II. Convivência quase amistosa.
Lucy ainda não sabia como definir sua rotina. Acordava cedo todos os dias, tomava o café preparado pela Virgo, treinava no colégio e ignorava a presença dos colegas. Sentava ao lado de Levy durante as aulas e compartilhava anotações. Às vezes, recebia olhares assustados pelos corredores. Estava na primeira semana de aula, então, o assunto sobre o soco ainda era recorrente.
Descobriu, em sua descoberta por aquele colégio enorme, um terraço que provavelmente era proibido subir. Tragava seu cigarro lá todas as vezes em que se sentia sufocada por estar naquele lugar. Sufocada pela presença inexistente do pai em sua vida que apesar de morar na mesma casa quase não a frequentava. E sufocada pelos próprios pensamentos.
Erza ainda tentava aprofundar o contato que tinham durante as manhãs, mas não ultrapassavam do “bom dia”. Mirajane já havia desistido, e Natsu fingia que não enxergava sua existência.
Não tinha muito a comentar sobre os professores. Na verdade, parecia que estava apenas existindo durante os dias e não prestava muito atenção nos mínimos detalhes. Não sabia se Levy percebia seu desânimo, mas procurava não demonstrar.
O dia do trabalho em dupla estava cada vez mais próximo e seu psicológico não estava preparado. Ainda não tinha resolvido a situação com Natsu, e duvidava que fosse resolver. Seria, no mínimo, estranho ir até casa dele, se pudesse fingir que tinha morrido...
Fugia durante os intervalos e observava o colégio pelo terraço. Recusava-se a usar aquela saia ridícula do uniforme, prendia o cabelo num coque e usava uma blusa maior do que o seu tamanho. Nunca quis chamar atenção, e muito menos ser sexualizada. Era só uma adolescente de 17 anos frustrada como muitas outras.
A maior diferença, talvez, estava no fato de ser filha de um empresário bem conhecido, mas que não dava a mínima para a “família.” Convivia mais com os funcionários do que com o próprio pai. E também não concordava com as atitudes e muito menos o método de trabalho. Dele, só queria distância.
Vivia numa constante pressão e aquilo era uma merda. Os acionistas duvidavam da sua capacidade de assumir a empresa quando fosse mais velha, mas a verdade é que não possuía a menor vontade de herdar aquele fruto de lavagem de dinheiro. Destruiria, se pudesse. Seria incrível a imagem de seu pai ruindo e perdendo dinheiro.
Não tinha muitas informações sobre a mãe, e todas as fotos de seu rosto tinham sido escondidas ou jogadas no lixo. Não fazia a menor ideia sobre onde ela pudesse estar, sua existência era quase um tabu dentro de casa.
Suspeitava que o pai tivesse feito alguma coisa. As únicas memórias existentes em sua cabeça são de muito novinha e, infelizmente, não conseguia se lembrar do rosto. E, afinal, se não tinha aparecido até agora, ninguém a salvaria daquele inferno. Nem mesmo sua mãe.
Estava tão distraída que não percebeu a presença de outra pessoa surgir. Conseguiu reconhecer o cheiro do perfume, e tragou o cigarro logo em seguida.
— Isso ainda vai te matar. — Murmurou, observando-a de longe.
— Seria bom, não acha? Você não veria mais minha cara emburrada. — Revirou os olhos.
— E perderia a chance de implicar com você outras vezes. — Aproximou-se, pondo as mãos no bolso e observando o colégio.
— Acho que gosto da ideia de poder te socar outra vez. — Soltou a fumaça na direção dele.
— E virar o assunto do colégio de novo. — Natsu resmungou, abanando as mãos no ar.
— Quer? — Ofereceu o cigarro, rindo da feição emburrada de Natsu.
— Dispenso. Se eu estivesse bebendo uma cerveja, talvez. — Deu de ombros, apoiando-se no muro e reparando na imagem da Heartfilia com o cigarro entre os dedos.
— Até mesmo os atletas não resistem às vezes, né? — Desviou o olhar, sentindo-se desconfortável com a súbita proximidade. — Você ainda não me mandou seu endereço.
— Por que tanta ansiedade? Quer me fazer uma visita inesperada? — Não perderia a chance de provocar a Heartfilia. Sorriu, umedecendo os lábios logo em seguida. Observou-a desviar o olhar outra vez, e sabia que receberia um xingamento como resposta.
— Vá pro inferno, idiota. — Mostrou o dedo do meio. — Preciso saber quanto tempo demoro até chegar lá, só isso.
— Eu não moro tão longe daqui. Então, são só alguns minutinhos a mais que a distância do colégio.
— Ótimo. — Resmungou, sentando-se naquele chão sem se importar muito. Sentiu o vento balançar os fios que se desprendiam do cabelo e fechou os olhos. Observou Natsu imitar seu gesto, e fechou a cara.
Natsu analisava as feições irritadas de Lucy e se perguntava como aquela garota parecia sempre estar com raiva de alguma coisa, como se o mundo conspirasse contra ela.
— Por que ainda está aqui? Xô, vai embora. Me deixa sozinha. Você tem aula daqui a pouco. — Jogou o que restou do cigarro no chão, e pisou em cima. Fuzilou Natsu com o olhar e ele ainda não tinha movido um músculo sequer.
— Você também tem aula daqui a pouco. — Respondeu como se fosse óbvio. — E nós não deveríamos estar aqui.
— Uau, gênio. Parabéns pela descoberta. Quer um prêmio? — Revirou os olhos.
— Depende do prêmio. — Arqueou as sobrancelhas, sorrindo de canto.
— Isso não funciona comigo, nem tente. Eu não vou flertar com você. — Franziu o cenho, desgostosa. — Posso te bater, na verdade. — Arqueou a sobrancelha, animada com a ideia.
— Eu até que gosto de um pouco de agressividade. — Inclinou a cabeça para o lado, pensativo. — É mais intenso, sabe?
— Pelo amor de Deus, cala a boca. Você consegue esgotar minha paciência com uma facilidade. — Passou as mãos pelo rosto, e balançou a cabeça.
— Não que isso seja muito difícil, né? — Alfinetou, gargalhando em seguida. Recebeu um olhar raivoso em troca.
— Você não vai embora? Estou quase procurando outro refúgio. — Resmungou, impaciente com a presença de Natsu.
— Não vou, eu gosto de ficar aqui. — Deu língua para implicar, como se fosse uma criança. — Aliás, vão estranhar se as únicas mesas vazias forem as nossas.
— Não me importo, já sou o assunto do colégio mesmo. — Abanou as mãos no ar, e deitou a cabeça no chão.
— Não se importa de dizerem que matamos aula juntos? E insinuarem—
— Você poderia ir embora. Assim, não teríamos rumores. — Interrompeu a frase sem vergonha que ele, com toda certeza, soltaria.
— Não tô muito afim. — Deitou-se no chão, e ficou ao lado da loira observando o céu.
— Vá pro inferno então.
Ficaram longos minutos em silêncio. Juntos. Observando o céu. Ouvindo o barulho do pátio, ouvindo os gritos (bem altos) de Aquarius, ouvindo os passos apressados e toda bagunça que um colégio produz.
Lucy fingiu que a presença de Natsu ao seu lado não existia. Calado, até que ele era legal. Observou-o deitado de olhos fechados, reparou nos cílios longos, a expressão serena e quis morrer por estar tão vidrada em pequenos detalhes. Desviou o olhar quando ele abriu os olhos, como se nada tivesse acontecido.
Natsu sabia que estava sendo observado por olhinhos curiosos. Estava fingindo que não tinha percebido, e continuou de olhos fechados propositalmente. Não sabia definir como era sua convivência com a Heartfilia. Durante as manhãs se ignoravam, durante as aulas também, e agora estava ali ao lado dela. Era inexplicável. Mas, as ações da loirinha eram bastante contraditórias. Se ela o odiasse tanto quanto dizia não suportaria sua presença nem por um segundo, e muito menos distribuiria olhares (nada discretos) em sua direção.
Quando abriu os olhos, ela se remexeu e tentou disfarçar. Sorriu, divertindo-se com a situação. Talvez pudesse se divertir com aquela inimizade. A vida escolar era um tédio, finalmente tinha encontrado algo que pudesse distraí-lo.
— Nós já perdemos o primeiro tempo inteiro da aula de matemática. — Espiou, observando-a sentada e pensativa demais.
— Não ligo. — Respondeu num fio de voz. — Posso pedir ajuda a Levy depois.
Os momentos em silêncio nunca foram muito bons para Lucy. Conviveu com o silêncio de sua casa desde a infância, com as mínimas palavras sendo ditas e as outras presas em sua garganta. Se quisesse ser uma boa menina deveria se manter limpa, estudar, ter bons modos e jamais responder o pai. Toda vez que se lembrava dos momentos não vividos quando criança reprimia o desgosto. Hoje, era totalmente o contrário do que o pai esperava, mas não é como se ele se importasse.
Perdeu o humor e ficou ainda mais emburrada. Estava sempre de mau humor, isso era fato, mas toda vez que pensava demais entrava num limbo de sentimentos ruins que destruíam sua mínima vontade de socialização. Abraçou os joelhos e encostou a cabeça, mas não conseguiu relaxar.
Natsu observava a inquietação da garota e não sabia o que fazer. Não queria ser enxerido e levar um fora. Mas também não queria a ver com um olhar tão triste. Perguntar ou não perguntar era uma grande questão.
Não perguntou. Ficou em silêncio, observando-a abaixar a cabeça e deitar sobre os joelhos. Naquele momento, Lucy até desejava que ele falasse algo, uma piadinha qualquer, mas ele não tinha feito nada. E ficaram num silêncio agonizante.
Natsu repensou a vida inteira durante aqueles longos minutos e não gostou nadinha de passar tanto tempo pensando sobre si mesmo. Quanto mais pensava, pior ficava a situação. Lembrou-se de que não tinha pedido desculpas a Lucy e entrou numa grande dúvida, conversaria sobre aquilo ou não?
— Idiota. — Resmungou a Heartfilia, do nada, incomodada com o silêncio.
— Que foi? — Arqueou as sobrancelhas, confuso.
— Você é um idiota, simples. Idiota, babaca, narcisista, ridículo... e eu posso listar muitos outros adjetivos. — Começou a resmungar sem parar numa tentativa de sair daquele silêncio.
— Uau! Quantas qualidades, hein? Gosta de mim tanto assim? — Perguntou num claro deboche, e surpreso pelo silêncio ter sido interrompido.
— Odeio você o suficiente. Não aumente esse ódio. — Bufou, irritada com o claro deboche.
Lucy ouviu o som que indicava o início da próxima aula e se espreguiçou. Já imaginava os comentários e cochichos quando retornasse à sala, e o olhar questionador de Levy. Não foi tão ruim quanto pensou que seria estar ao lado do Natsu durante aquele tempo, ainda que ele fosse insuportável.
Natsu já tinha se levantado, e observava a figura preguiçosa de Lucy sentada no chão. Balançou a cabeça para os lados, desaprovando aquela preguiça.
— Se continuar desse jeito vai perder outra aula.
— Seria incrível não estudar geografia agora. E ficar longe de você. — Cruzou os braços ao redor do peito.
— Anda logo e levanta daí. Se você não levantar eu mesmo te levanto...
— Você nem ouse! Estou muito confortável aqui. — Espreguiçou-se outra vez e deitou no chão.
Natsu abaixou o corpo e ficou na altura de seu rosto. Olhou em seus olhos e balançou a cabeça em reprovação. Pegou em sua cintura e a puxou para cima. Tudo tinha acontecido em câmera lenta na visão da Heatfilia, e agora sentia o perfume dele cada vez mais próximo. Aquele cheiro não sairia de sua cabeça tão cedo. Empurrou-o com os braços e saiu andando, sem dizer nada. Estava nervosa demais para dizer algo.
Natsu caminhava logo atrás com as mãos no bolso da calça, despreocupado. Não recebeu um chute ou um soco, então estava felicíssimo. Gostou da sensação de brincar com fogo e de ter Lucy em seus braços.
Estavam andando juntos pelos corredores. Uma cena cômica, e nada comum. Todos olhavam como se aquilo não fosse verdade. Lucy quis se enfiar dentro de um buraco ou ser invisível naquele momento. Chutou a canela de Natsu, irritada com a presença dele.
— Qual o seu problema, cara? Me chutou do nada. — Resmungou, passando a mão na perna.
— Você é insuportável. E tá chamando muita atenção ao meu lado. Não aguento mais esses olhares, parece até que sou uma alienígena.
— Foi você quem saiu andando igual maluca. E, também, me deu um soco histórico. É claro que estariam te observando. — Respondeu como se fosse óbvio.
— Você mereceu. Que infernooooooo! Quanto tempo até que esses alunos esqueçam e fofoquem sobre outra coisa? — Cruzou os braços ao redor do peito.
— Não vai demorar muito, acredite. Hoje é só quinta-feira. Na próxima segunda teremos novas fofocas.
— Como pode ter tanta certeza? — Franziu o cenho.
— Estudo aqui faz um longo tempo, conheço quase todo mundo. Acredita em mim. — Deu de ombros.
— Acho que nunca vou me acostumar com esses corredores enormes. — Murmurou, observando a quantidade de salas a cada lugar que passava. — E também não vou conhecer esse colégio inteiro em um ano.
— Se você quiser eu posso te apresentar alguns lugares bem legais daqui. — Piscou o olho.
— Vai sonhando. — Revirou os olhos. — É assim que você leva as garotas pras salas desocupadas? Não entendo quem em sã consciência ficaria com você.
— Que imagem você tem de mim, cara? Não sou esse tipo de pessoa. — Balançou a cabeça, fingindo estar ofendido.
— Conta outra, Natsu. A sua fama te persegue. A cada corredor tem uma garota te observando, por que não vai atrás delas e me deixa caminhar calmamente até nossa sala? — Apontou a cabeça para o lado, sinalizando as garotas paradas na porta das salas.
— Porque eu gosto de te irritar, ainda não percebeu? — Levou as mãos até a cabeça, e bagunçou os fios.
— Oh, Deus... o que eu fiz pra merecer? — Juntou as mãos, como se estivesse fazendo uma prece.
— Talvez a gente esteja um pouquinho atrasado. — Fez bico com os lábios, prevendo a bronca que levaria.
— Claro, você anda com passinhos de tartaruga. — Apertou os passos, querendo se livrar da presença de Natsu logo.
Quando chegaram à sala a porta já estava fechada, o que significava que o professor já tinha chegado.
— E agora? E agora? E agora? — Natsu perguntava desesperado.
— Bate na porta e pede pra entrar! — Exasperou.
— Tá louca? Eu não tenho uma fama muito boa nesse colégio.
— Que saco! Ainda vou precisar passar por essa vergonha.
Lucy bateu na porta gentilmente, não sabia qual seria a reação da professora Evergreen. Pediu aos céus que ela a deixasse entrar, não queria perder outra aula. E também não aguentava mais a presença de Natsu ao seu lado.
— Ora, ora. — Evergreen disse ao abrir a porta. — Os pombinhos resolveram aparecer?
— Desculpa pelo atraso, professora. — Lucy murmurou, abaixando a cabeça. Natsu continuou parado com a maior cara de pau, como se não estivesse atrasado.
— Eu não vou nem perguntar o que vocês estavam fazendo... entrem logo. — Abriu a porta, dando passagem. Lucy entrou, e sentou-se ligeira em seu lugar. Natsu caminhou a passos leeentos, como se gostasse da sensação de ser o centro das atenções.
A Heartfilia olhou para o lado e viu o olhar questionador de Levy. Suspirou, sem saber como explicar a situação. Se falasse do terraço a amiga descobriria seu refúgio. E se não contasse ela ficaria chateada. Sinalizou que após a aula contaria o que tinha acontecido. Omitiria, pelo menos, o cigarro. Olhou para trás e viu Natsu deitado sobre a mesa, os fios do cabelo rosa bagunçados e seu sono profundo. Como ele conseguia dormir durante a aula?
— Luuuuuuu! Eu sei que não somos tão próximas, mas o que houve entre você e o Natsu? Vocês mataram aula juntos? — Sussurrou Levy com os olhinhos brilhando.
— Você é a amizade mais próxima que eu tenho, acredite. E a gente se conhece faz pouquíssimo tempo. — Pôs a mão na testa, tentando disfarçar que estava conversando durante a aula. — Eu não queria matar aula, juro. Mas o terraço é tão confortável...
— Aquele terraço caindo aos pedaços? Tá louca, garota? É proibido subir lá. — Levy balançou a cabeça repetidas vezes, chocada.
— Eu descobri esse lugar faz pouco tempo e tenho fugido pra lá. Só que, pelo visto, eu não sou a única. — Desdenhou com as mãos. — Foi por acaso, tá? Eu não compartilhei minha descoberta com o Natsu. E, na real, acho que outras pessoas vão lá também.
— Então você basicamente estava se isolando e o Natsu apareceu? — Arqueou as sobrancelhas.
— Foi exatamente isso. E ele não quis me deixar sozinha. — Assentiu repetidas vezes.
— E a parte que vocês matam aula? Você sumiu o intervalo inteiro e mais dois tempos de aula, não rolou nada?
— Só as piadas de duplo sentido e minha vontade de matar ele que rolaram. — Revirou os olhos.
— Eu acredito e não acredito ao mesmo tempo. Ainda estou tentando desvendar como vocês ficaram tanto tempo juntos sem se matarem. — Pôs a mão no queixo, pensativa. — Já parou pra pensar que esse ódio todo pode ser outra coisa?
— Sai pra lá, Levy. Já me bastam os flertes descarados daquele idiota. Eu não caio nessa, não. — Abanou as mãos no ar, em constante negação.
— Vou fingir que acredito e você finge que acredita também. Ambas sabemos a verdade. — Piscou o olho, encerrando a conversa.
Lucy ficou pensativa sobre a fala de Levy pelo restante da aula. Pensou nos longos minutos ao lado daquele idiota e percebeu que se fizesse um esforço poderiam conviver quase sem brigas. Cansada de tantas coisas rondando em sua cabeça deitou na mesa e fechou os olhos. Não viu o tempo passar.
.
A aula já tinha se encerrado e a loira continuava com a cabeça deitada num sono profundo. Natsu espiou a colega, e não soube se a acordava ou não. Teve uma ideia brilhante, e resolveu arriscar. Qualquer coisa era só correr.
Recolheu os materiais e os guardou na mochila. Observou os fios loiros desgrenhados querendo se desprender do coque, a expressão tranquila que ela quase não mostrava e teve pena de acordá-la. Era diferente observá-la quando não estava com o cenho franzido e a cara emburrada. Dormindo, assim, até parecia simpática. Ninguém imaginaria que fosse tão mau humorada...
Aproximou-se da Heartfilia, abaixou o rosto na altura de sua nuca e sentiu o cheiro doce. Tão cheirosa... quis muito deixar um beijo naquele lugar. Limitou-se a assoprar, e viu os pelos de seu corpo se arrepiarem.
Lucy acordou com um sopro em seu pescoço e deu um pulo. Todos os pelos de seu corpo estavam arrepiados. Ouviu o som de uma risada e quis matar a pessoa. Natsu estava gargalhando, tinha adorado observar aquela reação inesperada.
— Você sabe que eu vou te matar, não sabe? — Levantou a cabeça, fuzilando o idiota com o olhar.
— Eu quero ver você tentar. — Provocou, aproximando o corpo. Lucy parecia uma gatinha arisca naquele momento.
— Ridículo, insuportável, idiota, filho da puta, desgraçado. — Resmungou, colocando a mochila atrás das costas. Observou-o gargalhar e se irritou ainda mais. — É melhor você correr.
Lucy avançou contra Natsu, mas ele foi rápido o suficiente para abrir a porta e sair correndo. “Filho da puta”, grunhiu contra o vento enquanto corria atrás dele. A mochila estava pesada o suficiente para atrapalhar seus movimentos, e o cabelo se soltava a cada passo que dava, mas não desistiria.
— Eu vou te matarrrr! Seu idiota! — Gritou pelos corredores, e o viu entrar no pátio. O colégio estava vazio naquele horário, a maioria dos alunos já tinham ido embora. Ainda bem que não precisava desviar das pessoas.
— Eu quero ver você tentar! — Ele revidou, provocando a pouca paciência de Lucy. Ignorou as pessoas que o cumprimentavam tentando despistá-la, mas ela era rápida. — Já pensou em praticar atletismo? Você é bem rápida. — Gritou enquanto corria.
— Me poupe dos seus comentários. — Observou Natsu correr para um dos lugares que ainda não tinha ido e quando seguiu seus passos não o encontrou mais. Tinha perdido ele de vista. Pôs as mãos no joelho, e tentou regular a respiração. Bufou alto o suficiente para expressar o quão irritada estava.
— Ele provavelmente foi embora.
Caminhou por aquele pátio e conseguiu enxergar a piscina utilizada nas aulas de Natação. Levou as mãos até o alto e girou o pulso no ar. Caminhou até lá, e observou a piscina de longe. Ainda não tinha tido aulas de Natação com Aquarius, quis muito entrar ali.
Tirou a mochila das costas para descansar, e os tênis também. Deixou-os num cantinho. Caminhou até a beira da piscina e molhou os pés. Observou aquele azul e o cheiro de cloro. Riu sozinha. Não queria voltar pra casa. Não queria encarar aquele espaço vazio e nada aconchegante.
Lucy estava tão distraída que não percebeu Natsu se aproximando — devagarzinho — atrás dela. Só foi perceber quando sentiu duas mãos em suas costas e o empurrão. Caiu com tudo na piscina. Só não entrou em desespero porque sabia nadar.
Estava toda molhada, o coque já tinha se desfeito e a blusa — branca — agora estava colada e transparente no corpo. Jogou a franja para trás, e nadou em direção a borda. Observou o idiota se contorcendo de tanto rir perto e aproveitou aquela margem de distração. Puxou-o pelos pés e o derrubou com tudo na piscina. A cara de susto dele foi impagável.
— A vingança é um prato que se come frio. — Disse risonha, feliz pela vingança numa pose comemorativa. Em seguida, mergulhou na água.
Quando emergiu, Natsu estava encostado, com os fios rosados molhados e sem blusa. Tentou não reparar muito. Ele a observava com uma feição emburrada, os braços apoiados na borda e o corpo relaxado na água.
— Cara, você molhou minha meia. — Balançou os cabelos e passou a mão entre os fios, resmungando. — Será que devo me vingar?
— Você não tem direito de reclamação. Merecia algo pior. — Apontou o dedo pra ele. Passou as mãos nos fios loiros e percebeu que mais tarde teria que hidratá-los. Fuzilou- o com o olhar, relembrando-se da forma como havia sido acordada. Passou as mãos pelo pescoço, nervosa com a lembrança.
— Eu não imaginava que seu cabelo fosse tão grande. — Exclamou, realmente surpreso. Imaginava que fosse médio.
— Ele vai até a cintura, mas vive preso. — Deu de ombros, como se não fosse uma informação tão chocante.
— Por que? — Natsu perguntou, curioso. Perguntava-se desde o primeiro dia o motivo de Lucy estar sempre com um coque frouxo.
— Se eu soltasse não aguentaria muito tempo com ele solto. Já viu o calor que anda fazendo? — Tentou evitar o assunto.
— Você poderia simplesmente cortá-lo na altura do pescoço. — Respondeu como se fosse óbvio.
— Eu gosto dele grande. — Arqueou as sobrancelhas, imaginando-se de cabelo curto. Até que não ficaria tão ruim.
— Deve ser bom de puxar. — Soltou, assim, sem vergonha alguma. E mordeu os lábios em seguida.
— Eu vou fingir que não ouvi isso. — Observou-o, inexpressiva.
Natsu estava sempre com uma resposta na ponta da língua. Segurava a maioria por não ter tanta intimidade com a Heatfilia, mas era inevitável. Gostava de levar as conversas daquele jeito descontraído. Depois de perceber as leves aberturas durante as conversas com Lucy sentiu que não precisava ter tanto medo dela. Ela era daquele jeito para, provavelmente, afastar as pessoas e não ter vínculos tão profundos. E Natsu não se importava com os xingamentos que recebia. Às vezes, queria xingar ela também.
Observou-a distraída com a água e jogou uma onda pra cima dela com as mãos. Viu seu rosto se contorcer numa carranca indignada e logo estava com o rosto encharcado de água também. Mergulhou, e nadou até ela. Puxou seu pé para baixo e emergiu, rápido, afastando-se o máximo que pôde. Natsu não a viu emergir, e achou estranho. Só foi perceber a pegadinha quando foi puxado para baixo, e tinha engolido água sem querer.
— Ainda não aprendeu que eu sei revidar suas provocações? — Jogou o cabelo para o lado, e pôs as mãos na cintura. Estava achando o máximo a cara de otário que ele fazia quando era pego de surpresa.
Natsu observou a pose confiante da garota e gargalhou. Aproximou-se, devagar, e ela já estava em pose de guerra com as mãos prontas para lhe jogar água. Segurou-a antes que ela fosse mais rápida, e prendeu seus braços.
— E agora? — Aproximou o corpo, e a encurralou na borda da piscina. Estavam próximos demais. Sentia a respiração descompassada dela bater em seu rosto. Observou os olhos castanhos arregalados e segurou a risada.
— Agora... — Ela sussurrou no ouvido de Natsu com a boca bem próxima da orelha. — você me solta. — Elevou o joelho e chutou Natsu forte o suficiente para se desvencilhar.
— Precisava dessa agressividade, poxa? — Pôs as mãos entre as pernas, sentindo a dor.
— Até amanhã, otário. Espero que a dor não passe.
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