31 de dezembro de 1995
Largo Grimmauld
22:43
Alguns meses antes, quando Eleanor, finalmente, começou a se sentir bem, novamente, ela jurava que aquela sensação duraria para sempre.
Até o momento em que teve que encarar Lucius Malfoy, apenas algumas horas depois de descobrir que ele era o seu bicho papão. E, também, não havia sido como se as coisas tivessem sido muito melhores, depois que chegou na escola.
Umbridge, as detenções de Harry, o sumiço de Hagrid, a Ordem da Fênix, a situação com seus amigos, a briga com Pansy e as detenções que a acompanharam, a pressão... tudo havia ficado muito pior, mas, é claro, também não havia sido duradouro.
Simplesmente não sabia mais lidar com a incerteza de como as coisas seriam. Com a instabilidade da sua felicidade, ou, da falta dela. Na verdade, duvidava que sequer tivesse conseguido lidar com isso, algum dia.
Não entendia o motivo de tudo ter dado tão errado... há apenas alguns anos, era uma aluna nascida trouxa da Lufa-lufa, que poucas pessoas sabiam o nome, que se misturava com a multidão, não tinha tantos amigos, e nem tantos inimigos. E estava feliz assim. Estava tão feliz.
Como foi que tudo virou de cabeça pra baixo? Qual foi a decisão que deu o pontapé inicial?
A resposta óbvia era o maldito momento em que colocou o seu nome no Cálice de Fogo, mas, depois de tantas horas em silêncio, trancada no quarto, depois do que aconteceu no dia em que foram visitar o Sr. Weasley, ela percebeu que, talvez, tivesse sido muito antes.
A noite em que decidiu seguir o Professor Lupin até o Salgueiro Lutador, talvez? Mas, também, isso não teria acontecido, se não tivesse aceitado se tornar assistente dele... e não teria sequer recebido a proposta, se não cumprisse detenção com ele. E, não teria recebido detenção depois de brigar com Draco na enfermaria, o que não teria acontecido se... bem, era um ciclo vicioso.
"Nada disso teria acontecido se eu tivesse rasgado a maldita carta", pensava, consigo mesma, enquanto encarava o teto envelhecido do Largo Grimmauld.
– Ei, El. – A voz de George a faz despertar de um transe profundo, e, ao erguer a cabeça, o viu parado, encostado no batente da porta. – Desculpa, não queria atrapalhar a sua sessão autodepreciativa do dia. – Brincou, enrugando o nariz.
– Tudo bem. – Deu de ombros, se sentando, e, quando se deu conta de que faziam dias desde a última vez em que se olhou no espelho, sentiu suas bochechas esquentarem. – Hã... você queria alguma coisa? – Disfarçou, passando os dedos entre os cabelos, esperando que aquilo fosse o suficiente.
– Ah, é... – Pigarreou. – Eu estava procurando a Elle, na verdade.
– Ai... – Levou uma mão ao peito, fingindo ofensa.
– Não é assim! – Sorriu. – É que o Fred sumiu tem uns vinte minutos, e nós estávamos falando de resolvermos algumas coisas da loja, antes do ano novo. E, obviamente, você não teria o visto.
– E quem te garante isso?
– Talvez, o fato de que você só sai do quarto pra usar o banheiro, e, de madrugada, pra assaltar a cozinha? – Arqueou uma sobrancelha, e ela ficou em silêncio, por alguns segundos. – As portas daqui são barulhentas, é meio impossível não escutar elas abrindo.
– Você tem um ponto. – Deu de ombros. – Bem, de qualquer forma, a Elle não está aqui... ela sumiu tem alguns minutos, na verdade.
– Estranho... – Pensou alto, franzindo o cenho. – Uma hora, ela aparece. Ou o Fred.
– Isso... – Balançou a cabeça, e os dois permaneceram em silêncio, como se não soubessem mais o que dizer.
– Você, hã... você tá bem? – Ele perguntou, hesitante. – Eu queria ter perguntado antes, mas a Mary disse pra nós deixarmos você em paz, e ninguém soube me dizer o que aconteceu lá.
– É só... ah... não foi nada. – Negou a cabeça, a abaixando.
– Você está se escondendo aqui tem dias, então, não, eu não acho que não foi nada. – Retrucou. – Mas, se você não quiser falar, eu é quem não vou te forçar.
– Obrigada. – Forçou um sorrisinho, e ele retribuiu. – Eu sei que os outros estão preocupados, e eu prometo que não estou fazendo isso pra chamar atenção. Eu só... – Gaguejou, por alguns segundos, sem saber como explicar o que sentia, e ele pareceu perceber isso.
– Eu sei. – Assentiu, e ela suspirou. – E ninguém acha que você está fazendo nada disso por atenção. Tem bastante coisa nas suas costas, não é?
– Podemos dizer isso...
– Se quer saber o que eu acho, eu digo que você está lidando com tudo muito bem.
– Mas não está ajudando em nada. – Bufou, mas logo se calou, envergonhada. – Desculpa, eu estou tagarelando... você pode voltar pros seus negócios.
– É isso que acontece quando você se isola das pessoas por dias, viu só? – Ergueu as sobrancelhas, parecendo achar graça. – E eu não me importo de escutar. Que é que você quis dizer, em não estar ajudando?
– Eu só tenho todas essas responsabilidades, porque Dumbledore achou que eu poderia ajudar a melhorar as coisas... eu deveria mostrar para todos que estou em perfeito estado, pra, assim, acreditarem no que eu e Harry estamos dizendo. – Explicou, enquanto ele se sentava na beira da cama. – Mas eu não consegui fazer nada disso! Pelo contrário, só estou piorando as coisas!
– E você já parou pra pensar que, talvez, isso esteja acontecendo porque você não está em perfeito estado? – Ergueu as sobrancelhas. – O Dumbledore deveria saber disso.
– Ele, com certeza, sabe. Mas, se ainda assim, decidiu fazer, é porque é necessário! Vai ver, é a única chance de conseguirmos melhorar as coisas, enquanto a Ordem não consegue mais provas do retorno de Voldemort, e eu estou estragando tudo! – Desabafou, cobrindo o próprio rosto. – Não estou conseguindo usar nada disso a meu favor, mas, também, não consigo agir como se tudo estivesse igual era antes. Pra que é que eu sirvo, então?!
– Você está sendo dura demais consigo mesma. – Fez careta. – Tenho certeza de que todos sabem que você está dando o seu melhor! Eu, certamente, sei disso!
– Mas, e se o meu melhor não for o suficiente? Eu deveria estar fazendo mais, mas... – Ergueu o olhar para ele, entristecida, e ele permaneceu em silêncio, por alguns segundos, suspirando. – Eu não acho que fui feita pra isso, George. – Confessou, e a sua voz falhou.
– Isso tudo vai acabar logo... essas farsas do Ministério. Você-Sabe-Quem não vai conseguir ficar escondido por muito tempo. – A consolou, parecendo tenso com o fato de ela estar na beira das lágrimas. – E, assim que aquele filho da puta der as caras, todo o Mundo Bruxo vai se ajoelhar diante de você e do Harry, pedindo perdão, por não terem acreditado em vocês!
– Eu não quero que ninguém me peça perdão. – Negou com a cabeça. – Só quero que tudo acabe logo... que tudo volte a ser como era antes... será que é pedir demais?
– É, sim, se quiser que eu seja sincero. – Riu pelo nariz, ácido.
– Eu sei que é... – Suspirou, derrotada.
– Sabe o que você precisa fazer? – Se levantou, com um pulo.
– De dez minutos trancada numa sala com a Umbridge, o Fudge, o Lucius e a minha varinha?
– Seria uma boa, mas não é isso. – Deu risada. – Você precisa socializar um pouco! Aproveite que todos vieram pra cá, hoje, e saia do quarto, por algumas horas!
– Eu não sei, não. Ainda estou tomando meus remédios, e eles me deixam bem sonolenta... – Enrugou o nariz, desanimada. – E, de qualquer forma, eles não vão me deixar participar da reunião.
– Quem é que disse algo sobre reunião?
– Você disse, oras. – Deu de ombros. – Disse que todos estavam vindo pra cá!
– E estão. – Assentiu. – Mas é porque o Sirius insistiu que todos comemorassem o Ano Novo aqui! Já estão todos lá embaixo!
– Ano N... que dia é hoje?! – Arregalou os olhos.
– Te dou duas chances pra adivinhar. – Ironizou, e achou graça da reação dela, ao ver a garota se desesperar mais ainda.
– Pelo amor de... fazem tantos dias assim?! – Sentia seu coração pulsar, muito acelerado. – Eu sabia que as horas estavam passando rápido, mas eu achei que... sei lá! Que fossem por causa dos remédios! Não que, literalmente, já tivesse passado uma semana!
– Seis dias, tecnicamente. – A corrigiu, mas, quando ela o encarou, irritada, ele deu uma risadinha nervosa. – Foi mal... você vai descer, então? – Mudou de assunto.
– Eu não sei se...
– Ótimo, vou avisar aos outros que você vai! – Se apressou para andar até a porta, antes que ela tivesse a oportunidade de responder. – Já são quase onze horas, então, se eu fosse você, me apressaria... venho ver se você está pronta em alguns minutinhos. – A lançou uma piscadela exagerada, antes de fechar a porta atrás de si.
* * * *
– Onde é que está?! – Sirius repetiu, pela quarta vez, enquanto abria o mesmo armário da cozinha.
– Six, você sabe que abrir esse armário toda hora não vai fazer as taças aparecerem, não é? – Remus perguntou, com uma expressão levemente preocupada no rosto.
– Por que nós não podemos usar copos normais? – Georgia fez careta, enquanto seguia Sirius, de um lado para o outro. – Tem vários copos perfeitamente limpos, bem ali! – Apontou para o topo do armário.
– Aqueles são copos de beber água, ou suco, ou algo do tipo! – Sirius apontou, parecendo frustrado, e ele e Georgia apenas se encararam por alguns segundos, enquanto ela arqueava uma sobrancelha. – ...não é a mesma coisa, tá bem?!
Os sons de passos desceram a escada, e Eleanor e George entraram na cozinha. A garota se assustou, por alguns segundos, quando viu a pequena bagunça.
– El! – Remus se levantou da mesa, afobado, ao vê-la, e andou na direção dela. – Achei que não fosse te ver hoje!
– Essa daqui nem sabia que hoje era dia 31. – George a cutucou com o cotovelo, bem humorado.
– George! – Ela o repreendeu, envergonhada.
– Não deixem o Sirius ouvir isso... está uma pilha de nervos, o dia inteiro. – Sussurrou, e os três olharam na direção dele, que abria o mesmo armário, mais uma vez.
– Se corrermos até o centro, talvez ainda dê tempo de comprar taças novas. – Mary sugeriu, sentada na mesa.
– Não, não será o suficiente! Eu quero as antigas taças da família, e faço questão de acordar aquele maldito quadro da mamãe, só pra ela me ver usar elas! Será que posso ter, pelo menos, isso?! – Exclamou, frustrado, enquanto massageava a ponte do nariz. – Agora, Georgia, pare de ser imprestável e me ajude a procurar!
– O que ele está fazendo? – Eleanor franziu o cenho.
– Sirius não lembra onde guardou as taças da família, e está insistindo que todos usemos elas hoje. – Remus a explicou.
– Umas taças de prata? – George perguntou, e Sirius se virou para eles, bruscamente. - Com uns brasões, e tal?
– SIM! Elas! Você as viu?! – Andou até eles, agitado.
– Não vi, na verdade. – Formou uma linha com os lábios. – Só vi você usando elas, uns meses atrás, e presumi que fossem as mesmas.
Sirius era um tanto mais baixo do que George, o que fazia com que ele tivesse que erguer a cabeça para olhá-lo, mas isso não o impediu de o lançar uma careta muito irritada.
– Você acha que isso é uma piada, Fred? – Perguntou, muito sério.
– George... – Eleanor sussurrou, o corrigindo.
– FOI O QUE EU DISSE! – Levou as mãos até os cabelos, bufando.
– Sirius! – Remus o repreendeu, franzindo, levemente, o cenho, e apontando para Eleanor com a cabeça.
Black ficou em silêncio, por alguns segundos, enquanto contava até dez, com os olhos fechados. E, então, os abriu e se virou para Eleanor, com um sorrisinho no rosto.
– Desculpe por isso, El. – Suspirou, colocando uma mão em cada ombro dela. – É ótimo te ver fora da cama. Quer comer alguma coisa?
“Ótimo, o Sirius está enlouquecendo...”, ela pensou, sem saber o que responder.
– E, mais uma vez, nós salvamos o dia! – A voz de Helena soou, quando ela e Fred entraram na cozinha, carregando uma caixa de papelão cada um.
– Não me diga que encontraram! – Sirius ergueu as sobrancelhas, de repente não parecendo tão irritado.
– Nós não dizemos, então... – Fred deu de ombros, fingindo fechar um zíper na própria boca.
– Onde estavam?! – Perguntou, ignorando a piada; parecia estar levando tudo aquilo muito a sério.
– No armário do segundo andar. – Helena contou, apontando para o andar de cima. – Foi bem fácil de encontrar, na verdade.
– Fácil?! Fácil de encontrar? – Sirius contorceu o rosto, e Eleanor jurou que viu um dos olhos dele piscar, involuntariamente.
– Hã... sim?
– ENTÃO, POR QUE DIABOS VOCÊS DEMORARAM TANTO?! – Colocou as mãos na cintura, e os dois se entreolharam, ficando estranhamente corados.
– Nós... er... as caixas...
– Muita poeira...
– Isso... a poeira...
– Não importa! Dêem aqui! – Tomou a caixa das mãos de Fred, respirando fundo, impaciente. – Remus, pegue a outra! Não temos muito tempo!
– Sinto muito por isso, crianças... ele está... com os nervos a flor da pele, como vocês já devem ter notado... – Remus se desculpou, em um sussurro, enquanto pegava a caixa de Helena, rapidamente o seguindo.
– Credo. – Fred murmurou, baixinho, fazendo careta. – O espírito festivo dessa casa deve ter morrido junto com o tal Jesus, no Natal.
– O Natal celebra o nascimento de Jesus, seu besta. Eu já te expliquei isso tantas vezes... – Helena revirou os olhos, contendo a risada.
– Oras, essa religião dos trouxas é confusa, ok? Comemoram o nascimento, a morte, a ressurreição... são muitas datas! – Se defendeu, cruzando os braços. – E eu só quis fazer um trocadilhozinho de nada...
– E você falhou miseravelmente. – Eleanor apontou, achando muita graça da situação. – Tente de novo na Páscoa.
– Vou lembrar disso. – Coçou a nuca.
– Eu sempre achei que os bruxos entendessem de religiões também... – Ela confessou, inclinando a cabeça pro lado. – Nós temos feriados em Hogwarts, afinal.
– Grande parte das famílias bruxas acabam adotando ás religiões dos trouxas, mas não são todas. – Helena deu de ombros. – Não tem uma menina da nossa turma que é judia?
– A Katie, não é? – George franziu o cenho, pensativo. – Não tenho certeza, nós não falamos muito disso.
– É, nós nunca fomos fãs de falarmos sobre o que não entendemos. – Fred deu de ombros. – É tudo muito confuso, não é?
Não demorou muito para todos, enfim, estarem reunidos, na cozinha. Mary e Eleanor tentavam fazer o velho rádio de Sirius funcionar, para que pudessem sintonizar na estação que faria a contagem regressiva para a meia-noite; enquanto isso, Sirius, Georgia e Arabella estavam mais focados em preparar bebidas para todos. Não-alcoólicas para os mais novos, é claro.
– Pra quê tantos frufrus, pelas barbas de Merlin?! – Moody os monitorava, fazendo cara feia para a demora das bebidas. – Se vocês querem beber, virem a garrafa de uísque de fogo de uma vez!
– Alguns de nós são fracos para bebidas, Olho-Tonto! – Mary protestou, enquanto cutucava as antenas do rádio com a ponta da varinha.
– E, com "alguns de nós", ela está falando de si mesma. – Georgia acrescentou, e, ao ver que Mary a lançou um olhar feio, deu língua para ela.
– Na minha época, bebíamos tudo do gargalo... – Moody resmungou, balançando a cabeça em desaprovação.
– E existiam garrafas na sua época, Olho-Tonto? – Fred ergueu as sobrancelhas, fingindo surpresa. – Achei que vocês ainda estavam aprendendo a fazer fogo com pedras!
Algumas risadinhas abafadas ecoaram, enquanto Moody batia o cajado no chão e fingia não ter escutado; Eleanor jurou ter visto Tonks se inclinando através da mesa, pedindo um high-five para o garoto.
– Vocês precisam de ajuda? – Cedric parou ao lado delas, parecendo ter se incomodado com o som de estática que estava saindo do rádio pelos últimos dez minutos.
– Seria bem apreciada... pode chamar a Mione, Ced? – Eleanor pediu, e ele fingiu ter sido atingido bem no peito, fazendo careta. – O que foi?!
– Eu perguntei porque estava me oferecendo pra ajudar, sabe...
– Ah, Ced... – Ergueu o corpo, deixando o rádio de lado por alguns segundos. – Você não conseguiria.
– Você me subestima. – Colocou as mãos nos quadris.
– Não, não subestimo. – Apoiou uma mão no ombro dele. – Eu só me lembro do fiasco que foi, ter que assistir você e o seu pai tentarem montar uma barraca, no dia da Copa de Quadribol...
O rosto, normalmente pálido e com a barba por fazer, de Cedric, rapidamente ficou vermelho; tanto quanto o suéter que ele usava.
– Hermione, a El quer a sua ajuda... – Ele chamou, depois de dar as costas para Eleanor, a deixando para trás, dando uma risadinha.
Enquanto as três nascidas trouxas tentavam fazer o rádio funcionar, os outros membros da Ordem da Fênix colocavam as conversas em dia; quase todos estavam ali, além das pessoas que já estavam morando lá.
– Minha nossa... – Remus pareceu muito surpreso ao ver as três curvadas sob o rádio. – Tão difícil assim?
– Mais do que parece! – Mary bufou, enquanto colocava uma mecha cacheada atrás da orelha. – O sinal aqui é péssimo...
– Use um feitiço pra amplificar o sinal!
– Eu já tentei! – Balançou a cabeça, impaciente. – Mas, acho que os feitiços de proteção são fortes demais pra isso.
Com isso, Sirius saiu de trás da bancada que dividia a cozinha, de fato, da mesa de jantar, carregando, consigo, uma bandeja de bebidas. Ao ver o grupo reunido em volta do rádio, deu uma gargalhada sincera.
– De quantas nascidas trouxas você precisa, para fazer um rádio funcionar? – Brincou, e, quando Remus ergueu a cabeça para ele, gargalhou mais ainda. – De quantas nascidas trouxas, e lobisomens, você precisa, para fazer um rádio funcionar? – Se corrigiu.
– Puxa, ainda não fizeram esse negócio funcionar?! – Arabella franziu o cenho, parecendo intrigada. – Onde está o...? Zahi! ZAHI! – Balançou as mãos, chamando a atenção do marido, que conversava com Helena e Ayaan, do outro lado da sala.
– Eu acho que é muito interessante, de fato, mas, pelo que Ayaan me diz, parece que vocês não têm muita oportunidade de explorar todos os lados da Adivinh... sim? – Ele ergueu o olhar, prontamente, na direção dela.
– Uma ajudinha com o rádio? – Pediu, com um sorrisinho, e, sem pestanejar, Zahi pediu licença e andou até eles.
– Qual é o problema aqui? – Perguntou, colocando a mão na cintura da esposa e olhando para o rádio, confuso.
– O sinal não pega direito aqui embaixo... eu fiz um feitiço pra ajudar, mas não foi muito potente, eu presumo. – Mary explicou.
– Ah, sim. Claro. – Balançou a cabeça. – Permitam-me... – Arregaçou as mangas do blazer que usava, se aproximando do rádio.
Eleanor observou, muito atentamente, enquanto ele movimentava os dedos ao redor da antena, e pequenas faíscas roxas e azuis saíam das pontas deles, apenas por alguns milissegundos. Não demorou muito para, enfim, a estática dar lugar para a voz teatral de um locutor.
– ...minutos para o Ano Novo! – Anunciou, e, todos que pararam para escutar, grunhiram, frustrados. – No centro de Londres, a queima de fogos promete! Uma grande multidão se reuniu, este ano, e todos esperam, ansiosamente, pelo espetáculo desse ano!
– Ah! A queima de fogos! – Eleanor bateu palmas, animada, dando alguns pulinhos; depois do Natal, sua coisa preferida no mundo eram os fogos de artifício do Ano Novo. – Aposto que, se formos olhar das janelas, vamos conseguir ver um pouquinho!
– Estamos tão perto assim? – Helena franziu o cenho, mas parecia animada.
– A queima de fogos é próxima do Big Ben, e ele fica a uns... vinte minutos de distância. – Relembrou, coçando a cabeça. – Dos andares mais altos, deve dar pra ver alguma coisa, sim!
– Do 5º andar, dá pra ver bastante coisa. Já assisti algumas vezes, uns anos atrás. – Sirius comentou, sorrindo fraco, mas parecia um tanto nostálgico. E não de um jeito bom. – Enfim... vocês vão beber, ou o quê? – Gesticulou com as mãos, para as bandejas de bebida, em cima da mesa, e todos, rapidamente, pegaram um copo.
Eleanor ficou para trás, esperando que todos tivessem sua vez, mas Helena, logo, saiu do amontoado com dois copos, estendendo um na direção dela.
– Peguei o seu! – Sorriu, mostrando quase todos os dentes; um sorriso muito específico de quando estava animada.
Eleanor a lançou um sorriso agradecido, enquanto pegava o copo das mãos dela. Em alguns segundos, todos formaram um enorme círculo, em volta do cômodo, e ficaram em silêncio, enquanto escutavam o rádio.
– Um minuto para o início de 1996, e para o início da queima de fogos! – O locutor anunciou, e, pelo tom de sua voz, era possível notar que estava sorrindo.
Um murmúrio de animação se fez, ao redor do grupo, mas todos, praticamente, mantiveram o silêncio; não gostariam de perder a contagem regressiva.
– Ei, El! – Helena sussurrou, se inclinando para a amiga, que estava bem ao seu lado. – O que acha de, quando der meia-noite, nós duas brindarmos os copos e darmos um gole?
– Eu... – Estreitou os olhos, erguendo a cabeça para encarar a amiga, desconfiada. – Isso aqui não tem álcool, tem? – Apontou para o seu copo.
– Não! O seu, não, pelo menos... – Deu um sorrisinho, com a língua entre os dentes.
– Tudo bem... – Deu de ombros, assentindo com a cabeça.
– É agora! – Tonks exclamou, apontando para o rádio.
– 10, 9, 8...
Eleanor, de repente, teve o impulso de olhar em volta, sentindo como se tudo estivesse em câmera lenta. Desde o Torneio Tribruxo, passava mais tempo do que gostaria de admitir pensando sobre o fato de que, se as coisas fossem minimamente diferentes, ela poderia estar morta.
De certa forma, aquilo havia a feito ter um pouco mais de apreciação pelos momentos que compartilhava, com as pessoas que amava. Havia adquirido o hábito de tirar um retrato mental de todos os momentos felizes que tinha, desde então; não que fossem muitos.
E, durante aquela contagem de dez segundos, ela sentia uma enorme sensação de pertencer. De contentamento. Como se estivesse exatamente onde deveria estar.
Helena, ao seu lado, estava nas pontas dos pés, contando, alto. Ao redor do círculo, todos pareciam extremamente confortáveis na presença um do outro; Ron balançava Harry de um lado para o outro, com um braço por cima do ombro dele, e o amigo dava risada. Zahi e Arabella estavam abraçados, parecendo mais contidos, enquanto, ao lado deles, Ayaan era forçada a saltitar, junto de Gina e Hermione, já que as duas estavam agarradas aos braços dela.
Fred e George se entreolhavam, parecendo prestes a aprontarem algo, mas Eleanor sequer teve tempo de pensar sobre isso, já que continuava olhando em volta.
Sirius ameaçava dar um gole da sua bebida, mas Remus empurrava o braço dele para longe, murmurando: "Espere a contagem!", enquanto Georgia e Mary, ao lado deles, pareciam duas adolescentes tímidas, se entreolhando.
A Sra. Weasley parecia um tanto cabisbaixo, mas Tonks não havia hesitado em tentar fazê-la se sentir mais animada; balançava, freneticamente, o braço dela e o de Moody, que bufava, impaciente. E, em uma parte mais isolada do grupo, estavam Shacklebolt, Bill, Amos e Mundungo, que já brindavam os seus copos.
Por apenas dez segundos, Eleanor permitiu a si mesma o prazer de ignorar tudo que a incomodava. Apenas por dez segundos.
Para que, ao menos, pudesse passar os primeiros segundos do novo ano sem sentir como se sua cabeça fosse explodir.
– 3, 2, 1... – O locutor pausou, por alguns segundos, e o som de uma rolha de champanhe sendo estourada soou, através do rádio. – E Feliz Ano Novo! 1996 chegou, e nós, aqui da BBC Radio, desejamos a você, caro ouvinte, um ótimo ano!
Eleanor ficou momentaneamente surda, quando todos gritaram, ao mesmo tempo, mas Helena chamou sua atenção ao bater seu copo com o dela; os sons em volta delas era tão alto, que mal puderam escutar o tilintar dos vidros. As duas se entreolharam, com os olhos arregalados, e, entre risadas, deram um grande gole em seus copos.
Eleanor se arrependeu amargamente de ter dado um gole tão grande; a sensação de que sua garganta estava sendo queimada a fez, imediatamente, inclinar a cabeça para a frente, tossindo, engasgada, mas sua reação passou despercebida pelo que os gêmeos fizeram.
Os dois tiraram as próprias varinhas dos bolsos e apontaram para o teto, de onde várias faíscas coloridas saíram, imitando fogos de artifício; seria muito bonito, se o som não fosse absolutamente ensurdecedor.
Moody, que não havia sido previamente alertado sobre isso, imediatamente entrou em estado de alerta e tirou a própria varinha do bolso, enquanto seu olho mágico girava, loucamente.
– PUTA QUE... – Eleanor tossiu, limpando a própria língua com a manga do suéter que usava, contorcendo o rosto de forma extrema.
– ...QUE PARIU! – Remus gritou, ao mesmo tempo, se abaixando, pego de surpresa.
Por alguns segundos, ninguém ali pareceu entender direito o que é que estava acontecendo no cômodo; alguns já comemoravam, abraçando ao próximo, mas, no meio do susto, tentavam se soltar. Harry e Ron haviam caído para trás, assustados, enquanto Ayaan colocava os braços na frente de Hermione e Gina.
Alguns segundos depois, uma faísca branca cegou a todos, temporariamente, e os fogos cessaram, deixando apenas uma fumaceira, e alguns tímpanos estourados.
– O que diabos... – Bill cortou o silêncio, falando mais alto do que o normal, enquanto apertava os ouvidos. – ...acabou de acontecer?!
Tossindo, em meio a fumaça, Zahi movimentou as mãos, e, aos poucos, a sala voltou ao normal. Tudo fez sentido, então, quando todos viram os gêmeos parados, no meio do cômodo, com sorrisos alegres nos rostos.
– Feliz Ano Novo? – Eles disseram, em uníssono, dando de ombros, e, por alguns segundos, temeram que fossem estar em apuros pelos próximos 15 anos. Mas, para a surpresa deles, as risadas ecoaram.
– Acho que eles trouxeram o Ano Novo pra nós, não é? – Arabella riu, apertando a ponte do nariz, parecendo não conseguir se controlar.
– Todos estão bem?! – Moody olhou em volta, com o cenho franzido, mas, assim que constatou que ninguém havia perdido um membro, nem estava sangrando, voltou a sua posição de antes. – Um aviso teria sido legal... quase azarei os traseiros de vocês...
– Meu traseiro, não! – George exclamou, em choque, levando as duas mãos até o local, e, mais uma vez, as risadinhas ecoaram.
– Acho que a El engasgou na fumaça... – Cedric observou, e todos se viraram na direção de Eleanor, que ainda tossia.
– Não... – Ela respondeu, balançando as mãos, freneticamente. – Helena... você disse... sem álcool!!
– Mas, está sem al... ah, não... – Contorceu o nariz, mas, assim que olhou para o seu copo, arregalou os olhos. – Acho que esse é o meu... heh... – Trocou os copos, com o rosto muito vermelho.
– Helena, eu não acredito nisso... – Georgia ergueu as sobrancelhas.
– Foi um acidente! – Se defendeu, rapidamente. – Bem que eu achei o gosto bem fraquinho...
– Pelo menos, dá pra ver que a Eleanor nunca bebeu. – Sirius observou, e Remus o deu uma cotovelada.
– E nunca vou! – Ela ergueu o corpo, voltando ao normal, enquanto massageava seu pescoço. – Como é que vocês bebem isso por diversão?! É horrível!
– Me lembre de voltarmos nesse assunto daqui á alguns anos... – Sirius deu um sorrisinho de lado, enquanto dava um gole no seu próprio copo.
– Enfim... – Remus suspirou, depois de garantir que Eleanor estava bem. – Feliz Ano Novo, todo mundo!
– Feliz Ano Novo! – Tonks repetiu, animada, e, então, o clima de antes voltou a tomar conta do cômodo.
Agora que, finalmente, podiam comemorar, todos iam se abraçando, aos poucos.
Zahi e Arabella trocaram um rápido selinho, antes de abraçarem Ayaan. Gina abraçava a mãe, e, logo, os seus irmãos se juntaram a elas, enquanto a Sra. Weasley parecia conter algumas lágrimas. Hermione correu até Ron e Harry, os puxando para um abraço em grupo, e os dois apenas aceitaram, com as bochechas vermelhas.
Eleanor e Helena se abraçaram também, dando alguns pulinhos animados, e, assim que se soltaram, a lufana abraçou Cedric, que estava bem ao seu lado. Logo depois, ele e Helena também deram um abraço desajeitado; ela estendeu a mão, envergonhada, mas ele já tinha aberto os braços.
Eleanor desviou deles para andar até Lupin, mas deu meia-volta, contendo um sorrisinho, quando viu que ele e Sirius ainda estavam se abraçando. Hermione logo a alcançou, a abraçando forte.
Ao lado delas, Georgia e Mary apertavam as mãos, mas, em apenas alguns segundos de contato visual, já haviam deixado isso de lado, se abraçando de uma vez. Mesmo depois de tantos anos, o abraço ainda parecia muito familiar, como se a última vez tivesse sido ontem.
Ayaan se juntou á Eleanor e Hermione, e abraçou Eleanor de lado, parecendo um tanto sem jeito, e a lufana aceitou aquela demonstração de afeto de bom grado; sabia que a amiga não era uma pessoa muito física.
Depois de abraçar grande parte do grupo, Eleanor se sentia muito aliviada, e, francamente, orgulhosa de si, por estar conseguindo fazer isso novamente. Era parte de quem ela era, e era uma sensação muito boa, ter isso de volta.
Enquanto tentava, novamente, andar até Sirius e Lupin, ela trombou em Harry, que acabava de vir de lá, e os dois sorriram um para o outro, antes de se abraçarem também. Não precisaram falar nada, mas ambos sabiam que, pela primeira vez em tantos meses, se sentiam como se fossem adolescentes normais.
Quando se soltaram, os dois notaram que, bem próxima deles, Georgia os observava, enquanto Mary fingia não notar. O garoto lançou um olhar tenso para Eleanor, que balançou a cabeça.
– Ano novo... simboliza recomeço, sabe... – Murmurou para ele, antes de o dar dois tapinhas no ombro e se afastar, indo na direção de Remus e Sirius.
Harry odiava admitir que estava errado. Principalmente, quando isso significava que Eleanor estava certa.
Com as mãos nos bolsos do seu casaco, andou até Georgia, e, automaticamente, Mary deu meia volta e se afastou, andando até Tonks.
– Oi... – Ele murmurou para a ruiva, que, desajeitadamente, apoiou seu copo em cima da mesa.
– Harry! Oi! – Sorriu, fingindo naturalidade; era a primeira vez, em dias, que ele sequer reconhecia a sua presença. – Feliz Ano Novo... – Cruzou os braços, como se fosse muito descolada.
– É... pra você também. – Balançou a cabeça. – Eu só... bem... é...
– Eu sei. – Assentiu, sabendo exatamente qual era a dificuldade dele, e, por alguns segundos, os dois apenas sorriram um para o outro.
– Era bem legal, sabe. – Comentou, mas apenas recebeu um olhar confuso dela. – O computador. Eu nunca usei, mas ouvi muitos elogios. Acho que eu teria gostado.
– Eu também acho que teria. – Sorriu de lado. – Não se preocupe com isso. Eu vou me resolver com a sua tia.
– Nunca considerei ela minha tia, de verdade. – Deu de ombros, encarando o chão. – Muito menos agora, que eu posso ter uma tia de verdade.
Os olhos de Georgia nunca se arregalaram tanto, e ela não conseguiu conter o sorriso.
– Está certo quanto a isso.
– Desculpe pelo... transtorno.
– Não se desculpe... acho que eu faria pior, no seu lugar. – Confessou. – Nunca fui a pessoa mais calma do mundo, sabe.
– Aposto que você tem umas boas histórias. – Balançou a cabeça. – Você pode... me contar, um dia? Depois? Se você quiser...
– Eu adoraria, Harry.
– Ótimo. – Deu um sorrisinho. – Brilhante.
– É... brilhante. – Repetiu, nostálgica.
Um tanto sem jeito, mas, ainda com um sorrisinho no rosto, Harry se juntou á Ron novamente, enquanto Georgia parecia muito satisfeita com a conversa. Não esperava um abraço, tão rápido, mas, se esse tempo morando com Harry havia a ajudado a conhecê-lo melhor, sabia que uma conversa civilizada era o melhor cenário, naquele momento.
– Ei, vocês dois. – Eleanor parou de frente para Remus e Sirius.
– Ah, se não é a minha lufana preferida! – Sirius exclamou, parecendo já estar sentindo os efeitos iniciais de todas as taças que estava bebendo, desde cedo. – Não deixe a Tonks escutar isso... ela acha que só ser minha prima significa ser a minha preferida, mas é preciso lutar pela minha afeição, sabe? – Tagarelou, colocando o braço em volta dos ombros de Eleanor, a puxando para um abraço desajeitado de lado.
– Você sabe que está gritando, não sabe? – Tonks resmungou, estando a alguns passos de distância. – Seu pilantra!
– Er... quantas taças ele já bebeu? – Eleanor olhou para Lupin, nervosa.
– Só três, ou quatro... não sei o que aconteceu, para ele estar assim... – Coçou a cabeça, parecendo genuinamente.
Sirius, lentamente, se inclinou na direção de Lupin, com o dedo indicador sob sua boca, como se pedisse silêncio.
– El... não conte para o Aluado... – Ele sussurrou, parando para dar uma risadinha. – ...mas, eu pedi para o Zahi fazer aquele feitiço de deixar a bebida mais forte... ele enfeitiçou a minha taça...
Remus o encarou, entediado.
– Você olhou bem com quem é que você está falando, Sirius?!
– Desculpa... – Fez careta. – Me confundi... as semelhanças são inegáveis, puxa vida...
Lentamente, ele voltou á posição normal, se inclinando na direção de Eleanor, desta vez.
– Minha nossa... – Remus massageou as próprias têmporas.
– El, não conte para o Aluado... – Sussurrou, novamente, e Eleanor conteve a risada. – ...mas o Zahi fez aquele feitiço de deixar a bebida mais forte, sabe... eu pedi, e ele enfeitiçou a taça...
– Eu guardo o seu segredo. – Ela assentiu, o lançando um sorriso assegurador.
– Você é uma ótima garota, Eleanor. Ótima, mesmo... – Bagunçou o cabelo dela, logo depois de a dar um beijo no topo da cabeça. – Ainda bem que eu não sou mais seu bicho papão, não é?!
– Minha nossa, isso parece que foi há milhares de anos! – Gargalhou, fazendo careta.
– Ei, não me chame de velho! – Levou uma mão ao peito, fingindo ofensa. – Você quer pudim? – Mudou de assunto.
– Hein?
– Pudim! A sobremesa! – Explicou, mexendo as mãos, como se desenhasse o formato de um pudim. – Estou falando errado? Pu-dim... pu-dim... pu-din? Po-din. Po-dim...
– Estava certo da primeira vez... – Ela balançou a cabeça. – Se bem que, agora, você falou tantas vezes, que eu estou em dúvida...
– O Zahi enfeitiçou a taça dele mesmo, foi? – Mary se juntou a eles, com um sorrisinho bem humorado, enquanto entregava a Sirius um pratinho de pudim.
– Viu só, El? Pudim!
– Preciso dar uma palavrinha com o Zahi... – Remus bufou.
– Ah, não é culpa dele. – Mary se apressou a falar. – Com a chantagem emocional que o Sirius fez, acho que até o Moody se renderia.
– Chantagem emocional? – Eleanor franziu o cenho, enquanto tentava se equilibrar, com Sirius praticamente pendurado nela.
– “Doze anos em Azkaban... não ganhei nenhum presente de Natal, durante todo esse tempo... têm presentes tão simples, mas simbólicos, não é?” – Ela relembrou, imitando o sotaque de Sirius quase que perfeitamente; um sotaque britânico que você, facilmente, escutaria, entre as famílias mais ricas de Londres. Sofisticado, forte e muito enunciado.
– Ele é impossível... – Remus deu uma risada incrédula, enquanto tirava ele dos ombros de Eleanor e o sentava na mesa. – Coma o seu pudim, Six. – Rapidamente passou os dedos entre os cabelos dele, e, sem pestanejar, Sirius começou a comer.
Mary, tendo cumprido sua missão de fazer com que Sirius comesse algo doce, voltou ao lado de Georgia, que estava do outro lado da sala, conversando com Moody e Shacklebolt.
– Bem... como eu estava dizendo, feliz Ano Novo! – Eleanor se virou para Lupin, e ele sorriu, parecendo se lembrar do que estavam falando.
– Feliz Ano Novo, El. – Respondeu, e abriu os braços, sabendo que aquilo significava que ela queria o abraçar; havia visto ela andando, de pessoa em pessoa, distribuindo abraços. – Muitas expectativas para esse ano? – Perguntou, depois dela envolver os braços em seu tronco.
– No topo da lista, chutar a bunda do Ministério. – Ela confessou, com o rosto encostado no peito dele, e ouviu ele gargalhar.
– Sua prioridade não deveria ser passar nas N.O.Ms? – A afastou, com as mãos nos ombros delas, e arqueando uma sobrancelha.
– Er... – Ficou vermelha; havia se esquecido disso. – É claro. Eu não citei porque já está implícito, sabe.
– Sei. – Sorriu de lado. – Bem, eu sei que você, provavelmente, preferia estar passando o Ano Novo com a sua família de verdade, mas, devo dizer que estou feliz que você está aqui.
– Eu também estou. – Sorriu. – Vocês também são minha família. Minha segunda família! Sem essa de "família de verdade"...
– Espero que, nessa segunda família, eu não seja o equivalente do seu avô... – Comentou, e ela jogou a cabeça para trás, gargalhando.
– Não, você não é! – Negou com a cabeça. – Só entre nós, acho que é o Moody...
– Ou o Mundungo. – Acrescentou, e os dois roncaram, contendo as risadas.
– Ei! El! – Helena a chamou, das escadas, enquanto os mais novos subiam os degraus. – Nós vamos correr para o 5º andar, pra assistirmos aos fogos de artifício! Você precisa vir!
– Não precisa falar duas vezes! – A lufana exclamou, erguendo as sobrancelhas, e, rapidamente, se despediu de Lupin, se juntando á sonserina.
Se subir as escadas, normalmente, já era cansativo, subir correndo, definitivamente, era muito pior. A cada degrau, Eleanor desejava, mais e mais, poder fazer o exame de Aparatação logo. Pelo menos, Helena parecia ter simpatizado com a sua situação, e, mesmo que pudesse aparatar, decidiu subir junto com a amiga.
– Perdemos muita coisa?! – A ruiva perguntou, ofegante, quando as duas se juntaram aos outros, na pequena janela do corredor do 5º andar, bem em frente á porta do quarto de Sirius.
– Está absolutamente lindo! – Hermione suspirou, inclinada na direção da janela.
Eleanor se ajoelhou no chão, colocando os cotovelos no peitoril da janela e apoiando seu queixo em cima dos seus braços. Quando se fez confortável, não precisou procurar muito para encontrar as explosões coloridas acontecendo, bem no horizonte.
– Não está tão perto, mas acho que nosso espetáculo chega bem perto, não é? – Fred indagou. – O que acharam dos fogos de artifício, lá embaixo?
– Desculpe, Fred, você vai ter que falar mais alto, já que todos os meus tímpanos foram estourados. – Ayaan ironizou, com um sorrisinho no canto da boca. – Mas, se querem mesmo saber... foi até bonito, se ignorarmos o barulho.
– Ainda é um protótipo, sabem. – George comentou, encostado na parede. – Precisávamos testar, e, bem... qual seria um momento melhor do que esse, não é?
– Protótipo? – Eleanor franziu o cenho, sem tirar os olhos da janela. – Estão planejando vender fogos na loja?
– Não necessariamente. – Ele deu de ombros. – Mas... anunciar coisas no jornal parece algo tão antiquado, não é?
– Anunc... o que isso significa? – Estreitou os olhos e o encarou, por alguns segundos, desconfiada. – O que vocês dois estão planejando?
– O tempo dirá, El... o tempo dirá.
– Queria que pudéssemos ir até lá... – Gina lamentou, fazendo bico, enquanto as luzes refletiam em seus olhos.
– É, desculpem por isso. – Harry suspirou, coçando a nuca, parecendo sem jeito. – Se vocês não estivessem envolvidos na minha bagunça, acho que estariam tendo um Ano Novo mais animado... – Comentou, mas Gina apenas apoiou uma mão no ombro dele.
– Harry, deixa disso... – Balançou a cabeça. – Nós estamos aqui por você, e não tem nada que nos faça mudar de idéia.
– Isso aí! – Fred balançou a cabeça, de acordo.
– Já vai começar o ano se lamentando, Harryzinho? – George ironizou, e, só naquele momento, Eleanor percebeu que ele havia se sentado ao lado dela. – Não está começando muito bem, se quer saber.
– É, e vocês começaram quase explodindo a casa do Sirius! – Ron riu.
– E quase foram azarados pelo Moody, no meio disso! – Helena acrescentou, e os dois deram um high-five, entre risadas.
– Nada fora do normal pra gente, não é? – Fred deu de ombros. – Começamos sendo nós mesmos, se querem saber!
– Vocês planejam fazer disso uma rotina? – Ayaan indagou, parecendo genuinamente preocupada. – Quase explodirem a si mesmos, quero dizer.
– Quem sabe, minha cara Ayaan? Quem sabe? – George ergueu as sobrancelhas, alisando o próprio queixo. – Se você espera previsibilidade, acho que a Ordem da Fênix não é o lugar certo pra isso.
– E nós somos a Ordem da Fênix? – Gina arqueou uma sobrancelha. – Achei que fosse toda uma discussão, nós sermos justamente novos demais pra nos juntarmos...
– Isso são meros detalhes, irmãzinha. – George balançou as mãos, com descaso.
– Ei, dá pra calarem a boca e assistirem o espetáculo? – Eleanor os repreendeu, em tom de brincadeira. – Estão perdendo tudo!
Os fogos de artifício não tinham pausa; o céu ficava iluminado por várias cores, uma atrás da outra, e, por alguns segundos, se as cores certas fossem misturadas, parecia até mesmo que o sol estava nascendo, novamente.
Por alguns longos segundos, que parecem muitos minutos, o grupo ficou em silêncio, admirando as cores brilhosas, enquanto se amontoavam diante da janelinha. Estava apertado, e um tanto desconfortável, mas ninguém estava reclamando.
– Vocês acham que, tipo... – Ron cortou o silêncio, pensativo. – ...nós podemos fazer desejos, pra essas coisas? Tipo, as estrelas cadentes?
– Parece fofo! – Helena exclamou.
– Parece inútil. – Ayaan fez careta, e Hermione pigarreou, ao lado dela, a fazendo bufar, contrariada. – Mas, eu acho que, não custa nada tentar... – Acrescentou, num tom entediado.
– Que é que foi isso? – Eleanor sussurrou para Hermione, confusa.
– Nós estávamos falando sobre promessas de Ano Novo, e eu fiz ela prometer que ia ser mais legal com os outros, esse ano. – A grifinória explicou.
– E eu já me arrependo amargamente de ter feito isso. – Ayaan resmungou.
– Eu nem fiz uma promessa! – Eleanor arregalou os olhos.
– Ainda dá tempo. – George deu de ombros. – Que tal todos fazermos promessas, antes dos fogos acabarem?
Um murmúrio de concordância percorreu o grupo, e, então, todos voltaram a ficar em silêncio, pensativos sobre suas promessas.
– O Harry bem que podia prometer pensar e escutar antes de sair falando as coisas. – Eleanor ironizou, olhando para trás para sorrir para o amigo. – Ia te poupar de muitas detenções.
– Olha só quem fala. – Ele arqueou uma sobrancelha. – E o que é que você vai prometer, gênia?
– Eu prometo... hum... – Pensou, franzindo o cenho e estreitando os olhos, voltando á observar os fogos de artifício. – Eu prometo parar de tentar controlar tudo a minha volta, igual vocês falam que eu sempre faço. Satisfeitos?
– Profundo. Eu gostei. – George balançou a cabeça, em aprovação.
– E está apoiado! – Helena exclamou. – Eu prometo tentar não ser tão competitiva, no Quadribol.
– Você só fala isso, porque não quer lidar com seu ego machucado, quando perderem pra Grifinória. – Fred a provocou, com um sorrisinho de lado.
– Vê se não enche, Weasley. – Ela revirou os olhos e o empurrou, sorrindo também.
– Eu prometi que não iria mais ficar tão neurótica em fazer as coisas do meu jeito. – Hermione revelou, cruzando os braços. – Ayaan disse que eu preciso relaxar, e acho que ela tem razão.
– É claro que eu tenho razão. – A corvina sorriu consigo mesma, mas recebeu um olhar de desaprovação da amiga. – Certo. Mais legal. Desculpe.
– Acho que... vou fazer a mesma promessa da Eleanor. – Harry deu de ombros. – Estou sem idéias, mesmo.
– Copião! – Ela deu língua para ele. – Escolhe outro!
– Tá bom, tá bom... – Revirou os olhos. – Então, eu... prometo tentar não deixar minha raiva tomar conta, quando algo me incomoda.
– Eu prometo... me esforçar mais nas aulas, e não copiar tudo da Mione. – Ron pensou. – Pelo menos, não tudo... só as que eu tiver muita dificuldade.
– É um começo, eu acho. – A grifinória deu de ombros.
– Eu prometi que ia focar em melhorar no Quadribol. – Gina contou. – Se, quando eu me formar, eu não estiver na história da escola, como uma das maiores jogadoras da Grifinória, eu falhei na minha promessa.
– Ambiciosa. – Helena balançou a cabeça, aprovando. – Se quer saber, acho que você consegue!
– Obrigada, Elle! – Sorriu para ela, convencida.
– E vocês dois? – Eleanor encarou os gêmeos, curiosa. – São os únicos que não falaram!
– Minha promessa é um segredo, El. – George sorriu para ela, com um pequeno brilho nos olhos.
– Eu prometi que ia levar a loja mais a sério. – Fred revelou, dando de ombros. – Se deixar toda a papelada nas costas do George, e só querer a parte divertida, a loja não sai do papel esse ano, então... hora de colocar a mão na massa.
– É... isso. – George corou. – Eu também prometi... algo sobre a loja. – Desviou o olhar.
– Acho que esse ano vai ser melhor, pessoal... – Eleanor confessou. – Não sei. Faz tempo que eu não me sinto tão otimista assim. É um bom sinal, não é?
– Nunca se pode ter otimismo demais, não é? – Helena se inclinou através dos outros para dar dois tapinhas no ombro da amiga, demonstrando apoio.
– Então, feliz Ano Novo! – Ela sorriu.
– É bom ver que está voltando, aos poucos. – George afirmou, a observando. – Feliz Ano Novo, El.
– É... aos poucos. – Balançou a cabeça, e o olhar de orgulho dele a aqueceu, por alguns segundos, como se olhasse diretamente para o sol.
* * * *
A sensação de renovação pelo novo ano não durou muito tempo depois daquela noite, infelizmente, já que, assim que Sirius se recuperou da ressaca da taça enfeitiçada, passou a exalar mal-humor. Era como se, assim como todo o álcool em seu sistema, sua felicidade também tivesse evaporado; muito mal parecia o mesmo Sirius de antes do Natal.
A cada dia que o retorno das crianças para Hogwarts se aproximava, mais a acidez de Sirius se alastrava pela casa, como se fosse um gás venenoso. Logo, ninguém mais tinha aquela animação do Ano Novo.
Eleanor já havia perdido as contas de quantas vezes a Sra. Weasley havia chamado Sirius de “rabugento”, toda vez que ele mal tocava o seu café da manhã e se trancava no sótão, com Bicuço, por horas, sem falar com mais ninguém.
– Vai ver, ele só não está muito ansioso pra voltar a ficar na companhia do Monstro. – Gina teorizou, quando todos se reuniram no quarto das meninas, depois do café da tarde.
– Mas, ele não vai! Ele, literalmente, não está morando sozinho! – Hermione retrucou. – Os Buhari, a Georgia, o Lupin... todos eles estão ficando aqui!
– Você tem razão, Mione, mas acho que você esqueceu que, assim que voltarmos pra Hogwarts, eles também voltam a fazer missões para a Ordem. – Ayaan apontou. – Ele é o único que não pode sair daqui.
– Ele e o Monstro, você quer dizer. – Fred brincou.
– Onde é que ele estava, inclusive? Quando não encontramos ele, naquele dia? – Eleanor relembrou, olhando para Harry.
– Sirius disse que o encontrou no sótão, umas horas depois, coberto de pó. Disse que, sem dúvida, estava procurando mais tralhas da família.
– Oh. – Ergueu as sobrancelhas, pensativa. – Eu só... bem... deixa pra lá.
– O quê? – Ron franziu o cenho.
– Não é nada, só estou sendo paranóica, de novo... – Balançou as mãos, com descaso.
– No que você está pensando? – Harry perguntou, parecendo ansioso.
– É só que... ele está bem quieto, ultimamente, não acham? – Perguntou, olhando em volta, para os outros. – Tem muito tempo desde que ele me chama de... vocês sabem... e, na verdade, tem muito tempo desde que ele dá as caras pela casa, igual sempre fazia.
– Ah, você também reparou! – Ele suspirou, parecendo muito aliviado.
– "Também"? – Franziu o cenho.
– Eu reparei que, desde esse sumiço, ele está muito mais dócil... têm obedecido às ordens do Sirius sem reclamar...
– Agindo como um elfo doméstico normal, então? – Ron arqueou uma sobrancelha.
– Para o Monstro, você têm que admitir que é bem estranho... – Eleanor apontou, e ele pareceu sem argumentos, coçando a nuca. – Você falou isso pro Sirius, Harry?
– Muito mal consigo falar com ele, ultimamente... – Suspirou, abaixando a cabeça. – E, além do mais, acho que ele já está estressado demais. Não quero parecer que estou... sei lá... colocando minhocas na cabeça dele.
– Você devia falar com alguém. – Reforçou. – Lupin, Georgia, Zahi, Arabella... todos eles moram aqui, e podem ficar de olho.
– Eu queria é poder ficar aqui, com ele... – Confessou, cabisbaixo.
– Que isso, cara... – Ron o deu um tapinha leve no braço. – E a escola?
– E a escola?! – Repetiu, sarcástico. – Você sabe que, voltar pra escola, esse ano, significa voltar pras garrinhas da Umbridge, não é? Aquelas regras idiotas, as aulas, as detenções...
– Aposto que aquela cobra velha já conseguiu fazer o Fudge aprovar mais uns quinze decretos ridículos, enquanto estivemos fora. – Eleanor resmungou, irritada com a menção de Umbridge.
– Fora que nós três nem temos mais o Quadribol, pra ficarmos empolgados. – George lamentou, abraçando as próprias pernas. – Valeu a pena, é claro, mas, se eu soubesse que seria assim, teria batido com mais força...
– George. – Ela o deu uma cotovelada, o fazendo rir pelo nariz. – Acho que o Harry tem um ponto... com as N.O.Ms chegando, a nossa montanha de deveres vai duplicar.
– Tem a AD! – Helena relembrou, estalando os dedos. – Isso é bom, não é?
– Acho que... é, é algo bom. – Harry assentiu. – Tenho que dizer, Elle, se você não me lembrasse disso, acho que eu teria todos os motivos pra abandonar a escola e vir morar com o Sirius.
– É sempre bom ajudar. – Ela o deu uma piscadela.
O que aconteceu no último dia das férias, no entanto, fez Harry considerar seriamente o que havia dito antes.
– Harry, meu bem... – A Sra. Weasley o chamou, colocando a cabeça pra dentro do quarto, depois do jantar. – Pode dar um pulinho na cozinha?
O pedido dela não foi escutado, no entanto, pois metade do grupo dos mais novos estava torcendo - muito alto - para a partida de de xadrez bruxo que acontecia, entre Harry e Ron.
Uma das torres de Harry travava uma violenta batalha, com um dos peões de Ron, enquanto Gina, Fred, George, Eleanor e Helena gritavam, com pura adrenalina.
– PEGA ELE! PEGA! – Helena pulava, batendo no chão com as palmas da mão, fazendo um som de estalo; sua mão doeria muito, depois disso.
– HELENA, DE QUE LADO VOCÊ ESTÁ?! – Ron fez careta para ela, visivelmente tenso.
– Foi mal! Foi mal! – Ficou vermelha, erguendo as duas mãos, em sinal de rendição.
– Você não tinha prometido que ia ser menos competitiva? – Fred a olhou de soslaio.
– No Quadribol. – O corrigiu. – No xadrez bruxo, tá liberado. – Deu língua para ele.
– Achata ele... achata ele! É só um peão, sua torre idiota! – Harry vibrava, mordendo a própria mão, mas, assim que a Sra. Weasley pigarreou, ele ergueu o olhar para ela. – Desculpe, Sra. Weasley... que foi que a senhora disse?
– O Professor Snape, querido. Na cozinha. Quer falar com você.
– Hein? – Eleanor nunca perdeu interesse em uma partida tão rápido.
– Como é?! – Harry ficou boquiaberto, sem reação, e todos do quarto ficaram calados; Hermione e Ayaan, que liam seus livros, separadamente, sentadas uma do lado da outra, se entreolharam, com os olhos arregalados. Bichento, que estava deitado entre elas, se espreguiçou e levantou da cama, passando pela porta, através das pernas da Sra. Weasley, e sumiu pelo corredor. – O Snape? Falar comigo?!
Fred, Helena e George se entreolharam também, igualmente confusos, enquanto Gina encarava Harry, temendo a reação dele.
– Professor Snape, meu bem. – O corrigiu, com um sorrisinho, o que fez Eleanor pensar que ela tinha dito isso a contragosto; bem parecia com algo que Snape diria. – Se puder vir depressa... ele diz que não quer demorar muito.
– Uh... certo... eu... tô indo. – Coçou o topo da cabeça, e, assim que a Sra. Weasley se retirou, olhou para os outros, fazendo careta. – Eu ouvi certo?
– Ou isso, ou estamos todos igualmente surdos. – George contorceu a boca.
– O que ele quer com você, a essa altura do campeonato?! – Ron enrugou o nariz. – Você não fez nada, né?!
– Não! – Se defendeu, rapidamente.
– Se você tem tanta certeza assim, pelo menos, pode peitar ele sem medo. – Helena deu de ombros.
– Aproveite que vai pra cozinha, Harry, e, se ele te perturbar, faça igual a nossa amiga, Eleanor. – George ironizou, com um ronco, e recebeu um olhar repreensivo dela. – Eu nem terminei a piada! Foi você quem pensou nisso!
– Ah, você é tão sutil... – Ela revirou os olhos. – Vá logo, Harry, antes que ele tenha um ataque de pelancas, lá embaixo... – O apressou, e o garoto rapidamente se levantou, saindo do quarto.
Por alguns segundos, os outros apenas se entreolharam, sem saberem, direito, o que fazer, enquanto esperavam. A torre e o peão do xadrez bruxo já haviam desistido de lutarem, já que não tinham mais a atenção deles, e apenas olhavam em volta, esperando que alguém lembrasse deles.
– Vocês querem tentar escutar da porta da cozinha? – Fred indagou, olhando em volta.
– Fofoqueiro. – Helena disse, balançando a cabeça, com desaprovação, enquanto levantava do chão.
– Onde você vai? – Eleanor a observou, franzindo o cenho.
– Ele é fofoqueiro, mas eu também sou. – Deu de ombros. – Vamos tentar escutar, ou o quê?!
* * * *
Cerca de dois ou três minutos depois, Harry descia os degraus até a cozinha, sendo surpreendido ao encontrá-la incrivelmente vazia; ali, estavam apenas Sirius, Georgia e Snape.
Seus padrinhos estavam de um lado da mesa, de braços cruzados, lançando olhares de adagas na direção de Snape, que fingia não notar, do outro lado da mesa. Sirius estava sentado, e Georgia estava de pé, ao lado dele. Em cima da superfície de madeira, estava uma carta, aberta, bem diante de Sirius.
O silêncio estava muito carregado, e não era nada bom. Não que Harry esperasse o contrário, é claro.
– Hã... – O garoto murmurou, esperando que fosse o suficiente para anunciar sua presença. – Mandaram me chamar?
Os três viraram-se para ele, ao mesmo tempo, mas apenas Georgia o lançou um sorrisinho tranquilizador, enquanto Sirius parecia muito estressado para isso, por mais que não parecesse ser com Harry, especificamente. Snape, no entanto, apenas o encarava, por trás dos seus longos cabelos.
– Sente-se, Potter.
– Não acho que você está no lugar de dar ordens pra ninguém, Severus. – Georgia o repreendeu, e Harry se assustou; nunca ouviu a voz dela parecer tão grossa, e séria.
– Você tem um ponto, Georgia... o Ranhoso não está no lugar de dar ordens pra ninguém, em lugar nenhum. – Sirius concordou, se encostando contra a própria cadeira, e olhando para a amiga. – Mas, muito menos aqui, não é? É a minha casa, afinal de contas.
O rosto de Snape ficou vermelho, com a irritação, e Harry, lentamente, andou até os padrinhos, enquanto Georgia puxava uma cadeira para ele, bem na lateral da mesa, próximo de Sirius.
– Eu devia falar com você a sós, Potter. – Snape prosseguiu, ignorando a presença dos outros dois. – Mas, esses dois... – Seu rosto se contorceu, involuntariamente.
– Esses dois são os padrinhos dele. – Sirius o interrompeu, com um sorrisinho forçado.
– Estou aqui por ordens de Dumbledore. Mas, é claro, sem dúvidas, vocês dois podem ficar. – O professor inclinou a cabeça para o lado. – Imagino como devem estar querendo se sentir... vocês sabem... participantes. Odiaria tirar esse momento de vocês.
– O que é que você quer dizer com isso? – Os dois disseram, quase que em uníssono, exceto que Sirius parecia muito mais irritado, deixando de se encostar na cadeira e inclinando o corpo para a frente, de forma um tanto ameaçadora.
– Bom, começando por você, Black, tenho certeza de que você deve se sentir... ah, como é que eu digo?... frustrado pelo fato de não poder fazer nada de útil... – Suspirou. – ...“pela Ordem”. – Enfatizou, fazendo aspas com as mãos.
– Você deve entender bem disso, não é? – Georgia disse, em defesa do amigo, que havia ficado um tanto constrangido pelo que havia sido apontado, antes que Harry pudesse fazer isso. – Se sentir inútil e frustrado é bem a sua praia mesmo.
– E, você, Blythe... decidiu brincar de madrinha, depois de tantos anos? – Alternou seu olhar para ela, com o mesmo tom passivo-agressivo na voz. – Mas, como eu disse, você pode ficar, também. Deve te ajudar á lidar com a culpa, não é?
– Você veio aqui pra falar comigo ou pra insultar os meus padrinhos? – Harry o interrompeu, impaciente. – Porque, se você me chamou aqui pra ficar vendo isso, eu tenho uma partida de xadrez bruxo pra retornar, lá em cima.
Georgia conteve um sorrisinho e olhou, de soslaio, para Sirius, enquanto os dois compartilhavam um breve momento de orgulho.
– Pois bem. – Snape ajustou a postura, voltando á expressão séria de antes. – O diretor me mandou avisar que ele quer que você, Potter, estude Oclumência, nesse semestre.
– Estude Oc... o quê? – Contorceu o rosto.
Por alguns segundos, Snape piscou os olhos, rapidamente, parecendo conter a vontade de revirar os olhos.
– Oclumência, Potter. – Sibilou, impaciente. – A defesa mágica da mente contra penetração externa. Um ramo obscuro da magia, mas, ainda assim, extremamente útil.
As batidas do coração de Harry, de repente, se fizeram muito presentes, em seu peito. “Defesa contra penetração externa”? Ele não estava sendo possuído, não é? Todos tinham concordado com isso... estavam errados, afinal?
– Por que tenho de estudar essa Oclu...?
– Porque o diretor acha que é uma boa idéia. – O interrompeu. – Você receberá aulas particulares, uma vez por semana, mas não contará a ninguém o que está fazendo, muito menos a Dolores Umbridge. Você entendeu?
– Sim, senhor. – Assentiu. – E quem é que vai me ensinar?
Snape ergueu uma sobrancelha, e o garoto não soube dizer se havia dito algo engraçado, ou algo extremamente burro.
– Eu – Ele respondeu.
Os olhos de Harry se arregalaram, e, enquanto sentia como se sua cabeça fosse explodir, lançou olhares desesperados para Sirius e Georgia, pedindo socorro. Os dois, é claro, não hesitaram em fazer isso.
– Por que você?! – Georgia contorceu o rosto, com os ombros enrijecidos.
– Por que Dumbledore não pode ensinar ao Harry ele mesmo? – Sirius acrescentou, agressivamente, como num rosnado.
– Porque, suponho que o diretor queira delegar as tarefas menos agradáveis. – O professor deu de ombros. – Posso garantir aos dois que não pedi por esse cargo. Aos três, na verdade. – Se levantou, indiferentemente.
– Claramente, não todas as tarefas menos agradáveis, já que ele ainda interage com você. – Georgia resmungou, irritada.
– Espero você às seis horas da tarde na segunda-feira, Potter. Minha sala. – Prosseguiu, fingindo não ter escutado. – Se alguém lhe perguntar, diga que está tomando aulas particulares de Poções. Ninguém que tenha visto você em minhas aulas poderia negar que precisa de reforço.
Snape se virou para ir embora, com sua capa preta de viagem se enfunando atrás dele, como uma cauda.
– Espera aí, um momento. – Sirius ergueu uma mão, erguendo suas costas, ainda sentado na cadeira, e Snape se virou para encará-los, entediado.
– Estou com muita pressa, Black. Ao contrário de você, tenho um tempo limitado de lazer.
– Irei direto ao assunto, então. – Deu de ombros, ficando de pé. Era bem mais baixo do que Snape, mas, em compensação, Georgia era mais alta da mesma altura que o professor, então, assim que ela se juntou ao amigo, Harry reparou que Snape fechou um punho no bolso da capa, segurando, sem dúvida, sua varinha. – Se nós soubermos que você está usando essas aulas de Oclumência para infernizar a vida do Harry, terá que se resolver conosco, escutou?
– Que comovente! – Debochou, contorcendo, minimamente, os lábios, em um sorriso sarcástico. – Mas, vocês com certeza já notaram isso... Potter se parece muito com o pai dele, não é?
– Já notamos. – Georgia deu de ombros, fingindo descaso, e Sirius estufou o peito, com orgulho. – Se você queria elogiar James e Harry, Severus, espero que tenha um tempinho do seu dia reservado pra isso... temos muito o que falar.
– Ah, confie em mim, não tenho um sequer elogio em relação á James, nem Harry. – Retrucou. – Bom, se vocês notaram as semelhanças, então devem saber que ele é tão arrogante, que as críticas parecem não surtir efeito. Lembra a vocês de alguém?
Sirius empurrou a cadeira bruscamente para o lado e ameaçou contornar a mesa em direção a Snape, ao mesmo tempo que puxava a varinha. Snape puxou a dele, mas Georgia, antes disso, se colocou no meio deles, enquanto gesticulava que Harry se afastasse.
Os três se encararam, por alguns segundos; Sirius furioso, Snape calculista, e Georgia em alerta, com seus olhos correndo de um para o outro.
– Eu não sei qual é a sua, Severus, mas, se você quiser provar a sua virilidade, insultar seu inimigo de infância não é a melhor forma de fazer isso. – A ruiva sibilou, o olhando de cima a baixo.
– Estava meramente apontando as semelhanças, Blythe. – Respondeu, impassível. – Se bem que, presumo eu, você não é nenhuma desconhecida para isso, não é?
– Oras, seu...! – Foi a vez de Georgia se descontrolar, mas, desta vez, não havia ninguém mais calmo para a segurar; Sirius, na verdade, pareceu aliviado quando a amiga foi a primeira a avançar na direção de Snape.
– GEORGIA! – Harry chamou, ameaçando entrar no meio, mas Sirius apenas estendeu a mão, o mantendo longe, enquanto Georgia puxava a própria varinha e a apontava para o pescoço de Snape, que fez o mesmo. – Sirius! Faz alguma coisa!– Suplicou, mas o padrinho não pareceu dar ouvidos.
– Eu não sei que tipo de moral você acha que tem, Ranhoso, agora que você fez o Dumbledore achar que você se regenerou... – Georgia sibilou, com o rosto a menos de meio metro de distância do de Snape. – ...mas, se você sequer pensar em citar a minha irmã, ou a minha sobrinha, de novo, eu juro que explodo a porra da sua cabeça.
– Ele acha que, só porque enganou a Dumbledore, que vai enganar a nós também. – Sirius acrescentou, andando até eles, empunhando sua varinha também. – Mas você sabe que nós vemos através dessa sua fachada, não é, Ranhoso?
– Por que não aproveitam e dizem isso pra ele, então? Para alertá-lo do perigo? – Snape ergueu as sobrancelhas. – Ou vocês têm medo de que ele não leve a sério os conselhos do homem que está há seis meses se escondendo na casa da mãe, e da mulher que fugiu do país?
– Me diga, como anda o Lucius Malfoy ultimamente? – Sirius indagou, e Harry sentiu uma pontada de irritação com a menção daquele nome.
– Ah, Sirius, que pergunta boba... imagino que ele deve estar encantado com o seu cachorrinho de estimação estar trabalhando em Hogwarts, não é? – Georgia acrescentou, com um sorrisinho de lado, sem vacilar em manter a varinha erguida contra o pescoço de Snape.
– Que tal passar um recado para o seu dono, Ranhoso? Hm? – Sirius prosseguiu, aproximando o rosto de Snape, e sua voz tomou um tom ameaçador. – Diga á ele que nós sabemos o que ele fez, com quem ele fez, e que iremos atrás dele por isso, para fazê-lo pagar. Acho que ele entenderá o recado, não é, Geo?
– Aposto que sim. – Ela assentiu. – Mas, caso ele seja burro demais para entender, simplesmente diga que ele não vai sair impune, depois do que fez com a Eleanor.
– Por falar em cachorros... – Snape tombou a cabeça para o lado. – Você sabia que Lucius Malfoy o reconheceu, na última vez que arriscou sair do esconderijo? Ideia brilhante, Black, deixar que o vissem em uma plataforma de trem que deveria ser segura... arranjou uma desculpa irrefutável para nunca mais deixar esse buraco em que você se esconde, não é?
Sirius ergueu a varinha, o pegando pelo colarinho da blusa, praticamente forçando Georgia a se afastar.
– NÃO! – Harry berrou, pulando por cima da mesa, para se colocar entre os dois. – SIRIUS, NÃO!
– VOCÊ ESTÁ ME CHAMANDO DE COVARDE, SEU MERDA?! – Sirius gritou, entre dentes, tentando tirar Harry da frente, mas o garoto não se mexeu.
– Suponho que eu esteja, não é? – Os lábios de Snape se curvaram em um sorrisinho de triunfo.
– Harry. Sai. Da. Frente. – Sibilou, enquanto tentava, praticamente, saltar por cima de Harry, mas o garoto apenas o puxava para longe, fazendo careta.
– Georgia, uma ajudinha?! – Encarou a madrinha, que estava uns passos afastada, encarando as próprias unhas.
– Ah, não. Sinto muito. – Ela negou com a cabeça. – Ainda estou decidindo se quero participar, ou se só deixo o Sirius chutar o traseiro dele...
– Eu... consigo... sozinho....! Harry... sai... da frente... – Sirius ainda tentava contornar Harry; poderia, facilmente, o empurrar para longe, mas nunca faria algo que poderia acabar com ele machucando o afilhado. Apenas esperava que, uma hora, ele se cansasse, e saísse da frente.
De repente, a porta da cozinha se abriu, revelando um enorme grupo de pessoas; Remus, Eleanor, Helena e Ayaan, no fundo, enquanto os outros Weasleys estavam um pouco mais á frente.
– Curado! – A Sra. Weasley anunciou, e os quatro viram que ela, com a ajuda de Bill, trazia, consigo, um Sr. Weasley muito sorridente, de pijama e capa de chuva, com alguns curativos espalhados por todo o corpo. – Completamente curado!
Todos do grupo, no entanto, ficaram paralisados, na porta, confusos sobre o que, exatamente, era o que estavam vendo; Sirius e Snape olhavam para a porta, com as varinhas apontadas, uma para a cara do outro, e Harry, entre os dois, no intuito de separá-los. Enquanto Georgia, há alguns passos de distância, encarava as próprias unhas, enquanto segurava a própria varinha na outra mão.
– Pelas barbas de Merlin! – O Sr. Weasley exclamou, com o sorriso desaparecendo de seu rosto. – Que é que está acontecendo aqui?!
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