21 — Grayish
Draco Pov
Eu sinceramente me sentia totalmente deslocado ali.
Sempre acontecia quando nosso diverso grupo de amigos resolvia ir para festas barulhentas ou baladas sem sentido.
Estávamos bem em casa hoje, eu tinha me divertido mexendo nas fotos legais que fiz com Harry. Foi um pouco complicado, porque envolveu usar uma tira para passar por todo o corpo dele, e eu me perdi com aquilo.
Mas foi divertido, havíamos editado as fotos juntos, e então eu não sabia por que precisávamos sair de nosso refúgio, se poderíamos fica ali juntos por toda a noite.
— Então, vamos definir nossas prioridades! Qual a razão de cada um estar aqui? — Foi Theo que questionou, e eu suspirei.
— Eu vim porque ninguém me deixou ficar em casa — Fui o primeiro a falar, vendo todos me encararem com cenhos fechados.
— Não seja rabugento, Draco! — Harry pediu com grande animação, e os olhos verdes brilhando de felicidade — Escolhemos um lugar legal! Eles vendem alguns lanches, e tem batata frita! Você não consegue ficar triste comendo batata frita!
— Eu... vim pela batata? — Falei, forçando um sorriso, e Theo deu um tapinha nas minhas costas.
— Esse é o espírito — Comemorou.
— Nós viemos para dançar — Ronald disse, indicando a si e Blaise, que sorria abraçado a ele, enquanto aguardávamos na fila para entrar.
— Eu também! — Hermione disse com um sorriso, timidamente de mãos dadas com Viktor.
— Eu estou aqui porque ela está aqui — Ele disse apenas, indicando a namorada, e isso nos fez sorrir.
Eram um casal muito adorável.
— Eu vim procurar o grande amor da minha vida. Sinto que possa estar aqui — Gina comentou, ainda naquela sua busca incansável por sua alma gêmea, e isso nos fez rir.
— Sexo animal e sem sentido! — Harry falou, e isso fez Nott rir e esticar a mão, para eles baterem ambas em comemoração pelo propósito em comum.
Apenas revirei os olhos, sentindo aquele ser rabugento e velho de 92 anos se alastrar por meu coração, e foi impossível não amarrar a expressão.
Nenhuma batata frita valia perder uma noite de sexta ali!
Eu ainda não sabia como me sentir sobre Harry, e definitivamente não precisava ser nenhum gênio para saber que assistir ele se esfregar em algum desconhecido não me faria qualquer bem.
Todos pareciam totalmente alheios ao meu mau humor, e no fundo eu sabia que apenas estavam ignorando.
Nott sempre dizia que não era a mesma coisa sem mim, mesmo que minha função ali fosse reclamar e fazer comentários ácidos.
Assim que conseguimos entrar, eu mal precisei abrir a boca, e eles decidiram achar primeiro um lugar para sentar, porque se queriam que eu ficasse ali por algumas horas, primeiro teriam que garantir o mínimo do meu conforto.
Encontramos um lugar confortável, na medida em que o local permitia, e então nos ajeitamos ali no banco acolchoado. Isso fez parte do meu mau humor diminuir, ainda mais quando Nott e Harry seguiram para o balcão e conseguir as batatas, e algumas bebidas.
Eu estava me esforçando para não parecer mais desanimado do que o habitual.
Porque, é claro, assim que todos haviam bebido a primeira rodada, não demorou para o grupo se desfazer.
Apenas assisti Nott e Harry seguirem para um ponto onde pudessem ‘encontrar as vítimas’, ao mesmo tempo em que Ron ia dançar com o namorado.
Eu estava ciente de Hermione, Viktor e Gina ao meu lado, conversando, mas enquanto comia as batatas idiotas, não conseguia desviar os olhos de Harry.
Ele estava tão bonito!
Ria de alguma coisa com Nott, enquanto estavam escorados no bar, com copos em suas mãos, e pareciam varrer o lugar com os olhos.
O fato é que, me sentir diferente sobre Harry estava começando a mexer com a minha mente.
Anterior a isso, eu costumava a vê-lo apenas como o Harry adorável que gostava de dormir me abraçando, que era um anjo ingênuo puro e intocado.
Não era apenas ciúmes.
Era... era como ser incapaz de imaginar ele em qualquer outro contexto.
Mesmo quando ele estava em algum relacionamento, ou quando queria apenas um caso de uma noite.
Eu ainda me lembrava, quando nós tínhamos dezessete anos, e depois de passar a noite com Leonard, aquele namorado idiota dele, Harry no dia seguinte estava... diferente.
É claro que como seu melhor amigo, no fundo eu sabia o que tinha acontecido.
Não precisava ser nenhum gênio para entender a razão dele ter passado uma semana usando roupas de gola alta, e na manhã seguinte ao dia que passou com Leonard, eu simplesmente conseguia ver certa cautela quando ele ia se sentar, ou a maneira que parecia indisposto para andar.
Eu e Harry, embora muito próximos, jamais havíamos conversado sobre nossas vidas sexuais, e eu sabia que isso era porque eu sempre fui incapaz de admitir até para mim mesmo que ele tinha uma.
Porque ele era... O Harry. Só Harry.
O meu garotinho de olhos verdes, manhoso e adorável.
Eu sempre fechei os olhos para isso.
Sempre que ele dava indícios de que tinha feito sexo, principalmente nas primeiras vezes, já que a dificuldade para se adaptar provavelmente era maior, eu costumava pensar que ele poderia estar daquele jeito porque caiu.
Harry também ficava dolorido e cheio de marcas roxas quando caia de bicicleta.
É claro que, embora me esforçasse para enganar a mim mesmo, no fundo eu sempre soube sobre tudo da vida dele.
E somente agora, eu me questionava se eu tinha criado essas ilusões para acalmar meu coração, com a intenção de mentir para mim mesmo.
Como é que eu imaginaria que meus atos teriam consequências?!
Harry tinha uma vida sexual mais ativa do que a minha, porque eu era um pouco reservado demais para me abrir com as pessoas, e tinha certa dificuldade em desenvolver intimidade, coisa que para mim era essencial para que o sexo acontecesse.
A grande questão é que o máximo de conversávamos era sobre coisas que não tinham muito a ver com nossa vida sexual.
Harry sabia sobre a maneira que para mim deveria existir uma conexão antes de conseguir sentir atração sexual. Na realidade, ele é quem havia me explicado que havia um nome para isso, quando eu comentei sobre o assunto ao perceber o quanto conseguíamos ser diferentes.
Harry conseguia ficar louco de desejo e paixão por qualquer um que achasse bonito, na mesma medida em que eu não sentia qualquer coisa ao ver esbeltas e lindas garotas desconhecidas. Não funcionava assim comigo. Eu não sentia atração por ícones da beleza, por modelos, cantores ou qualquer coisa do tipo.
Eu precisava de um algo antes disso.
E por eu ser tão reservado sobre todo esse aspecto, nunca havíamos conversado sobre sexo ou qualquer coisa que o envolvesse.
Então eu simplesmente passei anos fingindo que o Harry era a virgem Maria.
Eu, no fundo, sempre soube.
Mas agora, odiava saber.
— Você parece um pouco irritado, Draco — Me virei automaticamente ao ouvir meu nome, piscando atordoado ao perceber que estava sozinho com Viktor.
— Cadê os outros?
— Dançando — Ele indicou com a cabeça, um lugar onde Hermione e Gina estavam se movendo e conversando aos risos.
— Você não vai dançar?
— Não. Uma vez tentei aprender, mas eu definitivamente não sei o que fazer com os braços — Ele contou, chacoalhando os braços de uma maneira cômica e isso me fez rir.
Viktor era engraçado quando criava intimidade com as pessoas, e embora ele ainda fosse tímido no circulo de amizades, muitas vezes conseguíamos conversar.
Eu gostava dele. Sempre tinha coisas inteligentes a dizer.
— Quero dizer... o quanto devo bater os braços?
— Nenhum pouco, eu suponho — Falei rindo, sem me conter ao deslocar brevemente os olhos procurando Harry.
— Você não queria estar aqui?
— Absolutamente não — Voltei a me virar para ele — Não ouviram? Eu devo ter dito vinte vezes enquanto estávamos na fila.
— Me disseram para te ignorar — Ele explicou, e eu revirei os olhos — Só... fiquei curioso. Você é solteiro, estamos em um lugar cheio de garotas... Não vai sair por ai e conhecer alguém?
— Eu não sou o tipo de pessoa que consegue conhecer e gostar de pessoas bêbadas em bares — Falei, dando de ombros, e ele estreitou minimamente o cenho.
— Como Nott, Gina... E Harry?
— É. Como eles — Falei, torcendo para ele não perceber a nota de amargura em meu olhar, e virei a cerveja em um gole.
— Está preocupado com Harry? — Ele questionou por fim, e eu olhei para ele, negando com a cabeça — Você não para de olhar para ele — Explicou, e eu suspirei.
— Não estava olhando para ele — Falei, mesmo que soubesse que ele simplesmente conseguia pegar as mentiras no ar.
Esse era um grande problema com Viktor.
Nem sempre era tão empolgante ter alguém tão observador ao redor, ainda mais se esse alguém estava terminando o curso de psicologia.
— Você disse não ser o tipo de cara que conhece pessoas em bares... Que tipo de cara você é? — Ele questionou, com um sorriso simpático, e eu dei de ombros.
— Só sei que não sou esse tipo — Indiquei com a cabeça onde Harry e Nott estavam, com simplicidade — Não consigo me atrair ou querer... estar com pessoas que eu não tenha algum tipo de... conexão. É um pouco difícil de explicar — Dei de ombros, e ele assentiu.
— Ah, é disso que está falando? Eu achei que seu afastamento sobre essas questões eram por estar sentimentalmente indisponível. Não imaginei que houvesse algo assim.
Examinei a expressão descontraída dele, e mesmo sabendo que iria me arrepender, a curiosidade foi maior.
— O que quer dizer com ‘sentimentalmente indisponível’?
— Bem, parece óbvio, não é? — Deu de ombros — O fato de você ter essa ligação profunda com Harry... Bem, seu relacionamento com ele supre todas suas necessidades afetivas. Por isso vocês dois não estão sentimentalmente disponíveis — Explicou com a casualidade de quem comenta sobre o tempo.
— Ele não me parece sentimentalmente indisponível — Falei, muito embora na realidade devesse estar negando tudo o que ele estava dizendo.
Eu poderia colocar a culpa na bebida, de qualquer maneira.
— Ah, na realidade isso só prova meu ponto — Ergueu minimamente os olhos para Harry, e voltou a me encarar — Não conheço vocês há muito tempo, mas já posso supor que aquilo não vai dar em nada. Harry e seja quem for aquele cara.
Sua frase me venceu, e eu voltei a buscar Harry com os olhos, vendo que agora ele conversava com alguém perto do bar, e Nott havia sumido de perto.
Ótimo.
— Nós dois somos amigos, é só — Conclui, voltando a me virar para Viktor, decidido a não encarar Harry mais nenhum pouco.
— Eu não disse que não são — Ele sorriu, bebendo um gole de sua própria cerveja, enquanto eu não conseguia pensar em nada que não fosse a conversa com Astoria.
Parecia ser algo muito próximo do que Viktor estava insinuando.
Que eu nunca encontraria uma namorada, porque... tinha o Harry.
— Você já ouviu falar no gato de Schrödinger? — Ele questionou de repente, e eu arqueei o cenho para ele.
— O gato de quem?
— Em 1935 Erwin Schrödinger, propôs uma experiência mental. Um paradoxo, para ilustrar uma interpretação de mecânica quântica...
— Você e Hermione foram feitos um para o outro — Resmunguei, revirando os olhos — Você vai me ensinar mecânica quântica em um bar?!
Ele revirou os olhos.
— Essa experiência mental, consistia em prender um gato em uma caixa com um recipiente selado de veneno, que pode ou não se quebrar em um dado momento. Como ninguém sabe quando ou se o veneno foi liberado, até a caixa ser aberta, o gato pode ser considerado tanto vivo quanto morto. Não apenas vivo ou morto, mas sim vivo e morto ao mesmo tempo. Até você abrir a caixa, e descobrir o que tem lá dentro, sempre irá pairar essa duvida penosa sobre o que é, o que foi, o que será e o que poderia ter sido.
Automaticamente, franzi o cenho para ele.
— Não existe nada na minha relação com Harry que não seja amizade — Acusei de imediato — Não tem caixa para ser aberta. Sempre fomos amigos, sempre seremos, e é só.
— Engraçado... Eu não citei o nome de Harry. Só estava te contanto sobre meu paradoxo favorito — Ele disse, com um ar de vitória e certo deboche — Qual será a razão para seu relacionamento em potencial com Harry ter vindo a sua mente quando eu estava apenas citando um paradoxo divertido de ambiguidade?
— Para de me analisar! — Resmunguei, voltando a beber um longo gole de cerveja.
— Ei, meninos! — Hermione se aproximou, junto com Gina e ambas pareciam animadas, arfantes e sorridentes — Sobre o que estão falando?
— Fala para o seu namorado parar de me analisar! — Resmunguei para ela, que riu.
— Você disse que não ia analisar meus amigos!
— Eu não me arriscaria a chatear minha maravilhosa namorada analisando seus maravilhosos amigos, não importa o quanto sejam perturbados — Ele respondeu, e eu revirei os olhos ao ver eles trocarem um beijo rápido e apaixonado.
Eu realmente odiava casais melosos!
— Eu só estava comentando sobre um paradoxo legal. Já ouviu falar no gato de Schrödinger?
— Já ouviu falar que o sol é quente? — Ela rebateu, e os dois riram.
— Eu só comentei sobre isso, e então a primeira coisa a vir na mente do Draco é que eu estava fazendo alguma insinuação sobre ele e Harry — Ele disse, totalmente cara de pau, e eu revirei os olhos com as risadinhas dele.
— Afinal, onde estão Ron e Blaise?
— Estávamos dançando com eles, mas Ronald virou quatro doses de tequila, então...
— O que acontece quando ele faz isso? — Viktor pareceu curioso.
— O Ron de quatro doses começa a querer arrancar a camisa de Blaise, e...
— ... lamber ele como se fosse um delicioso sorvete de chocolate — Falamos todos em uníssono, rindo em seguida.
— Oh! — Ele bradou, um tanto sem jeito, e nós continuamos a rir.
— Ei, turma! Estou indo embora! — Nott apareceu, um tanto bêbado, sorrindo abertamente.
— Já?
— Eu conheci uma garota, nós vamos levar nossa festinha para o apartamento dela — Ele disse, rindo de um jeito engraçado — Não me esperem acordadas, crianças! E alguém precisa ficar de olho no Harry, é o segundo Martini dele — Avisou, e saiu caminhando trôpego, em direção a uma garota que parecia estar esperando ele.
— Então... o que acontece quando Harry bebe Martini?
— Ele fica por volta de 70% mais safado — Respondi de contra gosto, bebendo um gole da minha cerveja, fazendo uma careta em seguida porque estava ficando quente.
Foi engraçado perceber como a noite havia ficado consideravelmente mais terrível do que já estava.
— E se ele chegar no terceiro Martini, começa a ter uma estranha e significativa preferência sexual por caras loiros — Hermione comentou, trocando um olhar longo com Viktor, e eu revirei os olhos.
— Se um de nós foi embora, significa que eu já posso ir. Não quero ficar para ver vocês me analisando, ou Ronald conseguindo arrancar a roupa de Blaise no meio da pista — Comentei, puxando a carteira para tirar algum dinheiro e entreguei para Viktor, que era o mais sóbrio ali — A minha parte.
Eles me assistiram sair dali, em direção ao bar, e após pedir para o barman, ele me conseguiu uma caneta, o que me deixou seguir para a pista, onde Ronald estava totalmente solto dançando.
Suspirei, interrompendo eles, e puxei o braço de Blaise, escrevendo meu número ali, seguido da frase ‘Se eu estiver perdido’.
Sim, tinha história.
Eles já haviam me metido em muita encrenca quando os deixei sozinhos e bêbados.
— Me liguem se precisar de qualquer coisa — Falei, tendo que gritar para ser ouvido, fechando o cenho ao ver que Ron estava muito perto de começar a realmente lamber Blaise na pista de dança — E não lamba isso! — Apontei para onde havia escrito o número, e o ruivo riu ao concordar com a cabeça.
Revirei os olhos, indo para perto da mesa novamente.
— Se precisarem de alguma coisa, me avisem. Mas tentem não precisar de mim, ok? — Falei, vendo eles rirem, mas concordarem com um aceno.
E por fim, segui para o último lugar que queria.
Harry estava muito sorridente, leve e bêbado, conversando muito próximo com um cara alto, igualmente bêbado e sorridente, que estava com a mão pousada na cintura dele.
Suspirei, ao parar perto, e chamar o nome dele que se virou um pouco atordoado.
— Eu já estou indo embora, ok? O quanto você está bêbado? — Questionei, e ele me olhou por um instante, sabendo que era minha verificação.
— Esse é o Draco? — Não perdi a maneira como o cara perguntou para Harry, que assentiu rindo.
— Harry? — Insisti, sem querer prolongar meu tempo ali, claramente atrapalhando aquilo.
Eu não o deixava com desconhecidos se sentisse que ele não estava bem para saber o que estava fazendo.
— 5 ou 6 — Respondeu, na nossa escala de zero a dez, e eu assenti, puxando o braço dele para anotar meu número, sentindo que o outro cara estava me olhando com cenho arqueado.
— Se qualquer coisa acontecer, me avise. Qualquer coisa — Insisti, dando um olhar sério para o homem, de maneira que ele entendesse que era um tipo de ameaça, e Harry assentiu, sorrindo.
Me afastei, desviando os olhos no momento em que o homem voltou a passar os braços ao redor da cintura dele, e devolvi a caneta, seguindo para a saída dali o mais rápido que pude.
No meio da dança, da música, das batidas frenéticas das pessoas, e de toda a confusão interna e externa ao meu redor, eu lancei um último olhar para onde Harry estava, sentindo aquele aperto doloroso ao ver ele beijando o desconhecido do bar.
Com um suspiro exausto, me deixei sair para a rua fria e gelada, olhando para o céu por um instante ao colocar as mãos no bolso.
Eu não sabia quando tudo havia se tornado tão difícil.
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