A primeira neve já cobria o campo quando Rin calçou os chinelos de madeira e pegou timidamente emprestados os arco e flechas da sua vovó Kaede.
– Daqui a pouco eu volto, vovó! – Ela falou alegremente e saiu porta a fora para a brancura da paisagem gelada.
Cada aldeão a cumprimentava com um sorriso no rosto e a menina acenava com vivacidade. Conhecia cada um, seus nomes, suas famílias, vira até seus filhos nascerem. Aquela aldeia era sua casa fazia quatro anos, porém parecia uma eternidade desde que o senhor Sesshoumaru lhe havia deixado.
Quando conhecera Sesshoumaru tinha apenas nove anos, aos dez ela foi deixada na vila e agora aos quatorze, Rin pegara o gosto por muitas coisas das quais a vovó Kaede podia fazer. Isso aconteceu porque, de uns tempos para cá, descobrira que possuía alguns poderes espirituais de miko.
Isso acontecera muito singelamente.
Rin observou a vovó purificar uma casa para retirar um youkai da vila vizinha. Enquanto, a senhora recitava um mantra e induzia o youkai a se revelar, Rin repetiu as palavras que ouvia como brincadeira e para a surpresa de todas, a barreira espiritual se intensificou imediatamente.
Naquele dia, Rin descobriu que poderia ser uma sacerdotisa também.
– Você foi revivida por duas vezes, Rin-chan – A vovó Kaede explicou – Ninguém volta do mundo dos mortos sem trazer algo consigo.
Ela colocou um alvo numa árvore, um pedaço de tecido velho, que achara em algum lugar. Posicionando-se de frente, ela arqueou os ombros e colocou a flecha na sua mira, apertando os olhos o máximo que podia e mordendo os lábios de nervosismo. Com um leve movimento dos dedos, Rin soltou a flecha contra o ar e a viu rapidamente perfurar a madeira da árvore, porém sequer tocar seu alvo.
– Não acredito! – Rin reclamou.
A menina repetiu o movimento.
E repetiu. E repetiu.
– O que tem de errado com essa flecha?! – Rin exclamou exausta.
– Você precisa melhorar é a sua postura!
Rin virou-se com um sorriso para cumprimentar a voz que surgiu atrás dela.
Kagome depositou seu cesto de ervas, ainda vazio, na grama e com delicadeza se colocou atrás de Rin. Ela segurou seus ombros, corrigiu suas costas e colando-se ao seu corpo, segurou sobre a mão da menina a sua, apertando junto dela a flecha.
– No três, certo?
– Sim!
– Um, dois,... Três!
As duas mãos em sincronia soltaram a flecha de uma só vez, que zunindo foi para exatamente no centro do tecido e cravou-se om força no tronco da árvore.
– Isso!!! – Rin exclamou e saltitou supercontente de ter acertado finalmente – Obrigada, Kagome-sama!
– Magina, Rin-chan! – Kagome falou tão animada quanto ela – Quando todos descobriram que você podia desenvolver poderes espirituais logo pensei que eu tinha que te ajudar em tudo!
– Eu vou ficar tão boa quanto você! Hoje eu vou praticar até de noite! – Rin disse com um olhar determinado.
– Só porque o Sesshoumaru vem amanhã e você quer contar pra ele a novidade, né? – Kagome sussurrou perto dela com um sorrisinho malicioso.
O rosto de Rin começou a pegar fogo.
– Como você sabe que o Sesshoumaru-sama vem amanhã?
– Ora, porque amanhã é seu aniversário, não é mesmo? – Kagome disse com um sorriso quase maternal.
Rin ficou muito emocionada.
– Ei, Kagome, o que você está fazendo? – Inuyasha exclamou naquele seu tom ríspido habitual e surgiu do meio das árvores. Ele carregava amarrados em suas costas Izayoi e Souta, ambos dormindo e na frente Inumaru, que olhava indiferente para ela. Ele cumprimentou Rin com um aceno e logo pediu para Kagome se apressar.
– Já vou, já vou – Kagome falou com um bico – Até depois, Rin-chan! Pratique bastante!
Rin observou os dois saírem dali discutindo e enquanto Inuyasha reclamava e Kagome ralhava com ele de volta. Num relance, no entanto, a menina percebeu que o hanyou delicadamente pegou na mão da moça e a conduziu por entre os arbustos cobertos de gelo.
Rin sentiu inveja. Nunca havia segurado as mãos de Sesshoumaru. Na verdade, pouco havia tocado nas roupas dele. O youkai parecia tão distante na mente dela, como quando ela mal alcançava sua cintura em tamanho. Kagome no entanto, andava lado a lado com Inuyasha, sem parecer nem superior ou inferior a ele. Os dois eram iguais, e estavam juntos por vontade mútua.
Sem perceber, seus pés a levaram pelo mesmo caminho pelos quais os dois acabavam de passar, pisando sobre as pegadas que Kagome deixara segundos antes.
A menina espreitou-os por trás das árvores, enquanto caminhavam silenciosamente pela neve já endurecida da tarde. Kagome quase deu um escorregão, mas Inuyasha a pegou nos braços antes, e os dois deram risada como duas crianças bobas.
Rin sentiu inveja. Será que um dia iria rir junto do Sesshoumaru-sama? Será que um dia ele iria conversar trivialidades com ela, contar sobre a sua vida e seus planos? Ou será que os dois seriam sempre fechados um ao outro, ela tagarelando e ele ouvindo-a com atenção, porém jamais demonstrando quem ele realmente era. Talvez, nem a segunda opção.
Os olhos da menina continuaram depositados sobre o casal e num dado momento, Kagome apontou para um espaço entre a neve e Inuyasha depositou um tapete de palha sobre o chão. A moça sentou-se e começou a remexer em algumas plantas que despontavam aqui e ali entre o gelo. O hanyou desamarrou com destreza cada bebê de suas costas e colocou-os sobre o tapete de palha.
Ao acordarem, eles, que já haviam aprendido a engatinhar, começaram a remexer na neve com as mãozinhas e Inuyasha se desdobrava para impedir que eles comecem a própria neve acumulada entre seus dedinhos.
– Tome mais cuidado com eles, Inuyasha! – Kagome berrou ao ver que Souta já estava rolando neve abaixo.
– Eu não tenho culpa que eles são bagunceiros! – Inuyasha pegou Souta pela perninha e sacudiu-o para tirar a neve da cara.
– Não sacode o menino assim, seu tonto! – Kagome arrancou o bebê, que estava achando graça em tudo, do pai e ainda completou – OSUWARI!!!
Inuyasha foi ao chão e levantou um monte de neve que caiu em cima de todo mundo, deixando Kagome praticamente soterrada.
– Quê! Bem feito! – Inuyasha ressurgiu do chão e ajudou a limpar, Kagome, que só tivera tempo de proteger o Souta do monte de neve que recebeu no rosto.
– Agora fiquei toda descabelada! – A moça berrou envergonhada.
Inuyasha recolocou Souta entre os irmãos e tirou mais alguns pedaços de neve do cabeço de Kagome.
Rin observou com curiosidade quando o hanyou, tão irritadiço, ríspido e mal-educado, olhava para Kagome com os olhos cheios de ternura e com simplicidade, demonstrava o quanto gostava dela, ao tocar os longos cabelos da moça com afabilidade e delicadeza. Kagome abraçou-o, envergonhada e ele a agarrou de volta, como se nunca mais quisesse largá-la, apertando-a entre seus braços.
O coração de Rin doeu mais uma vez.
Ela saiu correndo dali.
Não sabia explicar por que seu coração ardia tanto ao ver a família de Kagome-sama, porém entendia que aquilo tinha de ser pura inveja.
Nunca, não importasse o quanto vivesse, ela teria os braços do Sesshoumaru-sama, pois era uma humana.
Inuyasha era metade humano, Kagome uma sacerdotisa muito forte. Rin era só a Rin. Fraca, frágil e burra. O que poderia oferecer a um Dai-Youkai além de sua própria fraqueza humana?
Ela correu pela neve e escorregou no gelo de um campo aberto, rolando como uma pedra.
Rin se sentiu sozinha pela primeira vez em mais de cinco anos.
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