Annabeth observou as letras em grego mudarem para latim e entregou o livro a Jason. — Percy III. — Leu.
PERCY NÃO TINHA MEDO DE FANTASMAS, o que era bom. Metade das pessoas no acampamento estavam mortas.
— Como assim?
— Vocês vivem com fantasmas? — Perguntou Will, surpreso.
— Isso não parece muito agradável. — Leo comentou.
— Se tratá-los gentilmente, eles serão legais com você. — Respondeu Jason, que sempre fora educado com os lares do acampamento romano.
Guerreiros de roxo cintilante estavam parados do lado de fora do arsenal, polindo espadas fantasmagóricas. Outros andavam na frente do quartel.
Um menino fantasma perseguia um cachorro fantasma pela rua. E nos estábulos, um cara grandalhão de brilho vermelho com cabeça de um
lobo cuidava de uma manada de… aquilo eram unicórnios?
— Sempre quis ver um unicórnio! — Exclamaram algumas crianças surpresas.
— Você já relou em um? — Drew perguntou imaginando as belas criaturas que deviam ser os unicórnios.
Jason riu.
— Já, e foi uma experiência nem um pouco agradável. — Falou deixando muitos confusos pensando no porquê de mexer com essas belas e dóceis criaturas poderia ser ruim.
— Não? — Disse Piper. — Por quê?
— Eles são dóceis e tudo mais, mas se dão melhores com garotas, e principalmente se forem virgens. Mas acho que o fato de eu não saber disso e por ser filho de Júpiter não me ajudou muito.
Nenhum dos campistas prestava muita atenção nos fantasmas, mas
enquanto a comitiva de Percy caminhava, com Reyna na liderança e Frank e Hazel de cada lado, todos os espíritos pararam o que estavam fazendo e encararam Percy. Alguns pareceram zangados. O menininho fantasma gritou algo como greggus! e ficou invisível.
Qualquer grego dali que lesse a palavra podia traduzi-la facilmente, mesmo estando em latim. Mas ouvindo a pronúncia não faziam idéia do que Jason havia falado. E Jason se preocupou pensando no que aconteceria se os romanos pensassem em Percy como uma ameaça.
Percy também queria poder ficar invisível. Depois de algumas semanas sozinho, toda aquela atenção o deixava apreensivo. Ele ficou entre Hazel e Frank e tentou parecer invisível.
— Impossível! — Exclamaram Clarisse e Annabeth junto de metade do acampamento.
— Estou vendo coisas? — Ele perguntou. — Ou eles são…
— Fantasmas? — Hazel se virou. Ela tinha olhos assustadores, como
catorze quilates de ouro. — São lares. Deuses da casa.
— Deuses da casa!
— Deuses da casa?
— Deuses da casa.
— Deuses da casa. — Percy disse. — Tipo… Menores que os verdadeiros deuses, mas maiores que os deuses de apartamento?
Jason fez cara de poker e muitos bateram as mãos na testa.
— Já tava' demorando... — Malcolm falou
— São espíritos ancestrais. — Frank explicou. Ele havia tirado seu elmo, revelando um rosto infantil que não combinava com o corte de cabelo militar ou seu corpo robusto. Ele parecia uma criança que tinha tomado esteróides e entrado para a Marinha. — Os lares são um tipo de mascotes. — Ele continuou. — Na maior parte do tempo eles são inofensivos, mas nunca os tinha visto tão agitados.
— Eles estão olhando para mim. — Percy disse. — Um fantasma criança me chamou de greggus. Meu nome não é Greg.
— Graecus. — Hazel disse. — Assim que se acostumar em estar aqui, vai começar a entender latim. Semideuses tem um talento natural para isso. Graecus significa grego.
— Ih, rapaz.
— Isso é ruim? — Percy perguntou.
Frank limpou a garganta.
— Talvez não. Você tem esse tipo de aparência, o cabelo escuro e tudo. Talvez eles achem que na verdade você é grego. Sua família é de lá?
— Você não tem idéia, é mais do que a gente consegue contar!
— Não faço ideia. Como eu disse, minha memória sumiu.
— Ou talvez… — Frank hesitou.
— O quê? — Percy perguntou.
— Acho que nada. — Frank disse. — Os romanos e gregos tinham uma antiga rivalidade. Às vezes romanos usam graecus como um insulto para alguém estranho… Um inimigo. Não me preocuparia com isso.
Alguns gregos olharam para Jason de cara fechada.
— Olha só, em minha defesa eu só xinguei alguém de grego umas três vezes. — Piper revirou os olhos achando graça dos olhares acusadores que eram mandados para seu namorado.
Ele soou bem preocupado.
Eles pararam no meio do acampamento, onde duas ruas se uniam em um T. Uma placa rotulava uma rua como via praetoria. A outra rua, atravessando o meio do acampamento, estava rotulada como via principalis.
Debaixo dos marcadores estavam placas pintadas à mão como BERKELEY A 8 QUILÔMETROS; NOVA ROMA A 1,6 QUILÔMETROS; ROMA ANTIGA A 11648 QUILÔMETROS; HADES A 3696 QUILÔMETROS (apontando diretamente para baixo); RENO A 332 QUILÔMETROS, E MORTE CERTA: VOCÊ ESTÁ AQUI!
— Pelo menos avisam. — Falou um garoto de Deméter.
Para uma morte certa, o lugar parecia bem limpo e ordenado. Os prédios eram caiados, arrumados com exagero como se o acampamento
tivesse sido projetado por um professor de matemática espalhafatoso. Os quartéis tinham varandas sombrias, onde os campistas descansavam em redes, jogavam cartas e tomavam refrigerante. Cada dormitório tinha uma coleção diferente na frente mostrando algarismos romanos e vários animais — águia, urso, lobo, cavalo, e algo que parecia um hamster.
Junto da Via Praetoria, filas de lojas anunciavam comida, armadura,
armas, café, equipamentos de gladiador e retalhos de toga. Uma
concessionária de bigas tinha um grande anúncio na frente: CAESAR XLS COM FREIO AUTOMÁTICO, NENHUM DENÁRIO A MENOS!
— O que é denário?
Jason e Annabeth abriram a boca para responder, mas um dos irmãos da filha de Atena foi mais rápido.
— O sistema monetário romano incluía o denário, uma pequena moeda de prata que era a de maior circulação no Império Romano. — Jason levantou uma sobrancelha com a resposta do garoto, parecia até uma resposta tirada da Wikipédia.
Em um canto da calçada estava o prédio mais impressionante —
uma cunha de dois andares, feita de mármore branco, com pórticos de colunas, como um banco à moda antiga. Guardas romanos estavam em frente a ele. Em cima da porta, estava um cartaz grande e roxo com letras SPQR douradas bordadas dentro de uma coroa de louros.
— Seu quartel-general? — Percy perguntou.
Reyna olhou para ele, seus olhos ainda frios e hostis.
— É chamado de principia. — Ela examinou a plebe de campistas
curiosos que os tinham seguido desde o rio. — Todos voltem às suas
funções. Darei uma atualização à vocês na reunião de hoje à noite. Lembre-se, teremos jogos de guerra depois do jantar.
— Saudade desses jogos. — Disse Jason.
— Como é? — Leo perguntou.
— É tipo Caça a Bandeira, só que um pouco mais agressivo e é dividido por Coortes.
Ninguém sabia o que eram as Coortes mas não perguntaram.
O pensamento do jantar fez o estômago de Percy roncar. O aroma de churrasco do refeitório deu água na boca. A padaria no fim da rua também cheirava muito bem, mas ele duvidava que Reyna o liberasse para ir até lá.
A multidão se dispersou relutante. Alguns comentaram sobre as
chances de Percy.
— Ele está morto. — Disse um.
— Direto.
— Igual ao Quíron quando a gente faz perguntas de mais. Sem ofensas. — Disse Connor. Quíron apenas concordou com a cabeça.
— Devem ter sido aqueles dois que encontraram ele. — Disse outro.
— É. — Murmurou outro. — Deixe-o se juntar à Quinta Coorte. Gregos e geeks.
Jason fechou a cara, e como todos olhavam para ele que lia o livro, perceberam.
— O que tem na Quinta Coorte? — Piper perguntou
— Digamos que quem fica na Quinta Coorte são os "zoados" do Acampamento. Após alguns acontecimentos, começaram a respeitar mas parece que voltou a como era antes depois que sumi.
Algumas crianças riram disso, mas Reyna fez uma careta para eles,
que sumiram.
— Hazel. — Reyna disse. — Venha conosco. Quero seu relatório do
que aconteceu nos portões.
— Eu também? — Frank disse. — Percy salvou minha vida. Temos
que deixá-lo…
Reyna deu a Frank um olhar tão severo que ele deu um passo para
trás.
— Devo te lembrar, Frank Zhang, — ela disse — que você está no
próprio probatio. Você tem causado problemas o suficiente essa semana.
As orelhas de Frank ficaram vermelhas. Ele brincava com um
pingente amarrado no pescoço. Percy não tinha prestado muita atenção naquilo, mas parecia um crachá feito de chumbo.
— Vá ao arsenal. Vou te chamar se precisar.
— Mas… — Frank parou. — Sim, Reyna.
Ele correu de Reyna, que apontou para Hazel e Percy na direção do
quartel-general.
— Agora, Percy Jackson, vamos ver se podemos melhorar sua memória.
O principia era mais impressionante por dentro. No teto brilhava um mosaico de Rômulo e Remo debaixo de sua mãe loba adotada (Lupa havia contado essa história milhões de vezes para Percy). O chão era de mármore polido. As paredes estavam envoltas em veludo, então Percy se sentiu dentro da tenda de acampamento mais cara do mundo.
Ao longo das paredes estava uma exposição de cartazes e varas de madeira cravadas com medalhas e
bronze – símbolos militares, Percy adivinhou. No centro estava um
mostruário vazio, como se o cartaz principal tivesse sido retirado para a limpeza ou algo do tipo.
No canto, uma escada levava para baixo. Estava bloqueada por uma
fileira de barras de ferro como uma porta de prisão. Percy se perguntou o que havia lá em baixo – monstros? Tesouros? Semideuses amnésicos que tinham conhecido o lado mau de Reyna?
— Ela não é tão ruim assim... — Jason a defendeu. Piper se sentiu ameaçada e Drew odiou.
No centro da sala, uma longa mesa de madeira estava repleta de
pergaminhos, notebooks, tablets, adagas, e uma tigela grande cheia de jujubas, que parecia estar fora do lugar. Duas estátuas de galgos em tamanho real – uma prata e uma dourada – ladeavam a mesa. Reyna foi para trás da mesa e se sentou em uma das duas cadeiras de encosto alto. Percy desejou poder sentar na outra, mas Hazel ficara de pé. Percy teve a sensação que ele também teria que ficar.
— Quem senta na outra cadeira? — Perguntou Pólux.
— Eu.
— Então… — ele começou a dizer.
As estátuas de cachorro arreganharam os dentes e rosnaram. Percy franziu o cenho. Normalmente ele gostava de cachorros, mas aqueles o encaravam com olhos de rubi. Seus dentes pareciam tão afiados quanto navalhas.
— Quietos, meninos. — Reyna disse aos galgos.
Eles pararam de rosnar, mas continuaram vendo Percy como se
estivesse imaginando-o em um saco de ração.
— Eles não atacarão, — Reyna disse — a menos que você tente roubar alguma coisa, ou a menos que eu mande. Eles são Argentum e
Aurum.
— Prata e Dourado. — Percy disse. Os significados em latim apareceram em sua cabeça, assim como Hazel havia dito que aconteceria.
Jason olhou confuso para o livro.
— Como ele sabe o significado se não é grego?
Quíron começou a achar o chão bem interessante.
— Isso é algo que me pergunto a tempos, pois não é a primeira vez que ele traduz latim espontaneamente. — Confessou Annabeth.
Ele quase perguntou qual era qual. Então percebeu que era uma pergunta idiota.
Reyna colocou sua adaga na mesa. Percy teve a vaga sensação que eles já haviam se visto antes. Seu cabelo era preto e liso como uma pedra
vulcânica, trançado nas costas. Ela tinha a pose de um espadachim –
relaxada, mas ainda assim vigilante, como se pronta para entrar em ação a qualquer momento. As linhas de preocupação ao redor dos olhos a faziam parecer mais velha do que provavelmente era.
— Eu acho que a conheço também. — Annabeth admitiu estreitando os olhos tentando se lembrar.
— Devemos nos conhecer. — ele decidiu. — Não lembro quando.
Por favor, se puder me contar qualquer coisa…
— As coisas mais importantes primeiro. — Reyna disse. — Quero
ouvir sua história. Do que você lembra? Como chegou aqui? E não minta. Meus cachorros não gostam de mentirosos.
Argentum e Aurum rosnaram para enfatizar o ponto.
Percy contou sua história – como ele havia acordado na mansão em ruínas nas florestas de Sonoma. Ele descreveu o tempo com Lupa e sua
matilha, aprendendo a linguagem de gestos e expressões, aprendendo a sobreviver e a lutar.
Lupa o ensinou sobre os semideuses, monstros e deuses. Ela tinha explicado que ela era uma dos espíritos guardiões da Roma Antiga.
Semideuses como Percy ainda eram responsáveis por continuar as tradições romanas nos tempos modernos – lutar com monstros, servir aos deuses, proteger mortais, e sustentar a memória do império. Ela tinha perdido semanas treinando-o, até ele estar tão forte, resistente e perverso quanto um lobo. Quando ela ficou satisfeita com suas habilidades, mandou-o para o sul, dizendo que se sobrevivesse na jornada, deveria encontrar uma nova casa e recuperar sua memória.
Nada pareceu surpreender Reyna. De fato, ela pareceu achar isso bem comum – exceto por uma coisa.
— Nenhuma memória? — ela perguntou. — Você não se lembra de nada ainda?
— Partes vagas e peças soltas. — Percy olhou para os galgos. Ele não quis mencionar Annabeth. Pareceu muito particular, e ele ainda estava confuso sobre onde encontrá-la. Ele tinha certeza que eles tinham se conhecido em um acampamento – mas esse não parecia ser o lugar certo.
Além disso, ele ficou relutante em compartilhar sua única memória
clara: o rosto de Annabeth, o cabelo loiro e os olhos cinzentos, o jeito que ela ria, atirando seus braços ao redor dele, e dando um beijo nele sempre que fazia algo estúpido.
Ela deve ter me beijado muito, Percy pensou.
Todos os olhares se voltaram para a garota e até mesmo algumas risadinhas foram ouvidas, Annabeth sentia seu rosto arder e tinha certeza de que estava ficando vermelha, para não continuar passando vergonha, afundou o rosto no ombro de uma de suas irmãs.
Ele temia que se falasse sobre essa memória para alguém, ela
evaporaria como um sonho. Ele não podia arriscar.
Reyna girou a adaga.
— A maior parte do que descreveu é normal para semideuses. Até certa idade, de um jeito ou de outro, encontramos o caminho para a Casa dos Lobos. Somos testados e treinados. Se Lupa achar que somos dignos, nos manda para o sul para entrar para a legião. Mas nunca tinha ouvido falar de alguém que perdeu a memória. Como encontrou o Acampamento Júpiter?
Percy contou a ela sobre seus três últimos dias – as górgonas que não
morreriam, a senhora que virou uma deusa, e finalmente quando conheceu Hazel e Frank no túnel da colina.
Hazel continuou a história dali. Ela descreveu Percy como corajoso e
heróico, o que o deixou desconfortável. Tudo o que ele havia feito tinha sido carregar uma senhora hippie.
— Uma deusa. — Os campistas corrigiram.
Reyna o estudou.
— Você é velho para um recruta. Tem o quê, dezesseis?
— Por aí — Percy respondeu.
— Se você perdeu tantos anos sozinho, sem treino ou ajuda, devia
estar morto. Um filho de Netuno? Você deveria ter uma aura poderosa que atrairia todos os tipos de monstros.
— É. — Percy disse. — Fui avisado sobre esse cheiro.
Reyna quase sorriu para ele, o que deu esperança a Percy. Talvez ela
fosse humana, afinal de contas.
— Você deve ter ficado em algum lugar antes da Casa dos Lobos. —
Ela disse.
Percy encolheu os ombros. Juno havia dito alguma coisa sobre ele estar adormecido, e ele tinha uma sensação vaga que ele tinha ficado mesmo – talvez por um bom tempo. Mas isso não fazia sentido.
Reyna suspirou.
— Bem, os cachorros não te comeram, então acho que está falando a verdade.
— Ótimo. — Percy disse. — Da próxima vez, posso passar pelo
polígrafo?
Reyna se levantou. Ela passeou na frente dos cartazes. Seus cachorros de metal a viam ir e voltar.
— Mesmo se eu aceitar que você não é um inimigo. — Ela disse. — Você não é um recruta comum. A Rainha do Olimpo simplesmente não aparece no acampamento, anunciando um novo semideus. Da última vez que um deus maior nos visitou em pessoa foi… — Ela balançou a cabeça. — Só ouvi lendas sobre essas coisas. E um filho de Netuno… não é um bom presságio. Especialmente agora.
— O que há de errado com Netuno? — Percy perguntou. — E o que quer dizer com especialmente agora?
Hazel deu a ele um olhar de aviso.
Reyna continuou passeando.
— Você lutou com as irmãs da Medusa, que não tem sido vistas há
milhares de anos. Você agitou nossos Lares, que estão te chamando de
graecus. Você veste símbolos estranhos – essa camisa, as contas no seu pescoço. O que querem dizer?
Percy olhou para sua camiseta laranja esfarrapada. Devia ter tido palavras alguma vez, mas estavam muito desbotadas para ler. Ele deveria ter
jogado a camisa fora algumas semanas atrás. Estava em pedaços, mas não conseguia suportar a idéia de se livrar disso. Só ficou lavando-a em córregos e fontes de água da melhor maneira que conseguia e a colocando de volta.
Quanto ao colar, cada uma das quatro contas de argila estava decorada com um símbolo diferente. Uma mostrava um tridente. Outra era uma miniatura do Velocino de Ouro. A terceira estava gravada com o desenho de um labirinto, e a última tinha a imagem de um prédio – talvez o Empire State Building? – com nomes gravados ao redor que Percy não reconheceu. As contas pareciam importantes, como fotos de um álbum de família, mas ele não conseguiu se lembrar do que significavam.
Todos os que conheciam Percy e que tinham quase as mesmas contas que ele sorriram, até mesmo Clarisse sorriu.
— Não sei. — Ele disse.
— E sua espada? — Reyna perguntou.
Piper e Annabeth franziram o cenho.
— Percy não falou da espada.
Percy checou o bolso. A caneta havia reaparecido como sempre. Ele pegou-a, mas então percebeu que nunca tinha mostrado a espada para Reyna.
— Eu consigo visualizar o rosto dela perfeitamente, mas não consigo me lembrar de onde eu a vi. — Falou Annabeth. Jason achou tudo muito estranho.
Nem mesmo Hazel e Frank a tinham visto. Como Reyna sabia sobre ela?
Tarde demais para fingir que ela não existia… ele destampou a caneta.
Contracorrente apareceu inteira. Hazel ofegou. Os galgos rosnaram
apreensivamente.
— O que é isso? — Hazel perguntou.
— Nunca tinha visto uma espada assim.
— Eu já. — Reyna disse sombriamente. — É muito antiga…um modelo grego. Costumávamos ter algumas no arsenal antes de… — Ela
parou. — O metal é chamado bronze celestial. É mortal para monstros, como o ouro imperial, mas muito raro.
— Ouro imperial? — Percy perguntou.
Reyna desembainhou a adaga. Com certeza a lâmina era de ouro.
— O metal foi consagrado nos tempos antigos, no Panteão de Roma. Sua existência era rigorosamente guardada em segredo dos imperadores – um jeito de seus campeões matarem monstros que ameaçavam o império. Costumávamos ter mais armas como essa, mas agora… bem, nós as riscamos da lista. Eu uso essa adaga. Hazel tem uma spatha, uma espada de cavalgaria. Mas essa sua arma não é romana, de qualquer modo. É outro sinal que você não é um semideus comum. E seu braço…
— O que tem? — Percy perguntou.
Reyna ergueu seu próprio antebraço. Percy não tinha notado antes, mas ela tinha uma tatuagem: as letras SPQR, espadas cruzadas e uma tocha, e debaixo disso, quatro linhas paralelas como códigos de barra.
Inconscientemente, os campistas e até o próprio olharam para o braço do romano.
Percy olhou para Hazel.
— Todos a temos. — Ela confirmou, erguendo seu braço. — Todos os membros completos da legião têm.
A tatuagem de Hazel também tinha as letras SPQR, Mas ela só tinha um código de barra, e seu emblema era diferente: um grifo preto como uma
cruz com os braços curvos e uma cabeça.
Percy olhou para seus próprios braços. Alguns arranhões, lama, e
uma mancha de Crispy Cheese ‘n’ Wiener, mas sem tatuagens.
— Então você nunca foi um membro da legião. — Reyna disse. — Essas marcas não podem ser tiradas. Acho que talvez… — Ela balançou a cabeça, como se estivesse descartando uma idéia.
— Reyna parece a minha mãe, o tempo todo ela começa a falar e não termina a frase, me da uma agonia.
Hazel deu um passo à frente.
— Se ele sobreviveu sozinho todo esse tempo, talvez tenha visto Jason. — Ela se virou para Percy. — Você nunca viu um semideus como nós antes? Um cara de camisa roxa, com marcas no braço…
— Isso foi tão bem detalhado que me surpreendi. — Zombou Leo.
— Hazel. — A voz de Reyna era firme. — Percy já tem o bastante com que se preocupar.
Percy tocou a ponta de sua espada, e Contracorrente voltou para a forma de caneta.
— Nunca vi ninguém como vocês antes. Quem é Jason?
Reyna deu um olhar irritado para Hazel.
— Ele é… era meu colega. — Ela apontou para a segunda cadeira
vazia. — A legião normalmente tem dois pretores eleitos. Jason Grace,
filho de Júpiter, era nosso outro pretor até desaparecer em Outubro.
Percy tentou calcular. Ele não prestou muita atenção no calendário no deserto, mas Juno tinha mencionado que agora era Junho.
— Quer dizer que ele já se foi há oito meses, e vocês não o encontraram?
— Ele pode não estar morto. — Hazel disse. — Não vamos desistir.
Reyna fez uma careta. Percy teve a impressão que esse Jason devia
ser mais que só um colega.
Todos olharam para ele, e Piper tentou não parecer uma namorada ciumenta e irritante.
— Eu nunca vi ela desse jeito. — Admitiu Jason negando a cabeça rapidamente.
— As eleições só acontecem de duas maneiras. — Reyna disse. — Ou a legião coloca alguém como um escudo depois de uma grande batalha – e não tivemos nenhuma grande batalha – ou temos uma votação na noite de 24 de Junho, na Festa da Fortuna. Que será em cinco dias.
Percy franziu o cenho.
— Vocês têm uma festa para tuna?
— Fortuna. — Hazel corrigiu. — Ela é a deusa da sorte. O que quer que aconteça no dia da festa pode afetar o resto do ano. Ela pode conceder ao acampamento boa sorte… ou muita má sorte.
Reyna e Hazel olharam para a cadeira vazia, como se estivessem pensando no que estava faltando.
Um arrepio trouxe Percy de volta.
— Uma Festa da Fortuna… As górgonas falaram disso. E depois
Juno. Eles disseram que o acampamento seria atacado nesse dia, alguma coisa de uma deusa malvadona chamada Gaia, e um exército, e a Morte sendo libertada. Está me dizendo que esse dia é nessa semana?
Os dedos de Reyna apertaram o punho da adaga.
— Você não vai falar nada sobre isso fora desta sala. — Ela ordenou. — Não quero você espalhando mais pânico nesse acampamento.
— Então é verdade. — Percy disse. — Sabe o que vai acontecer? Podemos parar isso?
Percy tinha acabado de conhecer aquelas pessoas. Ele nem tinha
certeza se gostava de Reyna. Mas queria ajudar.
— Você sempre quer, cabeça de algas.
Falou Annabeth baixinho com um leve sorriso.
Eles eram semideuses, o mesmo que ele. Tinham os mesmos inimigos. Além disso, Percy se lembrou do que Juno tinha dito a ele: não era só o acampamento que estava em risco.
Sua antiga vida, os deuses, e o mundo inteiro seriam destruídos. O que quer que esteja vindo, era enorme.
— Já conversamos o suficiente por enquanto. — Reyna disse. — Hazel, leve-o ao Templo do Morro. Encontre Octavian.
Jason revirou os olhos ao ler a última palavra. Apenas de ter o nome daquele ser citado, ele ja se irritava.
No caminho pode responder as perguntas de Percy. Fale sobre a legião para ele.
— Sim, Reyna.
Percy ainda tinha muitas perguntas, parecia que seu cérebro iria derreter. Mas Reyna deixou bem claro que a audiência havia acabado. Ela embainhou a adaga. Os cachorros de metal se levantaram e rosnaram, avançando lentamente na direção de Percy.
— Boa sorte com o agouro, Percy Jackson. — ela disse. — Se
Octavian te deixar viver, talvez possamos comparar as notas… sobre seu passado.
— Esse Octavian, ele é tão ruim assim?
— Você nem imagina!
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