Alcina se aproximou das janelas do escritório e olhou lá para baixo, a neve já cobria tudo e a imensidão branca se assemelhava a um cobertor macio; incrível como algo que parecia tão inofensivo poderia tem ser tão mortal, apenas uma fresta seria o suficiente para colocar três de suas filhas em risco, e não estava disposta a arriscar ainda que minimamente.
Lá embaixo, tão distante que parecia uma boneca, Alice corria pelos terrenos com o amigo do vilarejo; Alcina torceu o nariz, é claro que sua esposa permitiu tal atrocidade.
Pelo menos Alice estava segura por trás dos muros altos que cercavam o castelo, e, ao contrário de Judith, não parecia tentada a fugir em cada oportunidade; Ella lhe dava alguns privilégios, como passar os dias com Donna ou trazer o amigo esfarrapado do vilarejo, e cabia a Alcina aceitar tais condições em prol da segurança da filha.
Ainda era difícil não vê-la como uma menininha, seu bebê, e admitir que estava se tornando uma mulher era, por vezes, doloroso.
Ao longo dos anos permitiu que Ella fizesse as coisas do seu jeito, deixou que ensinasse Alice a caçar e limpar a caça, se orientar pela floresta, fazer fogueiras e a sobreviver de um modo geral; uma parte dela desconfiava que as expedições do lado de fora eram mais do que isso, algo que acontecia apenas entre Alice e sua esposa, e também lhe coube aceitar isso.
Afinal de contas, Alice pertencia à Ella tanto quanto Theo pertencia à Alcina. A diferença, como uma piada de mau gosto do destino, era que Theodora se tornou um fantasma entre Alcina e Ella.
Ainda doía pensar assim, mas era a verdade. Theodora não passava de um fantasma, o cadáver de uma garotinha, pairando entre as duas durante os primeiros anos após sua partida. Elas haviam chegado à algum lugar com isso, não exatamente confortável mas seguro.
Certa vez, logo após o desaparecimento de Theodora, Alcina a viu parada nos primeiros degraus da escada, o rostinho travado em uma expressão estoica, e teve o ímpeto de correr e tomá-la nos braços, apertá-la, chorar e agradecer por estar de volta. Seu coração quase não aguentou, como se aquela maldita adaga o tivesse perfurado centenas de vezes, ao notar que era Alice havia vestindo as roupas da irmã e estava se passando por ela.
Sentiu vontade de abraçá-la, agarrá-la pelos ombros e a sacudir até que explicasse o que estava pensando, quis pegá-la em seus braços e ninar como se fosse um bebê com a mesma intensidade com que queria lhe dar um tapa.
Não fez aquilo. Alcina era capaz de muitas coisas, havia um oceano inteiro de cadáveres em seu passado para provar sua índole, mas jamais encostaria em uma de suas filhas para machucá-las.
Fez a única coisa que pode naquele momento: tomou Alice em seus braços e prometeu que a protegeria de tudo.
E ainda continuava fazendo isso, mesmo de longe.
A porta do escritório foi aberta, mas Alcina não se importou. Somente uma pessoa entraria sem bater, até mesmo suas filhas sabiam que precisavam de permissão para entrar, e logo o perfume de Elleanor se espalhou pela sala.
Alcina sorriu sem se virar na direção da esposa, esperou que Ella se aproximasse e atendendo as expectativas a abraçou com força apoiando a cabeça em sua barriga.
- Vigiando Alice novamente?
- Sabe que me preocupo com ela, e você insistem em permitir a entrada desse moleque no castelo.
Jamais pretendeu esconder o nojo em sua voz, principalmente porque há muito tempo havia prometido ser honesta com Ella não importa o que fosse, e dessa vez a fez rir.
- O que é tão engraçado?
- Sua repulsa. Ele é um bom garoto, eles estão fazendo uma batalha de bolas de neve e vai ficar tudo bem.
- Não tenho tanta certeza.
Desvencilhou-se de Ella e puxou a cadeira em grandes dimensões atrás da mesa, tomando seu lugar por direito; no entanto, sua esposa parecia longe de desistir e se aproximou novamente, dessa vez para pressionar um beijo carinhoso em seu rosto.
Alcina se derreteu sob o toque, mas decidiu não demonstrar de imediato.
- O que quer me pedir?
Ella riu.
- Quem é que falou em pedir, amor? Está mais para uma ordem pacífica e, talvez, indireta.
- Às vezes fico pensando no tipo de mulher que escolhi pra ser uma esposa – Alcina mexeu nos papéis à sua frente com disfarçado desinteresse, mas isso não abalou Ella que apenas riu mais uma vez e esfregou o rosto no seu – Estou falando sério, poderia ter uma esposa dócil e bem comportada.
- Ao invés disso você tem a mim, e admita que eu torno sua vida muito mais interessante.
Enlaçou a cintura de Ella e a puxou mais para perto.
- E o que minha esposa deseja?
- Daniela fez biscoitos de natal, até tentou cortar em formato de arvorezinhas e vai trazer em uma bandeja com o chá.
- Não consegui entender a ordem implícita, draga mea.
- Digamos que os biscoitos não foram cortados corretamente, e como Daniela insistiu em fazer sozinha e negou ajuda da Agatha, eles ficaram meio queimados.
- Ainda não fui falar de entender.
- Daniela quer te agradar, então seja gentil e não mencione os pequenos deslizes que ela cometeu; se fizer isso, vai ferir os sentimentos dela.
Alcina sorriu, achou adorável a preocupação que Ella tinha com os sentimentos de Daniela, embora não raramente tivesse a tendência de mimá-la. Também sabia que, apesar dela própria ser mais rígida, acabava por mimar as filhas muito mais do que Ella.
- Não se preocupe, não irei criticar os esforços de Daniela.
Sua promessa fez Ella sorrir e enlaçar seu pescoço em um abraço apertado, só para beijar seu rosto repetidas vezes.
- Você é uma ótima mãe.
Alcina gargalhou.
- Espero que sim, visto que criei seis filhas... Quero dizer, Judy prefere viver com Heisenberg naquela fábrica imunda e Bela resolveu me punir trazendo Velaska para o castelo, mas acho que me saí bem com as outras.
- Um dia você vai precisar aceitar a Velaska, ela não é tão ruim e ama a Bela mais do que tudo.
- E esse é o único motivo pelo qual ela continua viva. Não sei o que fiz para Bela querer me castigar assim, minha primogênita...
Ella riu, sempre achava graça do desespero de Alcina, principalmente quando se referia a Velaska e sua relação pouco convencional. Afinal de contas, e essas eram palavras da própria Ella e não de Alcina, Bela sempre mandava e Velaska obedecia e esse acordo deveria deixá-la mais do que feliz.
- Só faça o papel de uma boa mãe e seja gentil com Daniela, ela está ansiosa por isso.
A previsão de Ella se provou verdadeira quando, meia hora mais tarde, Daniela apareceu com uma bandeja cheia de biscoitos e um sorriso enorme (e orgulhoso) no rosto; Agatha vinha logo atrás com o chá e as xícaras em uma bandeja de prata, o que foi bom porque era provável que a excitação de Daniela a fizesse derramar tudo.
- Mãe, eu fiz biscoitos! E eu fiz sozinha, sem ajuda de ninguém, ninguém mesmo...
Esperou que Agatha servisse o chá e se retirasse tão silenciosamente quanto entrou, Ella a seguiu após murmurar que a encontraria em seus aposentos mais tarde, o que a deixou a sós com uma Daniela muito animada e orgulhosa de si mesma.
- Fiz biscoitos, e fiz sozinha – Daniela repetiu e, em seguida, continuou em tom crítico: - Tentei cortar em formato de árvores de natal, mas ficaram meio tortos.
Estavam, de fato, meio tortos e alguns sequer se pareciam com árvores de natal, mas Alcina jamais ousaria dizer aquilo em voz alta.
- Parecem incríveis, querida.
O gosto estava surpreendentemente bom, meio queimado nas bordas finas, mas ainda assim doce o bastante para ser saboroso; Daniela sorriu ainda mais ao receber o elogio, e foi assim que percebeu o quanto aquilo realmente era importante e como ela queria agradar. Por algum motivo sua filha, aquela que jamais deixaria de ser uma menina animada, desejava agradá-la em uma tarde qualquer sem um motivo especial.
- Posso perguntar qual o motivo dessa festa do chá?
Antes de responder, Daniela baixou a própria xícara e Alcina notou que aquele era um de seus conjuntos de porcelana preferidos, e agradeceu internamente por Agatha tê-lo transportado.
- Queria fazer uma surpresa e tornar seu dia melhor – Daniela deixou o olhar se perder na paisagem bucólica lá de fora – Parou de nevar, mas ainda é quase natal e às vezes isso é triste.
- Sei que o inverno a deixa triste, mas logo a primavera vai chegar e tudo vai parecer melhor, querida.
Daniela, sua preciosa filha que tinha corpo de mulher e alma de menina, praticamente a escalou para sentar-se em seu colo e esfregou o rosto no seu, como um filhotinho de gato faria a sua mãe, e Alcina aceitou de bom grado a demonstração de carinho. Um carinho meio descuidado, até infantil, mas totalmente Daniela e que ela amava mais do que tudo; aquele era um traço da filha que Alcina desejava que perdurasse por décadas, séculos se fosse possível, e seu maior medo era que, com a morte inevitável de Naomi, algo se partisse dentro de Daniela e fosse impossível para ela como mãe fazer qualquer coisa a respeito.
Por enquanto, aproveitaria sua filha feliz e carinhosa.
Alcina retribuiu o carinho, esfregou o nariz pelo rosto de Daniela e a fez rir como uma garotinha.
- Não se preocupe, querida, mamãe vai te proteger durante esse inverno e durante a vida toda.
Daniela ficou séria, e mais uma vez observou as janelas por cima do ombro de Alcina.
- Às vezes ainda tenho medo do frio.
A confissão em voz baixa, controlada, de com que Alcina se lembrasse de Ella, como também costumava confessar seus medos quando sentia-se segura quando estavam a sós, e se perguntou em qual momento Daniela começou a se parecer tanto com a outra mulher.
- O que a preocupa de verdade, Daniela?
Sua filha permaneceu em silêncio, mordeu o lábio inferior enquanto brincava com a manga do próprio vestido, outra mania adquirida após anos convivendo com Ella; então Alcina, que já havia aprendido muito bem a lidar com sua esposa, apenas esperou até ser contemplada com a resposta para sua pergunta.
- Você vai sempre nos proteger, não é? Do frio, e também de todo o resto, não é?
- É isso mesmo, querida.
- E se for Mãe Miranda?
Alcina engoliu em seco.
- O que a faz pensar que Mãe Miranda tentaria machucá-la, querida?
- As coisas não estão lá muito boas, não é? Posso sentir a tensão no ar, mesmo com Bela e Cassandra garantindo que está tudo bem... Alice também disse que está tudo bem, que não preciso me preocupar, mas ela ainda é uma criança e não entende – Daniela respirou fundo – E se Mãe Miranda decidir que não somos importantes e quiser nos matar, você vai ficar do lado dela? Perguntei a mãe, e ela disse que não.
Com “mãe”, Daniela estava se referindo a Ella, e Alcina deixou que continuasse.
- Mãe disse que vocês não vão deixar a Miranda fazer nada de ruim, que somos mais importantes do que ela pra vocês. É verdade?
Embora não gostasse nada do rumo daquela conversa, e parte dela suspeitasse que Daniela tenha ouvido conversas às escondidas por aí, Alcina não pode negar o alívio que a filha tanto desejava. Acariciou o rosto bonito e pressionou um beijo carinhoso na testa de Daniela, precisava que ela soubesse e não tivesse dúvidas da importância que tinha para Alcina.
- Vocês acima de qualquer coisa, meu amor. Mamãe sempre vai proteger vocês, e não vou permitir que ninguém as machuque.
Isso pareceu o bastante para Daniela.
- Então mãe estava certa, não que eu tenha duvidado dela mas queria ter certeza.
Alcina riu e beijou a testa de Daniela mais uma vez.
- É claro que sua mãe estava certa, e você não precisa se preocupar com isso.
Parecendo mais leve, e despreocupada, Daniela saltou do colo de Alcina e lançou mais um olhar para a janela.
- Agatha prometeu ficar de olho na Alice enquanto estou aqui, mas quando a primavera chegar eu não vou deixar aquele garoto estranho chegar perto dela. Não gosto do Adam, ele passa muito tempo com a Miranda.
Esse último fato não incomodava Alcina, pelo menos não pelos motivos que incomodava suas filhas, mas também não gostava que o garoto ficasse sozinho com Alice.
- Você é uma ótima irmã mais velha, Daniela.
- Aprendi cuidando da Judy, cometi alguns erros mas acho que agora sou tão boa quanto a Bela.
- É claro que sim – Alcina sorriu – Só não vá dizer isso a ela, não quero vocês brigando no meio do inverno com todos trancados nesse castelo.
Com todo o seu talento para o drama, Daniela suspirou demoradamente, beijou o rosto de Alcina e saltitou até a porta.
- Vou procurar minha mãe, a outra mãe, talvez ela tenha uma ideia divertida para passar o tempo.
- Não quebrem nada!
O aviso de Alcina foi ignorado e porta fechada, o que a deixou sozinha mais uma vez para tentar fazer algum trabalho enquanto torcia para que sua esposa e filhas não destruíssem metade do seu castelo.
[...]
Horas mais tarde, depois de um jantar em família animado, Alice, que não fazia ideia das preocupações de sua irmã mais velha, adentrou a biblioteca em busca de um livro em específico e encontrou suas mães juntas.
Até onde sabia, a biblioteca foi reformada anos antes do seu nascimento para afastar as memórias ruins da quase morte de uma de suas mães, Alice conseguiu uma versão basta te detalhada e cheia de emoção vinda de Velaska, que narrou sua aventura junto a Ella para salvar a vida de sua mãe depois do atentado de uma criada qualquer. De acordo com Velaska, a arma utilizada, uma adaga tão bonita quanto mortal, fora destruída imediatamente, mas ela estava errada e Alice sabia disso.
Por algum motivo que ainda desconhecia, sua mãe havia escondido a adaga e Alice a encontrou.
Não acreditava que sua mãe seria capaz de usá-la, seu propósito devia ser outro, só não conseguia imaginar o que seria.
Observou as mães em silêncio, parada junto às portas da biblioteca. Ella estava empoleirada no alto de uma das escadas enquanto procurava por algum livro, analisou algumas lombadas e puxou um ao dar-se por satisfeita.
- Amor, uma ajudinha?
Assistiu, divertida, Alcina deixar a taça de vinho na mesinha ao lado de sua poltrona e levantar-se para ir até à esposa. Alcina ergueu os braços e pegou Ella do alto da escada, de onde poderia muito bem ter descido sozinha.
- Obrigada, amor
Ella sorriu e beijou o rosto da esposa, em resposta Alcina rodopiou com ela em seus braços enquanto riam baixinho, cúmplices em seu momento. As duas pareciam tão apaixonadas, presas em seu próprio mundinho que mal prestaram atenção em Alice.
Assim que foi colocada no chão, Ella a viu e sorriu novamente.
- Procurando alguma coisa?
- Um livro sobre piratas, Daniela disse que está na estante esquerda, no alto – Alice sorriu de modo sugestivo e ergueu os braços em direção a Alcina – Me levanta também?
- Tão parecida com a sua mãe...
Apesar da reclamação, Alcina a ergueu assim como fazia quando Alice era apenas uma garotinha e pode pegar o livro de capa vermelha.
- Obrigada, mamãe.
Alcina a beijou no rosto antes de colocá-la em segurança no chão, ela poderia muito bem usar as escadas para pegar o livro mas não tinha tanta graça.
As deixou sozinha, mas não antes de parar mais uma vez junto à porta para observá-las; Alcina havia se acomodado novamente na poltrona de grandes dimensões que lhe pertencia, e Ella acomodou-se em seu colo como se houvesse mais assentos disponíveis. O amor delas era físico, baseado na necessidade do toque e pareciam se sentir melhor quando próximas uma à outra; Alice imaginou se as mães percebiam que praticamente gravitavam uma ao redor da outra, em movimentos fluidos que pareciam bem treinados mas que na verdade eram bastante naturais. Onde Alcina podia ser impiedosa, cruel e com ataques de raiva, Ella conseguia ser firme e controlar seu temperamento explosivo.
Eram opostos, realmente, mas também se completavam.
Alice deu-lhes as costas e saiu da biblioteca, mesmo para ela havia um limite do que podia ver das mães tão envolvidas uma com a outra.
Só queria voltar para o seu quarto e ler em paz, analisar os mapas do tesouro no livro sobre piratas e então ter uma boa noite de sonho. Aquele não era seu tipo preferido de livro, mas teve a oportunidade de ver as ilustrações enquanto Daniela o lia e teve vontade de analisar com mais atenção.
Talvez Ella pudesse lhe dar algumas dicas de como desenhar as montanhas atrás do castelo, sua mãe era muito melhor nisso.
Estava prestes a tomar o caminho para a ala destinada à todas as filhas, onde seu quarto de “jovem mulher” ficava, mas parou ao notar que suas irmãs mais velhas ocupavam uma das muitas salas desocupadas do castelo; Cassandra e Daniela praticamente rolavam no chão em meio a uma luta desajeitada, e Bela apenas brincou com a taça de vinho como se não aprovasse totalmente o comportamento das outras duas.
- O que estão fazendo?
- O que parece? – Cassandra grunhiu ao se colocar sobre Daniela e apertar seu rosto contra o chão – Tentando ensinar Daniela a se livrar de um ataque, ela ainda não é tão boa.
Daniela aproveitou o momento de distração para puxar Cassandra para baixo até que também estivesse com a cara no chão, mas não conseguiu se soltar, e Bela bufou.
- Até hoje não aprendeu nada, Daniela?
Com um sorriso cheio de má intenção, Daniela aguardou por alguns segundos e para juntar saliva o suficiente e estendeu a língua para lamber o rosto de Cassandra que a soltou imediatamente fazendo uma careta de nojo.
- Que nojo, ela me lambeu!
Alice e Bela riram, cúmplices ao assistir as travessuras das irmãs.
- Então... É isso que vocês fazem? – Alice perguntou ao se sentar ao lado de Bela no sofá – Sentam aqui, tomam vinho e lutam? Parece meio chato.
Cassandra se levantou e esfregou o rosto repetidamente, como que para tirar os últimos resquícios da saliva de Daniela que, por sua vez, também se levantou com um sorriso orgulhoso.
- Dessa vez, eu ganhei!
- Você jogou sujo – Cassandra reclamou – E fora das regras.
- Não existem regras aqui, você mesma disse que vale tudo.
De onde estava, Bela estendeu a taça em direção a Alice que negou com um aceno, e então suspirou de forma audível.
- É por isso que eu sou a filha preferida.
Daniela deu de ombros e falou com ares de superioridade:
- Só porque você quer, todas sabem que eu sou a preferida da Ella.
Já Cassandra apenas se jogou em uma poltrona, com a cara fechada, e pegou a taça ainda cheia sobre a mesa de centro.
- Olha como é ótimo ser a irmã do meio...
Alice revirou os olhos para a irmã.
- Tá reclamando de que? Eu sou a mais nova e a única filha biológica que sobrou, e nem assim sou a preferida de uma das duas.
- É, seu caso é bem pior que o meu. Pelo menos Judy gostava mais de mim, mas até ela sumiu e olha que não saía da minha cama quando era menor.
- Meu amigo disse que viu ela na casa da Irma, esperou o marido dela sair pra caçar e se enfiou lá dentro – Alice ergueu as sobrancelhas de modo sugestivo – Ensinou isso pra ela também?
- Não. O romance destrutivo é mais uma coisa da Bela.
- Achei que estava tudo bem com a Velaska – Alice se virou para Bela – Aconteceu alguma coisa que eu não sei?
- Ignore a Cassandra, ela só está sendo uma vadia porque Daniela lambeu a cara dela – Bela resmungou – Está tudo bem.
Como se a menção de seu nome tivesse lhe dado uma ideia brilhante, Daniela praticamente saltitou pela sala e agarrou as mãos de Alice.
- Sabe o que ia fazer você ser mais preferida pelas mães? Arranjar uma namorada. Você vai até o vilarejo, encontra uma garota bonita e apresenta ela como sua namorada.
Alice não soube o que responder, não sabia se Daniela estava ou não falando sério e, por sorte, Cassandra decidiu por ela.
- Daniela é meio dodói da cabeça, mas não está toda errada.
- Ignore as duas – Bela mandou – Mas aquela história toda com os garotos, principalmente aquele Adam, não é boa coisa.
- Ele é estranho. Um menino feio, como diz a Angie – Daniela concluiu – Então, nenhuma garota?
Alice tomou alguns segundos para pensar, não é como se ela nunca tivesse considerado a opção; toda a sua família era formada por mulheres que se relacionavam com mulheres, com exceção do tio Karl que não negava a “companhia” de ninguém, fosse homem ou mulher, Adam que ela não considerava realmente da família e tio Salv que não era realmente uma pessoa; Alice não considerava Miranda como parte da família ou humana, e nem mesmo sabia se ela conseguia se relacionar. Mas ter uma namorada não era uma coisa de outro mundo, só não parecia haver a oportunidade.
Pelo menos não até a última semana.
A garota devia ser um pouco mais velha, não muito, apenas um ou dois anos, tinha pele escura e cabelos cacheados que pareciam selvagens, ela não parecia se importar em domá-los e isso nem foi o mais interessante nela; o que Alice mais gostou foram os olhos, tão profundos e intensos, mais pareciam uma imensidão negra cheia de determinação.
- Ninguém? – Daniela insistiu com um sorriso confiante nos lábios – Eu acho que tem.
- Não importa, ela não gosta de mim. Na verdade, ela mal pareceu me suportar e me tratou bastante mal.
- Por que?
- Talvez porque eu sou uma Dimitrescu e a maior parte do vilarejo nos odeia, o que você acha, Daniela?
Cassandra bufou.
- A Daniela eu não sei, mas eu acho que esse pessoal exagera muito.
- Sério, Cassandra?
- Muito sério.
Enquanto Bela se ocupou em abraçar Alice e lhe proporcionar algum conforto, Daniela estava animada demais para ignorar.
- Qual o nome dela? Como se conheceram?
- Sarah Fiehar, ela mora no vilarejo e foi fazer entregas para tia Donna enquanto eu estava lá, ela se dá bem com a Esmeralda, elas falaram sobre ervas e coisas assim por um tempo – Alice contou – Esmeralda disse que algumas pessoas do vilarejo a chamam de bruxa, mas que isso é besteira.
Cassandra resmungou novamente sobre as pessoas do vilarejo serem idiotas, mas Daniela bateu palmas.
- Vou te dizer o que vamos fazer, nós esperamos a primavera quando estiver quente o suficiente pra sair, vamos até a casa dela, pegamos ela, amarramos e trazemos pro castelo!
- E como isso vai ajudar, Daniela?
- Vamos manter ela presa aqui sem poder sair, isso vai fazer com que ela passe mais tempo com você e vai se apaixonar. Pronto, problema resolvido.
- Não escuta ela, Alice – Cassandra a avisou ao tornar a encher a própria taça com vinho – Daniela é chegada em um romance que começa com cárcere privado.
- Um, Naomi e eu estamos juntas até hoje – Daniela listou – Dois, mãe também prendeu a Ella no castelo e estão juntas até hoje. Meu plano é infalível.
Completamente incrédula, era assim que Alice se sentia. Não tinha ideia de que o relacionamento de suas mães havia começado com um sequestro, mais fácil acreditar que aquela era a visão distorcida de Daniela.
- Não sei se estou confortável com essa conversa.
- Nem eu – Bela reclamou – E Cassandra está certa, não dê ouvidos a Daniela.
- Nem à Bela – Cassandra replicou – Todos os romances dela tem como base a destruição da família. Ela já foi apaixonada pela tia Donna, pela Ella e agora Velaska...
Alice se virou para a irmã, a expressão em seu rosto era uma mistura de nojo e consternação.
- Ainda não superei essa informação, Bela!
- Eu superei tia Donna, ainda não via Ella como mãe e não tem nada de errado com a Velaska. Não sei quantas vezes vou precisar repetir isso.
Daniela listou:
- Velaska tem cicatrizes no rosto como tia Donna, seios grandes como mãe e a personalidade do tio Karl. E pensando bem, já repararam que a Irma se parece muito com a Ella?
Em resposta, Casssandra jogou a cabeça para trás e gargalhou, até derramou um pouco de vinho no tapete e sua mãe ficaria furiosa se estivesse ali.
- Bela com certeza tem problemas com a família, Daniela adora um cárcere privado e Judy está dormindo com uma mulher casada. Quem diria que eu seria o exemplo de um relacionamento saudável, depois de tudo sou a irmã responsável.
Aquilo foi demais para Alice, que levantou-se rapidamente e ajeitou o vestido, passando as mãos para alisar vincos inexistentes só para ter o que fazer.
- Se me derem licença, vou para o meu quarto – disse ao recolher o livro deixado sobre o sofá – E Cass, seu relacionamento pode ser o mais saudável mas Agatha ainda manda em você, então não falaria das outras desse jeito.
- E eu ainda tentei ajudar você...
- Boa noite – Alice acenou para as irmãs – Obrigada por me aceitarem no clube de vocês, mas acho que estou traumatizada.
Bela se levantou e foi até Alice, lhe deu um beijo na testa e sorriu.
- Você é uma mulher agora, acho que consegue aguentar algumas provocações de irmãs. Agora vá ler seu livro, mais tarde passo no seu quarto para te colocar na cama e dar um beijo de boa noite.
Sentiu-se tentada a argumentar que Bela havia acabado de dizer que já era uma mulher, mas não o fez. Desde que podia se lembrar, Alice adorava estar com Bela em todas as oportunidades e passou mais noites do que podia contar em sua cama; se lhe dar um beijo de boa noite fizesse com que Bela se sentisse responsável, talvez até que estivesse lhe cuidando, então que assim fosse.
- Vou esperar.
Despediu-se das irmãs e tomou o caminho para seu quarto, queria treinar os mapas antes de ir para a cama mas sentia-se cansada e era provável que adormecesse antes mesmo de Bela lhe fazer uma visita.
[...]
Quando Ella e Alcina retornaram aos seus aposentos não havia mais sinal das filhas pelo castelo, provavelmente haviam se cansado e retornado aos próprios quartos para passar a noite; sempre era mais difícil fazer com que gastassem energia durante o inverno, consequentemente permaneciam perambulando pelo castelo até tarde, a que menos fazia isso era Cassandra que sempre era chamada por Agatha.
Assim que entraram em seus aposentos, começaram a se preparar para a noite e Ella esperou que Alcina se trocasse, assistindo-a vestir a camisola preta de seda que tanto adorava.
Quando Alcina a chamou para a cama, a Ella negou.
- Sente-se e espere, amor, tenho uma surpresa pra você.
Ainda que desconfiada, Alcina obedeceu e sentou-se em sua poltrona diante da lareira que ardia para aquecer o quarto. Ella desapareceu no banheiro e levou alguns minutos até retornar, havia tirado o vestido e o trocado por um robe leve de seda que deixava claro que estava usando pouca coisa, ou nada, por baixo.
Sem pressa, Ella caminhou até estar defronte à Alcina e sorriu ao desamarrar o robe e deixá-lo cair aos seus pés. Estava completamente nua, com a exceção de um colar bastante justo ao pescoço e que carregava o brasão Dimitrescu; Alcina a olhou com curiosidade, admirou a beleza que sempre a encantou e tentou decifrar o motivo da entrega total.
- Algo errado, minha senhora? – Ella sorriu de lado e lambeu os lábios – Achei que apreciaria a vista completa do seu bichinho.
Foi quando deu-se conta de que o colar era nada menos do que o primeiro que deu a Ella quando chegou no castelo, a coleira de seu bichinho, e isso fez algo queimar dentro de Alcina.
Sentiu sua buceta se contrair de desejo, sabia que sua calcinha devia estar molhada e bastou que Ella referisse a si mesma como bichinho para lhe deixar em tal estado. Tentando manter alguma dignidade, bem como seu posto, Alcina se recostou na poltrona e a olhou dos pés à cabeça para gravar aquela imagem; passou pelas pernas bem torneadas, os pêlos bem aparados, barriga, braços, seios... Tudo nela parecia delicioso, completamente entregue a Alcina como um bom bichinho deveria ser.
- De joelhos.
Ella obedeceu prontamente, colocou-se de joelhos e engatinhou em direção à Alcina que a parou. Pousou o pé no peito de Ella para impedi-la de continuar e a olhou de cima, com toda a superioridade de sua existência.
- Eu disse que podia se aproximar?
Ella negou.
- Fiz uma pergunta, bichinho, espero que me responda.
- Não, senhora.
- Melhor assim.
Alcina abaixou o pé e esperou alguns segundos para ordenar que Ella se aproximasse, era tudo uma questão de poder, de demonstrar quem estava no comando.
- Sabe o que fazer, bichinho – disse ao afastar as pernas – Seja boa, e será recompensada.
O olhar de desejo de Ella foi o bastante para deixá-la saber que estava adorando tanto Alcina, anos de casamento as fizeram entender uma a outra sem que palavras fossem necessárias e se entendiam muito bem na cama, fosse para fazer amor ou foder até que nenhuma das duas aguentasse mais.
Ella engatinhou até Alcina, passou o nariz por suas coxas e deslizou os lábios pela pele macia tentando prolongar o contato, ao que a condessa agarrou seus cabelos força e a puxou para frente.
- Eu disse para ser boa, obedeça, bichinho.
Sem pestanejar, Ella se enfiou entre as pernas de Alcina e lambeu a calcinha arruinada, completamente molhada. Um gemido quase gutural, cheio de desejo, escapou da garganta da condessa e Ella afastou a peça de roupa para chegar a onde tanto queria.
Gemeram juntas assim que sua língua tocou a buceta de Alcina sem nenhum empecilho. Ella, pelo gosto, e Alcina, pelo prazer de ter seu bichinho entre suas pernas.
Tentando estender o momento, Ella passou a língua entre as dobras quentes e molhadas de sua dona, apreciando o sabor e como as coxas dela tremiam ao redor de sua cabeça, mas Alcina estava impaciente e mais uma vez agarrou um punhado dos cabelos loiros para lhe mostrar o que fazer. Ella lambeu o clitóris inchado, sensível, e fechou os lábios ao redor para sugar com força, exatamente como Alcina gostava; chupou algumas vezes, adorando como sua senhora gemia e se movia contra seu rosto, passou a língua ao redor do clitóris antes de pressioná-lo com um pouco mais de força.
O aperto de Alcina no cabelo de Ella deixou de ser tão opressor, ao invés disso passou a guiá-la, mantê-la no lugar enquanto rebolava contra seu rosto em busca do prazer que se construía cada vez mais rápido.
A junção da língua de Ella trabalhando de forma tão habilidosa em seu clitóris, como sugava ora com força ora com suavidade, e a obediência ao encarnar seu bichinho de estimação a estava deixando louca, à beira de um prazer inenarrável. Agarrou os cabelos de Ella com um pouco mais de força e a puxou para mais perto, para que praticamente estivesse presa contra sua boceta.
Ella gemeu, mas o som foi completamente abafado. Pode sentir que seu queixo estava molhado, por onde a excitação de Alcina praticamente lhe escorria e sentiu sua própria boceta se apertar em antecipação ao que estava por vir.
Ao rebolar com força contra o rosto de seu bichinho, Alcina encontrou o ápice do prazer e gozou, deixando escapar um som entre um gemido e um rosnado.
Com as pernas ainda trêmulas, soltou Ella pra que se afastasse; a falta de oxigênio pareceu não incomodar seu bichinho, que sorriu de modo convencido ao postar-se de joelhos defronte a Alcina, o queixo ainda molhado e lábios inchados.
Apesar de ter gozado e ainda estar trêmula, Alcina se encontrava longe de estar satisfeita.
Levantou-se e caminhou lentamente até a cama, onde sentou-se contra a cabeceira e acenou para que se bichinho se aproximasse.
Ella obedeceu mais uma vez, foi até Alcina e subiu em seu colo como foi instruída. Estava completamente nua, entregue, enquanto a condessa, a senhora daquele castelo e sua dona, continuava vestida e no controle de tudo e isso só tornou melhor.
Alcina agarrou o rosto de seu bichinho com força suficiente para deixar marcas de unha em forma de meia lua em suas bochechas, muito devagar se aproximou e lambeu o queixo de Ella para saborear o próprio gosto ali, o que a fez gemer de modo quase pecaminoso.
Seu bichinho era tão previsível.
- Mostre como está ansiosa por mim.
A ordem fez Ella rebolar contra Alcina, a forma como estava sentada com uma das coxas grossas da condessa entre suas pernas fez com que estivesse na posição perfeita para cavalgá-la. Gemeu mais uma vez ao se esfregar contra a poderosa Lady Dimitrescu, sua boceta estava molhada e a fez deslizar sobre a pele macia; a fricção contra seu clitóris era boa, porém insuficiente e isso a deixou insatisfeita, tentou rebolar mais rápido, colocar mais pressão, mas Alcina agarrou seu quadril com a outra mão e a fez desacelerar.
- Não precisa ter pressa, bichinho.
- Por favor – Ella gemeu – Eu preciso disso.
- Sei disso, bichinho, e você terá.
Alcina soltou o rosto de Ella e deixou que as alças finas da camisola realizasse por seus braços, caindo apenas o suficiente para deixar os seios fartos à mostra.
Mesmo que não tivesse entendido a ordem implícita, nada teria impedido Ella de avançar em direção aos seios deliciosos de sua dona. Abocanhou o esquerdo e sugou o mamilo com força enquanto agarrou o direito com a mão, passou a sugar com a mesma intensidade com que se esfregava em sua coxa.
Ella gemeu, adorava os seios fartos de Alcina, como pareciam enormes em suas mãos e pesados, poderia passar horas adorando-os, chupando, e distribuindo beijos por eles; saber como eram sensíveis, como sua senhora adorava tê-los sugados por ela só tornava melhor. Alcina enterrou as unhas afiadas em seu quadril, a dor serviu como um estimulante e Ella se esfregou com mais força, sua boceta doendo de desejo para ser tocada de modo apropriado. Soltou o seio de Alcina e passou a dar atenção ao outro, brincou com a língua ao redor do bico já intumescido e sugou com força só para voltar a lamber em seguida.
Alcina estava adorando sentir como seu bichinho estava se esfregando em sua perna, completamente encharcada pelo prazer. Tão pronta...
Ao notar que Ella estava prestes a gozar, Alcina a fez parar e se afastar, o que seu bichinho fez a contragosto.
- Não olhe para mim desse jeito – Alcina riu com escárnio – Eu a deixaria mamar por horas se isso fosse satisfazê-la, mas preciso preencher você.
Sem dar a chance de Ella dizer qualquer coisa, Alcina a virou para que se sentasse em seu colo com as costas pressionadas em seu corpo e sorriu mais uma vez, ansiando o que estava por vir.
Ella não pode ver, dado a posição em que se encontrava, mas ouviu quando a seda da camisola de Alcina rasgou e viu apenas de relance as enormes asas se expandirem ao seu redor; dois tentáculos finos serpentearam por seus braços como se provasse a pele, o sabor da fina camada de suor que já a cobria, e se enrolaram em suas coxas e as separaram para mantê-la completamente aberta e entregue à Alcina.
- Agora, seja um bom bichinho – Alcina riu baixinho – Preciso estar dentro de você.
Ella sentiu um tentáculo mais fino deslizar por sua cintura até entre suas pernas, não precisou olhar para trás para saber que saía de sua senhora. Aquele tentáculo se esfregou em sua boceta molhada, em seguida foi pressionado contra o clitóris sensível e o acariciou lentamente, o que fez Ella tentar rebolar para conseguir algum atrito mas foi impedida pelos tentáculos que a seguravam firmemente contra Alcina.
- Seja um bom bichinho para mim...
Mãos grandes apertaram seus seios, prendendo com força os mamilos entre os dedos, e sua reação pareceu divertir a condessa. Ella fechou os olhos e gemeu com o estímulo, o tentáculo em seu clitóris diminuiu o ritmo, movendo-se lentamente como uma língua provocante, enquanto outro maior e mais grosso se aproximou e a penetrou.
Alcina riu ao brincar com os mamilos endurecidos contra as palmas de suas mãos, seu bichinho estava se comportando tão bem e tão entregue...
Ella foi penetrada repetidamente pelo tentáculo mais grosso, sentiu sua boceta se alargar para acomodá-lo e entendeu o que a Condessa queria dizer com preenchê-la.
Os tentáculos se moviam em sincronia, enquanto o maior e mais grosso entrava e saía de Ella o outro estimulava seu clitóris. Cada penetração a levava para mais perto do clímax tão esperado, o estímulo se tornava cada vez maior e a Ella se sentia pronta.
Um gemido escapou de sua garganta no momento em que mais uma onda de prazer atravessou seu corpo, mas não pode fazer mais nada enquanto Alcina a segurava e a usava como uma boneca, aquele tentáculo a fodendo com cada vez mais força.
Alcina passou o nariz pelo ombro de seu bichinho, farejou seu pescoço e sentiu o sangue dela praticamente cantar em seu chamado. Pressionou um beijo no ponto onde pulsava mais forte e segundos depois Ella assentiu, uma concessão muda para o pedido que Alcina ainda não havia feito.
Rasgou a pele macia com os dentes afiados, sentiu a carne sendo lacrada e o sangue vertendo para sua boca. O sangue de Ella ainda tinha um sabor maravilhoso apesar do mofo, quase doce e com um toque de amargor que dava total diferença, assim como seus vinhos; Alcina sugou e se alimentou dela, os sons produzidos por Ella já não passavam de gemidos estrangulados, enquanto continuava a beber.
Aumentou a pressão do tentáculo em seu clitóris, o maior agora dando estocadas firmes e lentas, até que Ella estremeceu e atingiu o orgasmo.
Alcina continuou movendo os tentáculos, mais devagar, apenas o suficiente para prolongar o prazer do seu bichinho.
Ella ficou mole contra seu corpo, completamente satisfeita, e Alcina recolheu os tentáculos e as asas para se mover com mais facilidade.
Seu peito estava coberto de sangue, assim como os lençóis brancos, e deixou que Ella escorregasse para a cama e a deitou de bruços. Alcina retirou o que restou de sua camisola em frangalhos e a calcinha encharcada, só então pairou sobre Ella e lambeu a ferida em seu pescoço para aproveitar tudo o que podia dela.
Alcina posicionou-se sobre Ella, apoiando a maior parte do seu peso contra a cama, e esfregou sua boceta dolorida por prazer contra a bunda macia do seu bichinho, logo espalhou sua excitação sobre a pele e conseguiu deslizar com facilidade. Não estava longe do próprio orgasmo, a pressão contra seu clitóris não era o suficiente mas em breve seria.
Fechou os olhos e imaginou seu bichinho completamente entregue, segura em seus braços, completamente aberta para ela e sendo fodida por seus tentáculos.
Alcina gemeu e trincou os dentes quando uma onda de prazer mais forte atravessou sua boceta, Ella também gemeu embaixo dela e notou que a cada investida pressionava seu bichinho para que se esfregasse contra a cama.
Se moveu com mais força, fazendo com Ella que gemesse em perfeita sincronia com seu próprio prazer. O cheiro de sangue ainda se espalhava pelo quarto e Alcina adorou.
Gozaram juntas dessa vez, e Alcina precisou se segurar para não desabar sobre Ella naquele mesmo instante.
Caiu de lado na cama e após alguns segundos para normalizar sua respiração, Alcina a puxou para perto a fim de abraçá-la.
- Não aguento outra... – Ella gemeu – Ainda estou dolorida.
Alcina lambeu a ferida exposta, na manhã seguinte não passaria de uma mancha quase imperceptível mas ainda parecia extremamente dolorida.
- Não sabe como gosto do meu bichinho – disse ao passar no nariz pelos cabelos de Ella, uma parte estava empapada de sangue e o cheiro a inebriou – Te adoro...
Com cuidado, tirou a coleira do pescoço de Ella e a jogou no chão, então voltou a beijar o rosto de sua esposa.
- Mas amo minha Ella. Lady Elleanor Dimitrescu, o amor que tornou todos os outros amores insignificantes.
Ella murmurou em resposta e tentou se virar na cama, ao que Alcina a ajudou para que ficasse aconchegada em seu peito naquele momento de tamanha fragilidade.
- Descanse, draga mea. Amanhã cuidarei de você, estarei aqui para protegê-la o tempo todo.
[...]
Ava olhou ao redor e aprovou a organização do quarto, havia muitas coisas novas preenchendo o espaço e cada uma tinha o seu lugar, e seu trabalho, todos os dias, era garantir que estivesse organizado.
As prateleiras acima da escrivaninha foram preenchidas com uma mistura de objetos que Ava considerava seus pequenos tesouros, não apenas os globos de neve que foram presentes de Jill, mas também uma pequena – porém crescente – coleção de brinquedos do Kinder ovo; Elyna trazia um, às vezes dois, por semana, e não raramente Claire os adicionava a lista de compra, e Ava os estava guardando.
Na mesa apenas a máquina polaroide (que precisou de mais papel filme após tantas fotos) e o caderno que Claire lhe deu para “escrever seus sentimentos”; dado as circunstâncias especiais de sua condição, Ava não podia simplesmente ir a um terapeuta para lidar com anos sendo tratada como ratinho de laboratório, e Claire até lhe ofereceu algum atendimento no Terra Save mas recusou-se terminantemente a falar com outra pessoa sobre isso. O caderno não passava de um moleskine de capa preta, pautado, simples e Ava demorou alguns dias para abri-lo e começar a escrever, mas quanto mais o fez mais fácil ficou.
Evitava escrever sobre suas experiências na Umbrella, em vez disso descrevia seu dia a dia na nova casa, coisas novas que aprendia, e lugares novos que visitava com Elyna; suas saídas ainda eram controladas, mas melhor do que nada.
Não teve outra experiência fora do corpo, aquilo parecia fora de alcance como um rádio muito distante da torre de transmissão, ou talvez precisasse praticar mais, então Ava se concentrou nisso.
Mas algo interessante havia acontecido no dia anterior.
Sentara-se em sua escrivaninha logo antes de ir dormir, escreveu até que seus olhos começassem a arder com o sono que se apoderava dela e praticamente caiu na cama depois disso. Não era boa em desenho, até Elyna – que desenhava realmente muito bem – desistiu de ensiná-la, então Ava não tentou novamente, mas na manhã seguinte havia um rabisco no canto inferior direito da página, uma rosa que jamais seria capaz de desenhar, e no meio do seu relato do dia anterior, em sua própria caligrafia, estavam as palavras “hoje eu toquei piano”.
Ava não sabia tocar piano, até onde conseguia se lembrar nunca havia tocado em um, então não sabia de onde aquilo veio e apenas ignorou.
Deu-se por satisfeita com a arrumação do quarto e saiu, tinha planos para a tarde e não gostava de deixar nada fora do lugar. Desceu as escadas e foi tão silenciosa quanto sempre, já havia aprendido onde cada degrau rangia e evitava esses lugares, preferia se mover sem que soubessem
Por isso, as mulheres na cozinha não a ouviram se aproximar e continuaram a conversar. Ava não precisava estar lá dentro para ouvir bem, e por mais que soubesse que espiar era errado, informações eram importantes demais para deixar passar.
A voz de Jill chegou abafada até ela.
- Sabe que seu irmão vai surtar quando souber, além de uma ex agente da Umbrella você está com uma garota infectada em casa.
- Não a chame assim – Claire rebateu.
- Não me leve a mal, adoro a Ava mas sabe que é isso que o Chris vai dizer, e que ela deveria estar em outro lugar.
- E é por isso que ele ainda não sabe, Jill, e quero que mantenha assim.
- Além disso – disse Alice – Desde quando seguimos as regras?
Houve um breve momento de silêncio e então Jill riu.
- Que se fodam as regras.
- Que se fodam as regras – Alice concordou.
Ava imaginou que estar em outro lugar seria para ser tratada e não gostou nada disso, mas se tranquilizou por saber que não estavam dispostas a mandá-la de volta.
- Temos que manter essa garota segura – Jill falou após um momento.
- Está se apegando, Jill? – Alice perguntou.
- Todas nós nos apegamos, Claire já é mãe em tempo integral e eu sou a tia legal demais pra ser chamada assim.
Ava resolveu escolher aquele momento para entrar na cozinha, Alice e Jill estavam sentadas à mesa enquanto Claire estava junto à bancada da pia fazendo sanduíches de manteiga de amendoim e geleia.
- Sente-se – Claire mandou – Vou te fazer um sanduíche.
- Com suco de maçã, por favor, não gosto de leite.
Não obteve uma resposta verbal, mas sentou-se mesmo assim e esperou pelo que estava por vir, e de todas as coisas, aconteceu a mais inusitada.
Alice deslizou um smartphone em sua direção.
- É pra você, já está carregado e pronto pra usar.
- Não era arriscado ter um telefone?
- Menos do que você ficar por aí – Alice soou séria – Se quer sair por aí com Elyna, vai ser desse jeito. Preste bem atenção, se for sair é pra levar o telefone, nada de deixar em casa, esquecer no silencioso ou deixar a bateria acabar, se certifique de sempre estar com ele ao alcance da mão.
Ava olhou para o aparelho.
- Podem me rastrear com ele?
- Ela é inteligente – Jill pareceu se admirar.
- Mais do que imagina – Alice respondeu – E não, Ava, não podemos te rastrear com ele, na verdade todos os celulares são rastreáveis de alguma forma, mas não instalamos nada com essa finalidade. É o seguinte, vamos respeitar sua privacidade e em troca você segue as regras.
- Estou ouvindo.
- Não importa onde estiver, com quem estiver ou o que estiver fazendo, se uma de nós ligar você atende e diz “bem”, então pode desligar e assim vamos saber que está bem.
- E como vou saber que não é uma ligação de chegagem e que precisam falar comigo?
- Vamos ligar mais uma vez ou mandar uma mensagem antes.
Claire se aproximou e colocou um prato na frente de Ava e outro para Jill, antes que pudesse dizer qualquer coisa a mulher cortou o seu (já sem as cascas) em diagonal.
- Por que ela ganha um sanduíche cortado e já sem as cascas e sua esposa fica sem nada? – Alice reclamou.
- Porque ela só come desse jeito, e é nossa filha – Claire explicou pacientemente – E se reclamar, da próxima vez te dou apenas as cascas – fez uma breve pausa e pousou a mão sobre o ombro de Ava – Nossos números estão na discagem rápida, caso aconteça alguma coisa e precise de ajuda.
- E o que exatamente poderia acontecer?
As três mulheres ficaram em silêncio, nenhuma parecia querer responder, e Claire se afastou com desculpa de fazer mais um sanduíche para Alice que se ocupou em servir um copo de suco para Ava.
- Nada vai acontecer – Alice garantiu – Estamos sendo mães super protetoras, só isso.
Jill mordeu seu sanduíche, soltou um muxoxo de aprovação e agradeceu a Claire com um acenou de cabeça antes de falar.
- Se dependesse de mim, colocaríamos um rastreador nesse celular – e piscou para demonstrar que estava brincando – Assim saberíamos onde está durante vinte e quatro horas.
- Quer dizer que agora tenho três mães em vez de duas? – Ava devolveu.
A outra mulher fez uma careta como se pensasse no assunto.
- Eu faria parte do trisal pela Claire, mas Alice não faz meu tipo.
- Ei! – Alice reclamou – Eu faço o tipo de todo mundo – e então completou rapidamente ao notar o olhar de Claire: - E sou comprometida.
Continuou a comer enquanto as mulheres discutiam, com Jill contando o que faria para conquistar Claire se ainda tivesse a chance e que esperaria Alice cometer um deslize para assumir seu lugar, até assumiria a filha adolescente muito alta que tinham para criar juntas; Alice rebateu, dizendo que chutaria a bunda de Jill antes que tentasse alguma coisa.
Colocou o prato na pia assim que terminou de comer, as duas mulheres ainda discutiam mas Claire parecia ter deixado o assunto de lado.
- Vou encontrar Elyna, prometo não demorar – Ava colocou o celular no bolso – E não preciso de três mães, esse é mais um trauma que vocês podem evitar não colocando Jill na relação de vocês.
Jill colocou a mão no peito e fez uma careta.
- Vou tentar não me ofender com isso.
Ava apenas acenou em adeus e se retirou da cozinha, mas não antes de ouvir Claire a lembrando de pegar o casaco para neve e os fones abafadores de ruídos.
Nevara na noite passada, então ainda havia neve espalhada pelas ruas e grandes montes nas calçadas depois que os vizinhos retiraram os excessos das portas de suas garagens; Claire obrigou Alice e Jill a fazerem o mesmo, Ava foi poupada do trabalho porque só tinham duas pás e por isso permaneceu sentada na varanda enquanto as observava fazer tudo (Jill lhe ofereceu dez dólares para fazer a parte dela, mas Ava negou e achou mais divertido assistir).
Enfiou as mãos no fundo dos bolsos do casaco, o sol deu um jeito de vencer as nuvens pesadas mas ainda estava frio o suficiente para congelar seus dedos e não queria colocar luvas tão cedo; puxou o capuz para cobrir o rosto e continuou a andar meio curvada para frente, não queria que prestassem atenção em seu rosto e se amaldiçoou por não ter prendido o cabelo para escondê-lo também. Finalmente gostou de sair, de realmente estar do lado de fora, mas todas aquelas pessoas a incomodavam e Ava quase preferia que não estivessem lá.
Não foi longe e tampouco encontrou Elyna, havia mentido sobre essa parte e até sentia-se um pouco culpada por fazer isso, mas também não precisava ser seguida por aí durante vinte e quatro horas, era mais do que capaz de cuidar de si mesma.
Andou por quinze minutos até chegar a um café de aparência tipicamente americana, com bancos acolchoados e uma jukebox no canto; adentrou o ambiente e tirou o capuz, naquele lugar acabaria atraindo mais olhares, e só depois procurou um lugar afastado no canto de onde pudesse olhar ao redor e ter uma vista privilegiada de todos.
Uma garçonete se aproximou, claramente de origem latina, e sorriu de forma prestativa ao estender um cardápio em direção a Ava.
- Não, obrigada – Ava mentiu: - Estou esperando uma amiga.
O crachá no uniforme da jovem dizia que seu nome era Blanca, tinha bochechas redondas e coradas por andar de um lado para o outro dia todo e, além disso, parecia gentil. Ela apenas disse que voltaria mais tarde e se afastou.
Um grupo de adolescentes barulhentos passou pelas portas e ocupou a cabine próxima à janela, cada um deles parecia tentar falar mais alto do que o outro e todos, sem exceção, estavam com os celulares nas mãos e pareciam checar a cada poucos segundos; aquele era um comportamento normal, checar mensagens e redes sociais (Elyna explicou que ninguém da idade delas fazia ligações), então Ava tirou o próprio celular do bolso e fingiu olhar para a tela a cada tanto tempo. Não tinha uma conta no Instagram ou facebook, nem passava horas no Tiktok, mas talvez devesse apenas para manter as aparências.
Não precisou esperar muito pela oportunidade que desejava, um casal de meia idade adentrou o café, o homem na frente guiando a mulher pela mão, ambos caucasianos, muito bem vestidos e já ficando grisalhos. Ava os observou com atenção, assistiu enquanto se sentavam um reservado no fundo, do lado oposto ao dela, e chamaram pela garçonete que os atendeu com a mesma gentileza que lhe dispensara anteriormente; mesmo de onde estava pode ouvir como o homem soou rude, como Blanca precisou forçar um sorriso e sair em direção à cozinha.
Foi quando Ava tomou sua decisão.
Elyna já havia lhe dito que pessoas como ela, imigrantes, por vezes eram consideradas de segunda classe e Ava decidiu no mesmo momento que odiava quem pensava desse jeito.
Levantou-se e andou calmamente até o casal, os dois conversavam como se não tivessem acabado de maltratar um ser humano.
- Com licença – Ava sorriu mostrando os dentes perfeitos e as covinhas – Boa tarde.
Eles sorriram de volta, afinal de contas, ela era branca, loira e de olhos azuis, e para aquele tipo de gente isso era o que contava, então Ava não se sentiu nem um pouco culpada pelo que estava prestes a fazer.
- Boa tarde, querida – a mulher sorriu de volta. Estava ficando grisalha mas exalava aquele ar de importância que algumas pessoas se davam, olhos acinzentados e algumas rugas marcaram os cantos dos lábios ao sorrir – Nós a conhecemos?
O homem a olhou, parecendo desconfiado, mas Ava manteve o sorriso.
- É claro que me conhecem, meu nome é Joan e somos vizinhas. Se lembra de mim, não é? Assei biscoitos e levei alguns para os senhores ainda ontem.
Os olhos da mulher saíram de foco por um segundo, como se tentasse se lembrar de um passado muito distante, e logo um sorriso meio abobado apareceu em seu rosto.
- Me lembro de você, levou biscoitos ontem.
O homem a olhou como se não entendesse, ainda estava de fora da brincadeira.
Ava insistiu.
- Sou Joan, lembra? Somos vizinhas e a senhora disse que seu marido amou os biscoitos.
- Eu me lembro, Joan – a mulher sorriu e olhou para o marido: - Você disse que amou os biscoitos.
- Que biscoitos? Do que está falando?
Ava virou-se para ele.
- Sou sua vizinha, levei biscoitos ontem e o senhor os adorou – e então reforçou, colocando um pouco mais de persuasão nas palavras – Moro duas casas acima.
- Você mora duas casas acima – ele respondeu bobamente.
- Isso mesmo, agora acho que seria gentil se me convidassem para comer. Não acham que seria gentil?
- Achamos que seria gentil – responderam em uníssono.
Menos de um segundo depois aquele ar de confusão desapareceu, a mulher escorregou para o lado para que Ava pudesse se sentar e ambos começaram a elogiar os biscoitos que haviam comido; realmente muito bons, o homem afirmou, e esperavam que Joan pudesse aparecer mais vezes.
- Talvez, agora só quero um chocolate quente e panquecas com calda – Ava sorriu ao se sentar – E sejam gentis com a garçonete, ela não tem culpa de nada.
Não perguntou os nomes deles, não se importava nem um pouco com quem eram, e deixou que falassem sobre “sua doce vizinha Joan que levou biscoitos deliciosos em uma tarde fria de inverno” e se sentiu muito bem com isso; nem precisou se esforçar muito ou inventar detalhes, eles apenas aceitaram as sugestões e Ava sentiu mais do que satisfação consigo mesma.
Foi bom. Uma sensação de prazer indescritível.
A garçonete voltou com duas xícaras de café e uma fatia de torta que o casal dividiria, ela pareceu surpresa ao ver Ava sentada com eles mas a mulher logo se adiantou com um sorriso nos lábios.
- Panquecas com calda e um chocolate quente para nossa queridinha aqui, por favor.
O “por favor” pareceu assustar Blanca mais do que a presença de Ava na mesa, então apenas assentiu e se afastou.
- Muito bem – Ava elogiou colocando um pouco mais de persuasão em sua voz – É melhor tratarem bem quem serve a comida de vocês.
- É muito melhor quando os tratamos bem – o homem concordou – Muito melhor.
A mulher assentiu, como se concordasse com o marido e Ava sorriu mais uma vez.
Tão divertido. Tão fácil.
Poderia fazer com que subissem naquela mesa e tirassem as calças pela cabeça na frente de todos, mas isso chamaria a atenção. Só saber que podia fazer já a deixava feliz.
Blanca trouxe as panquecas e o chocolate quente, Ava comeu com avidez e sem trocar palavras com seus companheiros de mesa, não passavam de uma carteira para pagar por sua comida.
Assim que terminou, afastou o prato e olhou para que devolveram o olhar com grandes e assustadores sorrisos, como se esperassem pelo próximo pedido, como se desejassem a próxima ordem.
- Acho melhor ir andando, tenho que encontrar uma amiga. Paguem a conta e sejam gentis – Ava ia se levantar, mas parou e sussurrou para a mulher – Acho que uma nota de cinquenta cobre a gorjeta da Blanca por ter que aturar vocês dois.
- Também acho.
- Ótimo. Adiós.
Saiu da mesa e foi até a porta, ao olhar para trás os dois olhe acenaram alegremente e ela acenou de volta.
A rua estava um pouco mais deserta quando saiu, a maioria das pessoas preferia se locomover em seus carros quentes e confortáveis ao andar durante o inverno, mas ainda havia alguns transeuntes olhando as vitrines anunciando promoções de natal; faltavam quatro dias e aquele seria o seu primeiro natal, o primeiro desde que conseguia se lembrar, e estava ansiosa por isso.
Nuvens pesadas já se juntavam no céu e cobriram parcialmente o sol, logo estaria bastante escuro e era melhor voltar para casa.
No meio do caminho passou por um playground vazio, era comum ver crianças por ali mas todos foram espantados pela iminência da neve; Ava resolveu cruzá-lo para cortar caminho, já havia feito isso com Elyna algumas vezes antes e não havia motivos para não fazê-lo novamente.
Como que invocada por seus pensamentos, Elyna virou a esquina e abriu um sorriso enorme (e meio idiota) ao vê-la.
- Ei, você! – Elyna gritou e correu em sua direção – Fui na sua casa, mas disseram que você saiu pra me encontrar então eu menti que a gente se desencontrou, te dei cobertura, sabe? Onde você foi? Se divertiu? Resolvi vir te esperar aqui, mas precisei usar o banheiro na lanchonete do outro lado da rua, até que é bem limpinho.
- Como você consegue falar tanto sem parar pra respirar?
- É um talento! – Elyna sorriu e tentou passar o braço ao redor dos ombros de Ava, o que ficou estranho por ser tão mais baixa que a loira – E aí, o que vamos fazer?
- Estou voltando pra casa.
- Legal, posso ir também? Seria melhor você aparecer lá comigo, e se der pra ficar pro jantar...
- Você pode ir, já está sempre lá mesmo.
- É como se eu fosse da família, né? – Elyna sorriu.
Não teve coragem de desanimar Elyna, não depois que teve que matar o irmão zumbi dela. Notou que Elyna usava óculos escuros, o que não era incomum, mas a intrigou porque o sol estava desaparecendo rapidamente.
- Por que está de óculos?
Elyna sorriu e os abaixou, o que a permitiu ver que os olhos violetas brilhavam mais do que o normal, de forma quase sobrenatural, e se tornava evidente com a escuridão se aproximando.
- Por que estão assim?
- Acontece às vezes – Elyna deu de ombros – Rebecca fez uns testes hoje e pingou colírio, talvez seja isso.
Queria perguntar que tipo de testes, mas poderia fazer isso quando estivessem em casa.
- Pode dormir em casa também, se quiser. Mas Jill ainda está lá, então precisa dormir no meu quarto.
- Por mim, tudo bem.
Elyna desistiu de continuar com o braço ao redor dos seus ombros e resolveu segurar sua mão, à essa altura Ava já estava costumada com o toque e a insistência em manter contato físico que a morena parecia ter. A mão de Elyna era quente, e não fossem algumas calosidades provenientes dos treinos seria incrivelmente macia, e era como se suas mãos se ajustassem perfeitamente uma a outra.
Pretendia contar a Elyna sobre sua pequena aventura no café, sempre podia confiar nela pra essas coisas, mas o som de passos a interrompeu e, pela forma como a outra reagiu, também deve ter ouvido, e as duas se viraram juntas.
Dois garotos se aproximavam, ambos usando casacos grandes demais para eles, o mais alto deu um passo em frente e enfiou a mão no bolso, deixando transparecer o cabo de um canivete; embora o mais alto tenha tomado a dianteira, ficou claro que o outro dava as ordens, olhava para Ava e Elyna como se as analisasse friamente e calculasse suas chances.
Ava também calculou suas chances e sabia pelo menos quinze maneiras de desarmar o mais alto e quebrar seu braço em três partes, o que o faria cair no chão e gritar de dor, então só teria tempo de quebrar o nariz do outro com um soco, talvez deslocar um dos joelhos, e correr antes que os gritos alarmassem os vizinhos.
- Anda logo com isso – mandou o mais baixo e atarracado dos dois – Celulares, dinheiro... Sejam gentis, moças.
Elyna fez menção de avançar sobre o mais alto assim que ele tirou o canivete do bolso, Ava a impediu; um soco dela provavelmente arrancaria o maxilar dele ou o colocaria em coma, de qualquer forma seria um grande estrago e divertido de se assistir, mas quem disse que ela também não poderia se divertir?
Ao falar, dirigiu-se ao líder e não ao mais alto.
- Esse cara? É sério? Depois do que ele fez com seu irmãozinho?
O mais alto riu.
- Boa tentativa, eu sou o irmão mais novo dele!
Ava não desistiu, colocou mais persuasão na voz e um belo sorriso debochado no rosto:
- Se alguém batesse na minha irmã daquele jeito... – ela assoviou – Eu teria matado o filho da puta. Mas você é só um covarde, né?
O mais alto riu mais uma vez, incrédulo, e então olhou para o irmão que parecia tremer enquanto a raiva colérica crescia dentro dele.
- Eu não sou covarde!
- Tá falando do que, Ron? – o mais alto esqueceu o canivete e se virou para o irmão – Ela não sabe de nada, eu sou seu irmão.
- Então prova – disse Ava especialmente para Ron – Acaba com ele.
Ron partiu pra cima do irmão mais novo com o mesmo ímpeto que um jogador de futebol americano faria com um adversário, ambos caíram no chão e no segundo seguinte ele estava amassando a cara do irmãozinho com um soco depois do outro.
Assistiram em silêncio, ainda de mãos dadas, o sangue se esparramar pela neve a manchando de um vermelho profundo; o mais alto chorou e pediu clemência, ou pelo menos foi o que Ava imaginou, já não dava para entender o que dizia enquanto tentava cuspir os dentes quebrados, e a mão de Ron já estava machucada em vários pontos mas ele não parou de bater.
- Você é incrível, sabia? – Elyna sussurrou quase em devoção – Me dá um pouco medo, mas te acho incrível.
O telefone em seu bolso tocou, Ava o pegou e olhou para a tela onde o nome de Claire brilhou e iluminou seu rosto.
Deslizou o dedo para atender a chamada e o levou à orelha.
- Estou muito bem.
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