Shina encarou aqueles olhos cinzentos tão familiares por mais tempo do que deveria, sua mente era bombardeada por perguntas e lembranças que tinha desde que Pearl, sua mestra, havia desaparecido do Santuário após uma missão.
Tudo o que a amazona de Ofíuco sabia foi graças à Mestra Pearl de Cavalo Menor, uma amazona honrada e temida pelos outros guerreiros do seu tempo. Ela nunca media esforços para conseguir o que queria e trabalhou muito duramente com Shina para ela conseguir a armadura de Prata da qual tanto se orgulhava.
Mas não era mais a mulher esforçada e atenciosa que Shina via em sua frente. Não, aquela não era a mesma Pearl.
Aquela mulher de cabelos claros, vestindo uma armadura negra por cima de um vestido também escuro e com uma face friamente orgulhosa não era a sua querida e memorável mestra. Ou será que era?
-Shina, já faz tanto tempo... parece que era ontem que você era uma garotinha em busca da armadura de Ofíuco. E agora, tornou-se uma mulher forte e corajosa – disse Pearl, se aproximando da antiga discípula – E sem máscara.
-Atena dissolveu essa regra estúpida, mestra. Já não preciso me esconder mais e isso é uma grande dádiva – respondeu Shina com hesitação, afinal devia estar sempre preparada para tudo.
-Hum, entendo. Mas por acaso você sabia que essa lei da máscara não funciona aqui? Nunca pensei que diria isso, porém estou feliz de viver nessa ilha e ser uma amazona negra. Todos aqui me temem, como eu sempre desejei que fosse.
-Está feliz? Por viver aqui? Mestra, a senhora deve ter enlouquecido!
-Não, Shina, não enlouqueci. Apenas abri os meus olhos e estou pagando pela feliz punição que o Santuário me concedeu. Sabe, eles não me mandaram para uma missão e eu desapareci como devem ter te contado... eu fui exilada! O Grande Mestre viu grande má conduta em mim e me mandou para cá.
-Má conduta? Mas você foi a mestra mais honrada que eu já conheci!
-Honrada? Bah! Honra é para os fracos. Os cavaleiros negros me ensinaram a ter mais que honra. E eu descobri que para ser forte, eu preciso ser temida e fazer as outras pessoas temerem o meu poder. Aliás, era o que eu sempre quis no Santuário, mas, nunca tive. O temor. É difícil ser uma amazona, sabe?
-Não posso acreditar no que eu estou ouvindo... você gosta mesmo daqui? Gosta de viver entre esses sujos e podres cavaleiros? O que aconteceu com a Mestra Pearl que me ensinou tanto?
-Ela está bem aqui. Se não consegue vê-la, é problema seu...
Logo Shina sentiu a mestra elevar o seu cosmo e preparando-se para atacar. Mas a amazona foi mais rápida e desviou dos golpes de Pearl que por pouco não a acertou. Um clima de grande tensão envolveu as duas e elas apenas ficaram se encarando por um tempo, planejando alguma estratégia.
A ariana passava o olhar pelos espelhos opacos, pensando que deveria haver alguma coisa para torna-los úteis. Uma defesa especial, talvez.
Shina nunca foi de passar uma luta apenas se defendendo e desviando, mas, àquela ali na sua frente era sua mestra e sua inimiga. Ainda era estranho assimilar que precisava combate-la já que Pearl havia lhe ensinado a ser uma verdadeira e corajosa amazona.
Foi então que ela se lembrou do que sua antiga mestra tinha dito uma vez quando ainda treinavam juntas na arena:
“-Shina, uma grande amazona é temida pelos cavaleiros como se fosse seu pior pesadelo. Conseguiremos respeito pelo temor que eles terão de nós e não por trabalhar com eles em harmonia. Não! A harmonia não fará de você uma amazona de Ouro! – disse Pearl, olhando com fúria para um grupo de cavaleiros que treinavam.
-Amazona de Ouro? Mas você acha que é possível chegarmos a tanto? – perguntou a jovem Shina, ingênua.
-Claro que sim. Eu me tornarei a amazona de Ouro de Escorpião e meterei o terror no coração desses cavaleiros desgraçados!
-Mas o Milo já tem a armadura de Escorpião e não pode haver dois guerreiros com a mesma constelação.
-Por isso, ele será liquidado em breve... Shina, receber uma armadura de Ouro é uma honra que foi roubada por eles e eu mostrarei a todos do que o meu poder é capaz. Eles temerão meu poder como a primeira amazona de Ouro da história!”
E desde aquele dia, Shina tomou e seguiu aquele conselho durante muito tempo até perceber que não existia porquê ser contra os cavaleiros que muitas vezes eram seus amigos próximos, como o caso de Milo que sobreviveu apesar da ameaça de Pearl. Ela podia até querer que eles a temessem, mas, era um temor mais geral. Ninguém, cavaleiros ou amazonas, gostava de desafiar a furiosa Shina.
Mas esse não era o temor que Pearl ansiava. Ela queria ser temida com todo o fervor que as pessoas temiam gente como Gold. Um temor de deus. Pearl queria ser temida como uma deusa que pensava merecer ser.
-Você sempre foi uma decepção, Shina. Sua ambição não era grande como a minha... acho que não fui dura o bastante com você – disse a Cavalo Negro, preparando os punhos – E por isso, meus socos serão ainda mais duros.
-Pois eu também estou preparada. Se minha mestra e você, amazona negra, são realmente a mesma pessoa que não mudou durante os anos, acho que terei que te combater como a inimiga que se revelou.
-Então tente, querida. Tente conter os meteoros de uma amazona negra com a agilidade de uma amazona de Ouro! METEÓROS DE CAVALO NEGRO!
Pearl então lançou seus punhos velozmente na direção de Shina, a acertando de todas as direções com socos e meteoros mais potentes que os golpes de Seiya de Pégaso.
Quando era atingida, Shina sentia como se estivesse sendo apedrejada pelos meteoros e sua antiga mestra a golpeava com uma força descomunal e incomum para os cavaleiros negros. Não havia como contra-ataca-los, porém estava difícil se desviar e defender deles mesmo sendo da classe de Prata.
Foi logo que Shina chegou perto da parede, arrancou rapidamente um dos espelhos e o usou como um escudo contra Pearl. Os meteoros quebraram o espelho como pedras jogadas no vidro, mas, foi nessa hora que a amazona jogou o objeto na direção da outra que parou seus ataques para se proteger.
Cacos de espelho negro fizeram um grande barulho ao cair no chão e num momento de distração de Pearl, Shina correu na sua direção para lhe acertar um de seus ataques mais potentes:
-GARRAS DE TROVÃO!
Mas antes que as garras da Ofíuco alcançassem a mestra, esta lhe impediu com apenas uma mão e na mesma posição que as Garras de Trovão.
Pearl gargalhou bem alto ao olhar para a ex-discípula.
-Não posso acreditar que teve a audácia e a estupidez de acertar a sua própria mestra com um golpe que ela mesma te ensinou! Shina, você é uma vergonha para as amazonas – desdenhou a austríaca, atirando a esverdeada na direção da parede.
Shina bateu as costas contra a parede escura e formou uma pequena cratera na mesma, caindo de joelhos no chão.
“Claro, como pude ser tão estúpida? Mas... esse é o único golpe que eu tenho – pensou a amazona, desesperada.”
Infelizmente, a maioria dos guerreiros de Atena eram tão confiantes de sua força e capacidade de acabar com o inimigo de uma única vez que nem se incomodavam em criar ou aperfeiçoar golpes. Shina também foi tomada por esse orgulho e mesmo suas habilidades com saltos e estratégias não eram o bastante contra Pearl.
Mesmo ela tendo uma armadura de bronze e sendo uma amazona negra, ambas as categorias que eram tão fracas para uma mulher tão ambiciosa, Pearl ainda havia treinado bastante para chegar ao posto de Ouro. Sendo assim, uma hora ou outra ela conseguiria alcançar a velocidade da luz.
A amazona de Ofíuco engoliu em seco ao constatar essa possibilidade. Ela estava acabada e não havia o que fazer.
Mas, então uma luz clareou suas memórias. Naquele mesmo dia, Shun e ela estavam observando o pôr-do-sol pela cerca da Vila das Amazonas e o Andrômeda a havia dito a coisa mais bonita que ela já pensou ter ouvido:
“-Shina, você é a mulher mais corajosa que eu já vi. Não por sua força ou pelo medo que põe nos outros, mas porque você nunca desiste quando quer derrotar alguém – disse o virginiano, bem inspirado – Mesmo depois de tanto tempo, você ainda persegue os seus inimigos até se cansar. Isso demonstra perseverança e é algo ainda mais poderoso que a força.
-Mas é a força que ganha as batalhas, Shun – tentou argumentar Shina.
-Força? Hyoga precisou de força para vencer o próprio amigo? Shiryu precisou de força para sobreviver ao Máscara, ao Shura ou à três espectros? Seiya precisou de força para vencer Thanatos? E mesmo o Ikki precisou de força para suportar Kanon ou até mesmo a mim na forma de Hades? A força vem da perseverança e é dela que as pessoas vencem.
-Ainda não entendo o que diz.
-Pode até não entender, mas é isso que você é, Shina. Perseverante. Você nunca desiste e é corajosa o suficiente para continuar tentando, prova disso foi o quanto você suportou do poder de Poseidon. Pode não ver, Shina, mas você é poderosa por causa da sua perseverança e o amor pelo que faz.”
Força pela perseverança. O amor que se tem pelo trabalho que faz. Seriam mesmo essas qualidades que faz um guerreiro poderoso? Essa dúvida pairou pela mente de Shina mas, por mais que o odiasse, sabia bem quem era a prova dessa pergunta.
Apesar de Seiya ter lhe partido o coração e ser uma pessoa irritante, ele era a prova concreta do que a perseverança e o amor eram capazes de fazer. Ele lutava por Seika, pelos amigos e por Saori para alcançar o bem da humanidade. E ela, Shina, poderia conseguir vencer sua mestra com essas simples coisas.
Porque o amor é a maior força da qual os seres humanos, sobretudo os leais guerreiros de Atena, possuíam. Ela venceria por amor ao seu trabalho de guerreira. E tudo isso graças à Shun.
Pearl estranhou que a discípula estava calada e se aproximou mais dela, querendo conferir se a tinha matado finalmente ou não. Quando lhe foi confirmado o contrário, um sorriso de desprezo tomou o canto dos seus lábios. Ela já cantava vitória antes da hora.
-Percebe agora, minha cara aprendiz? Você não possui ambição e por isso, não tem como me deter. Você não deveria nem ser considerada amazona por ser tão fraca e não pôr o mínimo de medo no seu adversário – disse Pearl, olhando enojada para a italiana – Que as amazonas te punam quando chegar no Submundo.
-Medo? Temor? Força? Acho que você não percebe os conceitos verdadeiros que fazem um verdadeiro guerreiro, Mestra Pearl – respondeu Shina, se levantando e de cabeça para cima – Os cavaleiros não precisam ser temidos para serem fortes, eles apenas lutam em nome de Atena e pelo amor à Terra.
-Ah, essa bobagem de lutar por Atena. Hunf! Essa estupidez me custou uma armadura só porque eu não atendia a essa lei idiota.
-Não é idiota, se chama altruísmo e servidão. Nós dedicamos nossas vidas ao mundo e à nossa deusa por amor e sem receber nada em troca, assim como fazem as pessoas comuns. Quantas pessoas dedicam sua vida por alguém ou por uma causa nobre sem esperar alguma coisa?
-São pessoas comuns e fracas como você.
-Não! São pessoas fortes também! Há tanta força numa mãe que protege seus filhos quanto num cavaleiro de Ouro. Todos encontram sua forma de proteger e batalhar pela nobreza do bem e do amor. Na verdade, esses são os verdadeiros guerreiros que temos que temer e não pessoas como você.
-Quanta audácia! Vai pagar por isso, Shina. METEÓROS DO CAVALO NEGRO!
Mas dessa vez, Shina não pensou em desviar ou defender. Ela atacou os Meteoros com toda a fúria que as Garras do Trovão podiam ter e no final, não sofreu nenhum arranhão.
Ao olhar tal cena, a amazona negra ficou espantada. Afinal, a aprendiz havia crescido e se mostrado uma mulher forte sem precisar ser temida como uma divindade. Ela era uma guerreira forte apenas por sua perseverança e pela dedicação que dava ao seu trabalho nobre.
-Mestra Pearl, antes eu costumava te admirar muito, mas, agora, vejo o quanto estava enganada. Você não merece admiração e nem ser temida - declarou a ariana, elevando seu cosmo.
-Não mereço ser temida?! - repetiu Pearl com ira.
-E é você quem é uma vergonha para as amazonas por querer ser respeitada e temida pela força e não dá sua vida por uma causa justa. Se ao menos lutasse pela justiça, assim como fizeram os dourados traidores, seus pecados poderiam ser mais fáceis de perdoar... mas nem para isso você quer ser temida. Apenas quer ser temida por seu próprio, um terrível Complexo de Deus!
-Mas você é a minha aprendiz, Shina e sendo assim, também pratica as mesmas coisas que eu. Quem é você para me julgar? Sua fraca! Vergonha! A sua perseverança e seu amor irão ser a sua ruína. Qual foi o idiota que lhe ensinou essas baboseiras? Shion? Atena?
-Shun de Andrômeda. Um honrado cavaleiro que me deu novas esperanças. Esse sim foi um grande e honrado mestre, ao contrário de você.
-Andrômeda hein? Me lembrarei dele assim que acabar com você... o sangue dele será derramado em seu nome, Shina. Ele pagará assim como você por ser tão estúpido!
-Você não ousará encostar um dedo no Shun! - ameaçou Shina, erguendo a mão em forma de garras.
-Primeiro, acabarei com você. Eis que será morta pelo meu golpe mais fatal, aprendiz! Ninguém conseguiu sobreviver a ele...
Shina então viu um cosmo negro envolver Pearl e uma aura de um cavalo negro com olhos de pérolas escuras se formou atrás da antiga mestra. Tudo pareceu ficar ainda mais escuro do que realmente era.
-NEGRITUDE PEROLADA!
A Cavalo Negro conjurou uma esfera de pérola negra e jogou na direção de Shina, que quando a acertou foi deixando seus olhos opacos. Quando Shina percebeu, já não via nada porque estava em suas próprias trevas. Estava cega.
Ao fundo, ela pôde ouvir Pearl rir alto comemorando sua vitória. Esse golpe era fatal porque se o inimigo não via nada, ele não saberia de onde os outros golpes de Pearl poderiam surgir e acabar com ele. Ela a mataria sem dúvida nenhuma, graças a esse golpe covarde.
-Eu venci! Não há mais nenhuma chance de me parar, Shina. Farei um túmulo para você com as minhas pérolas negras! METEÓROS DE CAVALO NEGRO! - berrou a guerreira de Pérola, repetindo seu ataque mais potente.
No entanto, antes que os meteoros chegassem em Shina, ela os desviou e ainda contra-atacou Pearl com potência máxima das Garras de Trovão. O golpe de Ofíuco foi tão forte que Pearl foi jogada na parede oposta e caiu de bruços no chão negro, com os cabelos claros espalhados pelo chão.
Ela olhava descrente para Shina. Como ela ainda conseguia contra-atacar mesmo estando cega? E pior: quando foi que um golpe simples como Garras de Trovão se tornou tão poderoso?
Como se adivinhasse os pensamentos incrédulos da mestra, a italiana sorriu e respondeu num tom até debochado:
-Sabe, Pearl, as máscaras podem ser incômodas para as amazonas e para nossas vidas mas, elas são bem úteis quanto ao fato de nos apurarem os sentidos. Os buracos dos olhos são tão pequenos que ficamos quase cegas! – riu Shina – A Negritude Perolada é uma brincadeira de cabra-cega perto de uma máscara.
-I-impossível! Isso nunca me aconteceu antes! - berrou a escorpiana, desesperada - E ainda porque...
-Logo o efeito do seu golpe passará. Eu sei bem, esse é um golpe que eu já vi você aplicar na mestra da Marin. Depois de uns cinco minutos, ela voltou a ver de novo. Impressionante como você acha que conseguiria matar alguém em menos de cinco minutos.
-Quer apostar que não, cobra-cega?
Pearl logo se levantou e tentou acertar um soco, mas, Shina pegou o pulso da adversária e a chutou fortemente. O chute fez a inimiga ser arremessada ainda mais para perto da parede e ela viu que não tinha por onde correr.
A amazona de Ofíuco levantou suas mãos em formas de garras e elevou seu cosmo às alturas, tanto que as mãos já disparavam cargas elétricas antecipadamente.
-Você me ensinou bem, Pearl, mas está na hora da aluna dar algumas lições para a mestra. Primeira lição: não me subestime! – Shina então deu um soco em Pearl – Segunda lição: não duvide da minha coragem e do meu amor pelo que faço – outro soco – E terceira lição...
-Shina, por favor! – implorou a escorpiana.
-... jamais ameace o Shun!
E num último soco, Pearl bateu com a cabeça na parede e caiu desacordada no chão da Sala de Pérola. Sangue começava a sair do ferimento e a amazona vitoriosa ficou cabisbaixa para demonstrar respeito pela sua inimiga que encerrou a vida.
“Aqui jaz Pearl de Cavalo Menor. Grande mestra, grande inimiga – pensou a italiana ao fazer o sinal da cruz na direção da falecida”.
-Agora tenho que achar algum deles. E se meus cálculos estiverem certos, a pessoa na sala ao lado é... – mas a amazona mal completou a sua frase porque um grito a interrompeu.
-SHINAAAAA!
“Shun! – respondeu-se internamente a esverdeada.”
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