Lee Hyuna
Acabada.
É assim que eu estou me sentindo após a tragédia que foi aquele fim de semana. Hoje ainda é quarta, e eu já estou um pouco melhor se compararmos a minha situação de dois dias atrás, mas Namjoon continua me evitando desde então e só responde as minhas mensagens com poucas palavras.
Assisto minhas primeiras aulas na universidade, mas a vontade que tenho é de cruzar o campus e invadir o departamento de Economia para procurá-lo. Uma pena que isso geraria burburinhos, e deixaria ainda mais óbvia a crise na nossa relação.
Meus seguidores não podem desconfiar.
Decido, então, esperar até o horário do almoço. Agora, tudo que posso fazer é prestar atenção nas falas do senhor Han. Ele é um senhorzinho chato, e aposto que não conhece as redes sociais na prática tanto quanto eu, porém, ele também é amigo dos meus pais. Isso significa poder ganhar alguns créditos com eles sobre o meu bom desempenho, e arrancá-los elogios, quem sabe. Não me recordo muito bem da última vez em que isso aconteceu comigo, porque de fato, é raro.
Mas não os julgo. Ultimamente, só tenho passado os dias fazendo compras, tirando fotos e gravando lives no meu mundinho chamado quarto. São as únicas coisas em que eu sou boa, ao contrário de Wonjae, meu irmão mais velho.
Ele sim é alguém a se admirar, afinal, é o herdeiro dos restaurantes dos nossos avós. É a prova viva de que a tradição da nossa família irá perdurar em boas mãos, e eu não poderia tirar a razão dos meus pais. Jae é merecedor de todo orgulho do mundo.
Pego minha bolsa e saio da sala assim que o senhor Han finaliza seu discurso sobre as métricas do Marketing, rumando o lado de fora do prédio. Outros estudantes seguem o mesmo caminho que eu até o centro do campus, e não deixo de notar os olhares sobre mim. Ergo a mão e balanço os dedos num aceno. Quase pergunto se eles também desejam uma foto, mas sou interrompida pela visão de Namjoon no refeitório.
E não parar para admirá-lo é quase impossível pra mim. Ele está sentado numa das mesas redondas, acompanhado de mais três rapazes e duas garotas. Sei por alto de quem se tratam. São todos integrantes do clube de política, assim como o próprio Namjoon.
Ele parece entretido, discutindo algo realmente interessante enquanto sorri e deixa as covinhas à mostra. Ver essa cena deixa meu peito apertado. Talvez eu só não seja a melhor pessoa para debater bolsa de valores e economia internacional, mas queria conseguir prender a sua atenção tanto quanto essas pessoas à sua altura fazem.
De repente me sinto pequena, parada como um poste no meio do pavimento lotado, tendo esses pensamentos sórdidos que acabam me colocando mais pra baixo do que eu já estou. Meus dedos apertam uns aos outros, num sinal claro de que não sei o que fazer. Devo ir até ele? Devo voltar e simplesmente fingir que nada aconteceu?
Bom, não há tempo de decidir. Uma das garotas nota o meu olhar nada discreto direcionado a eles, e demora apenas alguns segundos para que toda a mesa me encare de volta.
Inclusive Namjoon.
Levo isso como um sinal imediato para que eu pare de relutar e faça alguma coisa antes que tudo entre nós se torne evidente. Então, sorrio. Como uma verdadeira namorada apaixonada que sou, sorrio, e praticamente desfilo até o local em que ele está, mantendo o meu melhor semblante de que está tudo perfeitamente bem.
— Olá! — cumprimento a todos, erguendo o queixo numa postura confiante. — Se importam se eu roubar o meu namorado por alguns minutos?
Alguns dão risadinhas, outros começam a cochichar, e, bom, eu não dou a mínima para o que eles falam, no momento meu foco está apenas em Namjoon. Estendo a mão para ele e lhe olho nos olhos, esperando sua atitude. Após alguns segundos que mais se parecem uma eternidade, ele suspira, e ainda que a contragosto, entrelaça os dedos nos meus.
Além do nervosismo, sinto minha claustrofobia a ponto de atacar enquanto passo por entre dezenas e dezenas de pessoas com Namjoon ao meu encalço. Ele não diz nada e não sei se isso é bom ou ruim, apenas sigo andando até encontrarmos um local mais calmo para conversar.
A biblioteca está vazia, e agora, de frente pra ele numa mesa, fica realmente na cara que agi por impulso ao trazê-lo. Mal sei por onde começar.
— Estou esperando, Hyuna. — Namjoon cruza os braços, cortando o silêncio. Seus olhos passeiam de lá pra cá nos meus de um jeito cansado. — Por que me trouxe aqui?
— Não é óbvio? — rio de nervoso, seguindo em frente com o diálogo pelo único e exclusivo fato de não existir uma escapatória. — Precisamos conversar, não?
— Não sei. Precisamos?
— Namjoon… — respiro fundo, espalmando minhas mãos na mesa, aflita. — Não dá pra ficarmos assim. Eu sei que estraguei tudo e assumo a culpa, mas… pensei que você só estava de cabeça quente, e que a raiva seria passageira. — engulo em seco, temendo sua resposta. — Pensei que você procuraria me entender.
Ele se inclina sobre a mesa, ficando mais próximo.
— Vou ser bem sincero. — começa. — Aquela noite era algo que tínhamos planejado há um tempo, e realmente fiquei frustrado com as coisas que aconteceram, Hyuna. Ou melhor, que deveriam acontecer. — ele me olha, irônico. — Eu sou um homem, e você é uma mulher. Nós namoramos, e o certo é fazermos o que namorados fazem, mas você simplesmente nunca dá o braço a torcer. Parece que não confia em mim!
O som da sua palma batendo na mesa me faz estremecer.
— É claro que eu confio! Confio em você sim, mas…
Travo.
Minha boca fica entreaberta, mas de dentro dela não sai nada. É difícil proferir que, na verdade, não confio em mim mesma. Certamente soaria como uma mentira esfarrapada, já que ele nunca questionou, ou, talvez, sequer imaginou que há um real motivo por trás do meu bloqueio. Aos olhos de Namjoon, e de todas as outras pessoas, sou uma mulher extremamente segura de si, popular, que exala confiança em um simples caminhar, o que piora toda a minha situação.
Temo decepcioná-lo, porque carrego um total de zero experiências na cama. Isso é o oposto do que a minha aparência imponente supõe, e o oposto do que Namjoon espera de mim.
— Sempre tem um mas. — retomo a consciência quando ele suspira alto, negando com a cabeça. — Sabe, se tornou cansativo, Hyuna. Não queria ter que apelar pro pior jeito, mas a partir de agora, tudo depende de você.
Franzo o cenho.
— Do que está falando?
— Disso. — apontou pra si mesmo, e depois pra mim. — De nós dois, da nossa relação, e de como eu não tentarei mais nada até você me provar que estive errado sobre essa situação. — ele me faz estremecer. — Quero que você me mostre que está realmente afim, e então levaremos isso para frente, do jeito certo, como deveria ter sido desde o início.
Pisco os olhos diversas vezes, tentando processar.
Ouço seu relógio de pulso apitando, marcando o fim do horário de almoço, e consequentemente o início das aulas do período da tarde.
Como um aluno extremamente exemplar, é fácil prever que ele não ficará para ouvir minha resposta.
— Preciso ir.
— Espera. — me ponho de pé, barrando sua passagem. Nos encaramos, mas parecemos distantes, ainda que somente dois passos nos separe. Deixo as mãos caírem na lateral do corpo em um gesto de pura chateação. — Você vai mesmo agir desse jeito?
Namjoon enfia as mãos no bolso da calça social, exalando normalidade. Os olhos vão dos meus pés até a cabeça, num julgamento silencioso que prefiro não imaginar o motivo.
— Só estou lhe dando uma última chance de salvar nosso namoro.
Me sinto avoada, perdida na sua fala, enquanto ele passa por mim e esbarra propositalmente no meu ombro. Eu tento, mas não consigo reprimir meus próprios sentimentos desta vez.
Suas palavras foram simples e diretas, mas tão dolorosas como uma facada no peito.
(...)
— Esse cara é um babaca.
Prendo o celular entre o ombro e a orelha, puxando mais um pedaço do rolo de papel higiênico para limpar as lágrimas que continuam escorrendo pelo meu rosto, manchando minha maquiagem e, na pior das hipóteses, a minha reputação também.
Já faz quase meia hora que estou sentada no vaso sanitário de um dos compartimentos do banheiro interditado do refeitório, me desabando em lamentações para Elenna, minha única amiga, e, por sorte, minha prima. É ela quem sempre me aconselha nos meus piores e melhores momentos desde nossa infância, independentemente da diferença de idade.
E agora, por mais que eu tenha quebrado totalmente o nosso juramento de jamais chorar por homens, é ela quem me escuta fungar pelo outro lado da linha.
— Mas é o cara que eu amo. — choramingo. — O que eu posso fazer?
— Dar um pé na bunda dele de uma vez por todas seria uma ótima opção. — ela diz, sem sequer alterar o tom de voz. Ao contrário de mim, Lenna é sempre muito realista, e vive abrindo meus olhos para tudo. — Não vê que ele só quer transar?
— Acha mesmo? — fungo, amassando mais uma bolinha de papel molhada, jogando-a no lixo.
— Prima, pense comigo. Vocês estão juntos a seis meses e aparentemente ele não levou nada do namoro em consideração, só a falta de sexo. E além do mais, você não tem experiência, não sabe do que gosta, ou como gosta. Ele deveria ser a pessoa mais paciente do mundo com você nesse momento.
— A culpa também é minha. Não consegui dizer que tenho insegurança, que sempre travo porque tenho medo. Eu não tenho essa coragem.
— Sei que você tenta passar uma visão cem por cento firme e confiante diante das pessoas, prima, mas nem sempre isso vai colar. Você também é um ser humano, e vai acabar expondo suas fraquezas uma hora ou outra, como agora.
Um desespero estranho toma conta de mim.
— Mas a questão é que eu preciso ser firme o suficiente para Namjoon, Lenna! Ele quer que eu prove que estou afim, que quero me entregar e que confio nele! — falo rápida. — Tenho mesmo que fazer isso, e logo, ou meu relacionamento estará perdido!
Ouço seu suspiro.
— Não minta pra si mesma, Hyuna. Sei que não se sente nem um pouco preparada pra nada disso.
Abaixo a cabeça, chorando um pouco mais. É ainda mais difícil saber que ela me conhece mais do que a mim mesma. Sou uma piada.
— Yah… — sua voz tenta me acalmar. — Se serve de consolo, acho que você não vai perder muita coisa indo pra cama com ele. Te garanto que existem caras muito mais sex appeal por aí que podem te mostrar o que é bom de verdade.
— Claro que não, Elenna! Ficou maluca? — retruco, um tanto ofendida. — Isso é algo totalmente fora de cogitação, e…
Paro de falar imediatamente. Meus olhos crescem após ouvir o clic da fechadura, seguido do arrastar da madeira da porta no piso do banheiro.
— Hyuna? — Lenna me chama, desconfiada. — O que houve? Alô?
Meu coração se acelera ao reconhecer o som dos solados de um par de scarpins. Não estou mais sozinha aqui dentro, e corro o risco de ser descoberta chorando em cima de um vaso sanitário interditado. Socorro.
— Faz silêncio. — sussurro rapidamente pra Lenna, abafando o celular com as mãos.
Torço para que ela tenha escutado, e somente ela.
Acho que funciona.
Os sapatos pretos se aproximam mais e param ao lado da porta da minha cabine. Eu consigo vê-los pela fresta, mas lembro que, se isso é possível, também posso ser vista, então recolho minhas pernas o máximo que eu consigo sem fazer barulho e prendo a respiração.
— Alô? Ah, oi, gato… — ela diz, adotando um tom manhoso totalmente de repente. — Sou eu, a da semana passada. Pensei que tinha trocado de número, já que não me atendeu das outras vezes…
Me encolho ainda mais sob a privada quando entendo que ela realmente está entrando na cabine ao meu lado e somente uma parede nos separa.
— Muitas clientes, entendi. — continua. — Sim, estou sozinha, mas qualquer pessoa pode me ouvir do corredor. Tentador, não? — sua risada sugestiva me faz querer sumir. — Uhum, podemos continuar de onde paramos naquele dia. Sou toda sua…
Não queria parecer tão fofoqueira assim, mas, ao mesmo tempo, não posso sair e simplesmente denunciar que estou matando aula num banheiro interditado. Então, mais uma vez, acabo me distraindo com os sons. Um zíper sendo aberto, uma calça indo ao chão…
Quando cai a ficha, me apavoro.
— Sua voz já me deixou completamente molhada… — ela começa a falar mais baixinho. — Sim, do jeito que você gosta.
Consigo ouvir o arfar assustado de Lenna pela ligação. Ela também escutou o que eu acabei de escutar.
— Quero que você me guie, hum? Eu faço tudo que você mandar, gato.
Tapo a boca com uma das mãos. Em todos os meus 23 anos de vida, nunca imaginei que estaria prestando esse papel de ouvir alguém sendo guiada a transar pelo telefone.
— Uhum… bem devagar, bem lá no fundo… — há barulhos molhados, e eu começo a entrar numa fase de total negação. — Oh, isso é tão bom! Continua sussurrando no meu ouvido, assim…
— Hyuna, sai daí! — Lenna murmura, em agonia.
Eu até gostaria de responder, mas não consigo, então desligo a chamada sem despedidas. Como as aulas terminam daqui a quinze minutos, minha única opção é ficar aqui até que dê o horário, ouvindo mais gemidos, presenciando cenas de prazer bem ao meu lado enquanto finjo que não estou passando por uma crise no meu namoro justamente por isso. Sexo.
A ironia do destino é gritante.
Dez minutos se passam e os ofegos, xingamentos e qualquer que sejam aqueles sons estranhos, ganham mais frequência, ainda que num tom contido. Alguma sensação realmente forte estava atingindo aquela mulher. Os arfares de “não pare” e “estou quase lá” com certeza vão me assombrar pelo resto da minha vida.
— Oh meu Deus, isso foi tão… uau — após alguns minutos ouvindo somente a sua respiração desregulada, ela diz, ainda sôfrega. — Porra, eu realmente estava precisando de você de novo. É uma pena que durou tão pouco, mas posso te convencer a fazer isso pessoalmente qualquer dia desses… — completa, e pelos barulhos, suponho que ela está voltando a se vestir. — Tá, tá, tudo bem, não está mais aqui quem falou…
Não entendo nada.
— Te transfiro o dinheiro ainda hoje. Preciso ir embora agora, ou vão acabar dando falta da minha presença. Até uma próxima, gato.
Uma onda de alívio me abraça. Finalmente a porta ao lado se abre, ela deixa a cabine e posteriormente o banheiro. Quando não escuto mais seus saltos, me permito sair do compartimento também. A primeira coisa que faço é encarar meu reflexo no espelho da pia, e por incrível que pareça, estou mais desacreditada com o que eu acabei de presenciar do que com a minha aparência completamente detonada.
Uma transa pelo telefone…
Bizarro.
Tento limpar o máximo que eu consigo da minha maquiagem manchada pelas lágrimas com um pouco de água, mas o rubor nas minhas bochechas não desaparece, tampouco o calor horrível que estou sentindo.
Ainda me sinto um tanto apavorada demais para pensar. Só sei que necessito de um banho gelado e caminho o mais rápido que posso para fora da universidade, no único e exclusivo pensamento de que preciso ir pra casa agora mesmo. Por sorte, a maioria dos alunos já foram embora. Vejo de longe o motorista dos meus pais plantado no estacionamento à minha espera e não penso duas vezes antes de correr até ele e entrar no carro.
O percurso dessa vez se torna lento e tortuoso. Minhas mãos ainda estão trêmulas quando chego em casa, e eu não faço ideia do porquê.
— Chegou mais tarde… — entro tão desconcertada que mal noto mamãe descendo as escadas. Ela não é de falar muito, mas quando quer, consegue me analisar bem. — Por que está tão assustada? Parece que viu um fantasma…
Engulo em seco.
— Quase isso.
E então, passo por ela como um furacão, subindo os degraus até meu quarto.
Na verdade, aquela trilha sonora foi pior do que qualquer cena de filme de terror. Gostaria de poder deitar, dormir e esquecer de tudo, mas não. Eu me conheço, e sei que ficarei intrigada por muito tempo. O jeito como aquela mulher estava realmente tomada pelo prazer, pela adrenalina, e principalmente pela voz do outro lado, fez parecer que o sexo pode ser realmente algo muito mais simples do que eu penso.
Então por que somente eu carrego todo esse medo? Qual o problema comigo?
Me jogo na cama e abro o aplicativo de mensagens no celular. Há uma notificação de Lenna, do momento exato em que desliguei a nossa ligação.
Prima [13:46]: o que foi isso???
Por mais que não haja uma resposta exata para a sua pergunta, sou rápida ao digitar.
Eu [14:55]: acredite, eu também gostaria de saber.
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