"E a brisa entra pela janela, provando que seus cabelos sabem dançar. E em tom de mel, reluz como ouro, que ao meu ver se torna o mais belo tesouro. Ju, tua graça é minha fortaleza"
No 1° ano do ensino médio, Maurílio encontrava-se perdidamente apaixonado por Júlio César, mais conhecido como Julinho. Mas a fatídica adolescência é cruel, possuía suas inseguranças com a aparência, aliada a sua timidez, sabia que o loiro também tinha interesse em meninos por conta de boatos, e boatos não são nada, afinal, havia vários contra Maurílio e nenhum deles valia de nada. Essa admiração era um segredo, até o confortava, como não possuía coragem para dar em cima, apenas o observava e escrevia seus poemas. Em seu círculo social restrito, seus amigos, desconfiavam de algo pois o moreno passava a aula escrevendo e sempre jogava fora o papel, suspeito pois toda vez que escrevia um roteiro ou algo do gênero ia palestrar para eles, também havia trocado de lugar, antes sentava no fundão, e ainda sim ficava olhando para aquele canto mesmo estando longe bem na primeira cadeira sendo que nunca trocou ideia com nenhuma pessoa daquela panelinha. E mesmo Renan sendo amigo de Maurílio, ele tinha uma natural implicância com o mais novo, assim, cabia a ele descobrir o que estava estranho no garoto.
De praxe, ficou sorrateiro observando todos os movimentos dele enquanto uma aula tediosa de física corria, ou melhor, caminhava bem lentamente já que Dos Anjos rasgou um papel em quatro partes, amassou e jogou no lixo, não da sala, mas olhando pela pequena janelinha de vidro na porta, percebeu que foi jogado na lixeira do corredor. Colocou seu plano em ação, pediu para ir ao banheiro, furtivamente pegou os quatro pedaços jogados, e leu, mal tinha três linhas de um poema, bobo, só conseguia rir dentro do banheiro, até mesmo perguntaram se ele estava bem e para não ter que dar explicações fingiu que passou mal e voltou para a sala. Julinho também era amigo tanto dele quanto de Rogerinho, mas por algum motivo (que só agora descobriu) nunca esteve na mesma roda de conversa com Maurílio, ele achava que o motivo era o próprio moreno em si pois em uma das suas vagas interações o chamou de "palestrinha" e claramente o apelido pegou pois era a mais pura verdade, pensava que julinho apenas o achava chato, todo mundo achava, mas Rogerinho adotou ele no grupo sem muito sentido, afinal, era só pra colar dele e depois acabou se afeiçoando a carinha de gripe do menino, Renan por sua vez gostava da amizade, não como gostava de Rogério, ele era seu melhor amigo seu maior laço de confiança, o único que sabe de seu romance com a prima, mas o Dos Anjos era inocente, com o passar do tempo percebeu que se divertia na presença do outro principalmente pois ele caía em qualquer provocação. Se o intuito é provocar então é isso que ele faria, juntou os pedaços com um durex que pediu para Rogerinho roubar de alguém.
— Que porra é essa Renan? Cê tá me dizendo que o Maurílio gosta do Julinho? - Disse com uma incredulidade em sua fala olhava para os dois integrantes da fofoca, um em cada extremo da sala.
— Não sou eu que to falando, é o próprio Maurílio, olha só é a letra dele!
— É você tem um ponto. Caralho ein ele nunca falou com o garoto e tá todo apaixonado? Mas é otário demais mesmo.
— Ele é lento né, Rogerinho. - constatou revirando os olhos enquanto guardava o papel para ninguém ver, ainda.
Por sorte, era julho, logo o detentor do papel já pensou no seu plano ideal de passar aquela informação para toda a escola, e se inscreveu para ser o orador do correio do amor da festa junina atrasada. A sexta feira demorava para chegar, principalmente por já ter planejado todos os detalhes, e ainda era quarta, a única coisa que aliviava sua ansiedade era ver todos os movimentos do moreno que agia da forma mais óbvia possível, até se admirava por não perceber antes.
— Olha lá, ele não para de olhar pro Julinho! - não podia deixar de comentar com seu melhor amigo.
Por sua vez, Maurílio quase esqueceu da festa, não gostava tanto assim de quadrilha, afinal, qual a graça de dançar com alguém que não tem nem o dobro da sua idade? A comida deixou de ser gratuita, mal dava para comprar um guaravita, e sinceramente, no ensino médio a graça de uma festa junina era ficar com a pessoa que gosta, mas como se ele mal conseguia chegar perto do loiro mesmo tendo amigos em comum? A única coisa que o fazia ir na festa era Amanda, sua irmã, que o perturbou a semana inteira para ir junto , e utilizando do fatal argumento “eu pago uma maçã do amor para você” fica muito difícil de recusar . Se arrumou da maneira mais preguiçosa o possível, a calça jeans surrada sem querer combinava com a temática, fora a irmã que o obrigou a botar uma blusa xadrez bonitinha, no final até que se sentia confortável para botar um chapéu de palha, no caminho já conversava feliz, fazia piadas e ao chegar na quermesse se divertia, regrediu a infância brincando de pescaria ganhando um estalinho, por sorte encontrou uma senhorinha da igreja que lhe deu dez reais para acompanhá-la ao som de falamansa. Amanda, cumprindo sua promessa chamou o irmão para o meio do pavilhão para dar o doce, aproveitaram que Renan estava no microfone falando algo e pararam para prestar atenção.
— O que Renan tá fazendo alí em cima, bicho? - olhava curioso para o palco preenchido de bandeirinhas e luzes sem entender o motivo alheio de estar ajudando na festa.
— Sei lá, o amigo é teu. Mas acho que é o correio do amor. - disse amanda enquanto comprava a maça do amor sem dar atenção para a apresentação.
Puta que pariu! O moreno congelou imediatamente, por um segundo esqueceu de seu apelido mais famoso e pensou que as palavras “Irei apresentar a bela arte do nosso palestrinha” não fossem direcionadas a ele, era difícil ter qualquer reação principalmente quando vê o sua inspiração olhando diretamente para si, com pena, o que mais doía nisso tudo, além de ser exposto da pior forma possível, era que a reação na qual sonhara era um sorriso e não um olhar pesado carregado de pena. Não chorou, não no momento, engoliu o sofrimento para fingir que nem tinha entendido, aproveitou para estampar um sorriso cínico no rosto e saiu andando para uma barraquinha de comida qualquer enquanto Amanda corria atrás confusa.
— Lírio, aquilo era teu? Você que entregou? Cê tá bem?
— Sim, não e essa posso responder em casa?
Aproveitou o momento em que começaram a encenar o casamento e todos os olhares foram para a encenação que inclusive sua irmã participava, meio a contragosto depois do ocorrido, e saiu à francesa para poder chorar em paz sem ninguém ver. Nesse meio tempo, quem o procurava incessantemente era o próprio Julinho pois depois desse tempo todo tentando se aproximar do moreno entendeu o porquê dele sempre o afastar, chegou até por um segundo agradecer ao Renan pois descobriu que não era odiado por ninguém, mas porra, nao podia ter chamado ele no privado? Provavelmente, se não tivesse envolvido na situação nem ligaria tanto assim, porém, seu nome estava alí naquele papel e olhar para o autor doeu seu coração, era impossível não se envolver, até deixou suas paqueras de lado. Com a falha de sua busca exaustiva foi falar com a pessoa mais próxima do moreno.
— Vem cá Amandinha, cadê teu irmão? - assim que a viu puxou de leve pelo braço - procurei por tudo quanto é canto e nada.
— Eu percebi que ele sumiu, do jeito que é sensível né? impossível de não ficar mal. Até falei que ia pra casa com ele, mas já deve ter ido sozinho.
— Ah… entendi - cabisbaixo olhava para o chão pensando no seu próximo passo.
— Sem querer ser grossa nem nada, o que você tá querendo com o Maurílio? nunca falou com ele. - Obviamente estava curiosa com a ação repentina do outro, e logo agora? Não fazia sentido
— Nunca falei porquê ele não deixava, hoje descobri o motivo. Só - suspirou tentando colocar as palavras em ordem - só queria tirar essa história a limpo mesmo.
— Se eu fosse você deixava esfriar, tô indo pra casa também, beijos até amanhã. - refletiu nas duas possibilidades, ou seu irmão já ia ganhar um fora ou ia ganhar um beijo, claro que tinha que contar pra ele o mais rápido possível e saiu andando apressada.
— Espera, quer uma carona?
— Aceito!
E mesmo fugindo covardemente do seu problema ele ainda sim o perseguia, no caso, estava deixando sua irmã em casa na van que ele provavelmente pegou da garagem da vó sem ela notar. Sabia que o loiro não ficava sozinho com frequência, sempre havia alguém ao lado mesmo não sendo sério, mas tinha necessidade de ser sua irmã? Claro que ficou com ciúmes, nem tocou no assunto apenas se esquivando de qualquer pergunta ou conversa de Amanda durante todo final de semana mesmo ela insistindo que tinha algo importante para contar, se soubesse que ia terminar assim nem teria ido a uma festa só para agradá-la. E mesmo sendo um momento péssimo seus dois dias de descanso, passaram bem rápido, até porque o pior estava se aproximando passo a passo em direção a escola e a cada movimento tinha a sensação de que todos olhavam para si, estava mais acanhado do que o normal, ao chegar na sala agradeceu por nem Renan e nem Julinho estarem lá, seu sofrimento amenizou um pouco fingindo prestar atenção na aula de química e quando viu o sinal tocou, “merda o segundo tempo”, claro que ambos chegaram tarde, era a aula mais tediosa da semana em uma segunda feira de manhã, a maioria chegava tarde, e aí sim a sensação de terem os olhos voltados o observando foi verdadeira e uma torta de climão estava sendo feita no ambiente e por mais que tentasse abstrair era impossível, diferente da festa, todos haviam percebido que ele estava mal, até mesmo Renan se arrependeu do que fez, de longe murmurou “desculpa” enquanto sentava e só recebeu um merecido “cala a boca”. Julinho, ao contrário do que se imaginara, também pensou na forçada confissão durante esse tempo todo, até deu uma dura em seu amigo no pátio esperando o sinal, na verdade, ninguém nunca soube porém ele também tinha um interesse por Maurílio, que não sabe como ou como surgiu, havia certas coisas que reparava, no esforço para sempre parecer inteligente ou o jeito que sorria quando cantava nas rodas de violão nos intervalos querendo ou não, uma de suas poucas interações eram quando Julinho tocava violão e sem querer os dois faziam um belo dueto, apesar das diferenças de personalidade de ambos haviam coisas em comum para compartilhar. Assim, ao passar pelo moreno, em um ato repentino, apertou o ombro dele de leve e falou baixo:
— No recreio a gente conversa, dodói?
Tanto Maurílio quanto a turma fingiu naturalidade com bastante curiosidade, afinal, nunca os viram juntos e logo agora o loiro esbanjava intimidade. O relógio de ponteiro acima do quadro piscava para si, o moreno não conseguia deixar de contar os segundos, naqueles dois tempos e meio restantes de aula desenvolveram nele uns cinco tipos de ansiedade diferentes, a cada dez minutos era uma comemoração do tempo que passou mas também uma tortura pois pela primeira vez gostaria de escutar o som ensurdecedor do sinal e quando veio se sentiu bem? Não, pelo contrário, teve a descoberta da gastrite nervosa e nem deu para usar isso para sair de fininho e evitar a conversa indo para a enfermaria pois Julinho já estava a sua espera. Não iriam conversar alí na frente de todos, então o maior foi para um local escondido do colégio no qual ele normalmente ia para fumar
— Cê tá bem, palestrinha? - Disse sentando despreocupado puxando um cigarro para si.
— Não me chama assim. - sem pedir licença, pegou também pegou um cigarro da cartela alheia e acendeu evitando contato visual. - Na medida do possível eu to sim.
— Que bom então, falei com Renan lá, mandei o papo pra ele dizendo que não foi legal o que ele fez contigo. - tentou puxar o papo de maneira descontraída na esperança que o outro saísse da defensiva.
— Ah… obrigado, mas o que você quer comigo? - ao contrário do outro, só queria que o assunto acabasse e ele fosse enterrado para nunca mais lembrar disso.
— Eu já não deixei claro? - ao falar tão calmo conseguiu perceber Maurílio arregalando os olhos e ficando nervoso.
— Que quer pegar minha irmã? Deixou sim.
— Porra, do que cê tá falando dodói? - soltou um riso fraco tentando entender o que se passava na cabeça tão exagerada do outro.
— Eu vi vocês dois no dia da festa, deixou ela lá em casa logo depois de ter sido rejeitado em público.
— Puta merda bem que ela me disse que tu é dramático. Para de ser besta, fui falar com a Amanda porque você sumiu, e me diz quando foi que eu te rejeitei? - Nesse momento, o moreno quebrou a muralha que construiu retribuindo o contato visual.
— No momento em que olhou pra mim, com pena, eu percebi o que aquele olhar significa.
— Tá falando de quando tentei ir falar contigo e você se afastou? - Ele tremeu quando conseguiu analisar o que julinho falava para si, e se arrependeu do tanto que tentou se fechar. - Aliás, como você sempre fez toda vez que tentei conversar. Fico feliz que você não me odeia Maumau.
Após a curta conversa de grandes revelações, se entreolharam por alguns segundos em silêncio, apenas deixando os sorrisos se encontrarem, de forma leve e tranquila. Foram soltando a voz pouco a pouco e quando deram por si já havia passado mais de meia hora que o recreio acabou, e deixaram por isso mesmo continuando alí a trocar assuntos bobos, tocando músicas e falando sobre si. Fora impressionante que aquele era a primeira conversa que tiveram, na verdade parecia que já tinham essa intimidade há tempos, era nítido a felicidade de Maurílio, afinal, desfez uma trava que contia o sentimento que ele se culpava de ter, mas também, de uma forma mais sutil, mostrava a afeição de Julinho que por vezes era mascarada pela resistência do outro. Querendo ou não combinavam, melhor ainda mal sabiam que se completavam, e ainda estavam para descobrir, naquela conversa que abriu portas chegaram até a agradecer a fatídica festa junina mentalmente pois passavam as horas em transe matando a aula juntos. Contudo, a fome apertando e chegando a hora do almoço precisavam finalmente ir embora, claro que o loiro não iria se conter após ter se envolvido nessa gostosa confusão, galanteador e imprevisível como sempre, acariciou os cabelos de Maurílio e o beijou lentamente, achando fofo o nervosismo alheio, se afastou sorrindo e logo sacou sua chave no bolso e a chacoalhou.
— Vou te levar de van, xuxu! Sempre que quiser carona é só me dar um beijo de novo.
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