Mia
Mal abri os olhos e já havia constatado que era um lindo dia parar estar morta.
A luz do sol de agosto invadia meu quarto, e evitei fazer movimentos bruscos pela dor de cabeça. Me levantei devagar e vi Luke deitado na minha cama. Estranhei e desci até a cozinha para buscar um copo d'água, no meio do caminho achando uma Hanna só de sutiã estirada no sofá.
Por Deus, o que diabos havia acontecido na noite passada?
Subi pro meu quarto depressa, ignorando as fisgadas na cabeça, que agora estavam mais fortes. Entrei no banheiro e fui procurar analgésicos, engolindo dois de uma vez só. Eu estava com fome, mas só de pensar em comer alguma coisa meu estômago já revirava. Tentei lembrar do que havia acontecido ontem, mas a única coisa na minha mente era Emily brava comigo. Eu só não sabia o porque.
— Mia? — escutei uma voz meio rouca de sono, e me lembrei que Luke ainda estava aqui. Joguei uma água no rosto e voltei pro quarto.
— Oi.
Ele me olhou um pouco preocupado.
— Você tá melhor?
— Sim, obrigada — respondi — Só ressaca.
Um silêncio se instalou entre nós, e eu me sentei na cama de novo, ao lado de Luke. Ele parecia desconfortável, com vontade de perguntar alguma coisa.
— Mia, sobre ontem...
— Eu não lembro de quase nada — disse, poupando seu constrangimento, e ele pareceu mais aliviado. Qualquer que fosse o motivo pra ele ter dormido comigo, também não queria saber — Só me lembro até a parte que o Ashton teve que tweetar uma foto sem calças. Depois disso as coisas ficaram mais confusas — dei uma pausa, não querendo assustar Luke falando tudo de uma vez — Além disso eu só lembro que corri atrás da Emily quando ela tava indo embora, e ela me chamou de burra, cega, e disse que me odiava.
Esperei Luke dizer alguma coisa, me explicar o que aconteceu, ou dizer que foi só um sonho meu, mas ele não disse nada. Continuou encarando um ponto aleatório no quarto.
— O que eu fiz pra ela, Luke?
Ele suspirou depois de um tempo, finalmente olhando pra mim.
— Eu acho que ela gosta de você, sabe... — ele disse — Daquele jeito.
Eu ri e balancei a cabeça, negando a hipótese. Não tinha nada a ver.
— E por que você acha isso? — questionei.
— Ontem Calum desafiou Emily a beijar a pessoa por quem ela se sentia mais atraída, e ela beijou você. — ele despejou e eu fiquei um pouco surpresa por não lembrar disso — E depois, quando Michael desfiou nós dois a termos três minutos no paraíso aqui em cima, ela foi embora com raiva.
Fiquei calada cogitando a possibilidade, e tentando ignorar ao máximo o que pode ter acontecido nos três minutos com Luke. De repente, a ideia de Emily gostar de mim não pareceu tão absurda, e uma tristeza me invadiu.
— Meu Deus — exclamei sem saber o que pensar — Você acha mesmo?
— Sinceramente, acho — ele respondeu — E tem mais. Se você parar pra reparar, toda vez que algum cara se aproxima de você ela fecha a cara. Só pode ser ciúmes.
Passei a mão pelos cabelos, pensando. Isso sobre ela fechar a cara era verdade, mas eu achava que acontecia por que ela não gostava dos meninos, ou em último caso só ciúmes de amizade mesmo. Como aquele dia na boate, quando ela ficou sentada e não quis dançar comigo e Michael. Ou na piscina, quando ela nem chegou perto de mim enquanto os meninos estavam lá. E ela vivia me tratando com mais carinho do que as outras, mas sempre pensei que fosse porque nós duas éramos amigas há mais tempo.
— Eu não devia ter ficado com ela de novo — disse sem pensar. — Mesmo bêbada, eu não...
— Como assim de novo? — Luke perguntou, se levantando — Você já tinha ficado com ela antes?
Eu não gostava do tom que ele usou, como se me acusasse de um crime terrível. Eu era mais nova, e foi meio que na inocência.
— Uma vez só — admiti, e ele soltou um risinho debochado, começando a calçar seu Vans que estava no pé da cama — Mas isso já tem muito tempo! A gente tinha, sei lá, uns quinze anos. Ela era minha única amiga, e foi mais por curiosidade. Como é que eu ia saber que ela tinha gostado?
Luke não respondeu nada, apenas balançou a cabeça em negativo e procurou seu celular, que estava na minha escrivaninha.
— Mia, você é uma bagunça. — ele disse, andando até a porta — Se justifique pra ela, não pra mim.
Fiquei olhando pra porta estática, sem saber o que falar ou o que fazer — o que era muito raro.
Se Luke tinha ficado bravo comigo pelo o que eu confessei, eu não podia imaginar como Emily estava. Se ela gostava mesmo de mim, eu devo ter sido uma puta de uma puta com ela. A beijei e depois fui ficar com outro.
Enterrei minha cabeça no travesseiro, com raiva de Emily por gostar de mim, e com raiva de mim por não ter percebido. Que saco. Eu não namorava justamente pra evitar esse tipo de drama, e agora ela me vem com essa história. Ser minha melhor amiga só piora tudo.
— O que aconteceu com o Luke? — escutei uma voz e me virei, vendo Hanna parada no batente da porta, agora completamente vestida — Ele saiu pisando tão forte que me acordou.
— Ele ficou com raiva porque eu fui uma filha da puta com a Emily.
Hanna fez uma cara confusa, e depois culpada. Olhei pra e percebi que ela evitar me olhar nos olhos.
— Você já sabia que ela gostava de mim, não sabia? — perguntei, mesmo já sabendo a resposta.
— Ah, Mia... Tava na cara! — ela disse, e eu bufei com raiva — Eu e as meninas já suspeitávamos, mas não podíamos te contar algo particular dela.
Balancei a cabeça, pensando quanto drama poderia ter sido evitado se eu já soubesse.
— Conversa com ela. — Hanna aconselhou. Suspirei concordando, visto que era a única coisa a se fazer.
Bati na porta da casa dela umas quatro vezes, mas ninguém veio me atender. Eu sabia que Emily estava em casa, porque ela nunca saia quando estava triste.
Apesar de já ser maior de idade e ter dinheiro suficiente pra comprar uma casa longe dali, ela ainda morava com pais (que eram meio protetores, ainda mais por estarem fora da zona de conforto inglesa) e com o irmão mais novo, então eu esperei que alguém além dela tivesse piedade e abrisse a porta pra mim.
Minutos se passaram e nada.
Bati de novo.
Nada.
Vendo que ela não queria me atender, fui até os fundos. Segurei numa trepadeira na parede casa, e escalei até o telhado.
Quem passava na rua e via aquela cena, provavelmente achava que a) eu era um ladrão, ou b) eu tinha um grave distúrbio mental. Mas a verdade é que na minha adolescência eu já havia entrado na casa dela escondida milhares de vezes quando ela estava de castigo. Essa não era a primeira vez e provavelmente não seria a última.
Me equilibrei no beiral e achei a janela do quarto dela, a abrindo e pulando pra dentro.
— Mia, você tá doida? — Emily pulou da cama quando me viu. Seus olhos estavam inchados e seu cabelo um emaranhado. Diário de uma paixão passava na TV.
— Você não abria a porta — expliquei, me levantando e sacudindo a poeira da minha roupa — Vamos falar sobre ontem.
— Eu não quero falar sobre ontem — ela disse, emburrada.
— Mas a gente vai — afirmei sentando na sua cama e batendo num lugar ao meu lado, para que ela se sentasse também. Ela o fez contrariada, sabendo o que viria em seguida — Você gosta de mim?
Fui direta, Emily sequer teve o trabalho de ficar surpresa. Sabia que meu jeito era assim, prático.
— Acho que você já sabe a resposta — ela confirmou, ficando vermelha.
— Por que você não me falou nada? — perguntei.
— Porque eu não to apaixonada, Mia. Eu gosto de você mais do que como amiga, mas não chega a ser amor. Eu não queria te dizer pra não ficar estranho, e eu posso muito bem conviver com você sendo só minha amiga.
Suspirei, agradecida por ela ter falado tudo de cara. Era difícil pra ela porque ela é bem mais tímida do que eu, mas a convivência é tanta que ela aprendeu a ser mais sincera.
— Se você não se importa de ser só minha amiga, por que foi embora com raiva ontem? — era minha última dúvida.
— Eu te beijei, e você não me afastou nem nada, então eu fiquei meio feliz demais. Mas depois você foi pro quarto com Luke, e eu me senti... traída. — ela confessou — Não foi culpa sua, Mia. E eu não te acho cega nem te odeio. Você só é bem lerda às vezes, mas ninguém é perfeito. — ela completou com a última frase, me fazendo rir.
— Olha quem fala — tirei os sapatos e me deitei na cama dela, aproveitando que o filme ainda estava no começo — Minha vontade é de te dar um tapa na cara por você ter feito esse drama todo.
Nós rimos, e ela se deitou também, voltando sua atenção ao filme. Se tudo estava esclarecido como eu achava, não haveria desconforto entre nós. Poderíamos continuar a ser amigas como antes.
Antes da banda, antes da fama e antes de todo mundo.
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