Pov Paola
Minha mãe em acordo com um dos meus tios e eu, vendeu meu carro lá pra que eu pudesse comprar um novo. Porém como já era de se esperar, ela quis se exibir, fez sozinha, e gastou mais para "me dar", um carro melhor que o que eu tinha antes. E agora cá estou novamente, dessa vez com um carro novo.
Eu queria mesmo, muito, reclamar, mas… daquela vez, ela havia realmente me agradado.
E é claro que vasculhei o carro inteiro atrás de algum tipo de dispositivo que pudesse estar sendo usado por ela para pelo menos saber onde eu estou. Mas não tinha nada, o que fez com que eu me sentisse mal, muito mal, em aceitar que ela só… me fez uma boa ação, mesmo.
Parecia que as coisas estavam indo bem entre nós, até conversávamos pelo telefone algumas vezes na semana. Ou estávamos numa fase melhor, ou a delegada só queria muito, mas muito mesmo, que eu não abrisse minha boca. Eu não seria capaz. Na verdade, agora, sou incapaz de abrir minha boca pra falar o que eu não tenho certeza, ou provas.
Os meses foram passando, e as coisas foram tranquilizando, gradativamente. Luana e eu estávamos bem no mundinho da nossa conversa virtual. O tempo passava devagar para nos levar a um encontro pessoalmente, mas nos dava espaço, mais ainda, para nos aproveitar. Tanto individualmente quanto em companhia. Pra dividir interesses, jantar juntas, ler livros, às vezes ver um filme e comentar. O fuso horário nos atrapalhava, claro, mas nada impossível.
Tinha vindo correr pela orla, em seguida parei para observar o mar. Calmo, o dia estava um pouco estranho, até. Nublado, porém fresco. Eu teria que trabalhar em algumas horas, ainda era bem cedo.
[6h21] Lu: bom dia pra você!!!
- Bom dia bolinho, tô aqui olhando o mar. Tá ouvindo? Tomara que seu dia seja ótimo. – enviei o áudio.
[6h22] Lu: o seu também, meu bem!!!
Por algum motivo, naquele dia não enviamos fotos. Mas tudo bem, aquele parecia que seria um dia bem cheio.
Voltei pro carro e dirigi até em casa. Sim, eu decidi, do nada, correr na orla mesmo não morando exatamente perto de lá. Definitivamente não era um hábito, mas eu estava com bastante energia essa semana. Foi uma boa maneira de acalmar meus pensamentos e minha cabeça.
- Já vai pro trabalho?
- Daqui a pouco. Bom dia. – beijei a testa dela.
- Tem café.
- Que bom, adoro quando você faz café.
- Tava te esperando pra comer. Vai comer, né?
- Claro, não é todo dia que tenho companhia além da Jade. Falando nisso, onde ela está?
- Na sua cama. – riu.
- Sozinha?
- Ela está dormindo, relaxa.
- Ok. Eu vou tomar um banho antes, você me espera? Já que fez tudo sozinha, vai ter que me esperar.
- Problema nenhum, eu espero.
- Que horas cê arrumou o cabelo? Eu nem vi.
- Ontem. – amassou os cachos novamente, piscando pra mim em seguida. – Amou?
- Perfeita. Passei na praia, deu uma vontade…
- Vamos marcar uma praia com as meninas, esse final de semana! Você poderia tomar um solzinho, Lola.
- Eu queria até negar, mas como? – ri. – Então fechado, nós vamos, Lica.
Entrei no meu quarto, deixando Aline na cozinha e encontrando Jade tomando conta da minha cama, deitada exatamente no meio.
- Jade? – entrei na cama devagar, para não assustá-la e ela acordou, se espreguiçando e levemente apertando meu braço com a patinha. – Não tá certo você na cama, hein? Oi meu amor…
Ela não me deu muita atenção, o sono tava melhor. Essa gata é folgada demais.
Em menos de meia hora eu já estava arrumada pra trabalhar, sentada à pequena mesa da cozinha tomando café da manhã com Aline. Surpreendentemente, a semana estava tranquila na delegacia, eu só tinha muita papelada pra resolver com a Babi. Mas a gente tirava de letra. Aline e eu estávamos como melhores amigas naquele ponto da minha vida. Ela era a minha pessoa preferida pra ir em qualquer lugar, e conversávamos sobre tudo.
Ela me ajudou a adotar a Jade há menos de um mês e já estamos carne e unha, eu e minha gatinha malhada do olho verde. E pensar que já ouvi que sou muito ruim pra ter animal. Ou eu realmente acreditava nas coisas que falavam sobre mim, ou eu só tinha preguiça – e estava desmotivada – demais pra querer ser uma pessoa boa. Já que o que sempre me disseram e esperaram de mim era que eu fosse ruim.
Mas, no fundo, acho que nem existe isso. Todo mundo é bom e ruim, só depende da situação.
E o meu recomeço, apesar de bem intenso, teve sua leveza. Eu achava tudo mais leve agora. E ter pessoas ao meu redor que acreditavam em mim e todo o meu potencial, como a Aline, me deixavam mais tranquila ainda.
Estou um pouco surpresa como a minha libido tem andado perfeitamente controlada. Não que eu seja algum tipo de animal ou fera, ou sei lá, mas passar longos períodos - vulgo meses - sem transar sempre me deixou levemente irritada.
Não dessa vez, de maneira alguma. Eu nem beijo ninguém desde a Luana. O que me tornei...
- Bora trabalhar?
- Bora, Lica. Tem muita coisa pra fazer.
Pov Luana
Pouco depois de todos aqueles incidentes, eu passei a me preocupar talvez o triplo com a minha carreira. Treinava mais, mais forte, por mais tempo. E isso, por incrível que pareça, me relaxava.
Voltei a ser um dos principais nomes do time feminino do Barcelona, e ter a minha posição de ponta esquerda guardada pra mim no time titular.
Lucas ainda morava comigo, e tinha começado a tomar gosto por escrever. Não sei dizer se ele estava escrevendo um livro ou se só usava as palavras para se sentir melhor, ou ambos.
E Paola… esta ainda era a pessoa que eu realmente achava ser perfeita pra mim.
- Eu vou gozar…
- Shh… vem. – sussurrei, sentindo seus dedos agarrarem minhas costas. – Devagar… – diminuí o ritmo, e ela me surpreendeu descendo uma mão para o meio das minhas pernas, levando-me até a borda junto com ela.
A água morna escorria por nossos corpos, molhava nossos cabelos, bagunçava nossos beijos. Era maravilhoso.
Gozamos pouco depois, ainda nos esforçando para não fazer nenhum barulho.
- Você é incrível. Isso é maravilhoso…
- Tem razão. – sorri. – Vale a pena vir antes de todo mundo aqui.
- Se for pra ter você, eu posso até passar a noite acordada. – ri.
- Isso não é bom pra o seu desempenho, Carla. Mas é bom pro meu ego. – rimos. Bem, Carla era uma colega. Um tanto mais nova que eu, e estávamos ambas em momentos que preferíamos chegar antes de todos aos treinos para nos dedicar um pouco mais. Foi assim que acabamos…
É, transando. Não planejamos isso.
Pelo menos não a primeira vez. E eu não podia evitar sentir como se estivesse traindo Paola de alguma forma porque não tinha coragem de mencionar isso. Acho que não precisava, mas às vezes me sentia meio culpada ou queria fazer algum comentário sobre ela.
Eu realmente não esperava que conseguisse me liberar, sexualmente falando, da mesma forma que aconteceu lá no Brasil com a Paola e a Aline. Mas aquilo me deixava acesa, energizada de uma forma diferente. Não sei explicar, mas uma vez Paola me disse sobre certos meses, ou em dias aleatórios, experimentar um tesão que a fazia ficar atenta aos movimentos de todas as pessoas, e pensar em sexo ao menor estímulo. Transar com Carla me dava essa sensação em algum nível. Era gostoso demais...
Provavelmente isso faria Paola dizer que eu "preciso inovar", visto que ela já me contou bastante coisa… nessa área. As nossas experiências com a intimidade virtual, digamos, também foram e são reveladoras pra mim. Mas eu não deveria me surpreender, afinal, Paola é um furacão.
Ela deve ter pelo menos duas mulheres dando conta dela. Ou não, porque, Deus, como ela trabalha bem sozinha.
Às vezes, imagino que ela está nos vendo, e esse pensamento sempre faz meu corpo arrepiar. E sempre vem acompanhado da minha leve culpa por ela sequer saber. Mas eu vou contar.
- Então, eu… transei. Na verdade, eu estou transando…
- Agora? Eu atrapalho? – riu. – Sério, tem alguém mamando você enquanto conversa comigo? Isso seria novo. E talvez excitante. Talvez.
- Não, Paola, ninguém me mamando. – ri, mostrando o resto do meu corpo enquanto andava até a cozinha. – Claramente.
- Que pena, Lu. Adoraria estar mamando você. – ri, apoiando o celular na bancada. Paola estava em horário de almoço, sentada em sua sala. Se não me engano, ela dividia essa sala com mais alguém, mas com certeza deveria estar sozinha naquele momento, com a marmitinha na mão terminando de almoçar.
- É, eu sei.
- Você estava dizendo que transou, me conte. Se quiser.
- Não, é que estou com uma colega de vestiário que… enfim, aconteceu algumas vezes e eu sinto essa sensação de “não deveria”. E sempre penso em você enquanto… enfim.
- Ah, que honra, você pensa em mim enquanto dá pra outra! – riu. – Você não tá fazendo nada errado, bolinho, relaxa. Tá gostando dela?
- É só sexo, mas eu gosto. Ela tá envolvida com outra pessoa, eu acho. Ainda não perguntei, ela sempre me “ataca” antes.
- Você é a amante, então?
- Vai se foder – riu. – Mas talvez eu seja. Não estou sabendo, mas talvez.
- Olha lá, cuidado com essas coisas. Mas não deixa de se divertir antes que eu chegue aí pra te dar um chá de buceta tão forte que você vai passar meses lembrando de mim de novo. – Luana gargalhou.
- Paola, nem precisa de mais chá, eu só penso em você...
- Ah, a não-monogamia… – que raiva!
Mas olha só a desconstrução, né? Eu não me via num relacionamento, e de repente eu estive num relacionamento por vários anos, terminei, não achei que encontraria alguém tão cedo, e agora até um relacionamento aberto, talvez não-monogâmico, algo que eu nunca imaginei, está funcionando pra mim. Se a eu de alguns anos atrás ouvisse que eu estaria aqui, ela riria muito. E talvez, a depender do ano, entraria numa crise por ter a sensação de que estava perdendo tempo com a Júlia, se ia terminar de qualquer jeito.
A minha versão de hoje sabe até que a Ju é uma das melhores coisas que me aconteceram e que não perdemos tempo, não. Só foi do jeito que tinha que ser. Não seria capaz de dizer que ela nunca me amou e estávamos nos enganando. A Júlia me amava e muito, e era completamente recíproco. A gente se entendia sem palavras, às vezes.
Ainda bem que estamos todas bem, depois de tanta dor.
- Mas se quiser me dar um chazinho eu quero...
- E eu sempre quero te dar. Lembra, faltam menos de dois meses!
- Menos de dois meses! O dia de tomar chá tá chegando… – rimos.
- Queria muito estar como você, Lu, mas não tenho cabeça pra isso… porra, tô estressada demais.
- Ainda o negócio com a sua mãe ou o trabalho?
- Ah, meus problemas familiares estão o tempo todo no fundo da minha mente, ecoando. Mas não, só o trabalho. Tem muito pra fazer. E eu tô realmente cansada…meu Deus, por que te fizeram tão gostosa?
- Paola, eu só tô existindo! – eu literalmente só tinha parado para escutá-la enquanto passava meu suquinho.
- E me desconcentrando das minhas falas.
- Se eu quisesse desconcentrar você, eu estaria tirando a roupa. – fingi que tiraria a blusa, mas é claro que não tirei. – Mas ó, tô aqui normal, de pijama.
- Metida.
- Por que te fizeram tão safada? Nossa, eu acabei de acordar…
- É o fuso horário, Luana. Não sei se você lembra como eu acordo. Agora estou almoçando.
- Sim, você acorda incomunicável.
- Demora um tempo para o meu corpo começar a funcionar, só isso. Eu preciso organizar meus pensamentos, sem muita pressão nem gente me dizendo o que fazer.
- Eu só preciso ter uma primeira sensação boa quando levanto e aí consigo já viver meu dia bem. Se eu estiver bem, no caso.
- Você tá?
- Uhum. Melhorando. Tô me tratando bem… e já precisando retocar essas luzes. – me olhei na câmera, negando com a cabeça.
- Ou cortar o cabelo todo?
- Sim, continuo pensando nisso. Talvez sim. Você acha que um daqueles cortes que o cabelo sempre parece meio bagunçado ficaria… – Paola se distraiu, e levantou o indicador pra que eu me calasse.
- Um segundo, amor, desculpa. Sim? – ela falava com alguém na sala. – Ah, claro. Vou sim. Sim, você deixou no meu carro, Aline. Tá, eu pego. – eu já tomava meu suco quando Paola voltou a olhar pra mim. – Aline simplesmente deixou a bolsa no meu carro junto com a minha. Eu posso? Como que não pensa que vai precisar da bolsa?
- Ela deve ter esquecido. – ri. Paola negou com a cabeça. – Vai desligar?
- Ainda não, vamos buscar lá, na esquina. Só vou botar você no meu bolso, pode ser? – ri.
- Claro, sem problema.
- É que deixei o carro na outra rua porque não tinha vaga aqui, a gente chegou meio tarde hoje. Paciência. Então te vejo em menos de cinco minutos, ok? – e tirou um dos fones. – Fala só um pouquinho mais alto, pra ficar melhor. – assenti.
- Por que tirou o fone?
- Está num volume considerável, e como eu estou trabalhando, não quero estar completamente desatenta dos meus arredores. Não acho seguro.
- Ah.
Aí está algo que eu jamais pensaria. Coisas do tipo me assustam um pouco, até porque eu sempre me lembro de que, provavelmente, Paola já viu muita coisa. Tipo, muita.
- Já volto. – e desligou a câmera. – Continuo aqui, ok?
E então, de repente eu escutava passos, burburinho, carros, e a voz de Paola.
- Quando tem jogo, Lu?
- Na próxima semana, só. Estou descansando um pouco. Talvez encontre las chicas mais tarde.
- Espero que sim! Sempre bom relaxar um pouco. – assenti, por um segundo esquecendo-me de que ela não podia ver. Ouvi Paola abrir a porta do carro. – O que…?
- O que foi, amor?
- Não, nada, só um… PUTA MERDA!
- Paola? Paola!!
Fui calada por uma explosão ensurdecedora.
E a ligação caiu logo em seguida.
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