Estamos enterrados em sonhos quebrados
Estamos atolados sem um fundamento
Eu não quero saber
Como é viver sem você
Não quero conhecer
O outro lado do mundo sem você
The Other Side — Ruelle
Jump City, 12:49 PM 15 de dezembro
Ravena estava um poço de nervos — mesmo que disfarçando —, sentada no sofá da sala com o notebook apoiado em suas pernas, ela poderia jurar que iria ter um ataque cardíaco a qualquer momento. Mesmo estando de férias, ainda tinha muita coisa de seu trabalho que ela teria que fazer, como por exemplo agora que Emma mandou os modelos para a coleção de natal.
Estava a quase meia hora olhando a tela do notebook e sua irritação aumentava mais e mais. Os designs eram de pouco agrado para ela, e com certeza iria pedir para refaze-los pois de jeito nenhum aqueles desenhos entrariam na coleção.
Zatanna sentada ao lado dela se divertia ouvindo os palavrões que Ravena soltava a cada vez que via um desenho. Tudo estava indo tão bem, quando acordaram Ravena se sentia no pais das maravilhas, mas tudo desandou quando abriu seu notebook para ver seus e-mails.
Ela suspirou e coçou seus olhos por baixo dos óculos de grau, iria ter muito trabalho essa tarde.
Garfield estava sentado do outro lado do sofá com o livro de Harry Potter em suas mãos, Kori ao seu lado o orientava quando não entendia algo ou se embolava com as palavras, Dick fazia o mesmo. Depois que ele e Ravena voltaram da livraria, ele tinha decidido contar para os outros sobre sua dificuldade, já que são sua família e querem o melhor para ele.
— Esse é bonito — Zatanna apontou para um na tela do notebook.
Ravena franziu o nariz e estalou a língua. — Sério mesmo que gostou logo desse? Desse em específico? Cheio com lantejoula e essas tralhas todas? Zatanna?
Zatanna revirou os olhos em repostas e a cutucou com o cotovelo. — Qual é, está bonito assim.
— Isso é brega, isso sim, está ridículo. Isso não irá para a coleção, esse estilo de design é feito por outras marcas e nós trabalhamos com algo sofisticado. Eu já te expliquei isso tudo, mas você é muito tapada para se recordar.
— Ei! — Zatanna protestou indignada. — Nossa que bicho te mordeu, mulher?
— Nenhum bicho me mordeu, oras, eu só estou estressada com essa porr... coleção horrível.
— Sabe que não tem tanto tempo para recriar outra coleção, não é?
Ravena bufou impaciente. — Claro que eu sei Zatanna.
— Vou ficar na minha senão vou acabar perdendo um braço. — Zatanna se encolhe no sofá dando total atenção para a tv.
Ravena deu de ombros e voltou sua atenção para a tela do notebook. Sim, Zatanna estava certa, ela não tinha tempo para criar uma nova coleção do zero, então apenas começou a fazer reparos para que ficasse pelo menos, aceitável.
— Sabe o que eu percebi, desde que cheguei aqui não vi nenhum alerta de — Ravena para subitamente ao ver a luz vermelha ocupar a sala — ...crime. Só foi eu falar.
Dick se levantou indo em direção ao controle central.
— Maluco do Controle, corrompeu várias tv no centro da cidade e está causando o maior caos — girou sobre seus calcanhares. — Já que estamos sem Karen e Ciborgue, precisaremos de uma mãozinha, quem será a voluntária?
Dirigiu seu olhar para Ravena e Zatanna.
— Eu passo, tenho que arrumar esses design — Ravena cutuca a amiga com o cotovelo. — Pode indo, você vai adorar dá uns belos socos em alguma coisa.
Zatanna bufa alto e se levanta já andando em direção ao elevador.
— Eu deveria dá uns socos em você, isso sim seria adorável — resmungou usando sua magia para colocar seu traje.
— Nossa amor, que bicho te mordeu? — Sorrindo travessa, Ravena gargalhou e voltou sua atenção para o trabalho. — É melhor vocês irem logo, Maluco do Controle está fazendo a maior bagunça. E falem para ele que eu mandei um enorme vai se fuder.
Os garotos deram risada e foram atrás de Zatanna, mas sem antes se despedirem dos gêmeos que desenhavam no chão perto da escada do elevador com Silkie ao lado dormindo.
— Tome cuidado. — A voz de Ravena reverbera sobre a mente de Garfield que parou de súbito sobre a frente do elevador. Sorriu de lado e apenas pensou um — eu sempre tomo — como resposta.
Depois que eles se foram, a Torre se encontrava na maior paz para Ravena, apenas era revestida pelas vozes dos gêmeos e suas risadas que faziam Ravena virar a cada 5 minutos para olhá-los e se derreter inteira.
— Acho que não deveria alterar tanto esse design, assim está bom — Conhecimento aconselhou.
— Pelo amor de Deus, Conhecimento esse desenho está horrível, nem uma velha de 86 anos usaria esse treco — Grosseria contrapôs.
— Você nunca gosta de nada Grosseria, sempre do contra — Conhecimento murmurou monótona.
— Ora pois sua...
Enquanto a discussão rolava solta na mente de Ravena, ela apenas escutava e dava risada com certas ofensas vinda da parte de Grosseria. Fazia pequenos reparos, estava sem um pingo de paciência para ver todos aqueles designs mau feitos e muito menos ter que tentar salvá-los do pleno desastre.
A mesinha de centro começou a vibrar, Ravena ergueu seu olhos e viu que seu celular tocava, se esticou e o pegou. Um número desconhecido a ligava. Enrugou seu nariz e atendeu.
— Alô?
Apenas um leve chiado e uma respiração era ouvida pela linha.
— Eu estou ouvindo sua respiração, então se não responder eu irei desligar!
— Para que todo esse estresse, passarinho?
Ravena gelou e sua mente ficou nublada. Não, não, não, não. Sua mente estava um completo caos.
— Deixei você sem palavras, não é? Tudo bem, não quero que você fale e sim me escute. Achou mesmo que iria fugir com meus filhos e ficar brincando de esconde-esconde? Eu quero você e meus filhos de volta.
— Eles não são seus filhos!
— Sim, eles são, e você sabe muito bem disso. Pode fugir o quanto quiser passarinho, eu sempre acharei você.
E assim, a ligação se encerra deixando Ravena ainda mais atormentada do que já estava. Tentou ligar novamente para o número mas apenas caía na caixa postal.
Ravena estava assustada, sim, muito assustada, mesmo que odiasse admitir estava com medo do que poderia acontecer com ela e seus filhos. Sabia que não podia subestimar ele, ela era esperta o bastante para temê-lo e tinha a plena convicção de que os anos que passou fora do rastro, foram porque ele permitiu isso. Pois se ele queria, ele conseguia, e isso a assustava.
— Mamãe? — Luke se sentou ao lado dela procurando seu olhar.
— Hum, o que? — Ravena saiu de seus devaneios e o olhou.
— Tá tudo bem? — Tombou sua cabeça para o lado preocupado.
— Está sim querido, por quê... por quê não estaria?
— É que a senhora estava mexendo ai nesse treco e do nada parou e ficou no mundo da lua.
A explicação de Luke fez ela franzir o cenho, olhou para sua mão e não viu seu celular que jurava que segurava, mas assim que direcionou seu olhar para a mesa de centro e o encontrou intacto no lugar, um arrepio em sua espinha surgiu.
— A ligação não foi quebrada... — Conhecimento murmurou com sua voz distante. — Mas nós quebramos a ligação, fizemos o feitiço, como pode ainda estar atado? — Perguntou mais para si mesmo do que para as outras.
— Isso é ruim, muito ruim. — Murmurou Tristeza, chorosa.
— Mamãe? —Eleanor estava parada em frente a ela com seus olhos preocupados.
— A mamãe não falou com ninguém no telefone?
Os gêmeos balançaram a cabeça em negação e Ravena sentiu seu coração errar as batidas. A ligação que ela achava que tinha desfeito com o pai de seus filhos ainda estava intacta, e se culpou por não ter percebido isso antes. Ela sabia que tinha algo de errado, sentia isso todos os dias, como uma sensação que a perseguia dia e noite. Nunca soube explicar o que era esse sentimento de desconforto, mas agora tinha sua reposta e não podia ser pior.
— Mamãe? — Luke segurou sua mão em um aperto forte e preocupado. — Tá tudo bem?
Ravena o puxou para um abraço e trouxe Eleanor junto depositando beijos em suas cabeças.
— Sim está tudo meu amor, tudo bem, está tudo bem. Não precisa ficar preocupado, tudo irá ficar bem.
Zatanna e os outros entraram na sala e a encontraram totalmente vazia e sem nenhum vestígio de Ravena e as crianças. Ela na hora franziu o cenho e olhou confusa para Kori.
— Onde eles estão? Não estou sentindo a presença deles em nenhum lugar. — Caminhou até Silkie que ainda estava no mesmo lugar e a pegou no colo fazendo uma leve carícia em sua barriga.
— Não faço a mínima ideia. Onde será que eles estão? — Timothy perguntou se sentando no sofá.
— Devem estar na livraria do shopping, vai ter história para as crianças e o atendente engomadinho convidou ela e as crianças para ir. — Garfield resmungou enciumado, mesmo que não queira admitir ele se sentia incomodado por Ravena e Ethan estarem se "aproximando".
Dick soltou uma gargalhada e deu tapinhas em suas costas.
— Está dando muito na cara amigão. — Sussurrou brincalhão.
— Vai ser ferrar Dick — murmurou estressado.
Ravena caminhava no corredor imenso do shopping de mãos dadas com seus filhos, um de cada lado. Tinha decidido de última hora que os levaria para a livraria, no intuito de conseguir se desfocar da curta e atordoante ligação que ocorrera mais cedo. A mente de Ravena era um campo de batalha, na onde ela era á que mais apanhava.
Enquanto caminhavam em direção a livraria, ela acabou percebendo que muitos do que passavam por eles acenavam e distribuíam sorrisos calorosos. Então percebeu que o motivo de toda atenção, era seus filhos animados que pulavam enquanto andavam cantalorado alguma música de pouco conhecimento de Ravena.
Assim que adentraram a livraria, caminharam até depois das mesas a onde várias almofadas estavam postas no chão. Havia em torno de 10 à 15 crianças presentes ali, Luke e Eleanor correram para se sentar em um dos lugares vagos logo a frente. Ethan sentado em uma cadeira comprimentou Ravena com um sutil sorriso e seu rubor nas bochechas fez a atenção dela aparecer. Talvez seja verdade, ela pensou.
Se sentou em uma das mesas perto o bastante para poder ouvir a história mas sabia muito bem que não ouviria nem uma palavra sequer.
Quando Ethan começou a leitura, ela se perdeu em sua mente. Sua cabeça dava indícios de uma enorme enxaqueca surgiria e um leve embrulhar no estômago a fez estremecer.
— Mantenha a calma Ravena, não deixe o medo te corroer, você precisa estar com sua mente em ordem para passar por tudo isso. — Sabedoria aconselhou com uma leve pitada de reprovação.
Como manterei a calma quando a vida de meus filhos estão em risco? Ela se perguntou. Virou seu olhar para encará-los, estavam tão concentrados em ouvir Ethan que seus olhos até brilhavam de tamanha animação. Seu coração palpitou forte com uma onda de emoção que a fez quase sufocar.
Medo.
Ela tinha medo de um dia saber que seus esforços para manter seus filhos seguros não foi suficiente o bastate. Ela não queria sentir medo, não queria sentir ele se enlaçando ao redor de seus ossos, apertando tanto que ela quase não conseguia respirar, quase não conseguia ouvir o pulso acelerado em seu sangue conforme ele sobe pela sua pele e toca os cabelos macios de sua nuca com seus lábios suaves.
O medo deixa mentiras em seu coração, deita-se ao seu lado à noite, suga a luz de cada canto. É uma companhia constante, enganchando a mão para puxá-lo para baixo enquanto você luta para ficar em pé.
Mesmo que nunca quisesse admitir em voz alta, ela temia o seu passado. Temia as coisas obscuras que ele carrega e suas devidas consequências qua trariam para si mesma e para sua família.
Olhando para seus filhos, a única certeza que ela tinha em seu coração é que faria tudo novamente por eles. Sem pestanejar, lutaria contra tudo e todos para ver seus filhos sã e salvos, ela daria sua vida por eles.
Depois de 3 histórias contadas, os pais e as crianças vão indo embora aos poucos. Ravena apenas acena para alguns deles preguiçosamente, e sorri sutilmente. Se levantou indo em direção a Ethan que observava os gêmeos dedilhar o livros infantis na estante.
— Eles são tão adoráveis — Ethan comentou quando a viu parar ao seu lado.
— Eu sei. — Sorriu quando viu Luke acertar um tapa não não de Eleanor por pegar um livro favorito dele.
— Posso perguntar uma coisa? — Se virou para olha-lá melhor e Ravena fez o mesmo.
— Claro.
— Você nunca pensou em voltar ser uma heroína? Depois do nascimento deles?
Ela sorri, e balança a cabeça.
— A única heroína que eu quero ser é para os meus filhos, e somente para eles.
Desde que Ravena e as crianças chegaram na Torre, ela havia ficado silenciosa e distante, quando perguntavam se estava tudo bem ela respondia um mero "estou bem". Era uma enorme mentira, nada estava bem, tudo desmoronava aos poucos na sua mente e isso a perturbava. Estava perdendo o controle da situação.
Zatanna sabia que havia algo de errado, assim que viu Ravena adentrando a sala com seu cenho franzido e seu corpo tenso, ela sabia que algo tinha acontecido. Ela chegou até perguntar o que tinha acontecido, mas Ravena sempre se esquivava fugindo de responder, pois sabia que se Zatanna colocasse uma leve pressão ela iria falar pelos cotovelos.
Ravena sentia-se cansada, um cansaço que a consumia aos poucos, uma sensação que fazia seu coração se estilhaçar, uma angústia que percorria pelo seu corpo se entrelaçando com seus ossos e os apertando que ela quase achava que poderiam se quebrar. Ela se sentia frágil, frívola, e quebrada.
Havia traumas presos em seu coração, estavam cavados tão fundo que era totalmente difícil falar sobre eles em voz alta. Somente uma vez ela chegou a falar sobre eles, somente com seu pai ela se deu a liberdade de colocá-los para fora.
— O que está fazendo? — Ouvi uma voz atrás de si, se virou vendo Garfield escorado no batente da porta da cozinha.
Usava apenas uma calça moletom, deixando seu torso todo a mostra. Ravena engasgou com sua própria saliva. Ela tinha que admitir, Garfield tinha adquirido um corpo completamente estrutural.
— Ai. Meu. Baguete. Cacete! Ai meu cacete! — Luxúria berrou na mente de Ravena.
— É... eu... bem... hãn... eu... — engoliu em seco e balançou sua cabeça. Encontrou o olhar de Garfield sobre si e corou. — Eu... e-estava lendo.
Ergueu o livro com sua mão direita e deu seu melhor sorriso amarelo. Sua intenção de quando saiu do quarto era ler e acalmar sua mente, mas nem tinha lido uma página sequer.
Garfield sorriu e arqueou uma sobrancelha.
— Uh, lendo? Então, quantas páginas você leu?
Ravena bufou e fechou a cara. — Ok, eu não estava lendo, você me pegou.
Ele sorri ainda mais e se senta ao lado dela no sofá. Não cansava de se admirar com a beleza dela, a luz do luar que iluminava toda a sala, deixava a pele de Ravena levemente azulada e seus olhos ametistas ainda mais brilhosos.
— Por quê está me encarando?
— Por quê está tão distante?
— O quê?
— Está estranha, desde que chegou da livraria, aconteceu alguma coisa? — Ela apenas abriu sua boca mas logo a fechou com as palavras embrulhadas em sua garganta. — Você está bem?
— Não — sussurrou. — Não, eu não estou bem.
— O quê aconteceu Rae?
— Não sei, é tudo tão... confuso e estranho. Me sinto perdida no meio de todos esses acontecimentos, sinto que talvez meus esforços para manter tudo no controle não foi o suficiente. Aconteceu muita coisa de 5 anos para cá, e eu ainda não consigo assimilar, não consigo superar. Me sinto sozinha e desorientada, me sinto frágil.
Ele segurou sua mão em um aperto forte e acolhedor, seus olhos verdes e profundos faziam o estômago de Ravena revirar.
— Você não está sozinha, estamos aqui.
— As coisas não são tão fáceis assim Garfield. — Balbuciou fechando seus olhos.
Ele respirou fundo e a puxou para um abraço. Ela no mesmo instante retribuiu e se deu o proveito de apreciar o aperto confortável que sentia.
— Eu sei que não é nada fácil, tem muita coisa nessa história que eu não entendo e talvez nunca vá entender, mas eu estou aqui para te ajudar, para fazer tudo isso ser mais suportável. Não precisa passar por tudo isso sozinha, eu estou aqui, e se você deixar, eu cuidarei de você.
Ela ergueu sua cabeça para encará-lo nos olhos. Em apenas um olhar, Garfield conseguia fazê-la desmoronar. Seu olhar curioso, atencioso, amoroso, era um tiro no pé para ela.
Selou seus lábios nos deles em um beijo suave e lento, sem pressa alguma. Sua mão acariciava a bochecha dele em um carinho confortável. Quando se separaram, ele sorriu corado.
— Você tem que parar de fazer isso.
Ela o olhou confusa e tombou a cabeça para o lado. — Fazer o que?
— Me beijar. Seus lábios me deixam completamente louco. Você me deixa louco.
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