Park Jimin
Abro meus olhinhos bem devagar, me acostumando com a claridade que escapa pela frestinha aberta da coluna e bocejo alto, esfregando minhas mãos em meu rosto e gemendo sofrido ao perceber que o dia mal havia clareado direto, ou seja, eu tinha acordado cedo em pleno final de semana.
Noto meu celular do outro lado do quarto e o encaro, tentando trazê-lo para mim com a força do ódio, ação está que obviamente sai fracassada e então, decido continuar jogado ali na cama, já que mesmo que eu tomasse coragem para buscar meu filho, papai não gosta que eu fique na internet logo cedo.
Viro a cabeça para o lado, inquieto, e observo meu namorado, dormindo todo gostosinho de boquinha aberta e o cabelo bagunçadinho.
Sorri, apaixonado.
Não havia um dia sequer em que eu acordava e não me lembrava daquele maldita vez em que Jungkook levou um tiro por mim. O dia em que ele quase me fez ter um infarto, se não fosse pelo colete a prova de balas que protegia seu tronco.
E também, o dia em que toda fase louca, perigosa e agitada que eu não gostaria de repetir a dose, finalmente acabou.
Bom, quase toda.
Depois da confusão, onde o policial se deu conta de que o verdadeiro risco era o Wang e eu acabei desmaiando de exaustão, Jackson foi preso e meu namorado me acompanhou até o hospital. O investigador perdeu a licença e o direito de exercer sua função.
Não foi uma noite muito tranquila para mim, dentro da emergência, onde os enfermeiros davam alguns pontos nas minhas mãos e limpavam vestígios de vidro de outros ferimentos.
Jeon também acabou pedindo outros exames e cuidados para os machucados que os homens de Jackson causaram em mim e o doutor responsável por mim, pediu um acompanhamento psicológico quando ficou sabendo de todo o caso em que eu estava envolvido.
Foi um choque saber que Jackson era meu pai biológico. Fiquei abalado por alguns dias, sem conseguir acreditar que um ser humano era capaz de fazer o que ele havia feito, ainda mais com o próprio filho, mas Jungkook esteve ao meu lado o tempo todo.
Hwasa levou dez balões de gás hélio com desenhos de gatinhos, para comemorar minha liberdade junto com diversas pelúcias, para o hospital. Foi muito legal, mas como algumas coisas não estavam resolvidas com a polícia, eu não pude receber nenhuma visita além do Jeon e do delegado, que afastou o investigador responsável pela quase morte de Jungkook e assumiu a situação.
Precisei conversar com vários oficiais durante o hospital e algumas semanas seguintes à minha liberação hospitalar, porém, o pai do meu dominador me defendeu, se tornando o melhor advogado que eu poderia ter, e garantiu que eu pudesse lidar com todo o processo direto da casa do meu empresário. Quando eu segui todos os seus conselhos, consegui ser liberado rapidamente sem nenhuma marca permanente em meu nome.
Prostituição era crime no nosso país, mas, com a perícia relatando as agressões físicas no meu corpo, o senhor Jeon conseguiu "comprovar" que havia sido abuso e contra minha vontade, também alegamos que eu estava sendo ameaçado durante todos esses meses e que o acidente de Kim Ye-ri havia sido parte disso. Depois de alguns julgamentos bem chatos, fui considerado inocente.
Jackson confessou seus crimes no tribunal, incluindo o sequestro da filha de Jeon a encomenda do assasinato da mãe da garota, e foi condenado a 25 anos de prisão.
Depois de alguns pontos abertos, na hora de montar a ordem cronológica de todos os crimes, descobrimos que ele realmente sabia sobre minha filiação e que ao contrário do que ele havia dito pra mim, foi graças a minha mãe que ele achou minha localização.
Bem, tecnicamente, quando ele viu a propaganda de gatinhos que participei na Euphoria, ele acabou indo atrás dela e tudo de no que deu.
Uma semana depois que a pena do Jackson foi iniciada, o corpo dele foi achado em uma das celas. Um lençol estava enrolado em seu pescoço. Alguns guardas afirmaram ter sido suicídio.
Assim que eu soube da notícia, não consegui sentir nada, se não, indiferença.
Minha mãe também não se safou, mas em vista do inferno em que ela transformou minha vida, cinco anos de cadeia foram muito pouco.
Kihyun deu o azar de estar na sorveteria no meio do batida e acabou sendo transferido para um reformatório do estado, indiciado por colaborar com o sistema de tráfico do Wang, além de todo o lance de vender o corpo.
A casa foi fechada para investigação.
Hyuna, entretanto, conseguiu fugir. Mas eu de fato não estava preocupado, ela não voltaria a me perturbar. Já Leon, levou um tiro quando tentou fugir durante a invasão e morreu na hora.
O caso ficou famoso em alguns noticiários, mas com a influência e o poder dos Jeon, consegui ter toda minha identidade zelada e fiquei de fora das notícias.
Superar a morte de Yeri e o sentimento de culpa avassalador em meu peito não tinha sido nada fácil, e para ser honesto, ainda estava em processamento. Havia dias bons e dias ruins. Eu ainda não tinha conseguido visitar seu memorial, mas mandava flores toda semana para deixar o local tão florido e alegre como ela era.
Nós não éramos tão próximos, mas com certeza Yeri foi uma pessoa boa para todos por quem passou. E sem sombra de dúvidas, a sementinha que ela havia deixado ao mundo para honrar sua linhagem, era tão maravilhosa quanto a progenitora.
Já a Ye-Eun, nossa pipoquinha, ao contrário do que pensei, preferiu continuar sua vida na Europa, com os avós. Ela amava o pai e sabia que seria muito bem vinda para viver com a gente, mas com tantas emoções acontecendo ao mesmo tempo, ter que se adaptar a outra rotina completamente diferente em um lugar relativamente novo, não seria o ideal para ela.
Jungkook ficou chateado no começo, mas depois acabou entendendo a situação, fora que depois de bastante tempo em Seul, a garotinha ficou muito feliz e animada em saber que estava voltando para casa e poderia rever seus colegas da escola e contar que foi sequestrada.
"Agora todo mundo vai me achar muito maneira, papai. Não é, Minnie?" — Do Jeon, filha.
Não preciso nem comentar que Jungkook ficou mais pálido que o normal ao se lembrar da situação e tentou inútilmente explicar para a filha que aquilo não era algo para se gabar.
Resumindo, tudo parecia estar entrando nos eixos novamente, de forma lenta. Dentro do possível.
Me remexo como uma verdadeira amoeba, tentando ocupar o espaço livre entre o peito e os braços de Jeon, e assim que me dou por satisfeito com a posição, meu dominador acaricia fracamente, dando leves tapinhas em minhas costas.
— Papai. — Sussurro, com a intenção de saber se o mais velho está acordado.
O único barulho que recebo em troca é um murmúrio rouco de sono. Bufo baixinho.
É tão chato ser o único acordado!
Fecho os olhos tentando voltar para a linda terra dos sonhos, mas, depois da décima tentativa falha, acabo desistindo e saio da cama, derrotado.
Olho para o chão e vejo minhas bagunças, lê-se "revistinhas de colorir" e lápis de cor, escondidas debaixo da cama e me agacho para pegá-las.
Papai tinha comprado muitos livros novos para eu pintar, tinha princesas, príncipes, super-heróis, bichinhos e algumas rosas e tribais bem bonitas, e isso estava sendo ótimo para eu treinar algumas técnicas novas que eu estava aprendendo no meu curso de artes.
Fora que isso me desestressava, quando eu acabava tendo alguns flash e pesadelos de meses atrás.
Finalmente eu estava conseguindo dedicar minhas energias ao meu futuro. Claro, com toda a confusão, acabei ficando em linha vermelha quando voltei à escola, porém, depois de explicar a coordenação, acabei ganhando um descontinho e então me formei.
Céus, aconteceu tanta coisa durante esse tempo.
Me deitei sobre o tapete felpudo do nosso quarto e espalhei minhas coisas, pronto para meu passatempo preferido.
Depois de finalizar as cores da quarta página, meu estômago roncou e como o empresário estava dormindo, decidi ir eu mesmo preparar um lanchinho.
Chegando na cozinha, meus olhos brilharam ao me deparar com uma barra de chocolate branco com cereais e passas, meu favorito, e logo peguei-a em minhas mãos, me deliciando com a guloseima.
E então, ao pensar no fato de que isso não seria um problema com o papai, já que quando o mais velho me deu, avisou que era pra eu comer a hora que eu quisesse e que ele tinha me dado com muito carinho, suspiro todo apaixonado e tenho a brilhante de ideia de fazer um café da manhã na cama, pra acordá-lo.
Abro um grande sorriso, animado. Eu amo quando ele me acorda com beijinhos e café na cama, logo, ele provavelmente vai gostar, certo?
[...]
Contemplo a bandeja, orgulhoso e satisfeito.
O pãozinho na chapa estava moreninho do jeito que o meu amorzinho gosta e o café expresso provavelmente estava amargo o suficiente. Jungkook também gostava bastante de mamão, então até piquei direitinho e acrescentei mel. O ovo mexido, que completava o café, foi mais pra parecer coisa de novela mesmo.
As duas fileiras que deixei pro Jun do chocolate também foram para a surpresa e utilizando meu dom para fazer dobraduras, até me animei, transformando um papel vermelho em uma rosa, para o mais velho.
Bati palminhas, animado, e com todo o cuidado do mundo, peguei o apoio de madeira e caminhei devagar (mais lento que uma formiga) até chegar no nosso quarto.
Descansei o café em cima das pernas do mais velho e me aproximei de seu rosto, distribuindo beijinhos na tentativa de acordá-lo novamente.
Ao perceber que não ia funcionar, vídeo e resolvi tentar um jeito um pouco mais tradicional:
— JUNGKOOK! - Gritei, fazendo com que o mais velho praticamente pulasse com o susto, acordando sem entender o que estava acontecendo.
Porém, com o espasmo rápido, seu pé acabou batendo na bandeja, fazendo com que o mamão e o prato com que estavam na beirada, escorregassem para a cama, sujando o lençol e escorregando o pão, até que este parasse no tapete.
Pelo menos não derramou o café.
Ao ver minha surpresa "destruída", meus olhos se encheram de lágrimas sofridas e mal pude controlar o soluço doído que levou meu corpo a convulsionar, dando início a um choro.
Jungkook ficou me olhando, ainda meio lerdo, sem saber direito o que fazer, enquanto meu mundo se acabava dentro da minha mente dramática.
Assim que o empresário se deu conta da situação e analisou tudo, se levantou com cuidado para não derrubar o resto e veio até mim, me erguendo em seu colo para me ninar como se eu fosse de fato um bebê. E funcionou.
— Shi… meu bebê, já passou. — Afagou meu cabelo, dando tapinhas em meu bumbum. — Não precisa chorar, sim?
— V-você chut… — Soluço. — chutou minha s-surpresa, papai. — Apontei para a cama, derrotado.
E então, meu namorado não se aguentou e gargalhou alto.
— Você me assustou, gatinho. — Confessou, risonho. — Não grite mais desse jeito, sim?
— Mas como, se você dorme igual pedra? — Perguntei sincero, sem ironia ou deboche, sentindo seu corpo vibrar com outra risada.
— O papai amou sua surpresa, sim? — Secou minhas lágrimas com o polegar, selando minhas bochechas logo em seguida.
— Mas tá tudo acabado, papai… — Manhei.
— É só a gente colocar de volta no prato, bebê. — Analisou a cama. — O potinho do mamão só virou de cabeça para baixo, não tem problema. E o pão no tapete… — Mordeu os lábios e me olhou, todo pilantrinha. — Regra dos cinco minutos.
Foi minha vez de gargalhar e passar a mão no rosto, limpando o ranho do nariz. Jeon arqueou a sobrancelha, me colocando no chão e pedindo para que eu fosse lavar meu rosto e minhas mãos no banheiro, enquanto ele tirava o lençol sujo e arrumava tudo direitinho. E eu fiz tudinho, feliz por ele ter gostado da surpresa.
— Você já tomou café, meu amor? — Perguntou, recebendo mais uma garfada de mamão em sua boca, já que eu achava o máximo chamá-lo de bebê e alimentá-lo, enquanto eu estava sentado no seu colo.
— Eu comi chocolate, e até deixei um pedacinho pra você. — Apontei, recebendo seu sorriso.
— Tomou seu leitinho? Eu repus seu estoque, no armário.
— Sim!
— Muito obrigado pelo carinho, mas pode comer, meu bebê. — Ufa! — Estava gostoso?
— Sim! É meu preferido.
— Todos são seus preferidos. — Dei de ombros. — Você não comeu mais nada? — Neguei.
Jeon pegou uma fatia do pão e ofereceu a mim, levando-as em meus lábios. Balancei a cabeça, rejeitando.
— Eu não quero agora, Jun.
— Quer que eu faça uma panqueca para você, gatinho?
— Eu não tô com fome agora. — Admiti, terminando de comer meu chocolate gostosinho.
Jeon riu. Eu falo que não gosto muito de doce, mas é porque geralmente me dá muita dor de barriga quando como, então prefiro não comer sempre, mas um docinho às vezes cai bem, né…?
— Eu te amo, vida. — Declara, juntando nossos lábios.
— Eu te amo, papai.
Observei o mais velho praticamente virar a xícara de café, de uma vez, suspirando satisfeito.
— Jungkookie?
— Sim? — Me olhou, mordendo um pedaço do pão.
— Você gostou da minha rosa?
— Ficou linda, meu amor. Eu amo tudo que você faz. — Pegou-a e a colocou atrás de minha orelha, decorando meus fios. — Aliás, sou completamente encantado e admirado por suas habilidades artísticas e estou muito ansioso para ver a exposição na galeria nova que você fechou.
Ah, é!
Quando comecei, por incentivo do meu namorado, a postar algumas fotos dos meus trabalhos e desenhos no Instagram e em outras redes sociais, um vídeo acabou viralizando e uma empresa, não tão famosa assim, resolveu patrocinar uma exposição só minha. E eu surtei, óbvio.
Mas também vi isso como uma grande chance, já que era algo bem difícil de acontecer, ainda mais para uma pessoa que mal tinha começado o primeiro semestre da faculdade de artes plásticas.
— Eu estou nervoso. — Admito — Eu escolhi um tema meio "chocante" para a maioria das pessoas… Não tenho certeza de que elas vão gostar. — Desço meu olhar, desanimado.
— Já eu, tenho a certeza de que todos vão amar. Além do mais, que se dane se eles não gostarem. Nem mesmo a autora da fic agradou todo mundo, que dirá meu bebê para carregar esse fardo… — Sorriu, grande. — Apesar de você estar mantendo surpresa até mesmo para mim, tudo que você pinta é maravilhoso!
A cada segundo que se vai, mais eu tenho a certeza de que não existiria pessoa melhor, com quem eu pudesse amar e construir um futuro. Uma família. Jungkook era, sempre foi e sempre será o meu pote de ouro no final do arco-íris. Meu aninho direto do céu. Minha luz no fim do túnel. Meu mundo.
— Você vai estar lá comigo, não é? — Pergunto, receoso.
— Eu sempre estarei com você. Você se lembra do Orfeu? Eu desceria ao inferno por você, Jeon Jimin. — Arregalo os olhos.
Acredite Jeon, você já desceu.
— Nós não somos casados, para eu ter o seu sobrenome. — Aviso, sem jeito.
— Acho que está mais do que na hora de mudarmos isso, sim?
Eu vou infartar.
Uma movimentação anuncia o primeiro disparo em meu peito. Jungkook se aproxima da mesinha ao lado da cabeceira, abrindo a primeira gaveta para em seguida puxar uma caixinha felpuda de dentro.
Prendo minha respiração, automaticamente.
— Você gostaria de se tornar oficialmente o Senhor Jeon Jimin e formalizar uma família, ao meu lado?
— É CLARO! — Abraço-o apertado, praticamente pulando em cima do homem. Nada novo sob a luz do sol. — Você quer se casar comigo? — Pergunto, todo bobo.
— Acho que fui eu quem te perguntou isso… — Responde, rindo. — Mas sim, bebê. Quero me casar, e viver o resto da minha vida com você!
Fim.
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