— Alô?
— Eu não tô bem, cara...
— Ei, respira. Tá chorando?
— Eu fiz merda, Noah. Eu fiz muita merda...
— Eu vi.
— V-Você também me odeia? T-Também quer que eu morra...?
— Claro que não! Josh, não fala essas coisas. Você é meu melhor amigo, cara!
— Mas... Mas eu...
— Fica calmo. Se acalma. Onde você tá?
— No quarto...
— No seu?
— Sim...
— Tá sozinho?
— Meus pais saíram agora... Mano, todo mundo me odeia... Tudo por causa de... de uma fucking música idiota...
— Josh, respira, nem todo mundo te odeia. Tem gente que tá do seu lado.
— Por quê? Eu só fiz cagada... Eu sou um merda, Noah...
— Calma. Você não é um merda. Só não pensou direito.
— Eu nunca penso em nada direito...
— Não devia ter postado aquilo no Twitter.
— Eu sei, tá legal? Não aguento mais, Noah... Só fiz uma coisa, uma coisa muito idiota, e subiram uma hashtag pra eu morrer? Eu mereço... m-morrer?
— Não. Porra, óbvio que você não merece morrer, Josh. Calma, se acalma. Você ainda tá lendo o Twitter?
— Tô...
— Desativa agora.
— Mas...
— Agora. Só vai te deixar pior ficar lendo essas merdas.
— Ok... Pera aí... Pronto.
— Precisa parar de chorar. Respira fundo.
— Porra, eu tô tentando...
— Quer que eu te ligue por vídeo?
— Minha cara tá péssima...
— A minha também. Eu tava indo dormir, tô morto.
— Desculpa...
— Me atende.
— Pera. Oi...
— Oi. Caralho, sua cara tá péssima mesmo.
— Eu falei...
— Tá mais calmo?
— Um pouco...
— Vai dar tudo certo, cara.
— Eu sou um idiota, Noah...
— Você fez uma escolha idiota, só isso.
— Porra, eu não fiz nada demais! Foi só uma música...
— Não é pela música.
— Qual o problema, então? Foi tão grave assim?
— Foi. Você sabe disso, cara. Não é burro.
— Eu só quis postar aquilo. Eu nem gosto da porra da música, tava com raiva dela...
— Eu sei, eu sei.
— Ela foi muito escrota comigo, Noah... Ela... Ela... Porra!
— Calma, mano. Eu sei. A Any não devia ter feito o que fez, mas não justifica.
— Não justifica?! Puta merda, ela me traiu, Noah! Ela me traiu com um cara qualquer... Não ligou pros meus sentimentos, ela cagou pra mim...
— Não foi assim.
— Não?
— Não, ela pediu um tempo, Josh.
— Um tempo pra pensar! Não pra enfiar a língua na boca de outro!
— Vocês combinaram isso?
— Não, mas...
— Olha, a questão aqui não é essa. Você tá errado também. A música era machista pra caralho sim, você tem um bando de criança te seguindo e não podia ter feito isso.
— Eu tava magoado!
— Josh, somos famosos, não dá pra fazer o que passa pela cabeça! As coisas tem consequências muito maiores pra gente como nós.
— Eu sei, mas... Foi só uma cagada... Eu só... Eu não quero que ela me odeie... É minha melhor amiga...
— Ela não te odeia, mano.
— O-Odeia sim... Eu fui babaca... Você tá certo, ela podia fazer o que quisesse, não me devia satisfações... Mas eu só... Quando sugeri achei que ela gostasse mesmo de mim, que quisesse alguma coisa séria...
— Sim... Eu achava também.
— Porra, eu sou um idiota!
— Ei, se acalma. Olha, agora a merda já tá feita, não dá pra voltar no tempo, mas você precisa pedir desculpas.
— Pra ela?
— Pra todo mundo.
— Eu não consigo, Noah...
— Para de chorar. Fez a cagada agora conserta.
— Amanhã.
— Agora.
— Ninguém vai me perdoar...
— Eu te perdoo. É sério, quanto mais tempo enrolar, pior vai ficar a situação.
— Eu não consigo... Agora não...
— Que barulho é esse aí?
— Meus pais chegaram. A gente se fala amanhã. Obrigado por não me odiar.
— De nada. Fica bem. Qualquer coisa me liga de novo. Tô contigo, mano.
— Valeu.
*
Noah
Quatro horas da tarde, faz frio. Estou no sofá da sala quando o telefone toca.
— Noah?
— Ei, tudo bem?
— Não...
— Você tem que pedir desculpas, cara.
— E-Eu... Eu não...
— Josh?
— Eu...
— Cara, fica calmo. Aconteceu alguma coisa?
— Sim...
— Tá, respira um pouco pra conseguir falar.
— Ok... Ok. Eu ia pedir desculpas, mas aí... Eu entrei no Instagram e... Olha a mensagem que eu te mandei.
Tiro o celular do ouvido e entro no chat com Josh, vendo um print de tela.
"Como vc consegue ser uma pessoa tão nojenta? Eu gostava de vc, gostava muito, mas vc estragou td. É um bbk idiota sem coração. Acha q tem o direito de mandar aquela música p ela?! P qlqr uma?! Vc é um lixo humano. Não merece estar vivo. N merece porra nenhuma. Queima no inferno. Espero q morra."
— Josh... Caralho, que merda...
— Essa foi só uma. Eu tô recebendo milhares dê mensagens assim... Todo mundo quer que eu morra, Noah...
— Ei, ei, claro que não.
— Sim... Eu só... Eu devia morrer?
— Josh, por favor, não fala isso...
— É o que todo mundo quer...
— Para com isso. Não tem graça.
— Eu... Eu sou um lixo.
— Você não é um lixo, mano. É umas das melhores pessoas que eu conheço. Só fez besteira.
— É, mas... A Any me odeia... Ela me odeia muito, Noah...
— Não dá pra culpar ela, eu também ficaria puto contigo.
— Ela disse que eu... Que eu sou a pior pessoa do mundo...
— Ela só tá brava. Você precisa se acalmar, Josh.
— Eu... Eu... Não dá, tá voltando tudo...
— Josh, não deixa essa merda te afetar. Respira.
— Tá voltando tudo... Eu não... Eu não consigo...
— Cara, por favor, se acalma. Você tá sozinho?
— O Jaden... Tá no quarto dele...
— Ok. Vai até ele, fala que você não tá bem.
— Mas...
— Agora. Liga pros seus pais.
— Mas...
— Você não pode ficar sozinho! Eu não vou suportar se tentar fazer besteira que nem... Só fica com ele, ok? Eu vou praí.
— P-Pra cá? Eu tô no Canadá...
— Foda-se. Você precisa de um amigo. Vou fazer as malas, chego aí em algumas horas.
— Noah...
— Por favor, não faz besteira, ok?
— Cara...
— Por favor?
— Tudo bem...
Desligo o celular, preocupado. Josh pode ter feito a maior merda do mundo, o que nem é o caso, mas ainda é meu melhor amigo e não merece morrer por isso. Apesar de ele achar que sim... Não posso deixar que faça alguma idiotice, não como da última vez.
Arrumo as malas às pressas e corro para o aeroporto, avisando minha família de dentro do táxi.
Josh precisa de um amigo agora. Por que as pessoas tem que ser tão cruéis o tempo todo?
Ouço um som de mensagem vindo do meu celular:
J: Noah, n precisa vir p ca
Eu vou ficar bem
N: Já to indo
J: É sério, cara
N: Tô flnd sério
Tô no caminho
Nem tenta me convencer
Passa seu endereço dps
Quando finalmente chego no aeroporto, pago o motorista e sigo direto para a companhia aérea a qual já estou acostumado.
— Qual o próximo voo para Edmonton, Canadá?
*
— Você tá aqui.
— Tô aqui. Oi.
— Oi...
Abraço-o com força, a cara dele está terrível.
— Posso entrar? Tô congelando.
— Desculpa. Entra. — A casa de Josh não está muito diferente do que me lembro, apesar de já fazer um tempo desde a última vez que vim. — Meus pais saíram, voltam daqui a pouco. Jaden tá na casa de um amigo e o Jonah tá viajando. Pode botar suas coisas aqui. — Acompanho ele até o quarto vendo a parede de tijolos coloridos. Conheço bem ela de stories e chamadas de vídeo, mas pessoalmente vi poucas vezes. — Fez boa viagem?
— Sim, algumas horas só.
— Quase cinco.
— É.
— Não precisava ter vindo...
— Precisava sim. Você tá mal pra caralho.
— Devia estar com a Any...
— A Any tá bem, você não.
— Falou com ela?
— Falei. Ela tá brava e um pouco chateada, mas não tá ligando tanto assim. Só precisa de um tempo sem ver sua cara.
Josh baixa os olhos para o chão, está triste.
— Eu magoei ela.
— É, magoou.
— Eu magoei muita gente...
— Sim.
— Só queria botar pra fora...
— Eu sei.
— Sou um idiota... Ia ser melhor pra todo mundo se eu realmente estivesse morto...
Vejo uma lágrima escorrendo. Qualquer um diria para ele parar de ser dramático, mas sei muito bem as coisas pelas quais ele passou. Quebra meu coração vê-lo assim por um motivo tão ridículo. Puxo-o para um abraço apertado.
— Não fala essa merda nunca mais.
— É verdade.
— Não é.
— Ninguém ia sentir minha falta.
— Ia sim. Tem milhares de pessoas que te amam, Josh,
— Não mais, não depois do que eu fiz.
— Amam sim. E seus pais?
— Eles me deram um esporro...
— Eles te amam.
— Mas só dou trabalho, só faço eles sofrerem...
— Josh, para com isso. Seus pais têm muito orgulho de você.
— Eu sempre estrago tudo... Claro que ela não ia querer ficar comigo... Quem ia amar um cara estúpido como eu?
— Eu. Eu amo você.
— É diferente...
— Diferente como?
— Você é meu melhor amigo. Não me ama desse jeito.
— Amo sim.
— Não do jeito que eu tô falando...
Afasto-o um pouco encarando-o nos olhos, agora molhados.
— Exatamente desse jeito.
— O que...
— Tudo bem, eu sei que não é recíproco. Tô bem sendo só seu amigo.
— Eu... Não sabia.
— Claro que não. Escondo as coisas perfeitamente quando preciso. Desculpa falar isso agora...
— Não tem problema...
Josh parece um pouco desconfortável, não tanto.
— Eu realmente só quero ajudar. Odeio te ver assim.
Ele enxuga as gotas escorrendo pela bochecha. Quem não o conhece pessoalmente não faz ideia de como Josh chora à toa.
— Tudo bem. Obrigado por ter vindo...
— Você tá me deixando realmente preocupado com esse papo de morrer. Depois da última vez eu...
— Relaxa. Eu não vou me matar.
Essas palavras... Caralho, é um alívio ouvir isso.
— Como posso ter certeza?
— Você não vai deixar, né? Tá aqui agora. Vai me salvar de novo.
— Eu não vou estar sempre aqui, cara. Não é brincadeira. Tô preocupado de verdade.
— Desculpa... — Ele senta na cama, encostando nos tijolos coloridos. Está todo encolhido no próprio moletom. — É só que... Ler que eu devia o dia inteiro tá fodendo com a minha cabeça... Eu não tô conseguindo lidar...
Suspiro e subo na cama também, sentando em frente a ele.
— Talvez seja melhor você se desconectar por uns dias.
— Mas você disse...
— Eu sei, mas sua saúde é mais importante. Depois que estiver bem pensa nisso.
Ele afirma, apertando com força os próprios joelhos.
— Eu não queria ser assim... Faço tudo por impulso...
— Tá tudo bem, não foi por mal.
— Eu não queria sentir as coisas desse jeito...
— Você tá tomando seu remédio?
— Parei faz uns meses...
— Josh!
— Eu tava melhor.
— Foda-se, não era pra ter parado sem ordens médicas. Tá indo no psicólogo pelo menos?
— Depois da última turnê eu desisti...
— Porra, não pode fazer isso!
— Desculpa... D-Desculpa...
Ele volta a chorar, fazendo eu me sentir culpado. Abraço ele outra vez.
— É pro seu próprio bem, cara.
A porta abre ao nosso lado e a mãe dele aparece.
— Noah?
— Oi, Úrsula.
— Oi, meu bem. Não sabia que estava vindo pra cá...
— Foi meio de última hora.
Ela entende minha cara bem rápido ao ver Josh chorando nos meus braços.
— Filho... — Aproxima-se de nós dois, sentando na cama também. — Trouxemos seu remédio. Você precisa tomar.
Solto ele devagar.
— Ei, é o melhor pra você agora, ok? Vou pegar uma água.
— Vou com você, querido.
Úrsula dá um beijo na testa dele e se levanta junto comigo, caminhando para fora do quarto e fechando a porta atrás de nós. Quando já estamos na cozinha ela resolve finalmente falar alguma coisa:
— Graças a deus está aqui, meu bem.
— Senti que devia vir. Tô muito preocupado. Ele não fez nada idiota, fez?
— Não, mas também estou aflita, Josh não para de falar coisas ruins.
— Tô com medo de ele se machucar... Fisicamente.
Não consigo encará-la, ela com certeza entende.
— Eu sei, meu amor. Eu também.
— Não ia aguentar, não depois da última vez... Prometeu que não ia fazer de novo, mas não dá pra saber.
— Ele vai voltar pro psicólogo amanhã, querendo ou não.
— Desculpa aparecer do nada, sei que deve estar tudo confuso.
— Imagina, não sabe o quanto estou feliz por ter vindo. É o único amigo dele que apareceu.
— O único?
— Sim...
— Caralho. Alguém ligou, pelo menos?
— A Sabina falou comigo ontem. Também estava angustiada com tudo. Queria vir pra cá, mas não deixei. Ela tinha muitos compromissos.
— Pelo menos isso. O pessoal não tá se falando muito... O clima pesou um pouco, a Any até saiu do nosso grupo de mensagens. Tiveram uma discussão lá que acabou não levando a nada, agora tá todo mundo quieto.
— Compreendo. Fico feliz que esteja aqui com ele.
— Eu também. Onde ficam os copos mesmo?
Úrsula me entrega um copo de vidro com água e tira da bolsa uma caixinha de remédio com tarja preta. Destaca um dos comprimidos e entrega na minha mão.
— Obrigada por fazer isso, Noah.
— É o mínimo.
— É muito mais, querido.
Ela sorri sem muita força e saio caminhando na direção do quarto. Quando entro vejo Josh está deitado e chorando muito.
— Josh? Josh, tá tudo bem?! — Solto o remédio e a água em cima da cômoda e corro até ele.
— Eu tô bem...
Vejo o celular em suas mãos e adivinho que deva ser outra mensagem odiosa.
— Por favor, para de ler isso.
— Eu... Eu mereço... M-Morrer... Eu...
— Para de falar essa merda agora! — Abraço ele com o máximo de força possível. Estou chorando também. — Por favor... Por favor não fala isso...
Ele apenas chora mais, tremendo. Como uma coisa tão pequena deixou ele assim? Josh não está bem, não devia ter parado de se medicar.
Solto-o pegando o comprimido e o copo.
— Toma.
Ele engole ainda chorando.
— Desculpa...
— Para de se desculpar.
— Desculpa...
— Amanhã vamos no médico, ok? Você não tá bem, Josh. Disse que tava, mas não tá.
— Eu achei...
— Não dá pra arriscar. Não depois do que aconteceu.
— Me perdoa...
— Eu te perdoo. Mas tô preocupado. Não posso perder você...
— P-Por que você me ama?
— É, porque eu te amo muito.
— D-Desculpa não... N-Não te amar do mesmo jeito...
— Se acalma. Tá tudo bem.
— Eu só magoo todo mundo...
— Não, Josh.
— Eu só devia morrer...
Mais lágrimas, mais dor, mais desespero. Ele não está brincando.
— Para com isso, Joshua.
— Eu devia ter morrido aquele dia...
Puta que pariu. Deito ao lado dele, abraçando-o. Não sei mais o que fazer.
— E me deixado sozinho?
— Você ia estar melhor sem mim...
— Óbvio que não. Minha vida ia ser uma merda sem você.
— E-Eu sou um idiota...
— Não é. Fica calmo. Para de falar um pouco, precisa se acalmar.
Josh se encolhe mais nos meus braços e o choro vai ficando alto, quase um pranto. Em algum momento os pais dele abrem a porta, mas acabam desistindo de entrar, também não sabem o que fazer.
Fico abraçado a ele até pegar no sono.
Quando está completamente adormecido levanto com muita delicadeza da cama para não acordá-lo.
Cubro o corpo gelado, essa e a época mais fria do ano no Canadá, e saio do quarto. Úrsula e Ron me esperam na sala.
— Você está bem?
Afirmo devagar.
— Só tô cansado.
— Imagino, a viagem deve ter sido longa. Quanto tempo, Noah.
Cumprimento o pai dele e sento ao seu lado no sofá. Já passa da meia noite.
— Amanhã vamos levar ele no médico.
— Não devíamos tê-lo deixado parar de tomar o remédio.
— Eu só quero que ele fique bem...
— Nós também, querido. — Úrsula levanta do sofá. — Achei melhor Jaden dormir fora hoje, está na casa de um colega da escola. Vou pegar uma toalha para você. Sabe onde fica o colchão?
— Eu lembro. E a roupa de cama é no armário do corredor, né?
— Isso. Eu vou me retirar também, foi um dia longo. — Ron espreguiça-se antes de ficar de pé. — Obrigado por ter vindo, Noah. Boa noite.
— Boa noite.
Continuo sentado até a mulher trazer a toalha e se despedir para ir deitar.
O telefone toca.
— Alô?
— Noah?
— E aí, Sabi?
— Te acordei?
— Não, já tava acordado.
— Que bom. Precisamos conversar sobre o Josh. Tô muito preocupada...
— Eu também.
— Conversei com a mãe dele ontem. Ele anda falando sobre se matar, Noah...
— É, eu sei...
— Queria ir vê-lo, mas tenho tanta coisa pra resolver, ela não deixou, falou que eu ia me prejudicar muito. Tô pensando em ir assim mesmo, ele tá lá sozinho...
— Relaxa, ele não tá sozinho.
— Eu quis dizer só com a família, sem nenhum amigo.
— Não precisa se preocupar, eu tô aqui com ele.
— Jura? Você tá no Canadá?
— Sim. Cheguei hoje.
— Ai, que bom. É um alívio. Tô preocupada de verdade com ele, nunca vi Josh falar coisas assim.
— Eu já...
— Já?
— Sabina, essa não é a primeira vez que o Josh fica mal desse jeito. — Respiro fundo, lembrando com dor de tudo. — Ele já tentou se matar duas vezes.
— Dios Mio... Tá brincando! Quando?!
— A primeira não o conhecíamos ainda, mas ele teve uma fase muito ruim ano passado antes de uma das turnês. Lembra?
— Eu lembro de estar um pouco desanimado em alguns dias, mas não pensei que fosse nada grave...
— Pois é, eu também não. Até chegar no nosso quarto um dia encontrar ele engolindo 17 comprimidos diferentes...
— Caramba... O que você fez???
— Fiz ele vomitar tudo. A sorte foi eu ter chegado bem na hora. Levei ele pro hospital depois, mas como ele botou pra fora muito rápido não chegou a dar nenhum problema sério.
— Meu deus, Noah... Você salvou a vida dele.
— Sim.
— Como não soubemos disso?
— Ele implorou pra eu não contar. Só falei com os pais dele e levei ele no médico no dia seguinte. Começou a tomar remédio e a frequentar um psicólogo, aí ele realmente melhorou por um tempo.
— Por um tempo?
— É. Achei que ainda tava se medicando, mas ele parou faz uns meses. Essa merda toda da música foi um gatilho, tanta gente falando pra ele morrer... Ele surtou, Sabi. Tá numa crise fodida.
— Ele tentou se machucar?
— Não. Mas não dá pra saber se vai. Os pais dele tão desesperados também. Voltou a tomar o remédio hoje.
— Sim... Que loucura, não acredito que não sabia disso...
— Não é culpa sua, nem a Any sabia. Ele tem muito vergonha disso.
— Você falou com ela?
— Falei mais cedo.
— Tá putassa com ele.
— Não é pra menos, ele foi um babaca.
— Foi mesmo, mas acho que não teve a intenção.
— Óbvio, a gente conhece o Josh muito bem pra saber que ele jamais faria algo assim pra machucar ninguém.
— Esses haters tão me estressando tanto...
— É porque você não viu o que ele tem recebido no privado... É pesado demais...
— Se com a Joalin já foi péssimo, imagino com com ele.
— Não faz nem ideia...
— Pelo menos você tá aí. Josh tá do seu lado?
— Tá dormindo. Chorou até dormir.
— Cuida dele, ok? E por favor me mantém informada.
— Pode deixar. Só não fala isso pra ninguém. Tô contando porque sei como são próximos e como tava preocupada.
— Pode deixar. Obrigada por falar. Dorme bem, Noah.
— Você também. Beijos.
— Beijos!
Ela desliga e o silêncio preenche a sala. As lembranças voltam. Josh sentado no chão do banheiro do hotel com milhares de caixas de remédio, três de tarja preta, chorando muito. Nunca senti tanto desespero na vida. Agradeci muito por ser mais forte que ele naquele tarde. Josh não conseguiu resistir o suficiente para me impedir de enfiar o dedo na sua garganta e fazê-lo vomitar três vezes seguidas. Eu precisava garantir.
A primeira tentativa foi pior ainda pelo que seus pais contaram, ele chegou bem mais perto da morte, perdeu muito sangue... Pensar nisso dói e só me faz querer chorar mais.
Pego a toalha no braço do sofá e ando até o banheiro.
A água quente é boa, acolhedora. O Canadá é tão frio o tempo todo. Agora no inverno é pior. Sou um garoto da Califórnia, não estou acostumado com isso.
Entro no quarto silenciosamente usando a lanterna do celular para tentar enxergar o colchão debaixo da cama de Josh. Ele ainda dorme:
Finalmente consigo e saio para pegar a roupa de cama no corredor. Volto botando tudo em cima da cama.
— Noah?
— Desculpa, te acordei?
— Relaxa. Quer ajuda?
— Já consegui.
— Como eu dormi?
— Chorando.
— Ah...
— Tá tudo bem?
— Sim... Desculpa.
— Não precisa se desculpar por nada.
— Pode deitar comigo?
— Posso, deixa só eu escovar os dentes.
— Eu vou também.
Ele se levanta pegando um pijama no armário e indo até um dos banheiros. Sigo para o outro com minha escova. Em poucos minutos estamos os dois de volta no quarto escuro.
— Vem.
Deito com ele na cama de solteiro.
— Você vai ficar bem.
— É...
— Vou cuidar de você.
— Não precisa.
— Precisa sim.
— Noah?
— Hm?
— Tava falando sério sobre me amar?
— Aham.
— Desde quando se sente assim?
— Sei lá, faz um tempo.
— E a Sina?
— Ela não quis nada comigo. Somos só amigos.
— Desculpa não ter percebido.
— Ia te assustar.
— Você não me assusta. — Estamos cara a cara. — Gosta de mim de verdade?
— Gosto.
— Quer me beijar?
— Josh, para.
— Eu não tô brincando,
— Eu sei, por isso mesmo devia parar.
— Você não quer?
— Quero muito, mas agora não é um bom momento...
— Por quê?
— Porque tá vulnerável. Não quero me aproveitar de você.
— Eu que sugeri.
— Você tá doente.
— Eu sei o que eu quero.
— Disse que queria se matar. Nitidamente não sabe.
Ele desvia os olhos, a expressão sofrida.
— Eu só queria beijar alguém que gostasse de mim...
— Josh, para com isso.
— Por quê? É tão ruim assim querer saber como é?
— Já beijou alguém que gostava de você antes.
— Não um garoto.
— Josh, não.
— Por favor? O que preciso fazer pra te convencer? — Ele chega mais perto. — Só um beijo. Ou você quer mais?
— Josh...
— Quer transar comigo?
— Cala a boca.
— Se eu fizer isso você me beija? — Josh desce a mão me apalpando. Puxo seu braço, assustado.
— Para, mano!
— Eu só quero saber como é.
— Eu não sou a porra de um experimento, ok?!
Ele se encolhe.
— Desculpa... Desculpa, tô fazendo de novo... Eu tô magoando você... Desculpa.
— Não pode fazer o que quiser, as pessoas têm sentimentos.
— Eu sei. Eu sei... Não quero te tratar como um experimento, não é isso. Desculpa. Eu não tô pensando direito.
— Tô vendo.
— Eu realmente quero te beijar.
— Por quê?
— Não sei...
— Isso não faz o menor sentido, Josh. Nem gosta de mim.
— Não, mas você faz eu me sentir seguro.
— Porque sou seu melhor amigo.
— Porque você me ama.
— Josh, cala a boca. Agora não é uma boa hora pra pensar nisso. Eu não devia ter falado nada...
— Devia sim. Foi a melhor notícia que eu tive em três dias.
— Josh...
— Por favor, deixa eu te beijar? Eu preciso me sentir bem.
— E eu?
— Só se você quiser. Não quero machucar mais ninguém.
— Nem você mesmo?
— Noah...
— Me promete que não vai fazer nada. Que não vai tentar se machucar.
— Eu...
— Se você prometer eu te beijo. Não posso me apaixonar mais e te perder no dia seguinte. Não vou suportar.
— Eu prometo.
Abraço ele com força. Nem sei mais o que está acontecendo.
— Tem certeza que quer me beijar, Josh? Não precisa fazer isso por mim, eu tô realmente bem sendo só seu amigo.
— Não é só por você.
— Promete?
— Prometo.
— Ok.
Encaro as íris azuis, mal consigo enxergá-lo no escuro. Vejo-o fechar os olhos e faço o mesmo. Lentamente nossas bocas se juntam num beijo delicado, quase um selinho. Não tenho coragem de usar a língua, mas ele tem e acha a minha dentro da boca. Se tocam por menos de três segundos antes de nos separamos.
— Obrigado, Noah.
— Por quê?
— Por mostrar que o amor ainda existe, mesmo que meu coração esteja quebrado, mesmo que eu todo esteja quebrado.
— Tô aqui pra te ajudar. Se você quiser.
— Acha que consegue me ajudar a me apaixonar de novo?
Solto um risinho, nem parece de verdade.
— Posso tentar.
Josh me abraça com força.
— Obrigado por salvar minha vida, Noah.
— Obrigado você por salvar a minha.
Muitos usuários deixam de postar por falta de comentários, estimule o trabalho deles, deixando um comentário.
Para comentar e incentivar o autor, Cadastre-se ou Acesse sua Conta.