~Billy~
Abri os olhos, bocejando. Fiquei incomodado com a claridade do sol entrando por uma das janelas; Max estava deitada em cima do meu braço, nós dois acabamos dormindo no sofá na noite anterior, o que estava se tornando comum.
Estendi o braço para pegar o relógio na mesa da sala, já que eu estava com a estranha sensação de estar dormindo demais; arregalei os olhos.
– Max – chamei; ela resmungou. – Max, acorda... estamos atrasados. O relógio não tocou.
– Eu sei – ela disse, sem abrir os olhos.
– Como assim?
– Eu desliguei o alarme – Max se aconchegou mais perto de mim, me abraçando tranquilamente.
– Por que? – ela suspirou.
– Porque não quero ir para a escola hoje.
– Não existe essa opção, Maxizinha. A escola é um saco, mas temos que ir – mesmo dizendo isso, continuei deitado ao lado dela, brincando com as mechas ruivas de seu cabelo, sentindo o cheiro doce do shampu.
– Podemos faltar... – Max enroscou as pernas nas minhas; estava ficando cada vez com menos vontade de levantar.
– E quando o Conselho Tutelar aparecer aqui procurando por você...? – ela finalmente abriu os olhos e me encarou.
– Não seja dramático, é só hoje, só um dia... – era impossível dizer não para Max, ainda mais quando ela me olhava daquele jeito e me abraçava como se não quisesse me soltar nunca; como alguém em sã consciência poderia recusar algo assim?
– Só hoje – concordei e ela sorriu. – Então quais são os planos para hoje?
– Primeiro dormir mais... estou exausta – nas últimas semanas estávamos tendo mais aulas no período da manhã, então acordávamos mais cedo e, geralmente, nos finais de semana, meu pai e a Susan faziam tanto barulho pela casa que era impossível descansar; eu podia entender ela querer dormir mais, eu também queria. – E... bom, a trilogia de Halloween vai passar naquele cinema drive-in, pensei que seria legal se fôssemos...
– Cinema? – arqueei as sobrancelhas. – Por acaso está me convidando para um encontro, Max? – ela corou.
– Ah... não... não foi isso que eu... eu... se achar estranho... – ri enquanto ela se enrolava nas palavras.
– Estou brincando. Podemos ir sim.
Eu ainda tinha minhas dúvidas sobre o que as pessoas pensariam sobre nós... Max também não ficava muito confortável por causa da relação, de certa forma, familiar, que tínhamos... e eu não me sentia bem pelo fato de ela ser mais nova e de como poderiam acabar comigo por esse detalhe irritante. Não era grande coisa, mas o suficiente para que houvesse comentários e era algo que eu estava tentando evitar...
Mas um drive-in parecia uma boa ideia. Ninguém ia achar estranho que nós dois estivéssemos dentro do carro juntos assistindo um filme... E duvidava que as pessoas fossem ficar reparando no que fazíamos ou não ali. É, até que parecia um bom plano.
~Max~
Eu não tinha parado para pensar no quanto ir ao cinema drive-in parecia um encontro até o momento em que Billy mencionou isso... Mas, para ser sincera, eu até que gostava da ideia de ir a um encontro com ele. Nossa relação era meio conturbada e nada convencional; a única vez em que tivemos, de fato, o que parecia ser um encontro foi na Califórnia e tinha sido incrível. Essa era uma das coisas que eu sentia falta, um dos motivos que me fazia duvidar que nós dois daríamos certo, porque eu gostava dessas coisas mais tradicionais e comuns num namoro. Essa era uma boa chance de Billy e eu vivermos isso de novo; talvez eu estivesse começando a considerar continuar com Billy...
Não estava sentindo falta de um relacionamento com o Lucas, considerando que éramos literalmente mais como amigos; se Billy e eu pudéssemos sair juntos para ir ao cinema ou coisas assim, quem sabe pudesse dar certo. Não brigávamos havia muito tempo e ele estava sendo legal comigo... a ponto de eu imaginar que ele tivesse mudado mesmo e deixado aquele comportamento explosivo para trás.
Talvez a ausência frequente do Sr. Hargrove estivesse influenciando essa situação e eu não podia ser mais grata por ele e minha mãe passarem tanto tempo trabalhando.
Nós dormimos até o horário do almoço, no sofá, como se não tivéssemos preocupações; seria ótimo se todos os nossos dias pudessem ser assim.
– Eu ainda prefiro o primeiro filme – falei, enquanto Billy dirigia até o drive-in. – Claro, os outros dois são legais também, aquele suspense, a música... mas o primeiro é um clássico, conta a história do Michael Myers, a origem e o desenvolvimento dele. Esse é o principal. O que você acha? – Billy riu.
– Não sei, Max. Nunca assisti esses filmes – olhei para ele, boquiaberta.
– Como assim você nunca assistiu Halloween? – Billy deu de ombros.
– Eu não costumo ver filmes assim... nunca vou no cinema e acho que terror não é meu gênero favorito, prefiro ação – pisquei várias vezes; ainda assim era uma surpresa, afinal eu via esses filmes milhares de vezes e Billy estava sempre por perto... como é que ele poderia nunca ter visto sequer algum trecho?
Mas outra coisa me ocorreu.
– Você concordou em vir mesmo não gostando? – isso com certeza não combinava em nada com a personalidade do Billy.
– Sei que você gosta dessas coisas...
– Então está indo só por minha causa – Billy desviou os olhos da rua para mim.
– Max, sabe que eu faço qualquer coisa que me pedir, não é? – senti meu coração errar s batidas enquanto encarava aqueles olhos verdes, os cachos louros sobre seu rosto... muito diferente da pessoa que era quando chegamos aa Hawkins.
Não era mais aquele cara cheio de raiva, que acelerava com o carro para me assustar, gritava comigo e me xingava de todas as maneiras possíveis. Billy me tratava bem agora... às vezes ele ainda se irritava com coisas idiotas, mas nunca mais levantou a voz. E eu adorava essa nova versão dele. Achei que tudo voltaria a ser uma merda depois da Califórnia, mas surpreendentemente, não estava ruim.
Pensei sobre o que conversamos antes de voltarmos para Indiana... Billy disse que me amava. E eu fui uma escrota dizendo que isso não fazia diferença nenhuma... a verdade era que fazia sim. Essas palavras mexiam comigo e eu ainda não sabia como lidar com elas.
Isso era amor? Essa mudança toda, o jeito que ele estava agindo, me tratando, falando... era amar alguém? Se fosse, talvez eu devesse começar a cogitar que o amava também, mas não podia dizer sem ter certeza. Precisava pensar mais sobre esse assunto... mas estávamos indo por um caminho ótimo.
~Billy~
Eu achava impressionante como Max conseguia se empolgar com aquilo. Eram apenas filmes de pessoas sendo assassinadas com efeitos especiais da década anterior e sexualmente apelativo, mas ela conseguia falar sobre cada cena, dizendo os pontos positivos e negativos do roteiro, das filmagens, dos atores, do figurino, do ambiente...
Estava claro que ela já tinha assistido um milhão de vezes; a maioria delas com o idiota do pai, até onde eu sabia. Max falava as frases junto com os personagens e, ainda assim, ficava encantada com o desenrolar do filme. Fiquei quieto, só observando e respondendo quando ela me perguntava o que eu estava achando. Se fosse um cinema numa sala fechada, tinha certeza que brigariam com ela por não parar de falar, mas eu não me importava.
Francamente, o mais fascinante desse “encontro” era vê-la feliz assistindo àquela porcaria; eu nem prestava muita atenção nos filmes.
Coloquei o braço ao redor do ombro dela e parecíamos mesmo um casal; eu não podia negar que gostava dessa sensação. Era muito diferente de qualquer coisa que eu tivesse feito antes; não era assim, eu não levava garotas para jantar ou para ir ao cinema ou conversar... Era mais prático, menos emocionante. Mas com a Max era diferente e eu queria que continuasse assim.
Depois de quatro horas e meia, dois baldes de pipoca e três garrafas de coca-cola, finalmente saímos do drive-in.
– Quer dirigir? – perguntei.
– Sério?
– É. Mas tem que fazer exatamente o que eu digo – como nas outras vezes em que a deixei dirigir; o sol estava se pondo, mas ainda teria claridade o suficiente a ponto de ser seguro que ela dirigisse tranquilamente e Max já estava começando a melhorara no volante.
– Ok – ela sorriu radiante; era engraçado. A maioria das meninas não tinha o menor interesse em aprender a dirigir ou ter um carro, mas Max ficava encantada todas as vezes em que eu a deixava assumir a direção.
Nós trocamos de lugar; Max nem esperou que eu desse instruções e fez como eu tinha ensinado antes, arrumando o banco, o cinto e os retrovisores.
~Max~
Billy ia me dizendo o que fazer, embora eu já estivesse pegando o jeito de dirigir; ficava mais fácil com o tempo e a prática, embora eu ainda me confundisse com as marchas e a embreagem, no geral, considerava que estava indo bem.
Consegui chegar em casa e nós dois ainda estávamos inteiros... só não sabia estacionar direito ainda, então Billy voltou para o banco do motorista assim que chegamos.
– Está indo bem, acho que vou te deixar dirigir mais vezes – sorri.
– Seria ótimo... – pensei em como seria a reação das pessoas da escola se eu chegasse dirigindo; talvez Billy não fosse deixar tanto assim, já que, em teoria, eu não tinha habilitação, então podia dar muita merda se algum professor visse. – Billy? – chamei antes de descermos do carro; ele olhou para mim.
– O que?
– Obrigada por ter ido comigo – o fato de ele não gostar desse tipo de programa e, mesmo assim, ter concordado em ir comigo me deixava feliz... ainda meio surpresa com esse comportamento diferente, mas extremamente feliz.
– Eu que agradeço pela ideia de cabular as aulas de hoje, foi incrível – ele se aproximou de mim, com o polegar sobre a minha bochecha e me beijou; foi um beijo sutil, diferente dos que eu estava acostumada e gostei disso. – Podemos pedir uma pizza, o que acha?
Era tudo o que faltava para o dia ser perfeito.
Eu concordei; nós entramos e, pouco tempo depois, estávamos sentados no sofá, rindo, sem ver a hora passar. Comemos quatro pedaços de pizza cada e conversamos sobre algumas lembranças da Califórnia... as lembranças boas, antes de nos mudarmos e durante a viagem que fizemos no último ano, mas nenhum de nós mencionou as partes ruins. Aquele não era o momento para falar pontos negativos.
– Vamos jogar? – pedi.
– Jogar o que?
– Videogame, óbvio – Billy franziu o cenho.
– Não tenho mais idade para essas coisas, Max – eu nunca o tinha visto jogar, nem quando era mais novo... então essa desculpa não colava.
– Vamos, vai. Só um pouco – sentia falta de jogar videogame com os meninos, especialmente com Dustin... éramos bem competitivos, mas já tinha um tempo que não jogávamos porque agora ele passava mais tempo com o Will, o Mike e o Lucas jogando D&D num clubinho onde garotas não eram permitidas.
– Eu já não fiz muito do que você queria por hoje?
– Por favor – pedi, olhando para ele do jeito mais fofo que consegui.
– Eu nem sei jogar essas coisas...
– Eu ensino você – Billy deu um longo suspiro.
– Tá bem... – abri um sorriso de orelha a orelha e fui pegar os controles. – Só você para me fazer jogar videogame... francamente... – ele murmurou.
Expliquei rapidamente as instruções de como jogar e como usar os controles; expliquei as regras do jogo e, minutos depois, começamos as partidas.
~Billy~
– Você é péssimo! – Max falou, rindo, depois de ganhar o que provavelmente foi a vigésima partida.
Revirei os olhos. Eu nem queria jogar aquela merda. Fora que Max estava jogando sentada no meu colo, o que não ajudava muito na minha concentração.
– Eu não sou nerd, como você, lembra? – ela continuou rindo.
– Eu sabia. Você não podia ser bom em tudo, tinha que ter alguma coisa errada...
– Ah, você me acha bom em tudo?
– Agora não mais – ela apontou para a pontuação na TV. Arqueei a sobrancelha. Tinha se tornado uma questão de honra.
– Garanto que venço você na próxima partida – merda, era assim que se viciava em videogame?
– Duvido.
– Quer apostar? – Max estreitou os olhos.
– Quero. O que vamos apostar? – estava começando a ficar mais interessante.
– Se você ganhar, pode escolher qualquer coisa que quiser para eu fazer.
– Qualquer coisa? – ela deu um sorrisinho.
– Qualquer coisa – concordei, sorrindo de volta, com um plano em mente. – Mas, se eu ganhar, eu escolho algo e você vai ter que fazer.
– Feito – Max disse, decidida, estendendo a mão para mim e eu apertei.
Ela apertou o “play” e, segundos depois, voltou a jogar com o mesmo fervor de antes, com a certeza de que não tinha como perder; mas a minha estratégia funcionaria.
A princípio, joguei também, marcando alguns pontos, só para obter uma certa vantagem; então aproximei os lábios de seu pescoço e comecei a beijar.
Senti Max se arrepiar e, por um momento, ela vacilou com o controle na mão; continuei acariciando sua pele com a língua, ao mesmo tempo que jogava. Ela, no entanto, não conseguia fazer os dois ao mesmo tempo e inclinou a cabeça para trás, apoiando no meu ombro, deixando o pescoço mais à mostra.
Mordi sua clavícula e ela arfou baixo, soltando de vez o controle, ao mesmo tempo que, na tela, apareciam as palavras “game over” e eu sorri.
– Ganhei – sussurrei. Max me encarou, indignada.
– Isso não valeu! Foi trapaça!
– Seria trapaça se eu tivesse quebrado as regras, mas, como não impusemos nenhuma... – ela cruzou os braços, ainda perplexa. – É o combinado – falei, também largando o controle e deslizando os dedos sob suas coxas.
– Não é justo, Billy.
– Acho que nós dois já concluímos que a vida não é justa... – beijei sua bochecha. Ela bufou, meio irritada; eu me divertia com a situação.
– Então o que você quer?
– Foi uma boa aposta com um prêmio genial... preciso de um tempo para pensar – embora eu tivesse algumas ideias em mente. – Assim que eu souber exatamente o que quero, te aviso.
Max assentiu, ainda de mau humor, mas eu diria que aquele dia não tinha como ser melhor.
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