Jungwon afundou o rosto na água da banheira e ficou apenas com os olhos para fora, pensativo. Ele já estava assim há um bom tempo, mergulhado na água quente enquanto seus pensamentos estavam em todos os lugares. Quando mais pensava em Jay, mais confuso ele ficava e ao mesmo tempo mais seu coração se agitava no peito. Era algo do qual ele sabia que não conseguiria escapar, não agora que tinha começado daquele jeito.
Ele saiu do banho e se jogou na cama, olhando para o teto. Ele já tinha completado dezessete anos nesse planeta, mas nunca tinha se apaixonado antes. E nem era porque não queria, era porque simplesmente nunca tinha acontecido, ninguém nunca tinha lhe parecido interessante o suficiente. Então ele nem estava procurando por isso, não era realmente importante namorar ou coisas do tipo, ele estava satisfeito com sua vida.
E aí do nada isso aconteceu.
Só podia ser paixão, não tinha outra palavra para descrever aquele sentimento. Seu coração ficava agitado quando o via e ele sentia uma felicidade absurda, por todos os cantos de seu corpo, como se ele tivesse injetado felicidade nas veias. O que mais podia ser?
Jay, é claro, era homem. Aquela era outra questão, aliás, como Jungwon nunca tinha se sentido atraído por alguém ou se apaixonado, ele nunca tinha pensado sobre coisas como sexualidade. Mas agora ele estava pensando sobre isso, tanto que seu cérebro estava fritando. Quer dizer, não tinha problema nenhum Jay ser homem e ele também, pelo menos não para ele. Mas para as outras pessoas aquilo era problemático, vide a confusão na escola mais cedo. E também tinha os seus pais que ficariam muito chocados, afinal eles eram uma família muito tradicional. Jungwon tentou pensar sobre, mas ele não tinha um primo ou um tio gay, todo mundo em sua família era hetero e também achavam que ele fosse, já que o próprio nunca tinha negado ser. Seus tios sempre perguntavam sobre namoradas e ele desconversava, não porque achava que era gay, mas porque não gostava de ninguém mesmo. A verdade é que aquela era a primeira vez que estava pensando sobre isso e era estranho... Ele era gay?
Jungwon virou para o lado e olhou para o seu reflexo no espelho. Ele estava sentado na cama com uma toalha branca enrolada da cintura para baixo, então ele olhou bem para o seu rosto, para o tronco desnudo, os braços magros... ele continuava sendo ele mesmo, certo? Nada tinha mudado mesmo que tivesse se dado conta de que estava apaixonado por um cara.
Ele olhou e olhou profundamente para o espelho, até que por um segundo pensou ter visto outra coisa no reflexo. Ou melhor, outro ele. Ele virou para trás confuso, mas não havia nada lá além de seu quarto. Ele tocou em seus cabelos, mas eram seus cabelos de sempre, molhados do banho recém tomado. Aquilo era muito estranho, por um segundo ele jurou ter visto uma coroa ali, no topo de sua cabeça.
Será que estava alucinando?
- Eu realmente estou maluco – ele suspirou e se jogou para trás no colchão novamente.
Naquele momento, Maeumi entrou e pulou na cama, vindo dar uma lambida em seu rosto. Ele acariciou o pelo do cachorro enquanto pensava, agora novamente sobre o que faria a seguir. Se ele estava apaixonado, tinha que fazer alguma coisa.
- Maeumi, você acha que eu devia confessar os meus sentimentos? – ele perguntou.
O cachorro, é claro, apenas cheirou seus cabelos e depois pulou da cama e saiu, deixando-o sozinho e sem resposta. O pior é que não tinha mais ninguém para quem ele pudesse perguntar, se sua mãe soubesse que ele não apenas estava apaixonado por um cara, como ainda era aquele que ela tinha lhe proibido de ver, ela com certeza teria um infarto.
Naquele momento, ele pensou que seria bom ter um irmão mais velho.
Jungwon ainda ficou um bom tempo rolando na cama, até que caiu estatelado no chão, choramingando de dor.
E por fim, ele decidiu que iria se confessar.
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A mãe de Jay estava na cozinha preparando o jantar enquanto ele dormia no sofá da sala. Desde que chegou da escola, sua mente estava tão esgotada pelos acontecimentos do dia que ele simplesmente capotou ali. O sol já estava se pondo no lado de fora quando sua mãe ouviu alguns gritos vindo da sala. Ela baixou o fogo e pendurou o pano de prato no ombro, indo até lá verificar.
- Jay? – perguntou.
Quando se aproximou, viu que o garoto estava se debatendo e gritava, o que não era uma novidade, já que desde criança Jay sempre tinha pesadelos assim, sempre se debatia e berrava, em profundo desespero. Mas quando acordava, ele nunca se lembrava com o que tinha sonhado.
No entanto, a gritaria sempre era “não morra” e coisas assim. Hoje, no entanto, ele estava chamando pelo nome de alguém.
- Jay – ela o sacudiu pelo ombro, para que ele acordasse – Vamos, você está tendo um pesadelo, acorde.
Ele abriu os olhos de súbito e encarou a mãe, o coração acelerado no peito e a testa molhada em suor.
- O que houve? – ele perguntou confuso.
- Pesadelo – ela respondeu – De novo.
Jay suspirou e balançou a cabeça, parecia que aqueles pesadelos que ele nunca lembrava iriam persegui-lo pela vida toda. Conformado, ele já estava prestes a levantar para tomar um banho e deixar aquilo para trás, quando sua mãe fez uma pergunta um tanto estranha.
- Aliás, quem é Jungwon?
Ao ouvir aquilo, ele arregalou os olhos.
- Ah?
- No sonho, você estava gritando “Jungwon, você não pode morrer” – ela explicou.
Ao ouvir aquilo, Jay sentiu uma pontada estranha na cabeça.
- Eu disse isso? – ele não estava acreditando.
- Você disse, antes você só gritava “não” e dizia para alguém não morrer, mas hoje esse alguém tinha um nome – a mulher o encarou – Por isso eu fiquei surpresa.
Jay ficou pensando se o sonho de hoje tinha relação com os sonhos do passado, mas ele realmente não se lembrava de nada. Por fim, apenas desistiu de tentar entender.
- Jungwon é meu colega de escola – explicou – Foi ele quem te ajudou aquele dia pagando o nosso táxi.
- Ah, o seu primeiro amigo! – ela colocou ênfase no “primeiro” e sorriu – Você precisa trazê-lo aqui para que eu possa lhe agradecer.
- Acho que a mãe dele não quer que ele ande comigo – Jay respondeu – Não julgo, pois eu também não ia querer que o meu filho andasse comigo.
- Que bobagem, por que diz isso?
- Porque a família dele é rica e a gente é assim – ele apontou ao redor.
A mulher deu um suspiro frustrado ao ouvir aquilo.
- Pelo menos somos pessoas dignas e ganhamos o nosso dinheiro com o fruto do nosso trabalho, seja como for – ela deu de ombros e saiu andando, voltando para a cozinha.
Jay ainda ficou algum tempo ali pensando por que diabos tinha sonhado com Jungwon, ainda mais em um cenário como aquele. Por que nada sobre aquele garoto fazia o menor sentido?
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Era sábado de manhã, a mãe de Jay tinha chegado do trabalho e os dois estavam comendo pão com manteiga e tomando café. Depois de toda a confusão, agora ela não estava mais saindo com nenhum homem e ia direto do trabalho para casa, o que deixou Jay muito aliviado. Os dois estavam conversando sobre a escola e o trabalho que ele havia feito sobre o javali extinto quando ouviram uma batida na porta. Jay pensou que podia ser algum dos mecânicos pedindo açúcar para o café ou algo assim, então ele não estava realmente pensando quando abriu a porta. No entanto, assim que viu quem estava ali, ele ficou um tanto confuso.
- Jungwon?
O mais novo estava diante de sua porta vestindo uma camisa azul escura, um jeans preto e um colar com um pingente dourado. Como sempre o via de uniforme, aquela era a primeira vez que o via vestindo outra coisa, por isso ele ficou mais tempo do que devia pensando sobre isso.
Até Jungwon entrar.
E então tudo aconteceu em uma fração de segundos.
Sua mãe se aproximou para ver quem estava ali, bem quando Jungwon se ajoelhou apenas no joelho direito e estendeu um buquê de flores diante dele.
- Jay, você quer ser meu namorado? – o mais novo perguntou sem fazer rodeios, com toda a coragem que conseguiu.
Dèjá vu.
Por um segundo, Jay sentiu uma pontada na cabeça e Jungwon teve a certeza absoluta de que, de alguém jeito, aquilo já tinha acontecido antes, mesmo que não fizesse o menor sentido.
Ao ouvir aquela confissão inesperada, sua mãe arregalou os olhos e pensou que aquela era a coisa mais inusitada que já havia presenciado. Ao seu lado, Jay estava tão petrificado que achou que tinha morrido, sua alma saindo do corpo. Enquanto isso, Jungwon o olhava como um cachorro sem dono, esperando sua resposta.
- Jay...? – ele perguntou.
- Ju-Jung-won... – ele gaguejou – Por favor... por favor, le-levante...
Ele ajudou o mais novo a ficar de pé, que estava sorrindo como um raio de sol. Jay achou que tinha ficado maluco de vez, só podia ser isso... Ele olhou com o canto do olho para sua mãe, que parecia ainda mais confusa do que ele com aquela aparição esquisita na porta da frente no sábado pela manhã.
- E então, você quer ser meu namorado? – Jungwon perguntou novamente, estendendo o buquê para ele – Não se preocupe, meus pais não precisam saber disso por enquanto.
Não era como se Jay sequer tivesse pensado nos pais dele, mas agora que o outro os mencionou... Por Deus, a mãe dele ia ter um infarto se soubesse disso, ainda mais que ela tinha proibido que os dois andassem juntos.
- Jungwon, eu... eu agradeço pelo pedido, mas... – ele tentou começar de forma mais honesta o possível.
- Ah não – Jungwon fez bico – Não diga “mas”, diga sim!
Naquele momento, sua mãe deu uma risadinha.
- Ah, essa é a pessoa mais honesta que eu já vi! – ela sorriu.
- Senhora Park – Jungwon pareceu finalmente ter notado que ela estava ali o tempo todo – A senhora está se sentindo melhor? Me desculpe por invadir a sua casa desse jeito.
- Imagina, foi um ótimo jeito de começar o dia! – ela riu – Eu estou ótima, inclusive queria te agradecer por ter me ajudado aquele dia, Jay falou sobre como foi você quem pagou pelo táxi, eu realmente estou muito agradecida.
- Ah imagina, fico feliz de ter ajudado – ele sorriu.
- Meu Deus, você é um garotinho tão agradável – ela não aguentou e apertou a bochecha dele – Como sequer você anda com o meu filho?
Ao ouvir aquilo, Jay resmungou. Ele ainda estava com o rosto todo vermelho, a ponta de suas orelhas estava pegando fogo, mas lá estavam aqueles dois falando sobre banalidades, como se um deles não tivesse acabado de se declarar com buquê e tudo!!!
Jay queria falar alguma coisa, mas desde que Jungwon se ajoelhou diante dele daquele jeito, sua cabeça estava lhe matando, doía tanto que ele não sabia se sentia mais vergonha ou mais dor. Ele estava naquele conflito até que foi o mais novo que apontou que havia algo errado.
- Seu nariz – ele disse – Sangue.
Ele saiu do transe e limpou com a mão, aquela não era a primeira vez que seu nariz sangrava nos últimos dias, então ele não se importou. Enquanto isso, o buquê de flores continuava estendido em sua direção, até que foi sua mãe quem o pegou.
- As flores são lindas – ela disse – Vou colocar em um vaso.
- Mãe... – Jay resmungou.
- Você não vai me dar uma resposta? – Jungwon fez bico.
O mais velho coçou a cabeça um tanto envergonhado e então o puxou pelo braço, carregando-o para fora de casa. Eles desceram as escadas e Jay apenas caminhou um tanto depressa, enquanto o mais novo o acompanhava um tanto confuso. Eles andaram por umas três quadras, até que Jay parou no meio de um parque. Naquele momento, não havia ninguém em volta, então ele podia falar o que queria dizer.
- Você não acha que está sendo precipitado? – perguntou.
- Eu só estava tentando lutar contra meus sentimentos por você, mas percebi que não posso passar a vida toda fazendo isso – Jungwon explicou – Eu gosto de você, quero ficar com você, quero te beijar e...
Naquele instante, Jay tampou a boca dele com a mão, seu rosto azul de vergonha, mesmo que não houvesse ninguém ao redor deles agora.
- Eu não posso – disse quando soltou a boca dele – Desculpe, não posso namorar você.
- Por quê? – Jungwon perguntou frustrado – Não sou bom o bastante?
- Não é isso...
- Você não gosta de homens?
Ao ouvir aquela pergunta, Jay não soube o que responder. Ele nunca havia se apaixonado por ninguém, então como saberia do que gosta? Mas era verdade que andava muito confuso ultimamente, seu coração dando palpitadas esquisitas sempre que via aquele garoto, mas ele não estava pensando sobre isso, e agora Jungwon simplesmente tinha se declarado. Era muito para uma pessoa assimilar tão rápido!
- Não é isso também – ele continuou.
- Então já há outra pessoa que você goste? – Jungwon estava tentando descobrir.
Ele ficou esperando, mas o outro balançou a cabeça, o que fez com que ele sorrisse. Por algum motivo, ele estava aliviado que Jay não gostava de mais ninguém.
- É só que... você chegou de repente, e... – ele suspirou – Eu não posso.
Ao ver a hesitação do outro, Jungwon assentiu e entendeu. Por mais que ele estivesse esclarecido em seus sentimentos, não era certo esperar que o outro estivesse da mesma forma. Apesar de ter recebido um não, ele estava um pouco feliz, não era como um “nunca”, parecia mais como um “talvez depois”, então ele achou que não devia mais insistir por enquanto.
- Está tudo bem, eu entendo – disse.
- Desculpe – Jay respondeu um tanto sem graça.
- Mas eu não vou sair do seu lado, viu? Não pense que você vai se livrar de mim tão cedo.
O mais velho assentiu e se sentiu reconfortado, ele não queria mesmo que Jungwon sumisse, o que era estranho, já que aquela era a primeira vez que ele não queria se afastar de alguém.
- Por que você gosta de mim? – ele perguntou de repente – Quer dizer, eu sou...
- Não sei – Jungwon foi sincero – Não sei por que eu gosto de você.
Ao ouvir aquilo, Jay sorriu.
- Ah, eu sei – ele voltou atrás – É por causa do seu sorriso.
- Tsc – as bochechas de Jay ficaram vermelhas.
- Eu preciso de uma razão? – Jungwon pensou – Eu apenas gosto de você, quero ficar ao seu lado e viver muitas coisas com você – disse – Quando olho para você, meu coração bate acelerado no peito e sinto que é certo, mesmo que pareça errado, é realmente certo.
Ao ouvir aquelas palavras, Jay sentiu uma estranha vontade de abraça-lo, ao mesmo tempo que queria chorar.
- Jungwon – ele disse – Eu não entendo o que eu sinto por você, parece que há algo entre nós, algo que eu não consigo ver, mas que parece existir há muito tempo, você acha que é loucura?
O mais novo balançou a cabeça.
- Desde que conheci você, parece que todos os momentos são como um dèjá vu.
Os dois se olharam e ficaram um tanto desconfiados.
- Talvez exista – Jungwon continuou – Algo entre nós, que existe há muito tempo.
Jay achava aquilo absurdo, o pensamento por si só não fazia sentido, mas quando o mais novo lhe comprovava que via aquela situação estranha da mesma forma, mais certo ele ficava de que não tinha enlouquecido.
Eles caminharam por algum tempo em silêncio, perdidos em pensamentos. Jay ainda estava tentando entender seus sentimentos quando Jungwon veio com uma pergunta que aparentemente não tinha nada a ver com o que ele pensava.
- Posso te perguntar algo? – disse – Por que você não usa o seu verdadeiro nome? Todos te chamam de Jay, até mesmo os professores.
- Hum, acho que virou um hábito – o mais velho respondeu – Minha mãe contou que quando eu tinha uns dois anos, comecei a me chamar de Jay, por mais que ela insistisse em me fazer aprender que meu nome era Jongseong, eu continuava a dizer que me chamava Jay, então por fim ela desistiu – ele deu de ombros – E então até mesmo ela começou a me chamar assim.
- Será que você ouviu o nome Jay em algum lugar?
- Talvez, eu realmente não sei – ele pensou – Mas eu gosto, me identifico com esse nome.
- Eu gosto também – Jungwon sorriu – Me traz um sentimento de familiaridade.
- Você já conheceu algum Jay?
- Eu não sei – o mais novo riu.
Jay balançou a cabeça.
- Nossas conversas são muito estranhas.
- É verdade, mas elas também são confortáveis – Jungwon sorriu.
Os dois se olharam e o sentimento era mútuo, mas também ainda se sentiam estranhos, já que um deles tinha sido rejeitado a poucos minutos.
- Eu devia ir – Jungwon continuou, limpando a garganta – Desculpe pela confusão.
- Está tudo bem – Jay assentiu.
O mais novo então deu um sorrisinho e chamou um táxi. Jay ficou esperando até que ele estivesse dentro do carro e partisse. Quando ele se foi, ele ainda ficou algum tempo parado no meio do parque, pensando que tinha acabado de viver algo um tanto único. Desde que Jungwon surgiu em sua vida, tudo tinha virado de cabeça para baixo, mas ele estranhamente não se sentia mal por isso.
Dentro do táxi, Jungwon baixou a cabeça em frustração. É claro que tinha dito que estava bem para que Jay não se preocupasse, mas no fundo estava frustrado e um pouco envergonhado. Ele nunca tinha se apaixonado antes, e logo de primeira tinha sido rejeitado. No entanto, por mais chateado que estivesse, algo lhe dizia que talvez, em algum momento, aquele garoto iria corresponder aos seus sentimentos.
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