Taehyung
Capítulo 19
Fui informado que haveria uma reunião de rotina com os fornecedores de produtos esportivos do clube. Logo começaria a temporada competitiva, apesar do golfe ser a prioridade do clube Persona, o torneio anual inclui diversas categorias. Portanto, um novo carregamento deveria ser planejado, e com isso se seguiria tantos outros fatores que só aconteceriam por meio da minha supervisão. Apesar de poder designar esta tarefa facilmente a Jennie ou Namjoon, preferia eu mesmo estar por dentro de todos os detalhes.
— Estamos com um novo equipamento sustentável e sofisticado já que o anterior parece um pouco ultrapassado para a nova proposta. Os novos sócios são pessoas que admiram a tecnologia, e as mudanças atuais que o novo mundo pode trazer. Então, queremos proporcionar uma experiência única, demonstrando também a evolução e o cuidado no esporte dentro do clube Persona. — Disse Max, decidido a mudar a tradição. Diretor de uma das maiores fornecedoras nesta área da cidade.
Vi Jennie ficar empolgada demais com a proposta.
— Nos últimos anos o clube manteve uma tradição privada e muito limitada, se levarmos em conta onde poderíamos chegar se não apenas os sócios participassem, mas suas esposas, filhos, amigos, sem determinar um padrão…
— Isso viraria um circo. — Jimin a cortou severamente. — O Persona não é o que é por ser acessível, e sim, por estar em um patamar privilegiado.
— O campeonato começará somente no mês que vem, temos tempo para analisar e testar o que for preciso dentro de duas semanas. Podemos averiguar se realmente seria uma mudança brusca usando os próprios membros do clube como avalistas. — Sugeri.
Jimin não diz nada, mesmo que eu seja o vice-presidente, a última palavra depende dele. A reunião não foi tão longa, mas seria ainda mais produtiva se Jimin tivesse prestado atenção em pontos importantes, sua mente estava longe desta sala, assim como tem acontecido há algum tempo. Quando enfim encerramos, Jennie acompanhou os colaboradores até a porta e se despediu cordialmente por nós. Aproveitaria esse tempo para colocar a cabeça de Jimin no lugar.
Entretanto, me enganei quando pensei que ficaríamos a sós. Jennie deixou sua máscara cair e revelou a raiva que reprimiu.
— Jimin o que está acontecendo com você? — Ela perguntou sem rodeios.
— Comigo? Nada está acontecendo, por quê?
A resposta não a deixou satisfeita, ela passou a andar de um lado ao outro. Ultimamente seu humor estava uma merda, principalmente quando se trata de Jimin. E quando ele deixou de se importar, consequentemente isso começou a interferir no trabalho também. Normalmente não dura muito tempo, mas agora, é claro o motivo que ele não queira resolver as coisas da mesma forma, ir pra cama com ela não é mais uma opção. O encanto acabou e agora seu foco era outro.
— Sério? — Ela bateu as duas mãos na mesa e gritou — Então, é melhor que você tenha toda sua atenção aqui na próxima reunião!
— Eu tenho tudo sob controle.
Controle? Jimin nunca teve controle algum, sempre agiu por impulso, e gradualmente precisou lidar com as consequências. Argumentos não me faltavam para mostrar o contrário. No entanto, achei mais interessante ouvir e observar o desenrolar.
— Não é o que vejo. Essa não é a primeira reunião que você fica perdido no mundo da lua. O que é, ein? Será a culpa que está deixando sua cabecinha pesada demais no travesseiro?
Ambos trocaram olhares que dizia muito mais do que suas palavras. Jimin se levantou e ficou em pé igualmente a ela. Eu não costumo me importar com o que fazem juntos, desde que não torne o problema deles o meu, e era exatamente o que estava acontecendo. O rumo que essa discussão estava tomando, com certeza traria consequências grandes.
— Não é da sua conta. Se preocupe com o seu trabalho. — Ele esbravejou, provavelmente afetado.
Jimin estava prestes a deixar a sala, mas Jennie, ainda tinha muito a dizer, e não se sentiu intimidada.
— Você está sendo egoísta!
— Eu sei! — Jimin respondeu com pesar.
Jennie não entendia que Jimin não era o mesmo desde que tudo aconteceu. Na verdade, nenhum de nós era, mas somente ele estava encarando isso de frente, à sua maneira.
— Será que ela sabe quem você era naquela época? Você só tinha um objetivo Jimin, herdar o clube Persona. O resto não era nada diante dos seus olhos, exatamente como é agora. — Ela o lembrou. O silêncio foi a resposta dele. Jennie viu como uma oportunidade para continuar destilando seu veneno da verdade. Ela só estaria satisfeita quando visse nos olhos dele a mesma dor que ela guarda — Você sabia que a garota ingênua tinha se apaixonado por você, todos sabiam! — Jennie olhou para mim, encarei seu olhar na mesma intensidade.
— Eu não posso mudar o passado, sei disso. — Seu sussurro doloroso não mudava.
— Tudo que está fazendo agora não é ainda pior do que antes? Você a jogou para a morte. Contou isso a Naomi? É claro que não, se não ela estaria a quilômetros de distância de você agora. É essa realidade que você tem que ver.
Realidade ou não, Jimin se calou consciente das palavras que atingiram seu ponto fraco. Estava acontecendo outra vez, ele pensava tanto sobre isso, que muitas vezes achei que iria enlouquecer. Falar sobre o assunto era um problema, já que nunca aceitou ajuda de ninguém, ele guardava tudo dentro de si e ninguém sabia o que estava pensando.
— A discussão de vocês não poderia ser menos tediosa? Já estou com dor de cabeça. — Fiz presente minha voz.
— Eu nem percebi que estava aí, você fica preso no seu próprio mundinho, nunca diz nada.
— Não tenho uma opinião, Jennie, porque eu não me importo. — Disse à ela. A ira tomou seus olhos.
Eu não ligava se Jennie estava frustrada por não ser mais correspondida, se ela odiava o mundo e sentiria mais alívio jogando parcela do seu ódio pra fora.
— Você vai defender ele como sempre. Claro, são farinhas do mesmo saco. — Ela riu, amarga.
— Já não se lamentou o suficiente? Você está frustrada, quer um pedido de desculpas pelo tempo que perdeu apaixonada por ele, mas não quer dizer isso claramente, porque seria como expor sua fraqueza. — Ela arregalou os olhos com a minha afirmação — Mas está seguindo o caminho errado. Na verdade, os dois estão. Ao menos conseguem se ouvir? Aceitem que não estão prontos para ter essa conversa.
Era cansativo se meter em problemas alheios. Ambos não são maduros o suficiente para esclarecer suas desavenças agora, estão apenas jogando a bola da culpa um para o outro, como uma mesa de ping pong.
Esperar que ouvissem o que digo era ainda mais difícil do que uma partida decisiva no golf. Sinto que envelheci alguns anos em poucos minutos com a divergência deles. Eu estava pronto para colocá—los para fora da minha sala e deixar que traven essa guerra em outro lugar. Mas Jennie ainda não havia dito tudo que queria.
— O que você sabe sobre isso, Taehyung? Nunca amou ninguém. Você fala como se fosse banal. E o seu amigo é um babaca filho da puta que brinca com os sentimentos dos outros. Bela dupla vocês são. — Disse cheia de rancor.
— Você tem razão. — Disse Jimin. A expectativa preencheu os olhos de Jennie. Isso não me admirava. Ele só estava cheio dessa conversa, e esta era a única maneira de dar um fim. — Me desculpa. Eu não posso mudar a porra do que já aconteceu entre nós, nem mesmo com os erros que cometi, mas o que posso fazer agora, estou tentando.
— Não, você só está fazendo o que lhe convém, porque é covarde demais.
A sala foi sugada pelo silêncio ensurdecedor. Jimin havia perdido o foco. Eu não duvidava que agora estivesse revivendo o acidente fatídico na sua cabeça, sua expressão era clara. As palavras de Jennie o atingiram profundamente. Em todo caso, somente eles poderiam fazer isso, compreender os erros e aceitar as soluções.
Assim que Jennie saiu, caminhei até o fundo da sala para pegar uma bebida no frigobar. Ofereci um copo a Jimin, que bebeu sedento e praticamente cuspiu em seguida.
— Isso é whisky? Eu quero outra bebida.
— Aqui não é um bar, se quer outra coisa, tira sua bunda do meu estofado e vá pegar.
Ouvi seus resmungos durante um tempo, mas em algum momento relaxei com o sabor da bebida e não me atentei a mais nada. Jimin deve ter percebido logo, porque quando abri os olhos, minha sala estava vazia.
O amor só tinha uma utilidade; foder a vida dos tolos.
°°°
Na manhã de sábado sai um pouco mais cedo de casa, peguei minha bolsa com os tacos e joguei no banco do passageiro. Antes de chegar ao clube, tomaria café da manhã com a minha mãe, era um ritual que ela criou para me ter por perto e não sentir tanto a ausência do meu pai. Mesmo que ele fosse um filho da puta que não parava com mulher nenhuma, infelizmente ela o amava, eu não poderia ir contra isso.
Eu não gosto de estar naquela casa, já havia dito para que se mudasse, mas era apenas mais um motivo para discussões. Minha mãe ainda achava que meu pai um dia voltaria a ser o mesmo, que ele só estava perdido na confusão dos seus problemas internos, e logo passaria. Sua esperança era uma infelizmente ilusão, os efeitos colaterais, talvez, fossem irreparáveis. Somente ela poderia decidir a hora de despertar para a realidade.
Estacionei meu carro no meio fio, acionei o alarme, e antes mesmo que eu chegasse a porta minha mãe saiu para me receber. Seu rosto cada vez mais pálido era marcado por bolsas escuras abaixo dos olhos, olhos castanhos sem vida, tal qual como um abismo. Seu cabelo não era mais um tom escuro brilhante. A mulher alegre e mais linda que já vi em toda minha vida, estava sendo consumida pelo maldito amor. E eu sou obrigado a assistir de mãos atadas.
— Você está aqui. Venha antes que seu chá esfrie. — Ela veio para fora segurar minha mão e me levar para dentro.
Conduzindo o caminho para a ala externa da casa, a grande copa tinha uma mesa pequena com tudo que minha mãe havia preparado. Ela me serviu com um sorriso genuíno. Meus olhos se mantiveram no seu rosto o tempo todo.
— Quando foi a última vez que tomou sol? — perguntei.
— Ontem. O clima estava ótimo às dez.
Sua resposta foi rápida e positiva, específica além do necessário. Tudo soava como um texto pronto. Eu odiava quando poderia perceber os sinais de mentira tão facilmente.
Havia dias que estava ótima, logo passava semanas trancada dentro do quarto. Hoje é um dos dias bons.
Logo após se servir ela sentou na cadeira do outro lado. Bebeu apenas chá, e ficou observando enquanto eu comia. O silêncio não era ruim, sempre aproveitamos a presença um do outro. Porém, essa rotina tornou-se monótona. Talvez houvesse algum assunto.
— Não vai comer? Suas veias estão aparecendo de tão magra que está — Ela abaixou os braços para esconder o que eu já havia visto.
— Isso não é nada. — Sua risada fraca não chegou em seus olhos — Estou sem fome hoje.
Não é só hoje. A afirmação preencheu minha boca, mas não disse.
— Eu preciso ir para o clube hoje, não vou poder ficar por muito tempo.
— Vai trabalhar no final de semana? — A decepção em sua voz não me deixou feliz.
— Vou treinar. Quer ir assistir?
— Eu vou na próxima vez. Tenho que arrumar a casa, fazer compras. Dia cheio.
Outra mentira. Eu sabia que ela só não queria sair de casa. O mundo lá fora, para minha mãe, se tornou desconfortável de uma maneira que eu não entendia. Com o tempo aprendi que forçá-la não era uma boa alternativa, e deixar que se afunde era ainda pior.
— Tudo bem.
Recolhi as xícaras da mesa e levei para lavadora embaixo da pia. Minha mãe veio a seguir colocando mais alguns talheres, então encostou ao lado do balcão após ligar.
— Está começando isso por vontade própria, ou tem um motivo? — O tom questionador e a desconfiança no olhar revelou a preocupação que sentia.
Minha resposta despertou o seu interesse, eu sabia exatamente porque. Há alguns anos costumava pensar que seria como meu pai no golfe. Mas então, um dia ele simplesmente foi embora. Sua atitude não fazia sentido algum. Eu tinha 5 anos, e nunca presenciei nenhuma discussão entre meus pais. Alguns meses depois ele voltou para casa, minha mãe o deixou ficar. Ela voltou a sorrir, era o que importava. Os motivos dele eram desconhecidos, até me tornar adolescente e procurar por respostas.
Meu pai havia se apaixonado por outra mulher e quando tudo acabou ele voltou para casa, como se nada tivesse acontecido. Nada era mais como antes. O golfe era tudo o que eu tinha, e o filho da puta levou isso também.
— Alguém me motivou. — Contei a ela, que claramente me olhou surpresa — O campeonato está chegando e eu preciso de um parceiro.
— Você vai competir? — Sua voz ganhou volume. A cada nova revelação minha mãe reagia como se fosse algo realmente grande. Um exagero seu. Embora o sorriso estivesse lá, surgindo aos poucos — Meu filho, Jimin sempre foi seu parceiro, o que houve?
— Quero explorar novos horizontes.
Eu poderia ter elaborado melhor a resposta, mas acabei dizendo a primeira frase que veio à mente.
— Se você está feliz com a sua escolha, eu também estou. Seja compreensivo e paciente com ela. — Disse, em seguida beijou minha bochecha.
Sem ao menos mencionar quem era, minha mãe sabia. Não sei como chegou àquela conclusão, mas era claro de onde eu havia herdado a mania de ler as pessoas tão facilmente.
°°°
O campo estava praticamente vazio a essa hora, somente treinadores transitavam a procura do que fazer para matar o tempo, e alguns se ofereceram para me auxiliar, apesar de suas técnicas serem boas, era um incômodo ter um deles palpitando sobre meus métodos. Dispensei ajuda antes de ver Naomi se aproximar.
— Se perdeu no caminho? Está atrasada — Acusei, ela balançou a cabeça, antes de responder.
— O ônibus demorou, não eu. — Disse ela.
— Você não tem um carro. — Afirmei.
Naomi levantou uma das sobrancelhas, colocou as mãos na cintura e pendeu a cabeça para o lado.
— Que perspicaz, você notou só agora que não tenho um carro? — Ela respondeu cheia de sarcasmo, e então a seriedade tomou seu semblante, repentinamente — Eu tenho uma pergunta pra você.
Acenei com a cabeça para que continuasse, enquanto retirava da bolsa os tacos que usaria. Ela não perguntou imediatamente, estava ponderando, o que acabou despertando meu interesse.
— O que quer saber?
— Jimin… me contou que ele e eu já nos conhecemos antes mesmo do meu acidente. — Disse ela. Seu olhar voltou para mim com curiosidade procurando algo que provavelmente não encontrou na minha expressão — Acredito que você já saiba disso, não é? Você não está surpreso. Por que nunca disse nada?
Eu não tinha ideia até onde Jimin se limitou a contar, mas acompanharia o ritmo dela e veria até onde sabe, ou está disposta a descobrir.
— Eu não estava aqui quando essa fatalidade aconteceu com você, então não posso sanar suas dúvidas. — Respondi simplesmente.
— É engraçado pra vocês que eu não saiba nada sobre o passado enquanto brincam comigo? — Por fora ela parecia tranquila, mas seu tom de voz era cheio de raiva. Naomi estava se segurando. E eu a entendo, mas não posso resolver todos os seus problemas.
— Naomi o único que lhe deve a tal verdade é o Jimin. Eu nem mesmo queria você aqui, não temos e nunca tivemos vínculo algum. — Disse.
— Você não me queria aqui porque já sabia que um dia isso iria acontecer. Foi um cúmplice. Não acha isso cruel?
Balancei os ombros.
— Do que importa saber sobre o passado? O que isso muda? Saber coisas que não sabia, não vai mudar o que acontece agora. O que você é, o que quer fazer, o que quer ser, o que quer sentir, implica em fazer uma escolha. Viver no passado ou aproveitar o que o futuro tem pra você. — Naomi franziu o cenho claramente incomodada.
— Você não entende mesmo. Eu não te culpo por isso. — Ela balançou a cabeça, como se compreendesse algo. Embora eu não tenha ideia do que esteja falando.
— Se te faz sentir melhor, agora somos muito mais próximos do que jamais pudemos ser no passado. — Disse a verdade, como se pudesse redimir algo que nem eu sabia.
— Eu nem sei se o que diz faz sentido mesmo. Parece que a minha única opção é aceitar. — Ela cruzou os braços e mexeu o nariz, inflando as bochechas antes de soltar o ar.
— A guerra é longa, a luta é fria, mas a vitória é visceral. Sabe o que quer dizer? — Recitei o ditado que caberia ao momento, assim como coube a mim quando foi propício.
— Não faço a menor ideia. — Respondeu balançando a cabeça em negatividade.
— Significa que deve buscar o que deseja. Se não tem memórias, procure meios para recuperar o que perdeu. — Ela levantou uma das sobrancelhas.
— Você fala como se fosse um velho sábio. Mas eu entendo o que quer dizer. — Não consegui evitar rir brevemente da sua sinceridade.
— Egoísta, idiota, agora velho sábio… Não se cansa de criar adjetivos tão bons? — Disse, facilmente culpado.
— Me desculpa. — Ela mordeu o lábio inferior, evitando um sorriso.
Eu sabia que não estava sendo sincera, embora tenha a feito rir. A mudança de assunto não foi brusca, lentamente ela me acompanhou. Peguei uma das bolas e joguei em sua direção, ela se assustou, mas conseguiu segurar..
Era engraçado como era fácil de ler seus pensamentos apenas olhando sua expressão. Pelo menos isso nunca mudou. No passado nunca fomos próximos. Via como uma garota sem personalidade, pois vivia seguindo os outros, não era como se sua presença fizesse diferença. Era por isso que sempre foi um alvo fácil. O acidente não só levou suas memórias, mas a garota vulnerável deixou de existir.
— Acha mesmo que posso fazer isso? — Perguntou, incerta, olhando para a bolinha branca em suas mãos.
— Pare de fazer perguntas óbvias. — Quando achei que entraria em uma briga sem fim para convencê-la, seu único dilema é se estou certo da minha afirmação — Tudo bem, ex-garota do carrinho, antes de começarmos vamos melhorar seu condicionamento físico. Quem sabe da próxima vez você não use suas pernas curtas para chegar na hora.
— Ei, minhas pernas não são curtas, você é que é comprido demais. O que eu tenho que fazer?
— Correr.
— O que? Está me punindo por que me atrasei cinco minutos? — Ela colocou suas mãos na cintura, indignada.
— Interprete como quiser. Agora corra, vá até o buraco, toque na bandeira e volte, só pare quando eu disser. — Expliquei propositalmente em tom de ordem.
— Você vai correr também? — Ela olhou para o cronômetro na minha mão e arqueou as sobrancelhas — Vou correr sozinha? Isso não é justo. — Naomi bateu um dos pés no chão e eu tentei segurar uma gargalhada, era divertido ver alguém tão pequena brava.
— Não tem que ser justo, basta obedecer o que eu digo. — Fui claro, como se fosse óbvio o que deveria fazer e não contestar.
Naomi ergueu os olhos franzindo o cenho.
— Se você não for eu não vou. — E cruzou os braços reforçando que não sairia do lugar.
Revirei os olhos, guardei o cronômetro no bolso da calça, por fim. Mostraria a ela que não era sua melhor ideia me fazer correr. Nos posicionamos lado a lado, fiz alguns alongamentos, e quando estava pronto para começarmos, alguém nos interrompeu.
— Achei que o treino seria com o golfe.
Eu não estava surpreso, mas Naomi quase perdeu os olhos de tão arregalados. Sabia que Jimin estaria aqui em algum momento, ele era previsível, e também havia confirmado as afirmações de Jennie. Balancei a cabeça, diante do seu pior erro.
— Você veio para verificar se estou agindo como um treinador? — Arqueei a sobrancelha.
— Estou só aproveitando o tempo, vim treinar também. Bom dia Naomi. — Eu não sabia a quem ele esperava enganar, então apenas revirei os olhos.
— Bom dia, senhor Park. — Sua voz soou baixa e fria. Com certeza Naomi não tinha gostado nada deste encontro.
Eu não consigo enxergar o final pleno que Jimin vê, sinto que estou compactuando para que se afunde nas escolhas erradas.
— Por que estavam se preparando para correr? — Ele questionou.
— Ela chegou atrasada, eu iria puni-la. Se ficar vai correr também. — Expliquei. Ele arqueou a sobrancelha, questionando meus métodos com o olhar. Eu não me importei.
— Eu posso me juntar a você, Naomi?
Ele já havia sacado que tinha sido descoberto e não demonstrava nenhum arrependimento, a julgar pela linguagem de sinais que estava tentando construir intensamente para mim, enquanto Naomi não olhava, Jimin implorava para deixá-lo ficar.
— Claro, senhor Park. — Obviamente não é o que ela queria, sua expressão era clara como água.
Talvez seja uma péssima ideia deixar esses dois juntos.
— Certo, cinco voltas, podem começar. — Eu disse, e me arrependi logo em seguida.
Vê-los juntos e não enxergar as rachaduras, era difícil, ainda mais quando Jimin agia por impulso. Um tolo. Ainda que pense que seja amor, é cheio de mentiras. Isso nunca dará certo, é um fato. É possível amenizar, mas ninguém pode impedir que as consequências alcance seu destino.
— Então é verdade, voltou mesmo a treinar.
Eu não precisaria me virar para saber quem estava ali, seria mais fácil conter minha raiva se não olhasse diretamente para o meu pai. Que porra ele estava fazendo aqui?
— Cuidado para não ficar parecido comigo. Ranzinza e egoísta. — Apertei minhas mãos em punho.
— Claro, não tenho nada mais interessante para fazer do que me lembrar como não ser você. O que veio fazer aqui? — Questionei diretamente
— Você é melhor do que jamais fui. Achei que nunca voltaria a jogar. Quis ver com meus próprios olhos meu garoto treinar.
Qualquer um que passasse naquela hora poderia se emocionar com a fala daquele homem, mas ele não me enganava.
— Sim, eu sou. Vá embora, estou ocupado agora para lidar com você. — Comecei a me afastar, mas ao invés de seguir meu comando, ele me acompanhou. Transitou seus olhos pelo campo com um ar nostálgico, e então fixou sua atenção em Naomi e Jimin.
— Quem é aquela moça ? — Perguntou. Seu súbito interesse me deixou em alerta.
— Por que quer saber ? — Devolvi a pergunta.
Ele não respondeu, apenas deu um passo à frente, pronto para ir na direção dela. Rapidamente segurei seu braço impedindo que fosse mais longe.
— Achei que fosse alguém que conheço. Só isso. — Sua tentativa falha de se soltar me motivou a assegurar que não fugiria.
— Você não vai dar mais um passo, eu sou seu limite. — Esperava que fosse suficiente para espantá-lo.
Eu não reconhecia mais aquele homem, sentia nojo de tê-lo como pai. Meu desprezo era claro, e ainda sim ele gostava de me desafiar.
— Quer saber em quem estou pensando? — Por que estava tão ansioso para dizer, ou o motivo do seu interesse repentino, tudo, eu sabia que era um jogo medíocre para me desestabilizar. O homem obsessivo por controle havia deixado sua máscara cair. Seus olhos vagaram por mais tempo na imagem de Naomi. Seu rosto guarda uma seriedade sombria, preocupante, no mínimo. Então, quando voltou a encontrar meus olhos, soprou sua resposta — Hea. Mas acredito que seja só impressão minha.
Como se sua pele fosse brasa, eu o soltei no instante que o nome da babá atingiu meus ouvidos. Hea foi uma funcionária do clube que gentilmente conseguiu conter dois garotos cheios de energia, Jimin e eu. Quando estávamos aqui entediados, ela tornava o trabalho duro divertido. Nunca houve mulher mais doce. Sua proteção e autoridade criou um laço de afeto que poderia ter sido eterno. Mas não foram, as últimas lembranças carregam apenas ódio e desprezo.
Eu queria fazer com que engolisse o que acabara de dizer. Mesmo tendo plena consciência de que não deveria reagir, assim estaria agindo como esperava.
— Não chegue perto daquela garota, ela não tem nada a ver com a porra das suas merdas! Entendeu?
Esbravejei o mais alto que pude, aquele fardo não era meu, o único que deveria sentir culpa era ele. No entanto, eu não enxergava arrependimento algum em seus olhos, não havia nada além de um abismo vazio.
— Diminua seu tom de voz, se esqueceu com quem está falando? Se ponha no seu lugar, moleque. Se eu quiser aquela garotinha aos meus pés como minha putinha, eu vou fazer isso. Seus berros ainda soam como os de uma criança desesperada. Quando vai crescer, Taehyung? — Ele ri, e se afasta. — Vou ficar na cidade até o próximo mês só para te assistir. Sua mãe vai adorar.
Eu queria socar aquele homem, mas eu não tinha coragem. Quando ele se virou e, finalmente, foi embora, senti o estranho alívio daquela angústia terrível chegar com a mão pequena de Naomi segurando meu braço. O olhar repulsivo de Jimin sobre as costas daquele homem, foi o bastante para compreender que haviam visto mais do que deveriam.
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