-Chega! Eu já não aguento mais essas duas! – exclamou Ikki para si mesmo, parando na saída da Casa de Câncer.
Estava andando praticamente fugindo de Pandora e Esmerald, ainda estupefato com o que acabara de acontecer e não queria nem menos dar uma explicação para Shun ou Shina. Não queria falar com ninguém.
Suas mãos ainda estavam queimadas e seu coração ardia em raiva. Qual era realmente o problema delas? Mal sabia que era ele próprio que estava sendo um obstáculo acidental na relação das duas, já que talvez em circunstâncias normais elas até teriam se dado bem. Talvez.
Ikki então se sentou e esfregou seu cabelo, apesar do ato fazer suas mãos doerem ainda mais.
Como pôde deixar o ódio delas evoluir tanto? Por que não as impediu? Bem, o leonino sabia bem que não adiantava mais se fazer essas perguntas pois o que foi feito já estava feito. Só queria que elas soubessem que machucaram mais do que as suas mãos, ambas machucaram seu coração.
-Esmeralda... o que eu faço? – perguntou para o vento que passava.
Não recebeu nenhuma resposta e suspirou por isso.
-Ei, falar com o vento não vai cicatrizar essas mãos! – disse uma voz abrindo a porta da saída de Câncer, de onde saiu o próprio Máscara da Morte.
O canceriano carregava no colo o seu filho Marco de três anos, que passeava bem confortável nos braços do pai. Mask tinha um sorriso debochado no rosto ao olhar para a situação do Fênix.
Nunca teve a oportunidade de conversar tanto com o leonino mas, já tinha a percepção de que eles nunca teriam se dado bem. Principalmente porque depois de Shiryu, Ikki era o que mais gostava de “escapar” do Inferno e como ele se autodenominava, no passado, o Porteiro do Inferno, Mask ficava meio irritado com Ikki.
Ele então se sentou ao lado do cavaleiro de bronze e os dois passaram a ficar olhando um pouco para as estrelas. Como nunca conversaram muito, não sabiam como iniciar uma conversa.
-Er... a constelação de Fênix parece meio apagada hoje, não acha? – perguntou Mask, tentando iniciar um assunto.
-Muitas coisas aconteceram hoje. Recebi a máscara de Guilty, Pandora e Esmerald lutaram e eu acabei com as mãos chamuscadas. Para esse dia ficar pior só falta o Shun me dizer que está apaixonado pelo Hyoga! – exclamou o leonino, irritado.
-Pelo beijo que eu vi ele dando na Shina é melhor descartar essa possibilidade – respondeu uma voz atrás dos dois.
Naquele momento, Afrodite ia até os dois azulados trazendo sua filhinha Rose de dois anos no colo. A pequena pisciana dormia a sono solto e não acordou nem quando o pai se sentou do outro lado de Ikki.
O sueco também tinha um olhar perdido nas estrelas. Claro que não tinha deixado de ouvir a briga que aconteceu na entrada do Décimo Terceiro Templo e Ikki sabia bem disso. Um pouco de vergonha encheu o rosto do leonino e Afrodite riu um pouco ao perceber isso.
Talvez por detestar tanto o Shun, o pisciano tinha um certo carisma pelo irmão mais velho do Andrômeda. Na verdade, Afrodite gostava de qualquer um que tinha pouca paciência com o virginiano, isso o fazia sentir como se realmente achasse pessoas que concordassem com ele sobre esse assunto.
-Mas, então, você está apaixonado por quem? Pandora ou Esmerald? – perguntou Afrodite, sem nenhum rodeio e o leonino praticamente pulou do lugar onde estava.
-D-do quê está fa-falando?! – perguntou de volta Ikki, com os olhos arregalados.
-Mask, corrija-me se eu estiver errado: falei alguma besteira?
-Não, não mesmo, amigão – respondeu Mask, com um sorriso de canto – Abre o jogo, galináceo! Você gosta da gótica ou da loira?
-Eu... eu...
-Pessoalmente, eu gosto mais da Pandora. Mulheres de cabelo escuro me atraem muito... além de que ela é rica, misteriosa e tem cara de quem sabe fazer um ótimo “sttrudel”. Como meu pai dizia: “Se uma mulher sabe cozinhar bem uma comida de sua própria terra é porque ela é a mulher ideal!”
-Eu já prefiro mais a Esmerald – comentou o pisciano – Gosto de loiras, pelo menos as loiras verdadeiras. Mas provavelmente deve ser porque como minha mãe era loira, minha mestra era loira e minha melhor amiga e esposa é loira... céus, eu só conheço boas mulheres loiras.
-A Verônica consta nessa lista?
-Aquilo era um homem! Eu acho... ok, para aquela criatura das trevas eu faço uma exceção da lista de “Boas Loiras da Minha Vida”.
-A pergunta não era para mim? – perguntou Ikki, apontando para si mesmo.
-É que estamos nos distraindo para você poder pensar na resposta, Ikki. Geralmente, pessoas apaixonadas demoram muito para pensar.
-Principalmente quando se está decidindo entre a mulher que queria roubar a alma do seu irmão, a mulher que é a gêmea da sua antiga paixão e, claro, sua própria antiga paixão que foi morta.
-Não complica, Mask! Não complica – Afrodite tinha batido a mão na cara e Marco, ao ver o “Tio Dite” fazendo isso, repetiu o gesto.
Depois da última fala de Mask, o Fênix já não parou para prestar a atenção em mais nada. Por mais que odiasse perceber isso, tinha que admitir que o canceriano estava certo.
Havia uma grande diferença entre Pandora, Esmerald e a própria Esmeralda. Não havia como fugir dessa verdade.
Pandora, apesar da face sempre triste e melancólica, era uma boa amiga. Ela entendia muito bem o que era sofrer, também tinha um carinho por Shun e sempre estaria ao lado de Ikki apesar de quaisquer circunstâncias.
Esmeralda sempre seria sua primeira paixão, sempre seria a pessoa que ele tinha confidenciado tudo sobre seu irmão e ela sempre iria ouvi-lo. Seria sempre sua eterna Esmeralda, apesar de que aos poucos parecia superar a sua morte. Mas quem poderia competir com ela?
Então, ele chegou no ponto mais delicado da questão: Esmerald.
Não a conhecia tão bem quanto as outras duas então, seria um pouco difícil analisá-la bem. Embora, enquanto passavam aquele dia de chuva na Cidade do Porto, eles conversaram um pouco sobre as coisas que gostavam e descobriram que praticamente gostavam das mesmas coisas.
Também sofriam dos mesmos problemas como a perda de Esmeralda e aquele sentimento de precisar impor o medo para ser respeitado pelos outros.
Mas assuntos em comum não eram o bastante para simplesmente deixar decidido seu coração para ela. Nem mesmo sabia com exatidão se estava mesmo apaixonado por qualquer uma das duas.
Como se adivinhasse os pensamentos de Ikki, Afrodite disse:
-Com o Milo foi a mesma coisa, ele jurava para mim que não estava apaixonado por Ártemis e olha só... hoje estão casados, bem felizes e têm um filho. Ikki – o pisciano pois a mão gentilmente no ombro do Fênix – Eu sei que você deve estar muito confuso, mas, confie em mim. Eu sei o que é um coração apaixonado quando vejo um.
-Mas sabe me dizer por quem eu estou apaixonado? – perguntou o leonino, levantando a sobrancelha em descrença. Se nem mesmo ele sabia, não tinha como o outro adivinhar.
-Ele te pegou, Afrodite – provocou Mask.
-Santo Deus, por que me deixas rodeado de homens de pouca fé no amor? O sentimento do amor nada mais é do que uma mistura equilibrada de emoção e lógica. Aposto que eu consigo adivinhar por quem você está apaixonado, Ikki.
-Aposta aceita!
-Hum... – o pisciano fingiu pensar um pouco – Bem, eu sei que você já disse para a Pandora que não ficaria com ela porque sempre a vê como uma amiga...
-Não é só Atena que deixa esses pobres corações na zona da amizade – comentou o canceriano, dramático.
-E claro, lembramos o fato óbvio de que Esmeralda está completamente em paz no Céu, cheia de anjinhos ao redor dela e usando branco porque é um espírito...
-E você não tem cara de quem comete atos de necrofilia, Ikki. Eu desconfio do Hyoga nesse ponto, talvez com um pouco de “Complexo de Erico” no meio.
-É Édipo, Mask. Complexo de Édipo.
-O psicólogo amoroso aqui é você, Gustav, não eu.
-Enfim, por ordem de eliminação, você está apaixonado pela Esmerald, Ikki – finalizou Afrodite. O leonino iria argumentar mas, imediatamente o sueco o cortou – Antes que venha dizer coisas como “Ah, eu não estou apaixonado por ela!”, me diga: o que sente quando está perto dela?
-Hã... eu... eu sei lá, ás vezes eu me sinto como se estivesse do lado da Esmeralda outra vez, mas...
-Lembra-se que Esmeralda morreu e começa então a perceber a Esmerald de outra maneira – continuou Mask, com os olhos nas estrelas e vagando em suas próprias memórias – Você então repara que, o que gosta nela não é o fato dela ser parecida com a outra e sim... você a ama por ser quem ela é. A outra, é passado. O verdadeiro amor está na garota do presente.
Por momento, Ikki ficou encarando o disperso Mask.
Soube da história dele com Helena da Grécia e ouviu vagamente sobre as dúvidas que ele tinha entre a antiga e a outra Helena, mas não tinha sabido mais do que isso.
No entanto, naquele momento, lá estava Mask, com seu filho no colo, e olhando as estrelas com nostalgia lembrando-se de tudo que passou lá em Asgard. Conseguiu facilmente se identificar com o canceriano naquele momento e então percebeu que as palavras ditas foram muito verdadeiras.
Esmeralda faleceu em seu passado e ficaria para sempre no passado. Já Esmerald era mais do que apenas uma garota que o odiava e passou a realmente se importar com ele.
Finalmente encontrou a pessoa dos seus sonhos e não havia nenhum obstáculo que o faria desistir. Agora tudo estava mais claro em sua mente. Não poderia mais negar o que sentia no fundo do seu coração, esse sentimento parecia crescer ainda mais agora que estava pensando nisso.
“Então... essa é a sensação de estar apaixonado. Achei que tinha esquecido isso – Ikki sorriu para si mesmo ao lembrar desse sentimento – Esmeralda, eu sei que você me amava mas, compreendo que talvez tenha sido você quem trouxe Esme na minha vida... você quer... você quer que eu prossiga com a minha vida.”
-Ikki? – chamou Afrodite, olhando preocupado para o Fênix que tinha os olhos marejados.
-A sensação de estar apaixonado de novo é tão boa que eu até me emocionei um pouco – o azulado então esfregou as lágrimas que ameaçavam cair, não iria perder o foco naquele momento – Você está certo. O meu coração realmente está nas mãos de Esmerald... e, talvez eu diga isso para ela.
-Você falou alguma coisa, Ikki? – perguntou Mask, despertando das suas lembranças.
-Obrigada pelos conselhos, Mask! E obrigada por abrir os meus olhos, Afrodite! Eu sei o que devo fazer agora, sei exatamente onde meu coração está...
E dito isso, o leonino se levantou e começou a correr pelas escadarias, desta vez com um sorriso no rosto e não ligando mais para as feridas em suas mãos. Agora isso já não importava mais.
Toda a raiva que estava sentindo de Esmerald se dissipou e ele, no clima de alguém que finalmente admitiu estar apaixonado, já até estava pensando em ajudar Pandora a achar alguém para ela também. Se por algum motivo ele fosse (e era) o motivo da briga entre as duas, faria de tudo para concertar as coisas.
Pela primeira vez, as pessoas até estranharam a felicidade em seu rosto quando ele passou por elas. Sentia-se renascer, assim como o pássaro de sua constelação.
-Acho que quebramos ele, Mask... – murmurou Afrodite, olhando com o amigo para onde Ikki ia.
-Você quebrou ele, eu apenas contei vagamente sobre minha experiência com mulheres estranhamente parecidas – respondeu o canceriano, se defendendo.
-Chau, tio Iki! – exclamou Marco, acenando com a mãozinha para o leonino que corria.
-As quintas palavrinhas dele, que emoção! – Mask sorriu largamente.
-Geralmente os pais não vibram pelas primeiras palavras?
-Eu sou diferente, estou tentando ser um pai presente e bem carinhoso para o meu filho... se eu precisar, infelizmente, apelar para o meu lado paternal...
-... e bem adormecido...
-... eu irei apelar!
Afrodite então suspirou com Rose ainda dormindo em seu colo, ela ainda não tinha falado nada. Já o gêmeo dela, Alexander, por outro lado, já tinha falado suas primeiras palavras.
-Ainda acho que quebramos o Ikki – comentou o pisciano, meio preocupado.
-Relaxe! Nada alegra mais o coração de alguém do que um bom amor – disse Mask, pondo a mão no ombro do amigo.
-Talvez tenha razão.
Mal eles percebiam, ao se preocuparem com o Fênix, que Rose ainda adormecida tinha pego a mãozinha de Marco e parecia dormir ainda mais confortável, com um pequeno sorrisinho no rosto. O moreninho acariciava a cabeça da menina para também dizer que estava feliz.
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