Garoto conhece o mundo
Capítulo dois
Ela tinha um jeito estranho de se importar com as pessoas. Por mais que ela tentasse esconder, eu sabia que ela era uma doçura por dentro.
— Yang Jungwon.⠀
Gyeonggi, 2020
Educação Física. Talvez essa não fosse a matéria preferida do nosso protagonista. Yang Jungwon era um aluno exemplar, tirava as melhores pontuações nos exames da escola e nunca dava trabalho para os seus professores. Seu único defeito era… atividade física.
— Certo, turma, temos ainda quinze minutos de aula, então vou deixar vocês jogarem um pouco de queimada agora.
Jungwon levantou a mão de prontidão.
— Posso ficar na arquibancada, professora?
— Não.
Droga.
— Vamos dividir a turma em dois times, vocês da direita e vocês da esquerda.
Numa bela manhã de terça-feira, após quase duas horas inteiras de ginástica e corrida, lá estava a turma do terceiro ano jogando queimada no ginásio da escola. A professora dividiu os alunos em duas equipes, e Jungwon e Kuna se viram em lados opostos. Quando o jogo começou, a novata exibiu seu atletismo natural, esquivando-se e arremessando com sua notável precisão. Jungwon, por outro lado, não era o mais atlético, mas fazia o possível para contribuir com seu time.
Ao longo do jogo, Kuna não pôde deixar de notar a determinação e dedicação do representante de sala, que apesar de não ser o melhor nos esportes, não aparentava estar cansado ou desanimado. Ela admirou como ele não desistiu e continuou a se esforçar ao máximo, mesmo sendo horrível nos arremessos. Aos olhos dela, havia algo cativante em seu esforço, e ela se viu torcendo secretamente por ele, embora estivessem em times rivais.
À medida que o jogo avançava, a tensão no ginásio aumentava. As equipes estavam equilibradas e a emoção crescia a cada esquiva, arremesso e recepção. De repente, durante um momento particularmente intenso, um dos colegas do time da Lee lançou a bola com uma força incrível, que por pouco não colou Jungwon. Para a sua surpresa, ele havia conseguido agarrar a bola. Era a sua grande chance. Ou melhor, sua milésima oportunidade para tentar se redimir.
Do outro lado da quadra, Kuna observava o representante, atenta, com um sorrisinho discreto nos lábios.
Vai nessa, Yang Jungwon! Acerta a cara de um desses otários!
Determinado a conseguir marcar um ponto e colar um dos adversários, Jungwon segurou a bola com mais firmeza e se posicionou no chão, podendo escutar algumas palavras de encorajamento das meninas. Ele respirou fundo e arremessou a bola com toda a sua força. A Lee assistia a cena mordendo o lábio em expectativa. Mas para o seu azar, o seu colega de time conseguiu agarrar a bola lançada e queimou o Yang em seguida, acertando bem no meio da sua cara. O garoto cambaleou para trás, os óculos voando diante dos seus olhos e o corpo caindo no chão duro da quadra. Seu nariz começou a sangrar.
— Au… deve ter doído… — Kuna murmurou, entortando a boca.
Ele gemeu de dor, torcendo o nariz ao sentir o incômodo ali, enquanto o resto dos alunos começavam um alvoroço, transbordando de preocupação. Especialmente as garotas, que eram caidinhas por ele. A professora rapidamente soprou o apito, sinalizando a interrupção do jogo, enquanto corria para verificar se o aluno estava bem.
Não era a primeira vez que aquilo acontecia. Aquilo não foi um acidente. Mas ainda era uma época em que ele não fazia ideia disso. E apesar de tantos lamentos e perguntas preocupadas em cima do menino prodígio, tudo era fingimento.
Percebendo o que havia acontecido, de longe Kuna olhou ao redor e viu seus óculos caídos pela quadra. Seu espírito competitivo desapareceu instantaneamente e no lugar disso, veio a preocupação. Ignorando os olhares dos companheiros, ela correu para pegar os óculos dele e se convenceu de que iria se enfiar no meio daquele tumulto que a odiava, e iria ver se Jungwon estava bem. Porém, quando já dava os primeiros passos, viu uma das meninas levando o Yang pela mão e saindo da quadra com ele.
Kuna abaixou o olhar, se sentindo idiota por ter dado importância quando era claro que ele não precisava de mais uma garota atrás dele.
★
Mais uma vez dentro da enfermaria, os nervos de Jungwon estavam piscando em alerta depois de finalmente conseguir fazer Park Sohee sair de lá e deixá-lo um pouco sozinho. Quando se tratava de situações médicas, sua mente vagava para longe. Ele detestava a enfermaria. Ainda bem que ele tinha a Senhorita Min, a enfermeira da escola que sempre cuidava dele com um carinho especial que tornava aquele ambiente menos angustiante.
Não demorou muito para ela avaliar sua situação e lhe entregar uma pilha de lenços, pedindo que ele inclinasse a cabeça ligeiramente para a frente para estancar o sangramento. Ficaram ali por dez minutos, em silêncio. A mulher sabia o quanto o garoto apreciava o sossego com os mais de dois anos de convivência, desde que ele se matriculou.
Quando o sangramento finalmente parou, ele sorriu para a Senhorita Min, sentindo-se grato por sua ajuda mais uma vez.
Após voltar para a sala de aula, o representante encontrou o lugar vazio. Afinal de contas, aquela tinha sido a última disciplina do dia e ninguém poderia ficar no colégio apenas para fazer companhia para ele, não é mesmo?
— Ei, Yang?
Bom, a Kuna podia.
Jungwon se virou um pouco surpreso ao ver a novata parada na sua frente com seu skate no braço e seus óculos na mão.
— O-oh, meus…
— É, eu… encontrei eles no chão da quadra — estendeu para ele. — Toma.
Ele sorriu, gentilmente pegando o mesmo e dando uma pequena reverência para ela.
— Obrigado, Kuna. Eu nem tinha me dado conta que estava sem eles…
— Por nada, Jungwon — ela sorriu de canto, vendo-o colocar os óculos no rosto e voltar a aparência que já estava acostumada a ver. — Você tá legal?
— Hã? — Jungwon se surpreendeu novamente. Ela estava se preocupando com ele? — Ah, eu estou bem. Só tive um pequeno sangramento nasal.
A Lee fez careta. Detestava sangue, mesmo que já tenha ralado os joelhos diversas vezes na infância. Ainda se sentia irritada pela bolada que o representante havia levado.
— Aigh, aquele cara era um otário. Pra quê arremessar a bola daquele jeito, hein?
— Está tudo bem, sério. Eu deveria ter prestado mais atenção ao meu redor.
— Hm… — ela fez bico, virando o rosto. A Kuna emburrada estava de volta também.
Jungwon observou a menina com mais atenção. Estava sem o laço do uniforme mais uma vez. Será que alguma vez ela realmente chegou a usá-lo?
— Você ficou aqui me esperando até agora?
— Eu? — ela piscou algumas vezes, se sentindo tímida de repente. — Fiquei, ué… Você não precisa dessa coisa pra ver?
Jungwon riu fraco, assentindo. A garota achou estranhamente adorável aquela risadinha baixa.
— Obrigado, Lee Kuna. De verdade.
Os dois sorriram um para o outro.
★
Ao chegar em casa, Kuna correu para o andar de cima sem nem tirar os tênis e foi direto para o chuveiro, escutando os berros vindos da cozinha. Seu irmão logo bateu na porta, mandando ela limpar o carpete quando terminasse seu banho e viesse comer em seguida, pois a comida já estava quase pronta.
Lee Heeseung era um irmão super protetor e talvez mais carinhoso do que uma mãe. Afinal de contas, ele criou sua irmã mais nova como se fosse sua própria filha.
— Essa garota… — ele murmurou ao descer as escadas, estralando o céu da boca com a língua.
Em 2008, quando o Lee tinha apenas dez anos, sua mãe adotou uma menina de cinco anos, vinda da China. Ela era professora do maternal na época, e ao visitar um orfanato como trabalho voluntário, Xiao Kuna lhe chamou a atenção. A pequena era muito esperta, embora não conhecesse muitas palavras do idioma local. Sua adoção foi complicada. A mulher a queria, mas seu marido era contra. Heeseung, por outro lado, também havia adorado a garotinha. No fim, o pai acabou cedendo.
— Ei, oppa — a mais nova chamou pelo irmão, se sentando na mesa da cozinha e já se preparando para começar a comer. — Está gostando da faculdade?
Agora com seus vinte e dois anos, Heeseung foi finalmente aceito na sua faculdade que tanto sonhou. Foram longos anos tentando e fracassando.
— Sinceramente? — ele também se sentou na mesa, vendo a irmã comendo como se não houvesse amanhã. — Lá é melhor do que eu imaginei. Mas e a escola? Está se adaptando bem?
Ela fez bico.
— Não fala da escola. Ainda tô brava por ter me despedido dos meus amigos em Namyangju.
— Sabe que foi pro nosso bem — ela virou a cara, irredutível. Ele suspirou. — Não seja teimosa, Kuna…
— Sinto falta da minha antiga escola, só isso — e encheu a boca novamente.
— Você vai conhecer novos amigos e te garanto que será muito feliz aqui em Uiwang — ele pegou um pedaço de carne e colocou gentilmente sobre a tigela da irmã. — Sabe que eu te amo muito, não é, Kuna?
— É claro que eu sei, seu chato… — resmungou, enfiando a carne na boca. — 'Tambeimtiamu.
Ele riu, apertando o nariz dela e ouvindo sua reclamação.
Heeseung faria de tudo por ela. Desde o dia em que sua família se reduziu a dois membros.
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