Alone se lembrava muito bem de como havia conhecido Tenma, seu melhor amigo. Lembrava também das promessas que haviam feito, do tempo em que passavam juntos – Alone desenhando e Tenma ao seu lado, tagarelando –, as confusões em que se metiam.
Lembrava de seus cabelos, do seu cheiro, de sua voz, de seus brilhantes olhos castanhos. Tão vivos e belos, com uma cor única, aquela que nunca conseguira reproduzir. Sim, aquele vermelho do crepúsculo, aquele vermelho que procurara por anos. Nunca chegou a terminar seu quadro, pois Tenma não voltou. Já haviam se passado dois anos, mas não se tinham notícias do colega. Perguntara em todas as redondezas, mas nenhuma notícia se tinha. Era como se ele tivesse sumido do mundo, como se tudo que restasse fosse sua mera lembrança.
Ali, naquela floresta negra e sem cor, Alone podia sentir o chão frio contra sua bochecha esquerda, tudo naquele lugar era frio e não sabia ao certo o porque estar ali. Não tinha cor, vida ou alegria, mas parecia um bom lugar para se entristecer ou lamentar. O cordão de metal pesava em seu pescoço, ele sentia a terra manchar sua pele e roupas. As lágrimas corriam pesadas, saltavam dos olhos quase sem permissão.
A dor de estar esquecido, sozinho, incapaz de poder pintar seus belos quadros. Tudo o que pintava se tornava morte e aquilo era horrível.
Certo dia, havia pintado um coelho, e então a a terrível notícia de que ele havia aparecido morto na porta do orfanato chegou ao seus ouvidos. As outras crianças gritaram assustadas enquanto Alone só podia ficar cada vez mais incrédulo. A maldição funcionava com qualquer ser vivo.
As plantas, os animais.... pessoas....
Talvez ele tivesse matado Tenma, talvez era esse o motivo do amigo estar fora por tanto tempo, o desespero lhe corroia a mente, o corpo, tudo. O medo lhe formigava as mãos e sentia a respiração ficar pesada. A cada dia angústia e medo tomavam conta de seu ser. Pintar tornara-se um enorme pesadelo.
"Isso não pode estar acontecendo, não é?"
Se levantou com dificuldade, as folhas secas presas a suas roupas e os cabelos loiros sujos. Sua carreira como pintor estava extinta, seu futuro era incerto e Tenma não estava ali para passar a mão em sua cabeça, sussurrar um "vai ficar tudo bem", ou até mesmo lhe dar um sorriso ou abraço. Ele sentia a sua falta, ah, como sentia.
Seguiu pela floresta, cambaleando incerto por entre os carvalhos altos e árvores esguias. Precisava voltar para casa, precisava sorrir e não podia se abalar ou chorar naquele lugar para sempre. Precisava se erguer enquanto era tempo, por si mesmo, por todos e também por Tenma. Tinha que acreditar que o amigo estava vivo, lá no fundo, ele podia sentir de alguma maneira. O sentimento não era nada mais que um arrepio esquisito que passava por si e sumia tão rápido quanto viera. Podia estar delirando, mas, o que o impedia de acreditar? Se conseguia acreditar que seus quadros podiam machucar os outros, poderia acreditar que ele estava vivo, em algum lugar como um cavaleiro, assim como havia prometido.
Na direção para o orfanato, olhou ao redor secando o rosto e levando os materiais nos braços, se esforçando por um sorriso doce. O seu sorriso, aquele que tinha certeza que Tenma gostava muito de ver, afinal era o que ele sempre dizia. Para sorrir.
"Seu sorriso me acalma, Alone, de alguma maneira ele me faz acreditar na bondade das pessoas".
E antes de colapsar novamente, ele pensava em Tenma, e de repente, nem tudo era tão escuro assim.
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