Raccoon City
2020
Terça-feira 10:00 p.m.
Bon Jovi tocava baixo no rádio do carro. Mesmo abafado o som da garoa podia ser escutado na parte de dentro batendo no vidro. Claire freou levemente assim que viu o sinal ficar vermelho, apoiou a cabeça na mão esquerda cujo braço se sustentava na porta do carro e suspirou fundo pelo longo dia de trabalho. Mesmo com casos simples como multas e assaltos, o protocolo policial ainda era um porre de ser feito e se Claire pudesse passava reto por todas elas, mas Irons certamente prenderia ela no escritório e daria um sermão de pelo menos 40 minutos, e de reclamação já bastava de Barry e Chris. Observou o vermelho do semáforo na espera de prosseguir seu caminho para casa, porém em segundos as memórias do sangue apareceram tão vívidas e nítidas quanto da última vez.
Fechou os olhos na tentativa de esquecer aquela lembrança e os abriu aturdida com a buzina que soava atrás de si, o sinal havia ficado verde e ela ainda não tinha saído do lugar. Acelerando aos poucos, a Redfield mudou sua rota até um bar mais próximo, percebeu que precisaria se embriagar se quisesse dormir bem essa noite.
Hampton's Bar
11:25 p.m.
—Eu juro, Chris. Não estou bebendo.
—Que música é essa, então?
—Okay, talvez eu esteja bebendo um vinho —respondeu revirando os olhos pela desculpa de última hora. —e…escutando uma música, mas estou em casa.
Recostou-se na parede úmida e olhou para os lados averiguando se ainda estava sozinha no beco. Assim que viu a ligação do irmão correu para os fundos do bar para atender o chamado, com Chris e Barry no seu encalço, ultimamente era melhor responder do que ignorar. Pôs a mão na arma que estava no coldre e recarregada, portanto não teria problemas em atacar alguém que viesse de surpresa.
—Irons estava uma fera porque você ainda não terminou o relatório —respondeu Chris chamando a atenção de Claire novamente.
—Tudo o que eu não preciso é preencher aquela porcaria, amanhã eu dou um jeito.
—Você disse isso há dois dias —pôde sentir o tom dele mais sério, ele realmente estava se estressando e se tinha uma coisa que Claire gostava de evitar era irritar seu irmão mais velho.
—Eu ajeito ele hoje e entrego amanhã de manhã. Satisfeito, Capitão?
—Sim, sargento. Agora saia desse fundo de bar e dirija pra casa.
Ajeitou a postura olhando para os dois lados na esperança de ver a figura do irmão, mas o lugar continuava vazio, então ela logo percebeu, era um blefe.
—Eu já disse que não estou no bar, se acha que usar isso contra mim vai adiantar pode tirar o cavalo da chuva.
—Vou acreditar em você, preciso ir. Amanhã a gente se vê. Boa noite, bear.
—Tchau.
Desligou o smartphone colocando ele no bolso da jaqueta vermelha de couro que vestia, puxou a porta de metal emperrada e entrou novamente no bar dando um gole no whisky sem gelo que segurava enquanto conversava com Chris.
Ela sabia que tudo isso era preocupação por conta do excesso de álcool que começou a ingerir, mas Claire simplesmente não tinha paciência para babás intrometidas, ela tinha 33 anos e sabia o que estava fazendo com seu fígado. Por isso, bebeu até sua vista embaçar e somente quando isso aconteceu, decidiu que deveria voltar para casa.
—Tudo bem?
—Maravilhosamente bem —respondeu sem se assustar com o desconhecido enquanto tentava acertar o botão para desbloquear o carro. Estava tão embriagada que não dava a mínima para a pessoa que se aproximou dela em um estacionamento vazio.
—Precisa de ajuda?
No mesmo momento o alarme do carro tocou, avisando Claire que havia desbloqueado o veículo. Caminhou até a porta do passageiro e entrou no carro, mas estranhou a falta do volante ao esticar as mãos. Ouviu batidas no vidro e abaixou para ver quem era.
—Acho que você entrou no lugar errado.
Virou a cabeça para o outro lado vendo o bendito volante e lamentou pela burrada que havia cometido, abriu a porta do carro vendo a pessoa dar espaço para ela passar, ainda não tinha prestado muita atenção em quem era, mas pela voz deduziu ser um homem.
Seu braço foi segurado pelo desconhecido e pela primeira vez notou a voz suave dele.
—Acho que não devia dirigir. Vem, vou chamar um táxi pra você.
Sem pestanejar, Claire acompanhou o homem até o limite da calçada e esperou pacientemente ele empurrá-la para um táxi. A Redfield no fundo do consciente tinha ideia do erro que estava cometendo, mas seus sentidos estavam inibidos pela bebida que controlava todo seu corpo.
—Vamos, entre.
— Neil —sussurrou pensando no amigo.
Abaixou a cabeça para entrar no táxi que havia parado e sentou no acolchoado macio, sua mente quase apagou por relaxar tanto com o estofado.
— Deveria ter escutado seu irmão, Claire.
— O quê? —perguntou sentindo um lapso de razão com a pronúncia de seu nome.
— Pra onde? — o taxista perguntou para Claire que esqueceu completamente do que havia escutado e deu seu endereço com o carro dando partida logo em seguida.
Apartamento de Claire
Quarta-feira 8:30 a.m.
— Porra!
Era a terceira vez que revirava o apartamento em busca da chave e não tinha visto nem mesmo uma pista do paradeiro do objeto. O dia havia começado com o pé esquerdo para Claire que acordou com uma bela dor de cabeça resultante da bebedeira da noite anterior, assim que olhou para o relógio digital da cabeceira sua mente alarmou ao ver que já eram 8:30 a.m., estava extremamente atrasada para o trabalho. Não tomou banho ou ao menos trocou de roupa, só pôs um pouco de pasta de dente na boca e correu em busca da chave do seu carro que sumiu.
Seu celular havia tocado pela quarta vez, provocando ainda mais raiva em Claire que correu até a sala e pegou o smartphone descansando na mesinha de centro.
— Está atrasada, Redfield.
— Irons…
— Você tem 10 minutos para aparecer na minha frente.
Sem dizer mais nada, o homem desligou na cara de Claire que fechou os olhos controlando o desespero pela situação. Ela tinha ideia de que não adiantaria continuar a busca, era inútil. Claire tinha perdido a chave do carro. Pegou a carteira, também na mesinha, e olhou se tinha algum dinheiro ali dentro, vendo que sim, correu até o elevador e clicou no térreo, assim que a porta abriu, correu com toda a força que tinha pegando o primeiro táxi que viu.
—Delegacia de Raccoon City —respondeu para o taxista que assentiu e começou a corrida.
Sua cabeça doía, sua barriga embrulhava e ela não tinha tomado seu café, Claire estava no ápice de seu mau humor e descontaria toda sua frustração no primeiro que aparecesse na frente dela.
Delegacia de Raccoon City
8:42 a.m.
—Irons vai te matar —Chris respondeu quando viu a irmã passar pela entrada principal da delegacia. Ofereceu o copo de café sem açúcar para Claire que aceitou de bom grado, ela não iria aturar mais um minuto se não tomasse pelo menos um gole de bebida.
—O sentimento é mútuo —murmurou seguindo seu caminho até o escritório de Irons, Chris continuava a segui-la rindo de seu comentário.
—Tenta não ser demitida —pediu ele antes de seguir seu caminho.
— Não prometo nada —gritou subindo as escadas rumo ao segundo andar.
A delegacia como sempre estava agitada, vários telefones tocando, pessoas correndo de um lado pro outro, excesso de vozes, tudo o que Claire não precisava naquele momento. Andou todo o percurso sem diminuir a velocidade e mesmo assim ninguém ousou atrapalhar seu caminho, afinal todos ali sabiam da fama da Redfield.
No final do corredor oeste do segundo andar, Claire viu a placa de identificação da sala "Chefe Brian Irons" e rodou a maçaneta da porta invadindo o escritório sem nem anunciar, vendo Brian olhando-a sério.
—Estou aqui.
—15 minutos atrasada. Está demitida.
—Ah, pelo amor de Deus, Irons, não enche a minha paciência.
—Você não enche a minha! —gritou. — Não posso deixar você continuar com isso, Redfield, está fora de controle, já é a quarta vez esse mês. Tem noção do problema que me mete com essas suas irresponsabilidades? Você não é assim.
Claire não ousou se mover com a reclamação de Irons, nem mesmo um olhar amedrontado, tudo o que transmitiu foi um olhar opaco e cético. Brian suspirou sabendo que qualquer investida seria inútil, Claire não voltaria a ser a agente de 5 anos atrás, não depois de tudo.
— Você precisa superar o caso Javier, Redfield —argumentou olhando novamente para a mulher, vendo seu olhar brilhar em raiva, mas ela permaneceu calada. — Você é a minha melhor agente, não deixe o fracasso consumir você.
—Estamos falando do mesmo caso? — perguntou Claire. — O prefeito se suicidou, Irons. Que tipo de pessoa some sem dar rastros e se suicida dois meses depois? A cidade estava afundando em ruínas.
—Isso já faz cinco anos! Não tem o que fazer. Não temos provas, Claire. Não temos nada. Absolutamente nada. Um beco sem saída. Trate de se portar como uma detetive ou eu transfiro você. Agora saia da minha sala e me traga o relatório.
Sem proferir uma palavra, saiu da sala de Brian e foi até seu escritório na ala leste. Assim que abriu a porta deu de cara com seu parceiro, Ben Bertolucci.
—Irons demitiu você? —perguntou ele brincando com um cubo mágico.
—Ainda não.
—Precisa de alguma coisa?
"Que caia fora daqui" foi o primeiro pensamento de Claire, ela não estava com paciência para o falatório de Ben em plena 9 horas, além dele ser exageradamente tagarela, era um cachorrinho na mão de qualquer pessoa.
Ela odiava cachorrinhos.
—Pega uma aspirina pra mim —pediu desbloqueando o computador e checando seus e-mails, tomou mais um pouco do café enquanto excluía o excesso de anúncios que caiam na caixa de entrada.
Estava prestes a fechar a aba quando um e-mail estranho chegou, sem remetente ou identificação. Clicou duas vezes abrindo o documento que vinha praticamente limpo, somente uma frase preenchia o espaço.
Ligue o fax se estiver atrás de respostas
Franziu o cenho com a mensagem estranha, o fax não é ligado há décadas, somente em casos de extrema emergência. Olhou para o aparelho atrás de si pensando se seguia a instrução, não tinha nada a perder ligando algo tão velho, afastou-se da mesa virando a cadeira para ficar frente ao fax apertando o botão de ligar.
—Por que está ligando o fax? —Ben perguntou assim que entrou na sala com aspirina e mais um copo de café.
—Estou só averiguando algo —comentou sem dar muita brecha, observou calmamente o fax ligar e lembrou-se da falta de folhas no equipamento. —Pega uma folha pra mim da impressora.
—Só uma?
—Só uma.
Bertolucci correu em direção a impressora mais próxima pegando uma folha A4 e voltou entregando para Claire que posicionou o papel no devido lugar, automaticamente escutou o som de impressão de alguma mensagem enviada e, novamente, somente uma única frase estava escrita no papel. Calmamente, a Redfield pegou a folha e leu a frase impressa arregalando os olhos à medida que repetia a leitura.
—Puta merda.
—O que tem escrito? —Ben perguntou colocando o remédio e o café sobre a mesa.
—Temos trabalho a fazer, Bertolucci. O caso Javier vai ser reaberto.
—O quê? —o detetive perguntou. Claire empurrou a folha para ele que leu a frase digitada.
Alexia Ashford teve um caso com o prefeito.
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