Gaara
Estacionei a pick up em frente a único bar que estaria em funcionamento aquela hora. Passava das 22h, quando entrei no estabelecimento situado na West Odessa.
Estranhei a pouca movimentação no local, mas caminhei até o balcão em busca de uma cerveja para desanuviar as ideias.
Hoje foi um fodido dia.
O funeral de Inoichi, a leitura do testamento, a loucura de Kizashi, o casamento fracassado dos meus pais e por fim Ino Yamanaka.
New York.
Murmurei sorrindo arremessando qualquer pensamento que pudesse surgir sobre aquela garota para bem longe.
O que eu tinha nada cabeça?
Ino era o tipo de mulher que deveria me manter longe e não apenas pelo respeito que tenho em memória de Inoichi. Aquela garota era um pólo oposto.
Vê-la daquela forma tão frágil mexeu comigo de uma forma que não saberia explicar.
Ela é bonita e divertida, quando não está surtando na maior parte do tempo. Negar que ela é uma mulher que me atrai não faz o meu feitio.
Baguncei os fios ruivos quando o atendente se aproximou secando uma caneca grande.
⎯ O que vai ser?⎯ me indagou o homem de traços latinos. O West Odessa é dotado de latino-americanos. Local de ponto de encontro das gangues locais e durante muito tempo point da extinta gangue de Los Chicanos.
Desde a fatídica chacina no galpão dos Hernandez, cujo o único sobrevivente foi o irmão mais velho e chefe dos Los Chicanos e atual envolvimento amoroso de Sakura, Juan e a pequena Hannah que estava cursando faculdade em Houston, que gangues mexicanas foram extintas. Não se sabe quem foram os mandantes, embora na época ,o nome Vultures fora cogitado diversas vezes, Inoichi como excelente líder tratou de calar a boca da cidade quando prestou apoio às vítimas e suas famílias. Foram tempos difíceis para as pessoas daquela parte da cidade, que aprenderam a detestar qualquer outra pessoa que viesse das outras regiões de Odessa.
Encarei o homem que possuía um bigode grande e escuro assim como seus olhos castanhos circunscritos.
⎯ Uma Corona. ⎯ pedi indiferente. O homem assentiu e foi buscar. Retornando ele estendeu a garrafa em minha direção, puxando quando ameacei pegar.
⎯ Espero que não tenha vindo arranjar confusão. Você não é dessas bandas e se pretende alguma coisa vindo até aqui é melhor dar meia volta e ir embora.⎯ Foi incisivo. Sorri com escárnio puxando a long neck.⎯ Não quero confusão no meu bar.
⎯ Obrigado pelo toque, amigo.⎯ proferi irônico.⎯ E pela calorosa recepção. Espero que a sugestão tenha sido por conta da casa!⎯ bufei me afastando sobre o olhar atento do homem. Sem paciência caminhei até o jukebox sacando uma moeda, quem sabe uma música para extravasar aquela tensão.
A lista era basicamente country, folk e rock. AC/DC era sempre uma boa pedida. Burnin’Alive soou no mesmo instante me fazendo relaxar. Fechei os olhos absorvendo as batidas mergulhando na letra que apesar de complexa expressava toda aquela carga de enfrentar seus medos, as verdades sobre o que exatamente você é.
Aproveitando da escuridão do bar encostei na pilastra de madeira ao lado da jukebox observando os espaço. Havia meia dúzia de bêbados, um grupo de latinos fazendo algazarra. Me limitei a virar mais um gole generoso quando a porta foi aberta e uma silhueta bem conhecida por mim passou por ela.
Sasuke Uchiha encarava a volta com a típica expressão dura e de completa indiferença. E se não fosse pela marca que deixei em seu rosto mais cedo, nada alteraria aquele impassividade daquele rosto.
Bebi mais um gole acompanhando -o com um olhar. O irmão do meu melhor amigo havia mudado. Sasuke não tinha mais nada daquele garoto que era a sombra de Itachi.
O Uchiha retirou e sacudiu a jaqueta que parecia molhada. Sentou-se próximo ao balcão falando algo para o velho mexicano que negou e fez gestos para ele, o mandando sair. Definitivamente aquele homem não gostava de forasteiros.
Sasuke parecia impaciente e puxou um maço de notas do bolso batendo no balcão.
⎯ Fuera, seu hijo de la chingada. ⎯ o homem berrou a plenos pulmões num espanhol embolado.
Sasuke riu com escárnio dizendo algo baixo para o velho e se afastou.Vi que as coisas começaram a ficar estranhas quando captei um gesto que dono do bar fez para os latinos que estavam no canto. Um deles era bem alto e trajava uma blusa colorida de botões e jeans largos. O de estatura mediana, usava uma regata branca que deixava exposto o corpo tatuado. Os gêmeos usavam o mesmo tipo de vestimenta do rapaz tatuado, exceto pelas bandanas na cabeça: uma vermelha e a outra branca. Todos possuíam os mesmos traços e tonalidade de olhos e cabelos; castanhos.
Sasuke voltou pegando o dinheiro do balcão e enfiando no bolso de qualquer jeito. Soltou um riso debochado se virando para sacudir mais uma vez a jaqueta.Ainda de costas para o grupo de homens que se aproximavam sorrateiramente, permanecia alheio aquela movimentação.
Praguejei quando o latino tatuado sacou um canivete ao se aproximar de uma distância razoável de Sasuke.
O mexicano mais alto pegou o taco de sinuca e os gêmeos bem mais baixos, as garrafas de cerveja vazia.
Quatro contra apenas um era uma fodida luta desleal. E ainda por cima armados, o que tornava mais preocupante para o Uchiha.
Caminhei em direção aos homens observando a cena, com cautela.
Sasuke colocava a jaqueta quando o homem mais alto acertou sua costela com o taco de sinuca. Vi quando o Uchiha arqueou devido a pancada.
⎯ Merda.⎯ murmurei encarando Sasuke se defender dos golpes do mais alto, de guarda totalmente baixa para os outros três.
Tomado por um sentimento de senso de justiça, me lancei contra o latino tatuado antes que ele pudesse acertar Sasuke com o canivete. Aproveitando do meu peso e estatura, soquei o rosto do homem impedindo que ele levantasse. Peguei o objeto pontiagudo cuspindo no cara antes de me levantar.
Sasuke girou o corpo encarando a cena, nossos olhos se cruzaram e ele apenas assentiu bem apenas tempo de ver o homem mais alto tentando lhe acertar com o taco. Encarei os gêmeos que se separaram. Um indo atrás do balcão e outro em direção a Sasuke.
A música parecia tocar em perfeita sincronia com os movimentos do Uchiha, que agora parecia ter se transformado. O sorriso amplo de Sasuke causava arrepio, como se ele estivesse realmente adorando quebrar aqueles caras.
Ele socou o mais alto de baixo para cima fazendo - o cambalear. Enquanto espalmava com o antebraço impedindo que a garrafa que o gêmeo de bandana vermelha segurava, entrasse em contato com seu rosto.
Eu apenas via a cena como mero expectador, enquanto segurava o corpo desfalecido do tatuado com meu pé esquerdo.
Sasuke socou repetidas vezes o abdômen do mais baixo na direção das costelas.
O outro gêmeo saiu do balcão com uma corrente em mãos se aproximou por trás de Sasuke ajudado pelo dono do bar.
Emputecido com aquele velho babaca, chutei o rosto do tatuado para garantir que ele não levantasse e me pus a caminhar.
⎯ Sasuke. Atrás de você.⎯ berrei chamando a atenção do Uchiha que entendeu o recado assim que viu o outro se aproximar firmando a corrente.
Sasuke girou o corpo puxando a corrente.Uma. Duas. Três vezes. E a cada repuxar um soco potente.O barulho dos ossos estalando contra o punho de Sasuke era seco. O gêmeo caiu ao lado do outro com o nariz esfacelado e sangrando. O mais alto levantou-se trôpego insistindo em ir para cima de Sasuke que o parou com um chute certeiro no rosto. O Uchiha arfava secando o suor que se formou em sua testa. Os poucos bêbados que ainda estavam por ali correram imediatamente.
Me afastei até o balcão puxando o dono do bar pela gola fazendo seus olhos escuros encararem os meus.
⎯ Escuta aqui, seu velho filho da puta. Ensine a porra dos seus cachorros a lutar com dignidade. Homens de verdade não agem pelas costas.
Soltei o corpo com força fazendo o homem cambalear.
Puxei uma nota de US$ 20 pairando sobre o balcão. Encarei Sasuke sem dizer uma só palavra, mas foi o suficiente para que ele me seguisse até o lado de fora. Ele parecia recobrar a consciência.
Notei sua moto parada do outro lado da rua e caminhei até minha pick up na outra extremidade.
⎯ Gaara?⎯ a voz de Sasuke me fez estagnar com a mão na maçaneta. Suspirei girando o corpo bem a tempo de vê-lo parado com a sobrancelha sangrando.⎯ Obrigado, você salvou minha vida duas vezes.
Assenti sabendo que ele se referia ao episódio do bar mais cedo.
⎯ Não por isso! Faria por qualquer um.⎯ murmurei dando de ombros. Vi quando ele se aproximou estendendo a mão. Encarei por um tempo antes de pegá - la num aperto firme.
⎯ Mas fez por mim.⎯ Senti o líquido quente entre os dedos. Puxei minha mão olhando os dedos molhados de sangue.
⎯ Você está sangrando.⎯ afirmei olhando a jaqueta e Sasuke deu de ombros.
⎯ Não foi nada.⎯ murmurou escondendo o incômodo.⎯ Nada que um curativo e anti séptico resolvam.
Lembrei da garrafada que ele havia levado no antebraço e o encarei.
⎯ Deveria procurar um hospital, talvez fosse o caso de levar alguns pontos.⎯ disse
Sasuke suspirou cruzando os braços na altura do peito.
⎯ Com a sorte que estou hoje, tá arriscado ir ao médico para levar uns pontos e ter o apêndice retirado.⎯ ele riu me arrancando um sorriso mínimo.
⎯ Tá certo.⎯ concordei finalizando o riso.⎯ Você realmente extrai o pior das pessoas. Fico me perguntando o que você disse aquele homem para que ele mandasse os lacaios darem uma puta surra em você.
Sasuke sacou o maço de Malboro me encarando por um breve momento antes de puxar um da cartela e acender. Acendeu encostando na lataria.
⎯ Tem um tempo?⎯ me indagou tragando e expurgando a fumaça languidamente.
Ponderei sobre sua pergunta, afinal não esqueci o que ele havia feito a minha irmã e talvez nunca esquecesse, mas em contrapartida aquele era Sasuke Uchiha, o irmão do meu falecido amigo. E virar as costas para Sasuke agora a meu ver seria como virar as costas para Itachi.
Aquilo era tão fodido.
Tomado por uma curiosidade sobre o que Sasuke teria a dizer e a cumplicidade e amizade que tinha por Itachi, fiz o que meu coração mandou fazer.
⎯ Tenho.
Sasuke meneou a cabeça apagando o cigarro com o coturno.
⎯ Vamos a um lugar. Tô com fome e não consigo pensar direito com o estômago roncando. Me segue com o carro.
Eu concordei de repente vendo Sasuke se afastar e dar partida na moto.
Liguei a pick up seguindo a Harley o mais rápido que aquela sucata permitia.
[...]
Olhei no relógio constatando não passar das uma da manhã.
Estávamos sentados na caçamba da caminhonete no estacionamento do drive thru comendo nossos combos.
Sasuke mastigava sem pressa. Havia retirado a jaqueta e feito uma bandagem com gazes e antisséptico comprados na farmácia 24 horas ao lado do Sal´s.
Realmente havia necessidade de uns pontos naquela região e com toda certeza deixaria uma marca grande, já que o vidro havia rasgado a pele. Aquilo não parecia preocupar Sasuke de maneira nenhuma, soava como se fosse algo corriqueiro na vida daquele cara.
⎯ Não adianta, os hambúrgueres do Sal´s são os melhores.⎯ ele sorriu bebendo o resto do seu refrigerante.
Eu meneei a cabeça, afinal não era muito fã desses porcarias.
⎯ Prefiro a comida da minha mãe.⎯ Sasuke assentiu espalmando as mãos na calça jeans.
Aquela conversa estranha não estava nos levando a lugar algum. ⎯ O que você disse aquele mexicano de uma figa que fez com que ele quisesse arrancar suas bolas?⎯ resolvi iniciar finalmente uma conversa.
Sasuke deu de ombros.
⎯ Pablo era um desafeto antigo. Eu fui expulso daquele bar na época da morte de Itachi por mais vezes do que me lembro, afinal nunca estava sóbrio o suficiente.⎯ ele sorriu amargo.⎯ Numa dessas vezes quebrei o bar inteiro. E Pablo jurou me matar se pisasse ali novamente. Acho que ele não esqueceu a promessa feita, mesmo eu tendo ido ali me desculpar e acertar a dívida deixada.⎯ ele riu por fim e o silêncio se instalou, exceto pelo barulho e movimentação no drive.
Abaixei a cabeça encarando o sanduíche pensando em Sakura e na conversa que ela possivelmente teve com o Uchiha. Fora as suposições que adentravam minha mente com relação aos próximos passos de Sasuke e o futuro do bar. Ele havia voltado para Odessa de vez? Apenas para o funeral do velho Yamanaka?
⎯ Sei que é estranho, afinal sempre foi não é mesmo Gaara?⎯ ele cortou meus pensamentos ganhando minha atenção.⎯ Nunca fomos próximos, não como você e Itachi.⎯ ele riu ao falar o nome do irmão e eu retesei o corpo.
⎯ Itachi era meu melhor amigo, apesar da nossa diferença de idade, sempre me identifiquei mais com seu irmão, Sasuke.⎯ suspirei.⎯ Mas nunca tive nada contra você, até o dia em que virou um merdinha covarde e virou as costas para minha irmã. ⎯ soltei o que estava preso em minha garganta.⎯ Eu não estava aqui por ela, e Deus sabe como me machuca falar sobre isso. Sakura encarou sozinha o peso de uma decisão como aquela. E se não fosse por Inoichi … Não quero pensar o que seria dela.
Sasuke voltou seus olhos escuros para mim absorvendo minhas palavras.
⎯ Mereci aquele soco, Gaara! Mas não pelos motivos que você pensa.⎯ eu o encarei seriamente.⎯ Eu não sabia que Sakura estava grávida, mas isso não exime minha culpa por ter ido embora. Talvez tenha soado egoísta, mas juro que pensei que ela estaria melhor sem mim. Eu estava quebrado. Você viu como fiquei…Destruir os sonhos da única garota que amei nunca foi minha intenção. Eu sempre quis que ela seguisse aquela droga de roteiro que fizemos…
A última palavra saiu como um sussurro, demonstrando que aquele assunto era uma ferida recém aberta.
⎯ Não entendo como você não soube se cidade inteira sabia.Inoichi sabia… Como que você não poderia saber!Ela te ligou, cara...⎯ disse descrente.⎯ Sakura me disse que você retornou a ligação tempos depois quando ela estava no hospital se recuperando do aborto mal sucedido. O que aconteceu de verdade Sasuke?
⎯ Eu não tenho a resposta para essa pergunta Gaara. Eu passei o dia inteiro pensando sobre isso, e tudo o que me vem à cabeça são sucessões de erros e eu nem tenho como culpar o destino por isso.⎯ ele puxou o maço de cigarros acendendo em seguida.Tragou calmamente expurgando a fumaça como se refletisse.⎯ Nossas escolhas tem consequências e tanto eu quanto Sakura estamos arcando com elas, mesmo que meu desejo nunca fosse colocar Sakura nessa situação, eu o fiz, indiretamente. Não posso mudar o passado. ⎯ ele balançou a cabeça sorrindo fraco.
⎯ Você quer consertar as coisas com Sakura?⎯ perguntei de uma vez.
Eu precisava saber o que Sasuke queria da minha irmã. Se aquilo que disse era verdade, existia sentimento verdadeiro por Sakura tanto que ele abriu mão dela. Não que de uma hora para outra sua justificativa seria o bastante para esquecer o passado. Porra minha irmã quase morreu, e mesmo que por decisão dela, ainda sim, Sasuke tinha sua parcela de culpa.
O Uchiha me encarou por um tempo antes de responder.
⎯ Não há como consertar o que fiz com ela.⎯ ele olhou para o horizonte onde era possível apenas enxergar o breu. ⎯ Eu voltei para lidar com as consequências das minhas escolhas, com o meu passado. Talvez depois disso, eu possa enxergar algum futuro para mim.
Eu continuei a observar o Uchiha que mantinha o olhar perdido.
Sasuke suspirou levantando-se. O rosto marcado por algumas escoriações da recente briga. Rolou seus olhos negros em minha direção pegando a jaqueta suja de sangue. Indicando que provavelmente aquele assunto havia encerrado.
⎯ Obrigado, Gaara por ceder seu tempo.⎯ meneou a cabeça descendo da caçamba e caminhando em direção da motocicleta.⎯ Mesmo que sua opinião sobre mim não mude, foi bom poder esclarecer as coisas com você, acredito que Itachi ia querer isso também.
⎯ Não foi tão ruim assim, Uchiha.⎯ murmurei em resposta.
Sasuke sorriu minimamente dando start. Notei a bandagem encharcada de sangue e soltei um muxoxo. Moleque teimoso. Sorri ao lembrar das vezes em que meu melhor amigo o chamava daquela forma, mesmo que irritado ainda podia sentir o carinho que sempre se referia a Sasuke. Embora fossem completamente diferentes eu via algo de Itachi em Sasuke e talvez fosse exatamente por isso que odiar Sasuke estava cada vez mais se tornando uma tarefa difícil.
Ino
Minha cabeça latejava. Pisquei os olhos algumas vezes, sentindo a dormência na região do braço. Acabei adormecendo em cima do meu braço direito, um hábito, que me renderia uma tendinite ou bursite, posteriormente. E apesar de ser repreendida pela minha mãe diversas vezes desde a minha infância, nunca consegui largar esse costume, de toda forma me sentia confortável, pelo menos até a manhã seguinte.Observei uma poça de baba que se formou na manga do meu moletom roxo, constatei que realmente estava exausta e não apenas psicologicamente.
Suspirei levantando, apertando o máximo meu bíceps no intuito de fazer o sangue circular e aquela sensação incômoda de formigamento passar. Encarei a volta, o escritório do meu falecido pai tentando engolir o bolo seco e amargo que se formou em minha garganta.
O monte de cartas abertas fizeram meus olhos encherem de lágrimas novamente.
Pior do que uma ressaca alcoólica, somente a ressaca moral que eu estava sentindo naquele momento.
Uma enxurrada de lembranças da noite anterior me atingiu em cheio, me dando a certeza de que tudo aquilo era real.
Mentiras.
Manipulação.
Eu me sentia uma marionete naquele jogo sujo.
Eu sabia o que tinha que fazer.
Eu tinha que ouvir da boca de Serena Lincoln toda a verdade. Ela me devia isso.
Juntei as fotos, as cartas , tudo o que pertencia a mim, que fora do meu pai.
Pai.
A minha boca pronunciou aquela palavra de forma tão diferente agora, com um toque de dor. Mas não a mesma dor que senti ao crescer sem a figura paterna. Não a dor do abandono afetivo que enterrei profundamente durante tantos anos.
Mas a dor de uma saudade.A dor de ser privada de ter Inoichi Yamanaka como pai.
Juntei tudo dentro do baú, permitindo chorar mais uma vez. Minha vida havia sido uma mentira.
Não imaginava que houvessem lágrimas, que eu ainda fosse capaz de chorar tanto, mas elas estavam ali, fortes limpando toda dor e decepção. Ainda absorta em meus pensamentos busquei minha bolsa e os chinelos, quando estagnei ao notar olhos verdes e vívidos me encarando num misto de curiosidade e preocupação.
⎯ Ino? ⎯ a voz suave me chamou e tive a certeza de que Sakura realmente estava ali e não uma peça pregada por minha mente conturbada.
Eu a encarei durante um tempo sem mencionar uma única palavra apenas segurando minha bolsa e o pesado baú em mãos.
⎯ Você está bem? Você está chorando? ⎯ sua voz soou mais preocupada e eu apenas meneei a cabeça negando. Isso foi o gatilho para que a Haruno se aproximasse com o semblante mais preocupado ainda.⎯ O que aconteceu? Você dormiu aqui?Alguém te machucou? Ino me responda!
Sakura elevou a voz observando meu rosto e meu corpo , naturalmente buscando algum ferimento ou qualquer indício do que pudesse ter me acontecido.
Exausta apoiei o baú sobre a mesa do escritório, encarando Sakura mais uma vez, o choro agudo chamou a atenção da jovem de cabelos rosados que me envolveu num abraço caloroso, me apertando contra si.
⎯Meu Deus, Ino! Você está tremendo.⎯ Sakura acariciou minhas costas enquanto eu chorava copiosamente em seus braços.⎯ Vai ficar tudo bem, Ino...⎯ ela tentava me consolar. Mas infelizmente nada do que dissessem traria meu pai de volta ou amenizaria aquele sentimento de traição e decepção.
Me afastei fungando repetidas vezes negando veemente suas palavras. Nada ficaria bem.Pelo menos até que expusesse todos os fatos e confrontasse minha mãe.
⎯ Não, Sakura… ⎯ eu finalmente juntei forças para falar.⎯ Não tem como ficar bem… Eles mentiram para mim… Tiraram meu direito a ter um pai… Me fizeram acreditar que meu pai nunca me quis…
Sakura me encarou perplexa e ao mesmo tempo indignada.
⎯ O que está dizendo Ino? ⎯ ela me indagou.
⎯ Durante a minha vida toda me fizeram acreditar que Inoichi Yamanaka era um pai relapso, alguém que nunca desejou uma família. Que ele nunca me quis… ⎯ falei a última frase num sussurro fraco.⎯ E a prova dessa mentira deslavada está dentro daquele baú… minha vida roubada está ali dentro, Sakura.
Sakura piscou aturdida encarando o baú antigo sobre a mesa, soltou um longo suspiro e me puxou em direção ao sofá de couro negro.
⎯ Primeiro de tudo, um café... ⎯ Sakura murmurou se levantando em direção a pequena cafeteira elétrica ao lado do frigobar.
Cogitei mencionar que odiava café, mas na atual conjuntura precisava de um pouco de cafeína para uma injeção de ânimo. A Haruno me encarou com um sorriso singelo e eu meneei a cabeça em concordância.Sequei os resquícios de lágrimas com o moletom encarando o assoalho de madeira. Voltei meu olhar para Sakura avaliando suas roupas tão simples quanto as minhas. Talvez até mais. Sua calça marcando seu corpo curvilíneo e a regata branca, além das peculiares botas marrons e sua bolsa de franjas. Havia uma beleza selvagem em Sakura, uma beleza natural, livre de toda aquela maquiagem e adereços das mulheres de New York. Corei quando seus olhos claros focaram em mim novamente arrancando um riso mínimo em resposta.
⎯ Seu pai costumava dizer que toda decisão importante deve ser acompanhada de uma boa xícara de café.⎯ ela sorriu mais amplamente parecendo perdida em lembranças e por um breve momento eu senti inveja de não poder ter a mesma sorte que ela. por não ter uma lembrança sequer do meu pai.
[...]
Realmente meu pai tinha completa razão. Aquele café de alguma forma deu mais clareza as minhas ideias. Eu já estava na terceira xícara, enquanto Sakura devorava o conteúdo de cada carta, com uma infinidade de expressões e algumas lágrimas no caminho.
Sakura dobrou a última carta colocando sobre a pilha cuidadosamente. Observei ela secar as lágrimas e desfocar o olhar para o vazio. Parecia tão estarrecida quanto eu, talvez até mais pois ela conhecia Inoichi de uma maneira que nunca conhecerei.
Ela por fim suspirou me encarando no processo, seu olhar parecia tentar decifrar meus sentimentos, embora ela entendesse muito bem sobre decepções.
⎯ O que pretende fazer? ⎯ foi sua primeira pergunta depois de sorver todo café de sua xícara.
⎯ O que você acha? ⎯ perguntei retoricamente.⎯ Esfregar cada coisa dentro desse baú e cobrar uma explicação de Serena, ela me deve isso.⎯ bufei irritada.⎯ Pretendo partir hoje mesmo para New York.
Sakura assentiu em entendimento.
⎯ E depois? ⎯ Sakura me contestou sem rodeios. ⎯ Tem o bar, o último desejo de Inoichi, sua vida em New York. Já pensou em como conciliar tudo isso?
⎯ Eu vou voltar, Sakura. Mas eu preciso encerrar este ciclo, preciso de respostas.Eu não posso simplesmente ignorar o que minha mãe fez ao me esconder esta parte do meu passado. Eu vou cumprir e cuidar de tudo que pertenceu ao meu pai e embora tenha uma carreira em New York, eu tenho agora, uma história interrompida em Odessa também que de um jeito ou de outro pretendo retomar.
Sakura suspirou sorrindo em seguida, levantou-se estendendo a mão em minha direção.
⎯ Acho que o primordial é que você tenha um lugar para ficar quando voltar para Odessa.⎯ Sakura sorriu minimamente continuou com a mão estendida.
⎯ Eu estou hospedada no Odessa Hotel, devo fazer o checkout e quando voltar procuro um apartamento pequeno próximo ao centro.⎯ dei de ombros segurando a mão estendida. Alavanquei meu corpo ajeitando a bolsa sobre os ombros.
⎯ Nada disso, vamos pegar suas coisas no Odessa Hotel e levar para o apartamento que foi de seu pai, me sentirei melhor se tiver alguém para dividir aquele lugar comigo.⎯ aquelas palavras me fizeram piscar aturdida, eu não sabia como reagir, era um misto de cuidado e gratidão que não me lembro de ter sentido alguma vez em toda minha vida.
⎯ Sakura, eu...⎯ ameacei negar, porém Sakura soou cortante.
⎯ Não ouse negar. Aquele apartamento pode ter sido deixado em testamento para mim, mas é tão seu quanto meu. Aliás é muito mais seu do que meu. Tenho outros planos, Ino. E Odessa provavelmente não está mais incluída neles. Seu pai foi um anjo na minha vida. Ele me deu oportunidades, foi meu pai, meu amigo durante esses cinco anos subsequentes. Cuidar da sua amada filha é o mínimo que posso fazer por ele. ⎯ ela finalizou com os olhos verdes marejados, e eu não pude negar a ela mais nada.
O destino tomava seu curso de uma maneira inusitada, me devolveu não apenas um pai, uma herança, um passado, mas me deu a chance de escrever um novo rumo, um futuro repleto de possibilidades, mesmo em uma cidadezinha tão pequena quanto Odessa.
Sakura
Definitivamente planejar nunca foi meu forte. Tinha ido até o bar, passar um tempo em meio às lembranças e fazer uma despedida apropriada desse lugar que me ensinou a recomeçar.Inoichi me permitiu um leque de possibilidades com a herança que me deixou.
Papa.
Pensar sobre ele ainda machucava, porque a sensação que tive ao pisar naquela assoalho de madeira é que ele estaria naquele escritório compenetrado em meio aquelas pilhas de papéis do MC ou de fornecedores que atrasavam as entregas. Embora tivesse John para auxiliar com os trâmites, o Yamanaka gostava de estar sempre envolvido com as coisas do bar, as corridas do MC, afinal como fundador dos Vultures gostava de participar de tudo o que envolvia a família. Achava admirável, cresci nesse meio, adorava ver as corridas e as exposições.No MC era comum que seus integrantes levassem suas famílias aos eventos, embora fosse completamente formado por homens, as mulheres tinham responsabilidades na organização das quermesses e exposições cada qual em seu respectivo Condado. Inoichi ainda tentava manter viva a grande família Vulture, tanto que as corridas e exposições eram organizadas a cada dois meses num grande encontro, geralmente nas cidades que beiravam a Route 66.
O destino do MC estava cada vez mais incerto, afinal era um fato que Kizashi Haruno não tinha condições psicológicas de se manter na liderança há tempos. Desde a ruptura indireta com Inoichi há cinco anos, ele vivia bêbado e cada vez mais longe de suas funções do clube. Eu sabia que tinha minha parcela de culpa nesse afastamento, apesar de não ser propriamente a culpada por tudo. Eu conhecia aquele homem que um dia chamei de pai. E toda vez que pensava no que ele me fez passar, a mágoa e amargura tomava todo meu coração e ânsia de ir embora daquela cidade crescia. Poderia afirmar que, agora, talvez nada me prendesse a Odessa. Mesmo tendo Gaara, minha mãe e Juan, algo me dizia que eu poderia partir sem qualquer sentimento de culpa. Mas ver Ino naquele estado me abalou. Embora a conhecesse apenas há um dia, ela era parte de Inoichi, parte do homem que foi meu refúgio e minha salvação. A gratidão, amor e respeito que tinha por meu padrinho me impedia de virar as costas para ela neste momento. Porque virara as costas para Ino seria virar para Inoichi.
Ouvi um suspiro resignado ao meu lado assim que descemos carregando o baú até o salão, me virei para Ino que parecia perdida em memórias. Eu sabia exatamente que sentimento era aquele. A decepção. Ela deveria estar travando dentro de si uma luta árdua entre a razão e o coração, porque de toda forma era sobre a mãe dela.
Ameacei dizer algo numa tentativa de confortá-la, mas sua parada abrupta quase nos fez cair quando alcançamos o primeiro degrau da escada que levava ao segundo piso.
⎯ Ino?⎯ a chamei notando seu olhar vidrado no salão. ⎯ O que foi?
Perguntei virando o rosto na direção em que ela encarava. Estranhei a presença de outra pessoa e praguejei ao notar que naturalmente havia deixado aberta a entrada principal.
Delicadamente abaixamos o baú, ambas observando a mulher elegante parada no meio do salão.
Me aproximei notando suas vestimentas nada convencionais para as mulheres de Odessa, bem similares as de Ino assim que chegou aqui.
⎯ Desculpe, mas estamos fechados.⎯ afirmei encarando a mulher alta, e pude notar que não se dava apenas pelos saltos de grife.
notei quando ela retirou os óculos escuros me observando com aqueles olhos amendoados. seus cabelos estavam curtos num corte chanel, sua maquiagem era forte em destaque para o batom num vermelho escarlate.
Ela me avaliava sem nada a dizer e aquilo me incomodou.
⎯ Vou ter que pedir que se retire, senhora, pois estamos de saída.⎯ a informei virando de costas.
⎯ Por um momento achei estar vendo Mebuki.⎯ o nome de minha mãe sendo proferido de forma tão calorosa me fez estagnar. Girei os calcanhares encarando aquela mulher com perplexidade.
⎯ O que disse?⎯ indaguei confusa.⎯ Como conhece minha mãe?
⎯ Desculpe...⎯ ela sussurrou aturdida.⎯ Vocês se parecem tanto… Você deve ser Sakura, certo?
Cruzei os braços na altura dos seios me sentindo em completa desvantagem.
⎯ Sim, e você é? ⎯ elevei o rosto na defensiva.
Foi quando a voz de Ino rompeu atrás de mim tão fria e cortante.
⎯ Esta é Serena Lincoln, minha mãe!
Sasuke.
Eu definitivamente deveria ter ouvido Gaara e ido ao Hospital Geral de Odessa. Meu braço além de doer como o inferno, ainda minava um pouco de sangue que nem a bandagem conseguia conter. Mas de toda forma eu precisava encontrar Ino Yamanaka e decidir as coisas. Passei no hotel em que ela estava hospedada e o velho Jiraya me informou que ela havia passado o resto da noite no bar. Automaticamente associei as manias de Inoichi, que quando estava de cabeça cheia sempre passava suas noites naquele escritório.
Ao sair cruzei com Naruto Uzumaki e achei engraçado a forma com que ele me olhou, como se realmente tivesse visto um fantasma. Naruto e eu nunca fomos amigos, nunca gostei do jeito espalhafatoso e comunicativo do cara. Estudamos juntos no fundamental, e sempre estávamos disputando as coisas como dois babacas que éramos.
⎯ Achei que os rumores depois do funeral do velho Yamanaka fossem apenas boatos desse povo desocupado.⎯ o sotaque ainda era mais acentuado que que me lembrava.⎯ Então voltou mesmo para ficar, Sasuke Uchiha?
Girei o corpo encarando Naruto com certa indiferença, afinal velhos hábitos nunca mudam. Seu sorriso provocativo ainda estava lá, mas desta vez com um ar de superioridade.
⎯ Não que seja realmente da sua conta, Uzumaki. ⎯ cuspi ácido.⎯ Mas Odessa ainda é minha casa.
Naruto assentiu pausadamente.
⎯Talvez você não seja tão bem vindo em casa novamente! ⎯ ele cutucou encarando meus hematomas e em seguida meu braço. ⎯ Até porque está cinco anos atrasado, não acha?
Passei as mãos sobre os cabelos em claro sinal de irritação passei a língua sob os lábios dando passos secos em sua direção. O puxei pela gola da camiseta de flanela e o encarei nos olhos azuis, nem ligando pelo dor no braço esquerdo.
⎯O que você pensa que sabe?⎯ trinquei os dentes recebendo um sorriso de puro escárnio.
⎯ Eu não penso que sei, eu digo o que eu vi…⎯ ele foi direto.⎯ Vi cada morador desta maldita cidade humilhar Sakura Haruno. Cada babaca desta cidade tratá-la como lixo.Eu fiz o que pude como amigo dela, mas nunca foi o bastante.⎯ ele afirmou e foi como um soco no estômago saber disso por outras pessoas. Eu me sentia pior a cada vez que ficava sabendo da vida de Sakura no inferno daquele lugar, quando eu optei por ir embora e me afundar naquele poço de lamentações. Soltei aos poucos a gola do Uzumaki inspirando profundamente na sequência.
⎯ Você não faz ideia...⎯ murmurei balançando a cabeça em negativa.
⎯ Tente.⎯ ele me encarou lívido como se esperasse uma justificativa ou algo a mais de mim.Como se de alguma forma acreditasse que eu não tinha feito algo como abandoná-la grávida.⎯ Prove que esta cidade está errada sobre você!
⎯ Eu não tenho que provar nada a você ou qualquer outra pessoa desta cidade. A quem eu devia alguma coisa se chama Sakura Haruno. Assim como não tenho que ouvir as merdas que pensam sobre mim. ⎯ soltei sua gola totalmente me virando para sair em direção a minha Harley. Eu precisava sair dali e aquela sensação desesperadora não se dava ao fato de ter alguém me julgando, porque ser julgado era tudo o que esperava quando voltei. Isso pouco me importava, mas ouvir de outras pessoas o que Sakura passou, me deixava enojado.
Coloquei o capacete afivelando-o rapidamente, encarei Naruto ao pé da escada que me devolvia o olhar.
⎯ De qualquer forma obrigado, Uzumaki. Obrigado por cuidar dela.
O arranque foi tudo o que ouvi ao partir em direção ao Vultures Bar.
[...]
Dizer que as palavras de Naruto não impregnaram meu subconsciente abalado seria uma porra de uma mentira. Parece que eu não tinha um segundo de paz desde que voltei para Odessa. Inoichi, Sakura e minha fodida mãe, tudo de uma só vez, como uma castigo divino pelas minhas escolhas erradas. Talvez fosse a tal lei do retorno, tomando seu curso, afinal.
Ainda absorto naquele emaranhado de situações, pensei na minha conversa com Gaara, e naquela pergunta em específico.
Será que ainda conseguiria consertar as coisas com Sakura?
Não sei se seria justo depois de tudo que ela passou. Ela tinha alguém agora e por mais que me custasse a aceitar isso, eu não tinha qualquer direito sobre isso. Eu não sei o que Juan foi para ela na minha ausência. Qual o grau de importância aquele bastardo tem em sua vida.
Inevitável não me sentir abalado depois de cinco anos e descobrir que meus sentimentos por ela ainda eram os mesmos, mas fui babaca o suficiente para jogar tudo fora. Imaturidade, amargura, revolta… São tantos os motivos que me fizeram tomar as decisões que tomei. Eu queria tentar consertar isso, mesmo que seja apenas para ser um amigo, eu me contentaria com qualquer migalha que ela me oferecesse, porque era melhor ter a indiferença do que não ter absolutamente nada.
Tirei o capacete prendendo no banco da moto, passei as mãos pelos cabelos, tentando alinhar aquela bagunça de fios. Encarei a entrada, onde havia estacionado e vi Sakura saindo pela porta principal. Na hora pensei que fosse uma resposta divina aos meus questionamentos.
Me aproximei notando ela mexer no celular, parecia alheia a minha presença. Mas como um imã nossos olhos se encontraram. Seus olhos intensos vasculharam meus rosto sem dizer uma única palavra, e por um momento, daqueles breves momentos que se piscarmos perdemos, eu notei o calor emanando deles.
Rapidamente, ela desviou para o celular apertando rapidamente como se iniciasse uma ligação. Caminhei mais perto quando ela colocou no ouvido e eu não duvido nada que fosse para me evitar. Dois poderiam jogar este jogo. Continuei a caminhar e a ouvi praguejar atrás de mim antes de me chamar.
⎯ Sasuke, espera… Não entre aí...⎯ eu estagnei e virei o rosto em sua direção um tanto confuso.
⎯ Por quê? ⎯ devolvi a pergunta imediatamente.
⎯ Ino está lá dentro… Com a mãe! ⎯ ela murmurou. Eu pisquei algumas vezes assimilando e voltei até ela que me encarou pelo canto dos olhos.
⎯ Está dizendo que Serena Lincoln está lá dentro?
⎯ Sim.⎯Sakura assentiu tomando o celular novamente. ⎯ Se você pudesse fazer a gentileza de não entrar aí. Ino precisa desta conversa. ⎯ ela se virou discando o celular.⎯ Gaara? Podemos almoçar hoje?⎯ colocou o polegar nos lábios mordiscando o canto. Ela fazia isso geralmente quando estava nervosa.
Eu não me movi, e isso pareceu irritá-la. Voltou suas obsidianas em minha direção esperando que eu me afastasse. Dei de ombros me mantendo no mesmo lugar.
⎯ Sim, estou ouvindo, Gaara! Desculpe é que um a droga de um inseto tirou minha atenção.⎯ ela murmurou me encarando. ⎯ Tudo bem. Até mais tarde. Te amo.⎯ ela desligou o telefone me observando.
⎯ Vai ficar me encarando?⎯ ela me inquiriu.Dei de ombros mais uma vez.
⎯ Não tenho nada melhor para fazer. Já que não posso entrar e falar com Ino.Te encarar parece uma boa forma de passar o tempo.
Ela bufou ajeitando a bolsa de franjas sobre os ombros. Sorri com aquele gesto e não pude deixar de lembrar das vezes em que eu a irritava só por diversão.
O silêncio reinou durante cinco longos minutos. Até eu mesmo quebrá-lo.Motivado pelas palavras de Gaara e um tanto quanto abalado pelas de Naruto.
⎯ O que disse ontem para mim...⎯ ganhei sua atenção automaticamente, mas seu semblante era incomodado.⎯ sobre as coisas do nosso passado...⎯ doía como o inferno dizer que éramos apenas isso passado, um doloroso e desgraçado passado.
⎯ Sasuke não vá por este caminho…⎯ ela advertiu impaciente. ⎯ Já disse tudo o que tinha para dizer a você. O que quer de mim?⎯ ela parecia cansada.
⎯ Que me escute… Apenas isso. ⎯ eu proferi.
⎯ E acha realmente que vale a pena trazer a tona tudo de novo? ⎯ ela indagou.⎯ Acha justo me fazer reviver aquilo tudo?Não vai mudar o que aconteceu… Não tem conserto.
⎯ Não vai mudar, mas você merece dar um ponto final a tudo da maneira correta. E eu ao menos tentar o seu perdão, ou pelo menos saber se algum dia o terei.⎯ ela me encarou triste.
⎯Eu já te disse que não te odeio, Sasuke.⎯ ela murmurou elevando as mãos sobre as têmporas.⎯ É tudo que posso te dar no momento.
⎯ Eu sei. ⎯ respondi.⎯ Me contento com o que pode me dar , por enquanto.
⎯ Então?⎯ ela me observou exasperada.⎯ Não tem porque insistir neste assunto. É passado. Acho que você só quer reviver isso, para amenizar a culpa que sente.
⎯ Não.Nada ameniza a culpa que vou carregar. Eu nem quero amenizar nada, porque tudo o que estou sentindo nem chega perto do que você passou e pode apostar que se eu pudesse, sem nem pensar duas vezes tomava sua dor inteira pra mim. ⎯ eu fui sincero.
Sakura me encarou e suspirou profundamente.Eu notei ela tocar finalmente meu rosto tirando os fios que cobriam minha sobrancelha com o curativo.
⎯ Aí, é que está … Para querer o perdão de alguém, Sasuke Uchiha, você tem que se perdoar. ⎯ ela soltou o meu rosto tocando levemente a região do meu braço machucado.⎯ E quando você mesmo se libertar do que te acorrenta ao passado, você entenderá que não pode viver refém das suas escolhas. Insistir neste assunto só vai trazer mais dor e lamentação para nós dois.
Sakura balançou a cabeça se afastando em direção a entrada do estacionamento, ela não foi propriamente embora, mas eu entendi que ela não desejava que a seguisse. Ela queria distância. Eu me afastei na direção oposta tomando o jirau em direção ao escritório ainda anestesiado por suas palavras. Que de tudo que ouvi desde que cheguei a Odessa, foi o mais perto da verdade que me assombrava.Como buscar o seu perdão se eu nem ao menos consegui me perdoar?
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