— Fiquei fora apenas por alguns dias e tudo isso aconteceu… — Ouvi o seu suspiro, suas mãos se apoiaram no chão da calçada ao passo que se inclinou um pouco para trás, olhando por fim para cima.
Compartilhávamos da companhia um do outro naquela área extensa e silenciosa, nem mesmo se ouvia mais a conversa animada dos seguranças na cabine próxima, o que me fez deduzir que poderiam estar descansando agora. Não sabia mais ao certo quanto tempo havia se passado desde que nos sentamos aqui, após um momento de choradeira e instabilidade demonstrada por mim. Ainda é estranho que Park Jimin esteja aqui, confesso.
Ele não faz o tipo de pessoa que eu procuraria em uma ocasião como essa, entretanto é o único que está presente, o único que por algum motivo incomum eu senti que deveria pedir nem que fosse somente um abraço, e mesmo que indiretamente, uma parte minha está feliz que o mais velho esteja presente.
— Muitas coisas acontecem o tempo todo, a cada segundo. — Disse, melancólica. Ao mesmo tempo em que estava surpresa comigo mesma por ter sido tão passível em desabafar em partes todo o infortúnio que experienciei nos últimos dias, permitindo que apenas uma mínima metade do peso que carrego se "alivie", ou não.
— Mas isso aqui não acontece todo dia… — O olhei de cenho franzido, virando-se para mim com uma feição séria, mas não chegava a intimidar. E foi então que entendi que suas palavras se referiam a nós dois.
— Não… — Crispei os lábios. — E quanto a você?
— Eu, o que?
— Disse que tinha um motivo para ter vindo me ver. — Me posicionei um pouco mais para o lado, assim poderia vê-lo melhor. — Gostaria de saber o que te levou a quebrar o seu orgulho implacável.
O Park sorriu ladino, passando a língua pelos lábios e voltando a olhar para cima.
— Acho que você já tem muitas preocupações no momento.
— Então é um assunto sério? — Ergui uma sobrancelha.
— Depende de como você interpretaria. — Rebateu.
— Eu…
— Numa próxima, quem sabe… — Me interrompeu.
Inevitavelmente, me senti curiosa, porém ele já tinha se determinado a não comentar mais a respeito. Cabeça dura como sempre.
— Tudo bem…
Ficamos em silêncio por mais algum tempo. Deve ser estranho para ele também, pois nunca tínhamos conversado dessa forma, não me recordava de alguma ocasião em que ficamos apenas assim, conversando como se fôssemos apenas dois amigos normais que "desabafam", ele nunca fala tão abertamente sobre si mesmo e é a primeira vez que eu desabafo meus problemas consigo. Era sempre o mesmo roteiro há um mês atrás, nos encontrávamos por aí, trocávamos mínimas palavras e transavamos.
Gostaria de saber mais sobre ele, mas não acho que seja fácil, o próprio não facilita.
— Eu sinto muito pelo que aconteceu com você, Sunhee. E por não poder estar lá para fazer alguma coisa.
— É bom que não tenha presenciado. Não foi agradável… — Desviei os olhos, não era como se eu tivesse contado a história por completo, havia pulado a parte em que Sora me bate, e todo o resto daí por diante. Me surpreendeu que nenhum de seus amigos o tenha contado sobre isso antes de mim.
— Sunhee…
— Acha que eu deveria conversar com Ah-ri? Sinto que devo uma explicação a ela, mas… ainda me sinto tão envergonhada. — Choraminguei. — Não quero que ela pense que sou esse tipo de pessoa, eu nunca… — Cessei a fala, ao perceber a minha própria hipocrisia.
Eu sou esse tipo de pessoa…
— Você nunca…?
— Esqueça… — Suspirei, contendo a vontade de chorar, ele já tinha visto e ouvido o suficiente, não tem obrigação nenhuma de ficar me suportando desse jeito. — É melhor eu ir, já está tarde e você está longe de casa. — Me levantei do chão, desferindo leves batidas no meu sobretudo para tirar as minúsculas pedrinhas que ficaram coladas no tecido.
— Já voltei pra casa muito mais tarde que isso. — Rebateu. — E sim, eu acho que você deveria conversar com Ah-ri sobre o que aconteceu.
— E se ela não quiser me ouvir? — Exclamei, ainda de costas para ele.
— Bom… ao menos terá tentado, coisa que nem todo mundo em uma situação dessas se presta a fazer.
Eu apenas gostaria de me explicar, e pedir desculpas adequadamente, e se mesmo assim ela quiser manter distância, eu a respeitarei, mas não quero deixar as coisas como estão e que Ah-ri pense que sou uma covarde, e muito menos que tinha alguma intenção ruim sobre seu relacionamento.
— Me desculpa, por chorar, e por fazê-lo ter de ouvir minhas amarguras, eu sei que não foi para isso que veio… — O olhei.
— Sinceramente, não era assim que eu imaginava nosso reencontro, foi a primeira vez que te vi chorando e… você cedeu que eu ouvisse seus problemas.
— Você é um bom ouvinte… — Sorri pequeno.
— Eu sou bom em muitas coisas. — Piscou, pensei que estivesse tentando me animar.
— Menos em ter paciência.
— Mas sempre tive com você.
— Você tenta. — Revirei os olhos. — Enfim, obrigada.
— Não precisa agradecer. — Deu de ombros.
— Eu gostaria de ouvi-lo se nos virmos de novo, acabei sendo o centro das atenções hoje.
— Então quer continuar me vendo? — Levantou-se do chão, se aproximando um pouco de mim.
— Eu sei que é estranho, desde a última vez que nos vimos e nossa relação torta, mas… — Fechei as mãos em punho dentro dos pulsos, buscando coragem. — Eu senti a sua falta.
Sua cabeça se moveu em positivo, entretanto preferia que ele dissesse em palavras o que achou disso. Meu subconsciente insistia em remoer o fato de que tudo teria sido diferente se ele estivesse lá naquele dia, com toda certeza, era Park Jimin que eu optaria por me tirar daquele lugar consigo.
Alguns segundos apenas nos encarando se passou, e meu coração voltou a bater rapidamente, incomodado pelo suspense do silêncio.
— Resolva os seus problemas primeiro. E depois resolvemos o nosso. — Disse, sério.
Restou-me assentir.
— Boa noite, Jimin.
— Boa noite, Sunhee.
Demos as costas um para o outro, era esperado que fosse assim.
[...]
Quarta-feira.
11:50.
— O que está tomando tanto a sua atenção hoje? — A voz grave atrai minha atenção por um instante. — Mal encostou no seu almoço.
— Ah, desculpa… — Sorri sem graça. — É que eu… só estou tentando me comunicar com uma pessoa…
— Precisa de ajuda? É alguém que eu conheço?
— É Ah-ri…
O Kim ergueu o cenho, expressando uma feição tensa.
— Puxa… — Tomou um gole do seu suco. — Eu não a vejo desde o dia do casamento, nem mesmo pelos corredores do campus. Você… quer falar com ela?
— Eu preciso falar com ela, Namjoon. — Falei. — Não é justo que apenas Seokjin assuma a sua parte da história e eu fique calada.
— Sei disso, mas não acha que ainda está muito recente? Ela possivelmente deve estar tão abalada quanto você, o que acha de esperar mais um pouco?
— Até quando? — Suspirei com pesar. — Até quando terei de suportar esse peso nas costas, Namjoon? Esse ocorrido já estava sendo acobertado há muito tempo, mesmo que eles estivessem desentendidos na época, se Seokjin tivesse tido a responsabilidade de contar sobre isso antes, essa situação poderia ter sido evitada!
— De que forma?
— Eu não sei… — Umedeci os lábios, frustrada. — Mas quero resolver essa história de uma vez, e temo que se esperar mais, possa perder a chance.
Vi Namjoon respirar fundo, parecia pensar, mas não é fácil saber exatamente o que fazer em uma situação dessas, principalmente por não ser ele o pivô de tudo, mesmo que esteja tentando me ajudar, não é suficiente, cabe apenas a mim tomar uma atitude a respeito.
— Aish… — Suspirou. — Faça o que achar que será melhor, não vou assumir o papel de julgador, muito menos lavar as mãos, desde que não precise mais vê-la angustiada desse jeito.
Sorri pequeno, assentindo.
— Obrigada por entender, Joonie.
— Então é assim que um pai se sente… — Riu, e consequentemente também me rendi ao riso pelo seu comentário frustrado.
Entretanto, o gesto não durou muito, pois minha expressão se fechou em surpresa e apreensão quando senti o vibrar do meu celular sobre a coxa. O nervosismo e expectativa começaram a se manifestar no meu interior, havia ligado duas vezes sem obter resposta, restando-me apenas algumas mensagens soando como súplicas de maneira educada, pois também não queria soar invasiva.
Foi como se a existência de Namjoon ali se resumisse a nada, assim como todo o resto do restaurante em que estávamos, minha total atenção foi direcionada ao aparelho, do qual desbloqueei a tela e com o polegar levemente trêmulo deslizei a barra de notificações para baixo, com os batimentos cardíacos latejando em meu peito quando li o nome de Ah-ri e sua resposta meia hora após eu ter mandado as mensagens perguntando se poderíamos conversar pessoalmente.
Kang Ah-ri: Quando, onde, e a que horas?
Eu: Não esperava que fosse realmente me responder, me perdoe por incomodar. Pode ser na sua casa? Não tenho ocupações durante essa tarde, se você puder…
Kang Ah-ri: Eu mesma irei até a sua casa, às 16:00 tudo bem? Ou prefere algum lugar externo?
Eu: Não, na minha casa está bom, estarei te esperando.
Kang Ah-ri: Ok.
Bloqueei a tela do aparelho, soltando todo o ar que tinha prendido nos pulmões, finalmente me impondo a comer o prato de japchae que já se encontrava consideravelmente frio pelo tempo que o deixei intocado ali.
— Ela respondeu?
— Sim! — Respondi com as bochechas cheias.
— E…?
— Vamos nos encontrar ainda hoje…
— Isso pode ser bom. Boa sorte. — Desejou.
[...]
15:55.
O sentimento de ansiedade me dominava, minhas mãos suavam e já havia arrumado o sofá incontáveis vezes mesmo já estando tudo impecável, tinha sorte de meus pais estarem no trabalho e Sora na faculdade, assim teríamos bastante privacidade até o fim da tarde.
Nunca necessitei tanto de um momento como esse, eu queria conversar, queria tentar resgatar ao menos uma mínima consideração da nossa amizade, Ah-ri sempre foi uma boa amiga, prestativa e desde que a conhecemos nunca nos deixou na mão até nos piores momentos, não que eu tenha tanta intimidade com ela como Sora, mas houveram ocasiões em que sua presença e conselhos foram de grande importância para mim e eu jamais vou esquecer disso.
Meus pensamentos se assemelhavam a um roteiro, ficava a todo instante repassando as palavras que achava serem as certas para dizer e não piorar tudo, deveria ser breve e direta.
Ouvi meu celular vibrar acima da mesinha de centro, e me movi tão rápido quanto um raio para pegar o aparelho e verificar caso pudesse ser Ah-ri me mandando alguma mensagem. Realmente desejei que fosse ela.
Todo o meu sentimento de ansiedade se transformou em tensão, uma tensão dolorosa, e quando eu finalmente tinha conseguido me livrar temporariamente das lembranças e o fato de que sou uma mulher suja, foi como levar uma facada nas costas apenas ao ler uma simples frase.
Jeon Jeongguk: Nós podemos conversar?
Ele raramente me mandava mensagens, era a primeira vez que recebia algo do rapaz desde que tudo aconteceu, estava me mantendo o mais afastada possível dele e até mesmo de Sora. Somente agora fazendo o que deveria ter feito desde o começo do namoro deles, ficando longe.
Me encontrava em choque parada no centro da sala, não sabia o que fazer ou o que responder, e sinceramente, não quero responder.
Engoli com dificuldade enquanto meu corpo não correspondia a nenhum dos meus comandos, apenas quando o som do interfone ecoou pelo ambiente e tive de me forçar a despertar daquele transe, desligando o meu celular rapidamente e indo em direção ao pequeno telefone colado na parede ao lado da porta.
— Alô… — Minha cabeça doeu ao ouvir o som da voz masculina do outro lado da linha, descrevendo a aparência da pessoa que aparentemente veio me visitar. E mesmo que agora eu queira desligar em sua cara e desistir de tudo, não posso. — Pode mandar subir, eu a conheço.
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