Pov ???
Balanço
Balanço
Balanço
A maresia infectava o canal nasal da mulher de cabelos ruivos, que encarava o luar com uma singela expressão de seriedade em seu rosto, estando na proa daquele navio que agora a carregava. Colocando as mãos nos bolsos do jaleco ao qual vestia por cima de suas outras roupas, ela acabou por soltar um longo suspiro, mostrando um claro sinal de frustração.
— Meinu-chan, você vai acabar pegando um resfriado se não entrar logo.
A mulher virou seu rosto em direção a voz, cravando seus olhos, protegidos por seu óculos avermelhado, no rosto da pessoa que havia dito seu nome.
Caminhando até ela, outra esbelta figura feminina se aproximava, vestindo o mesmo jaleco que a mulher, mas sendo mais alta.
A nova mulher deixou que o vento levantasse seus cabelos de tonalidade castanha escura, quase negra, que eram presos no topo por um rabo de cavalo, respondendo o olhar da outra, com seus olhos de cor carmesim e um sorriso no rosto.
Ao finalmente estar próxima o bastante de quem havia chamado, ela, mesmo com o balanço do navio em que estava, delicadamente entregou um dos dois copos de café ao qual trazia consigo, não deixando que nem uma gota caísse no chão.
— Fiz do jeitinho que gosta, se me lembro bem, hihihi. — Ela deixou escapar uma risadinha.
— Obrigada, Rey. — A outra acabou por soltar um sorriso de canto, goleando o copo que agora segurava, mostrando que aquela era realmente a forma de fazer café que a atraía.
— Você ainda tá frustrada por ele não estar aqui? — Rey questionou, já sabendo a resposta que receberia.
— Gosto de saber que estamos aqui... Os dezessete, depois de tanto tempo sem se ver. Ainda assim... Ele também foi nosso companheiro de classe por três anos, mas sequer considerou isso. — A ruiva bufou. — Francamente... Não sei os motivos de me importar com ele. Eu deveria ter entendido que tudo acabaria com o fim dos nossos anos na Hope's Peak... Nossos pensamentos não estavam mais em tanta sintonia.
— Phew, você tem que dar um desconto para ele. Nem todo mundo consegue lidar com o bullying de não ter talento de uma forma tão lógica quanto você. Hehehe, me impressiona como ele não desistiu da escola antes de se formar. Admito que não consigo não achar tal atitude interessante. — A garota riu por mais um tempo, até olhar no rosto de Meinu mais uma vez, que a encarava com uma expressão desconfiada. — O que foi?
— É que às vezes certos comportamentos seus me deixam com uma pulga atrás da orelha. Nos conhecemos faz muito tempo, sei que você não é alguém perigosa de verdade, mas, ainda assim, essa sensação não parece ser algo que vou superar. Odeio admitir, mas é como um instinto que se ativa para coisas desnecessárias. — A garota de óculos tomou mais um gole do próprio café. — Ei, Rey... Será que um mundo onde os talentos deixassem de ser algo considerado como importante seria realmente... Melhor? Sei que o reconhecimento e treinamento de pessoas talentosas acabou acarretando em muitos benefícios para o mundo, mas, ainda assim... A igualdade que tentam pregar em lugares como a Hope's Peak... Nunca é tão igual quanto tentam fazer parecer no papel.
— Você está bem filosófica hoje, mas por que não pergunta isso para o nosso professor, hein? — Rey sorriu, sendo retribuído com um sorriso por parte da outra garota. — Desigual ou não, foi graças a ele que eu conheci as dezessete pessoas que mais marcaram a minha vida, então não tenho muito a reclamar, mas acredito que compreendo o que quer dizer, de certo modo, devido ao talento que carrego comigo. Apesar das escolhas não serem mais feitas por sorteio, ser uma sortuda ainda faz você carregar um peso que todos te mostrarão que carrega enquanto estiver viva. Eu nunca vou ser igual aos outros Ultimates, mesmo sendo objetivamente melhor que eles. — Ela deu uma piscadinha. — Eu gostaria de fazer uma revolução, mostrar que a forma que eles estão levando as coisas é errada, que posso ajudar a guiar por um caminho melhor, mesmo com alguns sacrifícios e empecilhos no caminho, mas querer não é poder, infelizmente. Mesmo que meu desejo fosse ajudar a mudar esse sistema que só prega desigualdade e faz um lado ver o outro com um estigma, eu não tenho autoridade para isso, já que só sou mais alguém sem relevância no mundo que vivemos. Mas bem... Sonhar não custa nada, certo, Meinu-chan?
Meinu sorriu com os fins das falas da sortuda, fechando seus olhos enquanto pensava sobre o que ela disse.
— Você até que falou bastante para alguém que não tem muito a reclamar. — Abriu os olhos, ficando a encarar a lua mais uma vez por um tempo, até romper seu silêncio. — Você acha que vamos ter outra oportunidade de unir todos nós de novo? Somos dezoito pessoas e todos nós estamos vivendo uma vida adulta agora... Se não fosse pela ideia de trabalho do professor, eu não teria ideia de quando nos veríamos de novo, mas, mesmo assim... Ele ainda não... — Ela apenas se calou.
— Hihihi, Meinu-chan, não esqueça que você tem a sortuda mais sortuda da Hope's Peak do seu ladinho como amiga! — Rey fez um "V" com os dedos de uma das mãos. — Então não se preocupa tanto. Se eu não der um jeito o mundo vai dar, fazendo com que todos nós fiquemos juntos de novo.
— Obrigada, Rey. — Meinu sorriu mais uma vez, sentindo o balanço do navio em suas pernas, virando seu rosto para frente, vendo que ambas estavam se aproximando do destino que as aguardava.
— Relaxa, amigos são pra essas coisas, mas se quiser me recomendar lá para o seu pai quando a gente acabar aqui eu vou ficar grata. Infelizmente o Togami é bem vingativo e fez minha caveira pro papai dele me demitir depois que tomou um pé na bunda, então depois disso aqui eu não vou estar só na pista, mas na busca de outro emprego também.
Meinu não conseguiu controlar algumas risadas após as falas da garota, que acabou sorrindo também.
— Acho melhor dormirmos... Amanhã o trabalho de verdade começa. — Meinu já havia terminado seu café algum tempo antes de falar suas palavras, então apenas foi caminhando na direção da entrada da parte interna do navio.
— Certo, certo, Meinu-chan! Amanhã vai ser um dia cheio para todos nós! — Rey respondeu, seguindo a garota e entrando junto dela.
No fim, tudo que restou onde antes elas estavam foram os incansáveis balanços que o navio fazia a medida que encarava aquele mar de lembranças.
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