.
Não.
Akali ofereceu o seu braço para que a idosa pudesse atravessar o cruzamento em segurança. A senhorinha agradeceu. Logo alguns turistas perdidos pediram informações e a japonesa os ajudou com a maior boa vontade enquanto gesticulava a direção certa do destino que eles desejavam. Recebeu mais agradecimentos. Ainda apareceu um menininho choramingando que havia se perdido de seu pai. Akali o colocou em seus ombros para ele conseguir visualizar o seu progenitor na multidão. Pai e filho se reencontraram e o homem também ficou agradecido.
— Uau, Kai. Ela é assustadora. Rá! — A paquistanesa ironizou a fama de má que havia escutado sobre Akali.
— Deve ser um clone... Não é possível. — Comentava ainda sem acreditar naquelas boas e raras maneiras da japonesa.
Kai'Sa estava realmente admirada com as cenas que estava presenciando. E na situação que se seguiu, a japonesa tirou uma barrinha de chocolate do bolso de sua calça folgada e devorou o conteúdo. Logo jogou o embrulho vazio de longe no lixo, mas errando o alvo. Deu as costas para entrar no estabelecimento dos “Kinkou”.
Ahá! Jogando lixo na rua... ali está a maldade dela!
A japonesa se deu conta a tempo, voltou e apanhou a embalagem fora do lugar e ainda colocou no recipiente reciclável correto. Mais uma vez a garota observada contrariou a que observava. “Por que ela não é assim com o quarto dela?”, a namibiana se perguntava encucada.
E como se tivesse sentido que estava sendo espionada, Akali levou seus olhos para onde as outras garotas estavam. Franziu o cenho tentando focar melhor a sua visão para o outro lado da rua. Hum... nada suspeito. As outras jovens foram mais rápidas em se ocultarem atrás de um carrinho de comida tailandesa. A japonesa deu as costas entrando finalmente no tatame do padrinho. E então elas perderam o seu alvo de vista.
...
Akali podia jurar que sentiu um aroma de pêssego no ar... “O cheiro daquela bobona já até entrou no meu cérebro, aff... Sorte que é cheirosa”, deu de ombros e adentrou sem cerimônia, como sempre, no escritório de Shen. E mais uma vez não perdeu a oportunidade de se sentar na confortável cadeira giratória do homem.
— Sabe, acho que está na hora de você encontrar alguém. — Comentou chamando a atenção do mais velho — Até o imbecil do Zed achou e em breve a espécie dele vai se propagar quando aquela criança nascer... Eca. — Arrepiava-se só de imaginar um mini Zed convivendo naquele bairro — E olha só para você, tiozão... não tem nada além de uma afilhada chata. — Sorriu travessamente provocando o padrinho.
As pálpebras de Shen se abriram devagar, saindo de sua meditação no chão daquela sala. Era impossível se concentrar com aquela garota por perto. Suspirou ao mesmo tempo que os seus braços se cruzaram demarcando o limite de cada músculo dos membros superiores só naquele simples movimento.
— Você tem razão, Kali... minha afilhada é bem chata. — Rebateu risonho.
Divertiram-se. A garota era bem consciente de seu jeitinho perturbador.
— Vem, vou te registrar em um aplicativo de encontros. — Ligou o computador do escritório do adulto. Digitou a senha e acertou de primeira, o que deixou Shen espantado. Com certeza ele iria modificar novamente o acesso ao seu equipamento.
— Não, nem pensar. — Voltou a cerrar seus olhos mantendo a sua tranquilidade — Essas coisas não funcionam.
— Como sabe?! — Arqueou uma sobrancelha e um sorriso crescente tomou conta de seu rosto juvenil — Já tentou, foi?!
— Não preciso tentar para saber disso. — Defendeu-se simples.
— Ah, besteira! Até minha mãe arranjou um cara que estava do outro lado do mundo nesses aplicativos. Infelizmente. — Continuava digitando rapidamente no teclado mecânico enquanto preenchia algumas informações em um site especializado — Afinal, o que pode dar de errado?
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O aniversário de Miss Fortune se aproximava cada vez mais. Logo seria considerada responsável pelas leis do país e então poderia finalmente jogar fora suas identidades falsas usadas para comprar bebidas alcoólicas ou entrar em lugares suspeitos.
Porém, naquele tranquilo começo de noite, ela estava arrumada para o simples encontro que teria em um cinema. Realmente precisava relaxar, pois atualmente nem conseguia dormir direito.
— Vai sair? — Ahri perguntou ao entrar no quarto, inalando um rico aroma espalhado no ambiente.
— Sí. — Respondeu simples terminando de borrifar o perfume sobre a sua pele.
— Pra onde? — A amiga estava curiosa.
Ultimamente Sarah não andava contando todos os seus passos para a sul-coreana, o que deixava a asiática em alerta.
— Sair por aí... Tomar um ar. — Não quis dar mais detalhes já que, se ela soubesse que a ruiva estaria indo em um encontrozinho, Ahri acharia aquilo no mínimo brega.
— E precisa desse exagero de perfume para só tomar um ar? — Afrontou.
Sarah depositou um beijo na bochecha da garota desconfiada antes de ir em direção ao corredor da casa.
— Nos vemos, cariño. — Despediu-se ignorando totalmente o último questionamento da amiga.
Passou pela sala e cozinha do lugar e se despediu brevemente de quem ali estava presente.
— Sarah está estranha... de novo. — Xayah comentou depois que a porto-riquenha fechou a porta principal da casa.
— É, eu também percebi. — Ahri confirmou com os braços cruzados — E ela voltou a se remexer e resmungar enquanto dorme... Que saco. — Murmurou tendo a sensação de olheiras brotarem em seu rostinho.
— É porque vocês não viram a garrafa de whisky pela metade guardada debaixo do banco do carro dela. — Ez tentou fofocar.
— Isso é normal. — Ahri deu de ombros. Sempre houve uma garrafa de álcool no carro da amiga. — E não fale comigo porque eu ainda não te perdoei, traidor!
— Sim, senhora.
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As duas estavam no cinema como os meros mortais faziam. Sentaram-se nas poltronas mais altas do lugar, afastadas o suficiente de qualquer outro ser naquela escassa sala de cinema.
Haviam propositalmente escolhido um filme ruim e sem ação alguma, para assim poderem ter um motivo de seus lábios se encontrarem sem qualquer interrupção.
Desfrutavam daquele simples encontro, alternando entre conversar, comer lanches e finalmente voltarem a se beijar...
E mesmo depois da fúria hormonal já experimentada por ambas, Quinn estava admirada com as atitudes serenas de Sarah. Não podia negar que aquilo atiçou mais a belga do que as investidas diretamente sexuais da porto-riquenha em um momento do passado.
— Vai com calma, caçadora. — Segurou delicadamente a ousada mão da jogadora que deslizou para a parte interna de suas coxas.
— Perdão, eu me excedi. — Desculpou-se de sua aparente pressa em voltar a tocar a caribenha daquela forma.
Em resposta, Fortune voltou a beijar os lábios já conhecidos de Quinn. O toque era calmo e contido, como se ela quisesse prolongar o sabor que suas papilas gustativas experimentavam. A sensação não poderia ser melhor. E quando se deram conta, o filme havia acabado.
— A gente pode continuar lá em casa... — Sugeriu ameigando o braço da ruiva.
— Eu adoraria, mas... — Acariciava o rosto europeu. — Dessa vez eu quero que seja especial.
Voltou a selar seus lábios nos da belga antes de se separarem e voltarem a abrir suas pálpebras tranquilamente.
— Nos vemos no meu aniversário. — Completou a sua ideia em forma de um convite.
Quinn sorriu verdadeira; aquele pedido foi no mínimo inusitado. Estava decidida a esperar mais um pouco para ter Sarah Fortune por completo.
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Os dias se passaram e em mais uma oportunidade de tirar a paz alheia, Akali sentou-se no sofá da sala depois de pegar o controle da televisão... A mesma televisão que a namibiana estava usando naquele mesmo momento, hora e lugar.
— Não... não é possível isso. — Kai’Sa comentou indignada com mais uma atitude sem vergonha da menor.
— Meu programa vai começar. — Disse despreocupadamente zapeando os canais do aparelho.
— Mas eu estava usando primeiro. Custava pelo menos pedir?
— Tem razão. — Olhou para a garota alta ao lado — Poderia vazar, por favor?! — Pediu educadamente.
Kai’Sa massageou fortemente a lateral de sua própria cabeça. “Não, ela só quer um motivo para brigar... não cai nessa, Kai’Sa”, pensava consigo mesma. A namibiana ia deixar para lá, mas ao ver o canal que a japonesa queria assistir, seu sangue ferveu.
— Eu não acredito que você vai assistir de novo esse programa que repete o tempo todo! — E neste momento ela já estava em seu limite.
— Vou, ué. — Deu de ombros se acomodando confortavelmente no estofado.
A africana avançou para tomar o controle da mão da outra, mas a asiática tinha bons reflexos e enrijeceu seus dedos a tempo para segurar firme o objeto.
— Solta! — A mais alta exigiu.
— Solta você, bobona!
Ficaram naquele cabo de guerra com o pobre controle sob suas ferozes mãos.
— Pai!
— Ah, lá vai de novo recorrer ao papai — Provocava. — Daqui a pouco chama a mamãe morta também.
— Pelo menos eu tenho um pai e minha mãe me amava! — Não calculou suas palavras enraivecidas depois de toda aquela dura provocação da menor.
Akali deixou o objeto sair de suas mãos, quase desequilibrando Kai’sa pela força contrária recebida quando a outra soltou o controle. Entretanto, o que a namibiana não esperava era uma cotovelada sem piedade vindo da menor logo em seguida.
O golpe foi certeiro.
— O que está acontecendo?! — Kassadin perguntou ao entrar de novo na casa. Estava aguando a grama do jardim externo.
Viu sua filha caída no chão enquanto segurava seu próprio nariz; sangue escorria entre seus dedos que tentavam estancar a lesão recebida. Olhou para Akali que a encarava desafiadoramente, ignorando totalmente o fato da presença do mais velho.
— O que você fez com ela, garota?! — Vociferou irritado ao ver sua menina machucada.
— O que ela merece. — Respondeu em tom sério dando as costas para sair de sua própria casa.
...
— Eu nunca levantei a mão para a minha filha! Aí vem alguém de fora, pior, de dentro de casa e arranca sangue dela?! — Gesticulava aborrecido — Não, não, não! E eu juro que só não fiz nada porque ela é de menor e uma garota ainda por cima!
O homem relatava indignadíssimo com aquela situação para a mãe daquela agressiva criaturinha.
— Calma, meu bem, eu vou resolver isso. Ela nunca mais vai tocar na Kai’Sa. — Mayym comentava escondendo a sua frustração enquanto oferecia um analgésico para a namibiana.
A vítima estava sentada no sofá com a cabeça inclinada para a frente depois de passar minutos no banheiro tentando frear o líquido que fluía de suas fossas nasais. Agora tentava respirar pela boca porque havia algodões tapando as entradas de sua via respiratória enquanto seus dedos pressionavam o órgão ferido.
— É bom mesmo. — Kassadin murmurou.
Aquela agressão havia realmente o ofendido mais que à sua própria filha que no fundo estava se sentindo mal por ter dito aquelas palavras à outra garota — mesmo a mais nova tendo começado.
— Pai?
— Sim, meu amor? — Aproximou-se da filha, agachando-se para ficar na altura dela e poder fixar bem nos olhos violetas da mais nova.
— Me deixa morar com a vovó?
O homem arregalou seus globos oculares. Aquele pedido significava ter que se separar de sua menina...
— Mas, filha...
— Por favor? — Insistiu mais uma vez com a voz nasalizada e um pesar no olhar — Eu fico realmente feliz por vocês dois — levou sua vista para também fitar Mayym ao seu lado — mas isso... não vai dar certo para mim.
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