POV Narrador
Um vento frio entrava pela janela aberta da sala, fruto da noite calma que cobria todo o plano de Morthaul, ostentando um céu escuro repleto de estrelas que brilhavam fortemente, como se quisessem que cada um dos olhos abaixo delas admirasse todo o seu brilho resplandecente. Contudo, um par de olhos naquele quarto não iria atender esse pedido, ao menos naquela noite, pois o mesmo se encontrava vidrado no pergaminho que preenchia com a pouca vontade que ainda havia em seu corpo, como também usando todo o resto de energia que tinha. Huali solta um suspiro cansado e quente, que encontra o vento frio que adentrava a janela do quarto criando um breve redemoinho, bagunçando levemente as mechas de seu cabelo azulado que caiam sobre seu rosto, essas que ela afastava constantemente.
Huali: Amanhã ainda tem o teatro da Ai… preciso terminar isso logo - relembrou-se, molhando a ponta da pena com tinta.
A luz da lamparina refletia sobre o seu rosto e sobre o pergaminho que estava sendo escrito, que fazia um som mais que habitual para Huali quando a pena rabiscava a sua superfície seca. Ficar acordada até tarde não era incomum para a azulada, que passava horas da madrugada, até mesmo a varando totalmente, completando os relatórios e as requisições do santuário ao qual estava prestando serviços no momento, o que lhe cansava consideravelmente todos os dias. Tudo isso, somado ao seu serviço de guarda e patrulha no Vale de Randuin, levava a perseverança da garota ao limite do possível, sendo que era mais do que conhecido que os sátiros eram famosos por sua resiliência, mas isso era levado para outro patamar no caso de Huali.
Yuriko : Você ainda está aqui? Sabe que horas são? - a kitsune fala atrás dela, se apoiando no batente da porta enquanto segurava uma lamparina.
Huali: Umas duas? Eu preciso terminar o levantamento das doações…
A raposa, dona de cabelos rosados e lisos, se aproxima da mais nova, olhando a pequena bagunça que ela havia feito pelo escritório do santuário, vários pergaminhos se encontravam enrolados na mesa ao lado esquerdo de Huali, enquanto no direito havia os mais diversos livros que a mesma consultava de vez em quando. Essa cena faz Yuriko soltar um leve suspiro, a sátiro estava passando mais uma noite em claro para terminar os relatórios pendentes dela, algo que deixava a kitsune mais do que irritada.
Yuriko: Ok, chega! Você vai para casa e vai ter uma boa noite de sono! - com um basta, a mais velha para ao lado de Huali, tirando a pena de sua mão.
Huali: Nããão!! Eu preciso terminar isso ainda hoje, os prazos!! - a garota choramingou sonolenta, estendendo inutilmente seus braços na tentativa de pegar a pena novamente.
Yuriko: Eu estendo o prazo para você, é só pedir! O reabastecimento é semana que vem, não precisamos do levantamento para amanhã… ou seria hoje? Você me entendeu! - explicou a rosada, vendo a feição de Huali suavizar.
Huali: Não precisa ser para hoje?... - quase como se tivesse tirado uma carroça de suas costas, a sátiro relaxa e deixa a cabeça descansar na mesa - Graças a Gaia…
Yuriko: … - a kitsune cruza os braços debaixo dos seios e suspira levemente, impressionada com a dedicação da garota, mas precisava colocar limite naquilo - Muito bem, agora é hora de ir pra casa, eu vou te acompanhar.
Huali: Não precisa, eu posso ir sozinha - a sátiro levanta da cadeira, dando uma longa espreguiçada e bocejando - Sei o caminho de casa…
Yuriko: De jeito nenhum, olha a sua situação - disse estendendo as mãos até ela, mostrando como estava cansada - É perigoso você dormir debaixo da primeira árvore que ver, pior ainda o que maus intencionados podem fazer se te virem assim.
Huali: Hã?! - resmungou sonolenta e confusa, o que fez a kitsune suspirar mais uma vez, desacreditada.
Yuriko: Só vem comigo, por Gaia…
Yuriko abraça o braço de Huali, a guiando para fora da sala, andando pelos corredores do santuários como se tivesse levando uma zumbi consigo, pois a azulada apenas a acompanhava com os olhos semi abertos e murmurando algumas coisas de vez em quando, como se sua mente estivesse em outro lugar. A kitsune e Sátiro logo se encontram fora do santuário, que estava completamente escuro e deserto naquele horário, apenas com as assistentes residentes do local que dormiam em seus cômodos, o que faz ambas as mulheres tomarem cuidado para não perturbar ninguém em sua saída.
Huali: Espero que Aiko não tenha me esperado, amanhã ela tem teatro, precisa descansar bem… - comentou para a kitsune, que andava abraçada com ela pelas ruas desertas da cidade.
Yuriko: Você precisa seguir seus conselhos, sabe, vai fazer bem para você também.
Huali: Conselhos?... - indagou sonolenta, sem entender o que havia sido lhe dito por causa do sono.
Yuriko: Você é inacreditável…
Acompanhadas apenas por elas mesmas, ambas continuam a caminhada pelas ruas levemente iluminadas por lamparinas, seguindo o caminho até a casa de Huali, que não estava muito longe dali. Alguns minutos depois, já era possível ver o destino delas, a moradia de Huali, que se encontrava completamente escura em meio à noite, sinal de que a prima da azulada se encontrava na cama. Yuriko parou na entrada da residência junto da sátiro, que abria a tranca com um simples toque, fazendo uma pequena luz azulada surgir conforme movia seus dedos em frente à maçaneta.
Huali: Pronto… obrigada por me trazer até aqui, Yuriko - falou sonolenta, desvencilhando-se dos braços da Kitsune.
Yuriko: Eu vou cobrar esse favor outra hora, não se preocupe - a rosada deu um sorriso felino, para então bufar levemente - Trate de dormir bem, amanhã te quero inteira e Aiko vai querer também.
Huali: Certo, certo… - concordou com a cabeça, para então fazer uma feição pensativa - Se bem que eu poderia adiantar o relatório da patrulha de ontem agora…
Yuriko: Não, NÃO! Nem pense nisso, você vai dormir! - brigou a mais velha, que segurou a sátiro pelos ombros - Como você vai para o teatro da Aiko nesse estado?!
Huali: Eu vou tirar uma soneca na hora do almoço, vai dar tudo certo… - a garota bocejou, esfregando suavemente os olhos.
Yuriko: Amanhã você está sem hora de almoço - falou seca, o que fez a sátiro entrar em desespero.
Huali: Não! Eu durmo hoje! Eu juro! Não tira meu almoço!! - implorou, quase ficando de joelhos se a kitsune não a segurasse.
Yuriko: Fico feliz que a gente se entendeu, agora vá dormir, te espero amanhã - ajeitando a azulada, Yuriko logo lhe dá um abraço - Boa noite, Huali.
Huali: Boa noite, Yuriko, obrigada por me acompanhar… tome cuidado na volta, tá? - disse um tanto preocupada, retirando um sorriso divertido da rosada.
Yuriko: Oras, não precisa se preocupar - diz entre um riso, fazendo seus olhos brilharem num púrpura eletrizante - Eu sei me cuidar muito bem.
A kitsune brincava com os dedos, os remexendo suavemente, fazendo pequenas descargas elétricas púrpuras saltitarem entre eles com muita naturalidade, o que causa um arrepio na mais nova, ela esquecia com frequência que sua chefe era uma das criaturas mais poderosas do plano de Morthaul. Com um último aceno, as duas se despedem definitivamente, sendo que a Kitsune segue o caminho de volta até o santuário enquanto a sátiro fechava e trancava a porta com magia, dando um suspiro de cansaço antes de tirar seus sapatos que já machucavam seus pés por dentro da meia calça.
Huali: Eu deveria tomar um banho… amanhã eu tomo… não, vou tomar agora - tendo uma pequena batalha interna, a azulada vai até o banheiro a contragosto movida pela pura força de vontade.
……
……
……
Saindo do banho completamente molhado, Mika respirava bem fundo, fazendo seu corpo aquecer rapidamente para se livrar da água que ainda deslizava pela sua pele, evaporando-a em alguns instantes, para então colocar seu pijama. O rapaz sai do banheiro e se depara com o corredor escuro de sua casa, que já se encontrava silenciosa, era tarde da noite e dormir nesse horário já era uma rotina para ele, mas ainda assim o rapaz sentia algo estranho.
Mikazuki: … Hum.
Resmungou, para então checar se as portas da frente e do fundo estavam trancadas, como também todas as janelas, inclusive do quarto de sua mãe e de sua irmã, oque fez sem acordá-las já que seus passos eram extremamente silenciosos. Feito isso, algo ainda estava incomodando Mika, que não sabia ainda ao certo o que era, o que o fez retornar ao seu quarto e pegar seu celular, checando todas as mensagens que tinha recebido… que não eram muitas.
Mikazuki: Não tem nada demais… estranho.
Sem saber o que fazer, o rapaz vai até sua lista de contatos, girando por ela rapidamente já que não havia muitos salvos no seu telefone novo, apenas seus amigos da escola e dos seus demais colegas, além dos da sua família, é claro. Parando em um específico, o moreno o olhou por um bom tempo, para então discar o número e o deixar no viva-voz, sentando-se na cama e colocando seu celular na escrivaninha ao lado.
“Celular”: Aqui é John Williams, não estou podendo atender no momento, então por favor deixe sua mensagem após o sinal… - o telefone fica mudo por alguns instantes, algo que Mika já sabia que iria acontecer - Ainda esperando o sinal, não é? A mensagem deve ser importante então, desculpe fazer você esperar - há uma breve risada de fundo, para então o sinal ocorrer.
Mikazuki: … - Mika leva sua mão até o telefone para desligar a ligação, contudo, ele hesita antes de tocar na tela, a olhando por alguns segundos antes de trazer a mão de volta ao seu colo - …Oi pai, faz um tempo que a gente não conversa, né? Bem, eu fiquei em terceiro lugar no festival da U.A e consegui entrar no curso de heróis, estou na mesma turma daquele pessoal que te falei da outra vez: A Izumi, Izuku e a Tsuyu-chan… o pior é que eu lutei pelo terceiro lugar contra o lagartixa, se não fosse por ele e a mamãe eu não teria conseguido, sabe? Não que ele tenha me deixado vencer, foi um empate, é que ele só foi pra cima com tudo depois que tinha certeza que eu também iria, ele é um cara bom, o senhor iria se dar bem com ele - o rapaz para de falar por um momento, apertando as mãos com firmeza - Estou indo no rumo que prometi para o senhor, estou virando um herói aqui no Japão, não era bem o que eu planejava mas… sabe, sendo bem sincero, eu nem tinha algo planejado ainda, mas o senhor se foi e tive que fazer muitas escolhas muito depressa e… me arrependo de boa parte delas. Mas algumas… algumas estão valendo a pena, obrigado pelo seu último pedido e… caralho, quero te contar tanta coisa - a voz de Mika vacila um pouco, sendo que ele esfrega o rosto um tanto abalado, mas logo respira fundo e se acalma - Queria que conhecesse a Lollipop, ela é meio esquisita, mas foi a primeira a me aceitar aqui e é bem gentil… do jeito dela, além de prestativa pra caramba. O único defeito dela é namorar o Izuku - o moreno deu uma risada brincalhona, apertando suavemente seu polegar - Ela me lembra nossa Sayuri, eu sei que já te falei isso, mas eu gosto de lembrar, é uma boa amiga... tem a Izumi também, só que é… diferente, sabe? Acho que o senhor iria saber, só de me perguntar uma coisa e olhar na minha cara. Ela é divertida, animada, acolhedora e tem uma autoconfiança que eu sinceramente invejo. Aliás, sabia que ela lê Bleach? Não achei que nenhuma alma viva além de nós dois iria ler aquela coisa ainda - Mika ri mais uma vez, só que um pouco mais baixo - Eu queria te apresentar ela, mostrar a escola foda que eu estou, porra, é a U.A! A escola mais pica do Japão, também queria te mostrar os amigos que fiz, o quanto eu melhorei também, agora consigo criar fogo e controlá-lo… ao menos de forma que eu não queime tudo. Sabia que a mãe fazia isso também? Criar fogo e tals?... Claro que deveria saber, eu que sou meio tapado mesmo - dessa vez, nenhuma risada veio, apenas um suspiro carregado de emoção - Eu só… só queria ter descoberto isso antes, antes de vir para cá, antes de… antes de tudo, sabe? - a boca dele fica seca e o mesmo tenta respirar fundo, mas acaba falhando, deixando uma tosse chorosa escapar - Estou com saudades, eu te amo… Me desculpa, pai… por favor, me perdoe...
Sem dizer mais nada, Mikazuki desliga a ligação, respirando bem fundo como se tivesse segurando a respiração por um tempo, tanto que ele volta a tossir um pouco, sentindo lágrimas teimosas descerem por seu rosto… essas que evaporaram rapidamente sem deixar rastros, como se nunca tivessem caído. O rapaz morde seu polegar com firmeza, tentando controlar sua respiração descompassada, sentindo seu corpo esfriar devagar conforme fazia isso, para então dar um último suspiro longo e lento.
Mikazuki: … - por alguns momentos, Mika apenas encarou a escuridão do seu quarto, não sabendo o que fazer com os sentimentos que martelavam em seu peito, mas que ele impedia de sair - What a shit show (Que show de merda).
Resmungou, para então deitar em sua cama e fechar os olhos, torcendo para que o sono chegasse logo e o tirasse daquela situação infeliz que se encontrava, sendo que seu “pedido” é atendido para sua surpresa. Pois logo começou a sentir se afundar cada vez mais em seu próprio ser, como se estivesse mergulhando…
Mikazuki: “Mergulhando…?!”
Se sentando de supetão, Mikazuki consegue colocar a sua cabeça para fora d’água que o rodeava, tossindo instintivamente achando que estava se afogando, causando uma agonia intensa em todo o seu corpo, contudo, essa se dissipa rapidamente conforme ele se situava da onde estava. Olhando em volta, o rapaz se vê novamente no imenso lago que tinha visitado dias atrás, esse que era a manifestação de sua individualidade de acordo com a “voz”... qual era o nome mesmo?
Mikazuki: Asuraragūn - sussurrou, o nome saindo de forma tão natural que Mika nem acreditou que ele mesmo havia falado aquilo - O que estou fazendo aqui?
???: Para alguém tentando fugir de si mesmo, você acabou caindo na parte mais íntima de seu ser… isso sim é uma puta piada de mal gosto, até mesmo para mim - por um momento, Mika havia esquecido que sua “companhia” estava sempre ali, sendo que ele se levanta para encará-la.
Mikazuki: Mas que inferno - exclamou num grito, se virando para a sombra que tomava forma a sua frente - O que caralhos você quer? Como você consegue me trazer aqui?!
???: Eu apenas tenho o poder que você me dá, seu boçal - afirma, praticamente cuspindo as palavras - Você foi avisado: Toda vez que perder, duvidar ou fraquejar, irei prová-lo, e se falhar… você sabe muito bem as consequências - a fala da sombra deixa Mika em alerta, que acaba tomando uma postura defensiva - Contudo, esse não é o momento disso, não fui eu que lhe trouxe… foi alguma outra coisa.
Mikazuki: Alguma coisa? - ainda desconfiado, Mika mantém sua postura - O que pode me trazer para cá além de você?
???: O que você acha que pode lhe trazer para cá, Will? Para a manifestação da sua individualidade? - perguntou o demônio, que tomava assento no próprio ar, cruzando as pernas ao praticamente levitar.
Mikazuki: … - parando para pensar por alguns instantes, o rapaz reflete por uma resposta… será que era a mais óbvia? - O Adolla Burst?
???: Olha só, você não é um caso perdido - Mika pode notar a silhueta de um sorriso perverso surgir no rosto da sombra, o fazendo bufar - As individualidades são uma fonte de poder extremamente novas, desconheço completamente suas forças e até onde elas podem chegar… posso dizer as mesmas coisas para os humanos também, contudo, posso afirmar uma coisa com certeza: A sua é um espelho do seu espírito, extremamente leal a você - afirmou mais uma vez, levando seu olhar para um local, para além do horizonte - Eu até arriscaria brincar com ela um pouco… se ela não fosse me queimar de dentro para fora por puro desgosto, mas sabe de uma coisa curiosa, posso dizer que ela está tentando te consolar nesse momento.
A fala da sombra surpreende Mika completamente, tanto que ele torna seu olhar para a lagoa em si, a forma que as pequenas ondas batiam gentilmente nas suas pernas, o frio suave da água que acalmava os sentimentos que queimavam em seu peito, como também o som sereno no lugar que deixava sua mente limpa e clara, o envolvia completamente. Sendo que o moreno acaba se sentando novamente, levando a água até seu rosto algumas vezes, permitindo que tudo o que o afligia naquele momento fosse levado por ela, o que acaba funcionando de certa forma, o deixando mais leve.
Mikazuki: … - o rapaz sentia o olhar da sombra sobre si o tempo todo que fazia isso, mas não se importou nem um pouco… estava curioso na verdade - Obrigado.
???: … - a figura deu uma leve risada com a atitude do rapaz - É sempre um prazer.
Mikazuki: Eu não disse isso para você - retrucou, o que fez a sombra rir novamente - Mas pode ser também, não sou um ingrato… aliás, como posso sair daqui? Eu meio que quero dormir.
???: Se eu soubesse como sair, não acha que eu já teria o feito? - retruca, sendo que Mika faz uma careta - Se quer dormir, então durma, sonhe, este lugar é seu… não irei atrapalhá-lo - aquilo surpreendeu Mika, até que outro sorriso surge no rosto da sombra - A menos que sonhe com aquelas coisas promíscuas novamente, aí terei que chutá-lo.
Mikazuki: Por gentileza, vai se ferrar, se não gostou pode ir achar outro maluco para assombrar - o rapaz nem chegava a se irritar com o comentário, apenas o retruca sem interesse - Bem, é só deitar então?
???: Você dorme em pé? - agora era a vez dele retrucar, dando uma risada - Sabe moleque, você nunca deixa de me… - a voz do demônio morre, esse que pareceu paralisar ao observar algo atrás de Mikazuki - Eu não acredito…
Mikazuki: O que foi? Viu um fantasma? - provocou, se virando para ver o que o demônio observava tão desacreditado, sendo que acabou se surpreendendo pra valer - Mas o que isso tá fazendo aqui?
Mika se depara com uma porta branca que carregava uma aparência bem antiga, dois grandes retângulos compunham sua estrutura central e uma maçaneta dourada estava junto a fechadura da mesma cor, era um modelo que ele só via em filmes bem antigos, o que acabou combinando pois a porta estava bem desgastada, a tinta branca estava decaindo de algumas partes e uma folhagem estranha crescia nas suas extremidades… era relativamente bonito se parasse para apreciar.
Mikazuki: Isso é coisa sua? - perguntou ao demônio, enquanto olhava ao redor da porta, que estava de pé num portal que não dava para lugar algum.
???: Se fosse, não teria uma aparência tão delicada - responde, sendo que Mika pode notar a silhueta de um sorriso divertido surgir no rosto dele - Mas faço uma ideia de quem deixou isso aí… porque não a abre?
Mikazuki: Eu tô fora, você acha que eu não tô notando esse sorrisinho maroto na sua cara não? Essa porta aí deve levar pra toca do diabo - o mesmo diz, se afastando um pouco da porta.
???: Eu achei que tinha deixado sua covardia de lado, rapaz - alfinetou, ainda ostentando o mesmo sorriso - Isso é um convite, alguém está te chamando para uma visita amigável, provavelmente não quer que eu escute a conversa que vão ter.
Mikazuki: Alguém quer conversar comigo? Mas como conseguiriam mandar um convite para mim aqui, na minha individualidade? E quem caralhos é essa pessoa?!
???: Você já esqueceu do que te falei anteriormente? Há outras forças que vão mudar essa era como você conhece… fora que, acredito que suas perguntas vão ser respondidas assim que você passar por essa porta - a fala da sombra instiga Mika de uma forma que ele não previa, atiçando sua curiosidade ao máximo - Não era isso que você queria de mim na última vez? Respostas? Entender em que trama você se meteu?... elas podem estar bem aí, vá buscá-las.
Mikazuki: … - o moreno olhava para porta num conflito interno, afinal, respostas cairiam muito bem agora, no fundo ele queria saber se tudo aquilo era apenas uma delírio insana dele - Quer saber, que se foda, se eu morrer eu volto para te assombrar.
???: Você já faz isso, pivete… boa sorte.
Mikazuki: Boa sorte? Agora sim você me assustou.
O mesmo retruca, tocando na maçaneta dourada que transmitia um calor confortável, algo que o moreno não esperava, mas mesmo assim ele a gira bem devagar, empurrando a porta suavemente para então ser tomado por um clarão repentino…
……
……
……
Huali solta um suspiro ao ver sua prima deitada em sua cama, ela havia adormecido mais uma vez no quarto da azulada a esperando voltar para casa, o que fazia o coração da sátiro apertar fortemente. Essa que se aproximou da cama em silêncio, seus pés descalços percorreram agilmente o piso gelado do quarto enquanto ajeitava sua camisola, chegando rapidamente na cama que estava extremamente convidativa para ela. Tentando ao máximo não assustar Aiko, a azulada se enfia debaixo dos cobertores bem devagar, deixando o calor presente lhe envolver num abraço quentinho, algo que ela acaba fazendo com a prima mais nova, que solta um resmungo sem nem ao menos acordar.
Huali: “Que sono mais pesado…” - pensou, para então bocejar baixinho.
Sem querer julgar ainda mais sua prima, fora que nem tinha energia para isso, a sátiro apenas encosta sua cabeça no travesseiro, fazendo com que o sono, que a cercava a tempos, finalmente a alcançasse, a levando para um descanso muito merecido… ou ao menos era isso que ela esperava. Diferente da sensação de ter sua consciência desligada, Huali sentiu que ela na verdade estava sendo levada para algum lugar muito distante do seu quarto… muito mais acima, em rumo às estrelas.
Huali: … Humm - acabou resmungando, incomodada com a mudança repentina de ambiente que estava.
A sátiro sente uma luz forte incomodar seus olhos, como também uma suave brisa bater em seu rosto, o que a faz se sentar e esfregar os olhos suavemente, dando um longo bocejo antes de pensar em qualquer coisa.
Huali: Eu deixei a janela e a cortina aberta?
Sussurrou confusa, para então abrir seus olhos e se surpreender completamente com o'que viu, ela não estava sentada na sua cama e muito menos acompanhada de sua prima, mas se encontrava no meio de um campo coberto de flores brancas, espalhadas até aonde a vista alcançava em todas as direções. A única coisa que “quebrava” a homogenia da paisagem era uma árvore enorme, que se encontrava num ponto alto do campo, tão branca quanto as flores que a rodeava, ostentando folhas que pareciam fios de cabelo enormes caindo sobre seus galhos.
POV Huali
Huali: “Isso… não é o meu quarto, onde estou?” - indago assustada, olhando para todos os lados - “Será que isso é um sonho?”
Sendo que, para minha total surpresa, minha segunda pergunta foi respondida assim que a fiz, pois um forte sopro vem de encontro em meu corpo, fazendo meu cabelo se esvoaçar junto de minhas roupas, tanto que levanto os meus braços à frente do meu rosto para amenizar o impacto do vento. Após uma trégua dele, pude notar que estava vestindo as minhas roupas de assistente do santuário… o que eu acabo nem me perguntando o porque e apenas agradeço, só de me imaginar estar nesse lugar estranho com a minha camisola para dormir era extremamente constrangedor.
Huali: “Droga, eu não consigo invocar meu arco, como também não sei como cheguei aqui. O pior é que isso não parece ser um sonho, pois estou consciente demais para isso… No que eu me meti de novo?” - penso um tanto aflita e observo o jardim, eu não o reconhecia de lugar algum - Pelo menos a paisagem é linda.
Sem ter um plano definido em mente, eu apenas caminho em direção a árvore branca no ponto mais alto do campo, já que era a única coisa que destoava do resto do local, então deveria ter algo importante por ali… certo? Independente disso, sigo até ela, observando todo o lugar com atenção, tento comparar as características dele com as de algum que eu conheço, mas nada me vem à memória. Por sorte, não demorou muito para que eu chegasse até a árvore, que tinha seus galhos e folhas sendo balançados constantemente pelo vento, fazendo um barulho natural bem suave e agradável aos ouvidos… era pacífico, eu poderia cochilar aqui por um bom tempo, mas não posso, não até descobrir o porquê de eu estar aqui.
Huali: “Parece ser um salgueiro chorão, mas nunca vi dessa cor… o que não ajuda em nada” - analisando a árvore, não acho nada fora do normal que já não havia observado antes - “E agora? Será que é apenas um sonho mesmo?”
Sem saber o'que fazer, acabo me se sentando numa das raízes da árvore, tentando achar com o olhar alguma coisa tão perdida quanto eu no meio desse campo de flores, contudo, não pairo muito tempo sobre ele, pois um som distinto chama minha atenção… o ranger de uma porta. Este som era exatamente o que eu estava procurando, algo que destoava completamente daqui, uma pista!... Uma bem diferente do que eu estava imaginando, sendo bem sincera, além de que o som estava vindo do outro lado da árvore, então tive que me levantar para ver o que era, sendo que acabo escutando outro som também, o claro som de uma porta batendo.
Huali: “Uma porta?” - pensei enquanto dava a volta na árvore, me perguntando porque haveria uma ali.
Porém, quando eu olho para o local de onde vinha o som, eu não vi nada do que eu esperava: Não era uma porta, porteira ou um até mesmo um portal… era um rapaz, ele estava de costas para mim, trajado de um kimono preto com detalhes dourados, observando o local com atenção e admiração. Eu me escondo parcialmente no tronco da árvore e o observo, tentando reconhecê-lo de algum lugar, o traje parecia ser de um artista marcial do palácio, mas era diferente em sua própria forma… fora que a aparência dele é um tanto infamiliar.
Huali: “Ele não parece ser qualquer criatura que eu já vi…” - o olho de cima a baixo mais uma vez e saio de trás da árvore - “Fora isso, ele parece tão perdido quanto eu…”
Não havia muito sentido em me esconder, afinal, eu precisava de respostas e ele poderia me dar algumas. Contudo, quando saio de trás da árvore, estava focada demais no rapaz e nem percebo que uma das raízes da árvore estava retorcida sobre o chão. O que me faz tropeçar nela de forma nem um pouco sutil e caio de joelhos no chão, soltando um grunhido nem um pouco discreto.
Huali: Ai! Porque sou tão estabanada? - acabei resmungando, esquecendo por um momento aonde eu estava.
Porém, sou lembrada rapidamente do que estava ocorrendo ao escutar o rapaz se mover a minha frente, ele assume uma posição de combate numa velocidade impressionante, além de que vejo o ar a volta dele se agitar de forma alarmante… e sinto que não é por causa da ventania constante.
Huali: Espera!! Eu não queria te assustar - não posso invocar meu arco aqui, estou completamente à mercê da misericórdia dele - Não vou te fazer mal nenhum, eu juro!
O olhar dele era severo, quase caótico, eu conseguia senti-lo indo de cima a baixo sobre mim, me analisando como eu havia feito com ele momentos atrás, sendo que, depois de alguns instantes, noto que seu olhar e sua postura se suavizam um pouco… mas tinha algo estranho. Agora que podia observá-lo de frente, pude ver que ele não carregava nenhum traço mágico: Focinho, bigode, orelhas, garras… será que tinha algo escondido debaixo do Kimono? Será que tem algo haver com a marca em seu rosto ou o seu braço?... Ele é bem intimidador, mas se parece muito comigo.
???: Se você não queria me fazer mal, o que planejava fazer? Chegando de fininho assim - ele diz cerrando os olhos para mim, o que fez um arrepio surgir pela minha espinha.
Huali: Eu só queria me apresentar e fazer uma pergunta, eu juro - respondo ao me levantar, mostrando que não havia nada em minhas mãos.
???: … Sério? - ele me olha de cima abaixo mais uma vez, lançando um olhar desconfiado, que acaba se suavizando - Então se apresente, moça.
Um sorriso afiado surgiu em seu rosto enquanto ele abaixava a guarda bem devagar, até que cruza os braços, o que me traz um certo alívio, ele não iria atacar… e vai ser melhor se mantermos desse jeito, ao menos para mim, é claro.
Huali: Eu me chamo Huali, é um prazer enorme - digo, segurando meu vestido e fazendo uma breve reverência.
Mikazuki: Quanta classe… - o escuto sussurrar, para então observá-lo fazer uma breve mesura - Sou Mikazuki Williams Oze, o que você quer saber? - ele é bem direto!
Huali: O senhor sabe, por algum acaso, aonde estamos?... Estou perdida - acabei confessando, na esperança que ele me desse alguma resposta
Mikazuki: Senhor? - ele solta um riso abafado enquanto levantava uma sobrancelha - Só me chame de Mika, por favor, e não, não faço ideia de onde a gente está, estou perdidinho - ele diz dando os ombros e acabo soltando um suspiro, estávamos no mesmo barco - Eu esperava que você soubesse, talvez quem me convidou possa ter te convidado também - … convidada?
Huali: Eu… não fui convidada, eu só apareci aqui quando caí no sono, até estava achando que era um sonho, mas pelo jeito não é - penso um pouco sobre aquilo, cruzando meus braços e levando minha mão até o queixo.
Mikazuki: Parece que você foi convocada então, pior que eu entendo como é… mas quem será que nos trouxe?
Huali: Bem, você não foi convidado? Não sabe quem te chamou para cá? - ele apenas dá de ombros para minha pergunta, o que me faz dar uma careta - Ao menos sabe porque está aqui?
Mikazuki: Não tinha um remetente escrito na porta que apareceu no meu lago - ele retruca com uma careta também, voltando a cruzar os braços - E eu não faço ideia do que to fazendo aqui, talvez ter escutado aquele cara não foi a melhor das ideias… - ok, isso é um problema.
Huali: Uma porta apareceu do nada e você simplesmente entrou nela?... Tá, é algo que eu faria também - algo que eu já fiz, na verdade - Espera, seu lago? Onde você estava antes de vir para cá?
Mikazuki: Bem… na minha individualidade, na manifestação dela na verdade, é como um mundo interior dentro de mim, a porta só apareceu lá e eu entrei - Ele tem um mundo interior?!
Huali: Você tem um mundo interior? De que linhagem mágica você é? Eu não estou sabendo dizer só de te olhar, me desculpe - eu o questiono e lhe faço uma mesura… mas ele ficou bem confuso.
Mikazuki: Mas do que você está falando? Linhagem mágica? Tenho isso não moça, mas minha individualidade é “Adolla Burst” - … ele não sabe o que é uma linhagem mágica?!
Huali: Como assim não tem? Para ter um mundo interior é preciso ter uma especial e… o que é uma individualidade?
Mikazuki: Você está me dizendo que não sabe o que é uma individualidade? - ele me questiona enquanto me olhava desconfiado, sendo que apenas aceno que sim - Misericórdia, você não tem uma mutante de uma cabra ou algo parecido? Você tem chifres pelo amor de Deus, não vai me dizer que você é uma sátiro.
Huali: Eu sou uma sátiro - ao menos, eu acho… - Não tenho nenhuma individualidade, o'que quer que isso seja… Espera - eu o olho de cima a baixo mais uma vez e uma ideia assustadora surge na minha mente - De onde você é, Mikazuki?
Mikazuki: No momento eu estou em Musutafu no Japão, mas eu nasci em Tokyo - não reconheço nenhum dos lugares que ele falou para mim, o que devo ter deixado transmitir pela minha face, pois ele continua - Fica na Ásia, é uma península… no planeta Terra.
Huali: Na terra… - “espera, ele realmente vive na Terra? Tipo, no planeta em si?” - Mikazuki, você é um humano?
Mikazuki: Eu sou sim… e eu estou começando a achar que você não tava zoando comigo quando disse que era uma sátiro.
POV Mikazuki
A conversa já estava um tanto estranha e difícil, mas agora piorou umas 10 vezes, já que, quando revelei de onde vim, a garota decidiu colar as placas e falar um monte de coisa ao mesmo tempo, parecendo que algo extremamente ruim havia acontecido e, por algum motivo, era tudo completamente culpa dela. A observo ficar andando em círculos enquanto murmurava algo que eu apenas entendia por cima, fazendo os murmúrios do Midoriya parecer uma canção de tão claros que eram em comparação aos dela, o que realmente me impressionou… mas não de uma forma boa.
Mikazuki: Moça… Moçaaa… - eu a chamo, mas sem sucesso - Huali, HUALI! - eu aceno minha mão logo à frente de seu rosto, o que a faz olhar para mim assustada - Perder a cabeça agora não vai ajudar, oque aconteceu? Tem algum problema?
Huali: … - as pupilas dela estavam incrivelmente dilatadas, ela estava bem assustada - É que eu não devia estar aqui, nós não deveríamos estar conversando! Você não devia saber que eu existo! Por Gaia, eu fiz de novo! - Essa Gaia mais uma vez, quem é ela?... e como assim fez de novo?!
Mikazuki: Ok, isso tudo não deveria estar acontecendo, mas, querendo ou não, está acontecendo, o que deveríamos fazer agora? - pergunto de forma tranquila para acalmá-la, o que parece dar um pouco certo.
Huali: Bem… Ai, eu não sei ao certo - sua voz sai tristonha e manhosa… o que foi um tanto fofo, mas preocupante - Até onde eu sei, a reintegração das espécies deveria começar com um encontro dos monarcas, não dessa forma - ela gesticulou as mãos entre a gente, o que eu acabo entendendo - Primeiro os dragões e agora isso! Yuriko vai me matar! - dragões?! Monarcas?!... e ela tá perdendo a cabeça de novo.
Mikazuki: Ei, ninguém vai te matar enquanto eu estiver aqui - asseguro para a garota, que olhou um tanto surpresa para mim - Eu não entendi nada essa conversa de monarcas, dragões e reintegração das espécies, mas eu sei que nada acontece por acaso, se estamos aqui conversando é porque alguém me convidou e alguém te convocou… talvez tudo isso aqui seja algo planejado?
Quando as palavras saem da minha boca, vejo uma mistura de emoções conflituosas passar pelo rosto da Huali em poucos segundos: Confusão, surpresa, dúvida, medo e, principalmente, negação. Ela fica pensativa por alguns momentos, revezando seu olhar entre mim, a árvore e o chão diversas vezes, até que ela parece chegar a algum tipo de consenso ao respirar bem fundo.
Huali: Isso… é possível, a questão é porque a gente? Qual o sentido de nos fazer se encontrar aqui? - essa é uma ótima questão.
Mikazuki: É, tem isso daí - concordo com ela, para então refletir um pouco também - Bem, vamos descobrir então! Quem é você, Huali? O que você faz? O que deixa de fazer? Do que gosta? Me conta sobre você! - peço com um sorriso singelo que pareceu acanhar um pouco a sátiro, sendo que me sento numa das raízes da enorme árvore, vendo que já iria ficar ali por um tempo.
Huali: Hããã… - “rosto dela está corando, deve ser tímida quando o assunto é sobre ela” - Eu não sou muito interessante, sou apenas uma criatura mágica entre várias outras, trabalho como secretária assistente no Santuário Real e sou o patrulheira no Vale do Randuin, no plano de Morthaul… você não deve conhecer - ela acaba tomando assento logo a minha frente, se sentando de forma elegante, ainda que um tanto acanhada.
Mikazuki: Não conheço mesmo, mas não deixa de ser interessante - comento, apoiando meu queixo na minha mão - O que são criaturas mágicas? O que você faz como secretária e patrulheira? Parecem ser trabalhos bem distintos.
Huali: Bem, criaturas mágicas são seres com acesso a magia de gaia, temos uma conexão corporal e espiritual com o mundo em si, isso nos faz ter uma aparência um tanto… selvagem, acho que você entende - aceno um sim com a cabeça, dando uma deixa para que ela continuasse - Meu trabalho de secretária não é nada demais, eu só cuido dos assuntos administrativos referentes ao santuário. Hoje mesmo, de madrugada, eu estava fazendo o levantamento das doações que recebemos no último mês: Dinheiro, comida, tecidos, roupas e outros materiais, daí eu pego o relatório que fiz do almoxarifado e faço a relação do que falta para o reabastecimento, fora que também tem os pedidos pessoais das sacerdotisas, já tava esquecendo disso… - ela leva a mão até o queixo e olha para baixo - Também seria bom eu já começar a organizar as autorizações e a papelada para o festival, assim já posso pedir material extra junto do levantamento, já que o prazo dele foi estendido dá para fazer isso, assim vou poder organizar as escalas do mês que vem com mais tranquilidade e… ah, espera, tem o…
Eu realmente tento prestar atenção em cada coisa que a Huali diz logo após isso, mas ela acaba se fechando em murmúrios mais uma vez, sua mente com certeza era muito mais rápida que sua boca, uma característica bem marcante. Apenas a escuto em silêncio por um tempo, a observando se aprofundar em seus pensamentos que ocasionalmente soltava para mim, só que sem saber se era realmente proposital ou não… se bem que não importa agora, né?
Mikazuki: “Será que o Izuku era exatamente desse jeito quando não tinha amigos?” - acabei refletindo, o lagartixa já murmurava bastante, imagina quando era pior?... será que ela é assim por causa disso?
A ideia acabou me fazendo dar um leve riso, o que não passou despercebido pela Huali, que começou a ficar vermelha que nem um pimentão, o que faz meu riso se intensificar um pouco, como ela consegue ser extremamente fofa desse jeito? Deveria ser ilegal.
Huali: Eu acabei falando demais, me desculpa! Essa coisa toda de papelada, relatórios e rituais deve ser um saco para você ficar ouvindo e… - ela fez uma careta engraçada enquanto balançava as mãos à sua frente, o que me faz ter que segurar uma risada.
Mikazuki: Ei ei, tá tudo bem - a corto imediatamente, levantando minha mão para que ela parasse, o que acabou fazendo - Eu que perguntei pra você como que era, então não precisa se desculpar por me explicar, você deve estar com a cabeça cheia do serviço para ter se aprofundado tanto nisso comigo aqui.
Huali: Ai, eu estou, é que é tanta coisa para fazer e tão pouco tempo…
Mikazuki: Eu percebi, você e as outras assistentes devem ficar com a mão cheia boa parte do tempo - no momento que digo isso, vejo um sorriso sem graça brotar no seu rosto da sátiro - O que foi?
Huali: Bem… é que eu sou a única secretária assistente do santuário, faço tudo isso sozinha.
Mikazuki: … - não consigo disfarçar a surpresa que senti ao ouvir isso, tanto que pisquei algumas vezes rapidamente, processando as palavras dela - Pelo jeito a escravidão em Morthaul não foi abolida então, só pode.
Huali: Ow! Não sou escrava, eu sei que trabalho bastante, mas eu recebo muito bem, consigo deixar tudo em ordem… ao menos quase sempre.
Mikazuki: Receber bem é o mínimo, você faz o trabalho administrativo de, brincando, umas quatro pessoas, e to jogando bem baixo, eu teria ficado maluco no seu lugar. No máximo em duas semanas o santuário real estaria pegando fogo se largassem na minha mão assim.
Huali: … - a sátiro acaba tendo que abafar um riso, sendo que pude perceber que ela ficou um tanto sem graça - Para falar a verdade eu nem sei como tenho o trabalho ainda, eu faço muita burrada: Já misturei relatório, esqueci de enviar requisições, dormi no serviço, invadi outros planos por acidente… eu sou um desastre.
Mikazuki: O único que erra é aquele que faz… e você faz muita coisa, Huali, logo erros vão vir também, é natural - explico dando de ombros, não era nada demais - Se alguém falar pra você que nunca errou, ou esse alguém é mentiroso ou nunca fez nada na vida. Sua dedicação e competência devem valer muito mais que os erros que você deve ter cometido, por isso você ainda está lá, fora que, se jogam tudo nos seus ombros, é porque você é indispensável e extremamente capaz.
Huali: … - a sátiro olha para mim no que parecia ser uma mistura de surpresa e confusão, sendo que logo o desvia para baixo assim que se encontra o meu, mexendo numa das mechas de seu cabelo - Eu… eu acho que sim… obrigada.
Mikazuki: Não foi nada - “Ela não deve receber muitos elogios ou reconhecimento, essa timidez também não deve ajudar muito” - Fora esse trabalho no santuário, você falou que também faz patrulhas, não é? Como funciona?
Huali: É bem simples, eu acompanho os artistas marciais do palácio pelo Vale do Randuin, por algum motivo pessoas estão desaparecendo e algo está corrompendo as criaturas de Morthaul, as transformando em… monstros, por falta de palavra melhor - “caramba, mas que merda” - Isso já tem acontecido faz um bom tempo e ainda não sabemos o porquê de as coisas estarem assim, posso não ser uma guerreira muito boa, mas tento ajudar o máximo que posso, afinal, eu consigo sentir a presença do corrupção mesmo com meu controle de mana sendo bem ruim, então acabo sendo útil.
Mikazuki: Mesmo com as suas limitações, você está fazendo sua parte - comentei, a olhando de cima a baixo rapidamente - Agora sei porque mandaram você aqui: Competente, responsável, dedicada… você é baita de um exemplo, sério - falo aquilo naturalmente, observando o olhar dela vacilar um pouco.
Huali: Não acho que eu seja tudo isso… mas obrigada pelas palavras gentis - ela acaba dizendo baixinho e, antes que eu pudesse dizer qualquer coisa, ela torna seu olhar para mim e dá um sorriso singelo, esticando a mão para mim - E você? Quem é você, Mika?
Mikazuki: … - “Por algum motivo, o qual eu não sei ao certo, ouvi-la chamar meu nome mexeu comigo, de um jeito estranho” - Eu sou um aspirante a herói, estou estudando numa academia que forma heróis profissionais, de onde vim não tem esse negócio de mana ou magia, mas sim individualidades que dão poderes únicos para cada pessoa. Eu estudo e treino com a minha para virar um herói, que luta contra os criminosos do meu país junto com a polícia, já que eles usam as deles para motivos egoístas e machucar os outros - quando explico o que faço, percebo que Huali se interessou apenas pelo seu olhar, que pareceu me analisar por um momento.
Huali: Eu desconfiava que você era algum tipo de guerreiro pelo seu traje, mas não imaginava que era um… herói profissional? Não entendi muito bem esse termo - ela confessa para mim com um sorriso sem graça, o que me faz soltar um riso nasal.
Mikazuki: É algo relativamente novo por lá, mas é praticamente alguém que é autorizado pelo governo a utilizar sua individualidade em público a prol da segurança da sociedade, recebem salário, tem agências, fãs e são muito populares, é uma carreira que muitos desejam buscar pela estima e reconhecimento… além do dinheiro.
Huali: Ah sim, entendi… é que eu apenas estranhei o nome que escolheram para isso, mas a ideia é interessante.
Mikazuki: O que é estranho no nome? Faz bastante sentido, heróis lutam contra vilões e mantém as pessoas em segurança. - pergunto um tanto curioso, querendo saber o que se passava na cabeça dela.
Huali: Faz sim, eu quis dizer do “Herói Profissional”, você falou que está sendo treinado numa academia para se tornar um herói, certo? - aceno um sim com a cabeça, vendo até onde ela queria chegar - Como que você é treinado para ser um herói? Eles te ensinam os valores de um? Como também os deveres e os sacrifícios? Não sei se é algo que possa ser ensinado para alguém numa academia, claro que dá para ensiná-la a lutar e a proteger… mas ser um herói tem que nascer da pessoa, de seu caráter, ser um herói de verdade é o símbolo de altruísmo máximo… transformar isso num trabalho com muitos benefícios pode tirar o sentido disso, ou pior, até mesmo distorcer. Ser um herói não deve ser decidido pelo cargo de uma pessoa, mas sim pelas suas atitudes. - Huali explicava seus pensamentos para mim de forma calma e límpida, pude ver que ela realmente estava raciocinando sobre aquilo.
Mikazuki: “Ela fez bastante sentido agora… o pior é que eu penso de forma parecida” - levo meu punho fechada para apoiar meu queixo, refletindo no que Huali havia dito, sendo que mal percebo uma feição assustada surgir em seu rosto.
Huali: Eu não estou dizendo que você não serve como herói ou coisa assim, você parece ser bem forte e é muito gentil, tenho certeza que vai ser um ótimo herói. Por favor, me desculpe se eu te ofendi ou falei algo insensível - me surpreendo um pouco ao ver a sátiro abaixar a cabeça num pedido de desculpas, sendo que preciso segurar uma vontade espontânea de afundar meus dedos no seu cabelo azul num cafuné relâmpago.
Mikazuki: Se eu pergunto o que você pensa sobre algo, não precisa se desculpar por me responder, mesmo se acabar sendo ofensivo ou não, então não se preocupe, não comigo - mesmo com toda sua responsabilidade e competência, essa moça é bastante insegura… para falar a verdade, deve ser exatamente por isso - Nossas ideias e percepções podem ofender os outros de vez em quando e está tudo bem, não precisamos todos pensarmos da mesma forma sobre tudo.
Huali: Eu sei, é que…
Mikazuki: Relaxa, eu te entendo - sorrio para ela e dou um aceno com a minha mão, a tranquilizando, o que a fez sorrir suavemente - E eu também penso como você, tanto que eu estava relutante em entrar no ramo heróico por causa disso, mas depois de alguns acontecimento e de refletir um pouco, acredito que com trabalho duro, dedicação e um bom exemplo, podemos moldar uma sociedade de heróis que vão honrar o nome que carregam, vai ser um trabalho longo… mas é um que vale a pena.
Huali: Com toda certeza! - ela acenou um sim com a cabeça para mim, no final de contas, ainda é bem expressiva - Bem, agora tem alguma ideia do porque fomos chamados aqui? Ainda não consigo pensar em algo.
Mikazuki: Hum…
Mesmo com toda nossa conversa, eu ainda não cheguei a uma conclusão exata do porquê estarmos ali, Huali era uma secretária e patrulheira no mundo dela, enquanto eu era apenas um aspirante a herói no meu mundo. Não havia muitos pontos para ligar, o que fazia restar apenas uma alternativa… o mundo interior que nos encontrávamos, de acordo com o que Huali havia dito, apenas linhagem mágicas poderosas poderiam ter um desses, se a manifestação da minha individualidade contasse como um…
Mikazuki: Hua…
Torno meu olhar para a moça a minha frente, ia perguntar algo sobre linhagens mágicas e magia, mas acabo perdendo completamente a questão quando meus olhos caem sobre ela. Eu estava falando com uma sátiro, as dos livros de mitologia, e algo me dizia que ela realmente não estava tirando uma com a minha cara, realmente existia outras criaturas mágicas como lobisomens ou centauros?! Acabo olhando para a Huali com um pouco mais de atenção, observando os chifres saindo dentre seus fios de cabelo azulados, seus olhos relativamente grandes que estavam focados nas flores entre nós, como também percebia que a parte de trás de sua saia se remexendo num ritmo constante, será que era sua cauda?... será que é azul também? Sendo que o que me chamou mais atenção foi a falta dos seus cascos, até onde sei sátiro tinham cascos e pernas peludas, mas isso não parecia ser o caso dela… mas as coxas eram bem fiéis…
Mikazuki: “O que eu estou fazendo?!” - acabo esfregando meu rosto com firmeza, tentando retomar o foco.
Huali: Mika? Está tudo bem? - o olhar dela volta para mim, o que me faz dar um sorriso nervoso.
Mikazuki: Si-im! É que minha ficha caiu agora, estou literalmente falando com uma criatura mitológica, uma sátiro! Você só existe nos livros de história e de conto de fadas, sabia? Parando para refletir, é bem surreal - acabo dando um riso nervoso, oque a faz rir suavemente.
Huali: Contos de fadas? Que fofo - ela sorri, levando a mão até o sino em seu peito - Se bem que eu estava estranhando um pouco o fato de você não ficar impressionado ou confuso, estava tão natural que eu estava achando que eu não era a primeira criatura mágica que conhecia.
Mikazuki: Em minha defesa, há pessoas com individualidades mutantes de animais no meu mundo, então sua aparência não é totalmente novidade para mim - explico, dando um sorriso sem graça - Mas você tem um ar completamente diferente, deve ser a magia ou algo do tipo, é muito daora… acho que essa não foi a melhor escolha de palavra - isso a fez rir novamente, parece que é a vez dela de se divertir com minhas reações.
Huali: Eu achei adorável, muito obrigada - todo o medo e preocupação que sua face carregava a minutos atrás não estava mais lá, o que me permitiu ver uma nova parte dela… que não era nem um pouco ruim - Porque não me diz um pouco mais sobre esses livros de mitologia, o que eles são?
Mikazuki: Bem, eles contam sobre mitos do mundo antigo, alguns até falam sobre uns modernos, mas os antigos são os mais populares. Normalmente eles são separados por cultura e/ou impérios antigos, sendo que as criaturas descritas neles, mesmo que únicas de em suas próprias formas, compartilham muitas semelhanças… não é que toda história tem um fundo de verdade?
Huali: Realmente, é que a segregação das espécies não foi igual para todos, os dragões foram retirados completamente em pouco tempo do plano terreno, já nós fomos retirados de forma gradativa, talvez nossos ancestrais possam ter se encontrado num momento anterior… aliás, o'que falam sobre os sátiros nos seus livros?
Mikazuki: Bem… - “Os sátiros eram uns tarados e eles viviam a vida toda bebendo e transando, eram coisa do Dionísio se eu não me engano, fora que só haviam sátiros homens… mas eu não vou falar isso para ela nem ferrando, deve haver alguma outra história que… JÁ SEI!” - Eu não era um leitor ávido de livros de mitologia, mas pelo que eu me lembro alguns deles, sátiros eram seres resilientes, muito prestativos e extremamente leais aos seus companheiros e amigos, não faziam corpo mole e tinham uma forte conexão com a mãe natureza - “De acordo com Percy Jackson!!” - E você encaixa certinho nessa descrição, parecem que fizeram a pesquisa deles direito - “ESPERO QUE ANTIGAMENTE ELES ESTIVESSEM MUITO ERRADOS ”
Huali: E-eu encaixo?! Você está me estimando demais - ela fica sem graça com a minha afirmação, o que me faz soltar um suspiro.
Mikazuki: “Você que se subestima demais” - acabei pensando, vendo um tom vermelho tomar o rosto dela, ela cora bem fácil mesmo… pior que isso me deu uma ideia divertida - Sabe de uma coisa? Há uma história que parte da mesma civilização a qual eu li sobre os sátiros, uma que explicaria muito bem a situação que estamos agora.
Huali: Sério?! Sobre o'que ela fala? - vejo um brilho de esperança surgir no olhar dela, o que faz uma culpa surgir em meu peito pelo que vou acabar de fazer, mas agora não tinha mais volta.
Mikazuki: Não é bem uma lenda em si, mas sim uma história bem popular lá no meu mundo, onde fala que heróis saem em missões e aventuras aonde recebem um companheiro para ir com eles… um sátiro - percebo que minha afirmação surpreende Huali, que esbugalhou seus olhos levemente.
Huali: Um sátiro?!... Mas o que isso tem haver com a nossa situação?
Mikazuki: Não consegue ver? Você é uma sátiro e eu sou um herói em treinamento, provavelmente estamos aqui porque você vai ser minha sátiro! Não é demais?! - tento soar o mais convincente possível nessa brincadeira, o que parece dar muito certo.
Huali: HÃ?! - o rosto da sátiro explode num vermelho intenso, tanto que ela solta o que parecia ser um guincho, me fazendo ter que segurar uma risada que quase explodiu para fora de minha boca - Su-su-a Sátiro?!
Mikazuki: Isso! Faz sentido, não faz? Só vou ser um herói de primeira se eu tiver uma sátiro de primeira como ajudante, tá tudo escrito detalhadamente nos livros e… - eu iria continuar a encher linguiça, mas Huali me interrompe rapidamente, balançando as mãos delas a minha frente de forma desesperada.
Huali: Es-espera um pouco! Calma! Você tem certeza disso?! Não são apenas histórias para dormir ou se divert…
Mikazuki: Nah! Detalhes, detalhes - a interrompi de volta, a deixando muito confusa - Vamos falar sobre seu codinome de ajudante e o seu pagamento, uns três salários mínimos dá pro gasto?
Huali: Como assim codinome?!... E o que é um salário mínimo?
Mikazuki: Um codinome para… espera aí, você não sabe o que é um salário mínimo? - pergunto um tanto surpreso, sendo que quando vejo ela responder positivamente com um aceno de cabeça, não consigo deixar de dar um sorriso travesso - Isso está ficando cada vez melhor!
Huali: HOI! Porque parece que você vai tirar vantagem de mim ?!
O rosto dela fica mais vermelho ainda, fora que consigo ver a irritação em seu olhar, ela até mesmo levanta e estica os braços ao lado do corpo, fechando os punhos como uma garota dando piti, o que me faz ter que segurar ainda mais a risada que lutava para saltar de minha garganta.
Mikazuki: Tirar vantagem? Eu?! Está insinuando que um aspirante a herói está tentando tirar vantagem de uma jovem sátiro?! Isso poderia me ofender, sabia?! - tento parecer o mais indignado possível, mas sinto que falhei miseravelmente nesse teatrinho, pois a sátiro cruza os braços debaixo dos seios e cerra seus olhos para mim.
Huali: Não foi você que disse para não me preocupar em ofender? - … aí ela me pegou.
Mikazuki: …
Não consigo resistir e acabo deixando um riso escapar de meus lábios, desviando meu olhar para o lado conforme continuava a rir quase que descontroladamente, ela havia me pego direitinho, tinha que admitir. Quando volto a olhá-la, percebo que Huali estava um tanto confusa e surpresa com a minha reação, o que era um tanto normal para as pessoas que conversavam comigo, é tipo meu charme.
Mikazuki: Desculpa, é que eu lembrei de uns livros para adolescentes sobre a mitologia grega, a qual retrata os sátiros, e não consegui deixar de brincar um pouco com você - confessei, dando um riso um tanto besta demais - Foi mal, mas não queria tirar vantagem de você, sério… a menos que queira virar minha ajudante, ai eu topo!
Huali: … - vejo o olhar irritado voltar a face da sátiro, que se encontrava toda vermelha, ainda mais pelas suas bochechas que se inflam de ar… queria poder tirar uma foto disso - Isso não é hora para brincadeiras! Precisamos pensar numa forma de sair dessa situação!
Mikazuki: “Eu sei… é que é difícil te levar a sério com você fazendo essa cara” - pensei, observando a sátiro desviar o olhar completamente envergonhada - Já pedi desculpas, ok? Só achei que seria muito legal ter uma sátiro para te acompanhar em aventuras, além de que você é uma garota mágica também, deixa eu sonhar um pouquinho.
Huali: … - observo o olhar dela voltar para mim, esse que pesou para sustentar, um olhar com uma tristeza que eu não esperava - Não é nada demais, vai por mim…
Mikazuki: Humm… eu até acreditaria em você, mas daí nós dois estaríamos enganados - brinco novamente, mas, dessa vez, Huali não esboçou reação alguma - Toquei num assunto delicado? Está tudo bem?
Huali: Não é nada… não tem nada haver com você, não se preocupe… - a postura da garota “murcha”, tanto que ela se ajoelha sobre o chão e olha para ele, o que me faz puxar meus lábios para o lado… aquilo não estava certo.
Mikazuki: Metade de trabalho de um herói é se preocupar com as coisas que não deveria, a outra é se meter em problemas que não tem nada haver com ele - afirmo com seriedade, o que faz a sátiro olhar para mim curiosa - Se tem alguma coisa te incomodando, pode me dizer, eu quero te ajudar.
Huali: … - vejo uma sensação de desconforto passar pela face da garota, que pareceu afastá-la ao balançar a cabeça suavemente, dando um longo suspiro - É que… bem… - ela desvia o olhar para chão por um momento, o tornando para mim devagar - Eu não sei bem se sou uma sátiro, eu perdi meus pais verdadeiros quando eu era muito pequena e fui acolhida por dois sátiros, eles diziam ser meus tios e que meus pais haviam viajado… só que eu não tenho todas as características de um: Não tenhos os cascos e as pernas peludas, as orelhas longas, a pelagem ao longo das costas e nem mesmo consigo berrar… nem daria para dizer que sou uma “garota mágica” também, minha magia é instável e mal tenho controle da minha mana… pareço uma junção de duas coisas que deu errado, eu sou uma aberração.
O clima pesa com a confissão da Huali, seu olhar desce até as flores ao nosso redor e seu semblante se fecha, criando uma distância entre nós que, não importasse o quanto eu refletisse, parecia que eu nunca iria alcançá-la. Suspiro levemente, eu conseguia entender até certo ponto como a Huali se sentia, ela estava deslocada do resto da sua linhagem, provavelmente devem importuná-la com isso para piorar… não é a toa que ela está dando tudo de si no trabalho e para ajudar os outros, ela quer ser aceita de alguma forma… ou é o que parece pelo menos.
Mikazuki: Sabe quando eu te falei sobre os humanos com quirks animais? Eles parecem com você, alguns mais peludos, outros menos, alguns com orelhas felpudas, rabos, chifres… Cada um deles possuem algum tipo de característica animal, o que os fazem serem segregados e agredidos pelas outras pessoas “normais”, principalmente nas cidades mais isoladas, vilas nem se fala… eu já vi acontecer - meu comentário parece trazer a sátiro um pouco mais para “perto”, o que já era alguma coisa - Sem falar que uma cicatriz que cobre metade do rosto e um braço inteiro de pedra também não são muito populares por lá… a questão é que esses tipos de detalhes estão bem fora do nosso controle, não há muita coisa que podemos fazer sobre eles… o que sendo bem sincero é uma droga - a última parte sai com um riso, sendo que me ajoelho sobre as flores junto a ela, o que me faz ficar bem a sua frente - Mas o lado bom das coisas que não podemos controlar, é que elas não importam, o que importa de verdade é as que controlamos: Nossas atitudes, nossas ações, as escolhas que fazemos, a moral que nos guia, ao o que nós dedicamos as nossas vidas… isso que é importante de verdade. Uma pessoa que quer ser melhor todos os dias, que cuida e zela pelos outros a sua volta e dedica sua vida para um propósito maior que ela mesma, para mim, essa pessoa pode ser oque for: Uma criatura mágica, um humano, dragão, lagartixa ou até mesmo uma mistura disso tudo… ela não vai deixar de ser alguém maravilhoso, um verdadeiro exemplo.
Naquele momento, minhas palavras chegaram até Huali, que me olhava com uma expressão que eu não conseguia decifrar ao certo o que era, só que com certeza era bem melhor do que a anterior, então apenas continuo.
Mikazuki: Huali, só o simples fato de existirmos é uma benção, ficar nos preocupando em se encaixar num lugar, num povo, numa linhagem, parecer com algo ou alguém, é tão desgastante e desnecessário. Você é única, incrível em sua própria maneira, então não se deixe abalar por essas coisas que você não tem controle, seja apenas você mesma, a melhor versão possível de si sempre que puder… pois existir alguém como você não é apenas uma bênção, Huali, é um verdadeiro milagre.
Huali: …
O olhar dela, que estava sustentando o meu, acabou cedendo e volta até as flores entre nós, a sátiro tinha ambas as mãos juntas sobre suas coxas, as pressionando logo em cima dos desenhos da sua meia calça. Sua expressão era de surpresa e indecisão, ela talvez não estava sabendo como processar tudo que eu havia dito, ou talvez não soubesse como se sentir, o que eu não a culpava, era um problema que ela deveria estar passando a muito tempo, só algumas palavras minhas iriam fazê-la mudar de ideia de repente… para alguém que se sente menos que todo mundo, além de deslocado, ver seu valor era uma tarefa que levava tempo.
Huali: Eu… - ela sussurrou, alto o suficiente para que eu escutasse, sendo que podia sentir uma certa melancolia vindo dela, com certeza ainda estava indecisa.
Mikazuki: Mas você nem comece! - a corto na hora com firmeza, a surpreendendo completamente, tanto que olha um tanto espantada para mim - “Eu não sou tudo isso”, “Você me estima demais”, “Você não me conhece direito”, “Sou um desastre” - falo com a voz fina, tentando imitá-la, o que sai bem zoado… o que era o plano - Nem vem com esse papinho de novo para cima de mim que vai azedar pro seu lado, eu não dei uma das opiniões mais verdadeiras e maneiras que eu já fiz na minha vida para você descartar desse jeito! A única outra forma que eu penso de fazer você me entender seria desenhando, e vai por mim, você não quer que eu desenhe, sou péssimo nisso e não quero passar vergonha! Já faço isso toda vez que tento pegar um lápis, já tentou pegar um com uma mão de pedra? É uma droga! - remexo meus dedos enrijecidos na minha frente, que fazem um barulho engraçado - Então nos faça o favor e nos poupe disso, ok?!
Huali: …
A sátiro havia ficado quieta durante todo o meu piti, esse que eu achei que havia sido um pouco “duro” e “incisivo” demais, o que faria ela se afastar novamente… até que vejo um pequeno sorriso surgir da sua face surpresa. A feição da Huali começou a se iluminar, tanto que um riso começou a brotar daquele sorriso, o qual ela tenta esconder com as mãos, só que é em vão, pois ele apenas começa a aumentar até que se tornou uma risada, que era abafada por ela da melhor forma que pode, conseguindo se acalmar alguns instantes depois.
Huali: Está bem, vou nos poupar disso, não vou ser uma ingrata - ela afirma com leveza, suas mãos agora pressionaram o seu peito e sua face mantinha uma expressão neutra… que acaba quebrando um pouco, pois um pequeno sorriso surgiu ali a iluminando mais uma vez.
No primeiro momento que encontrei Huali, eu não havia prestado muita atenção na sua aparência, apenas notando seus pontos mais característicos como seus chifres e seu cabelo azul, o que é um hábito que tenho desde sempre, mas, agora, nenhum detalhe dela passava despercebido pelos meus olhos. A observando, com certeza seu cabelo azul era o que mais me chamava atenção, que ostentava um tom bem claro perto da sua raiz que ia se escurecendo até as pontas, algo que vi poucas vezes em outras pessoas, será que era por causa de sua magia? Era encantador!. Também tinha seus chifres, que “surgiam” dentre as ondas de seu cabelo, o cortando como um navio negro com detalhes vermelhos cortaria um calmo oceano ao navegar, sendo que eles eram até que grandes e combinavam bem com ela, de alguma forma. Só que, com certeza, o que mais me cativou foram seus olhos, um tanto grandes comparado com a maioria, mas isso não era um problema já que eram magníficos, a cor da sua íris era a mistura de um roxo escuro e o mais brilhoso dourado, sendo que o roxo descia do topo dela, se misturando ao dourado no meio e se esvaindo perto do fim, como duas cores se misturando na paleta de um pintor. Fora que tudo que a Huali estava sentindo, por mais que tentasse esconder, era completamente entregue por eles: Medo, curiosidade, anseio, irritação, felicidade… eu podia ver tudo bem ali, como se fosse uma janela para o seu interior, uma que me convidava a observá-la e conhecê-la… puta merda, eu poderia fazer isso o dia todo.
Percebo que havia me focado um tanto demais nela, pois meus olhos caíram em seu sorriso por alguns instantes, esse que ela esconde com uma das mãos enquanto virava seu rosto, desviando seus olhos dos meus quando vou buscá-los, com seu rosto tomando uma cor carmesim claro, o que me faz bufar suavemente… por que isso mexe tanto comigo?
Mikazuki: Aliás, sabe de uma coisa? - indago, olhando para os lados e me aproximando um pouco, como se eu estivesse prestes a lhe contar um segredo, o que desperta a curiosidade da sátiro que acaba se aproximando - Não sei quanto a Morthaul, mas lá no meu mundo… - digo mais baixo, deixando minha fala morrer por um momento, olhando para o lado mais uma vez e inclinando para frente, chegando mais perto de Huali, que acabou fazendo o mesmo ao apoiar suas mãos no chão, virando o rosto para que eu pudesse sussurrar no seu ouvido - Uma garota tão linda como você, nunca seria chamada de aberração, não na minha frente.
Não deu outra, a sátiro praticamente deu um salto para trás e sentou com a bunda no chão, sendo que tive que segurar uma risada quando fez isso, fora que o rosto dela tomou uma cor tão vermelha que achei que ela iria desmaiar, batendo o recorde de todas as coradas que havia dado até agora.
Huali: Hãnh?!?! - ela indagou de um jeito engraçado, sendo que um sorriso travesso acaba surgindo em meu rosto por causa disso.
Mikazuki: Oque foi? Não escutou da primeira vez? Eu disse que uma garota tão linda como voc…
Huali: Eu escutei da primeira vez! - ela me cortou, agarrando as duas mechas de cabelo que caiam ao lado de seu rosto para cobri-lo, criando uma mistura interessante de cores - É só que… eu não esperava isso.
Mikazuki: Sério? Jurava que estaria acostumada a ouvir isso, é como se fosse um fato, sabe? Como o céu é azul, essas flores são brancas, como o vento que não para do soprar aqui e…
Huali: Eu entendi! - ela me cortou, me olhando por entre os fios azulados que escondiam seu rosto cor de pimentão - E eu não estou acostumada…
Confessou, soltando as mechas de cabelo e as ajeitando rapidamente, além de se sentar direito e ajustar sua postura, sendo que acabou pegando uma de suas mechas e começou a mexer com ela, a olhando com ternura enquanto um sorriso singelo, mas meigo, surgia em seu rosto, até que seus olhos caiam sobre mim.
Huali: Obrigada, Mika - sua voz saiu doce e, diferente das outras vezes, o sorriso e seu olhar se sustentaram enquanto olhava para mim…
Quando suas palavras chegaram até mim, e eu as processei, senti uma onda de calor percorrer meu peito de forma caótica, subindo sem qualquer resistência até ao meu rosto, que se quebrou completamente num sorriso bobo que eu não tinha controle algum. Quanto mais eu a fitava, mais o calor se espalhava pelo meu corpo, o que faz eu virar o meu rosto para o lado, a fim de quebrar o contato visual com ela, mas meus malditos olhos ainda se fixaram a ela, como se fosse um crime não testemunhá-la. Sendo que, durante todo esse tempo a fitando, um sentimento crescia em meu peito de forma que eu não poderia evitar nem com toda minha força de vontade, se misturando a algo que já estava encravado em mim há muito tempo: “Eu vou proteger esse sorriso, não importando o preço”.
Huali: Mika, você está vermelho - a voz dela me tira do pequeno transe que me encontrava, sendo que ela parecia conter um riso - Está tudo bem?
Mikazuki: Tá tudo ótimo, é que… ah, você sabe como é - tento desviar do assunto, o que faz a garota rir um pouco e eu também.
Só que nossos risos morrem quando uma forte baforada de vento nos pega de surpresa, fazendo o cabelo longo da sátiro esvoaçar e meu traje se remexer um monte, tanto que preciso levar minha mão a frente do meu rosto, fazendo a manga do Kimono bater no meu rosto algumas vezes. Quando finalmente a ventania dá uma trégua, levo meu olhar até Huali que parecia tão surpresa quanto eu, o que me faz olhar ao redor… de onde todo esse vento estava vindo?
Mikazuki: Caramba, estamos no topo de uma montanha ou coisa do tipo? - pergunto a ela, arregaçando as mangas do meu kimono até meus ombros, para depois passar minha mão em meu cabelo, que pegava fogo para ajustá-lo para trás já que havia caído sobre meu rosto - Nada seu saiu voando, né?... Huali?
Huali: Hã?! - ela me olhava de um jeito engraçado, fora que estava um tanto corada - Não não, está tudo aqui - um riso sem graça sai de seus lábios enquanto ela ajeitava seu cabelo um tanto depressa demais.
Mikazuki: Uééé, o que foi? O que é dessa sua carinha? - pergunto um tanto curioso e travesso, a olhando de lado quando ela tenta virar o rosto, o que ela estava pensando?
Huali: Não é nada! - cerro meus olhos para a sátiro, que começa a brincar com uma das suas mechas de novo - É só que… você é bem forte e… achei interessante como arrumou seu cabelo.
Mikazuki: Ow… - “eu não esperava por essa, mas eu gostei” - Obrigado, não sou um cara muito charmoso, então preciso me cuidar um pouco.
Huali: Olha, eu até poderia concordar com você, mas aí seria nós dois falando besteira - … essa daí menos ainda.
Mikazuki: Nossa, eu… hã… - acabo coçando minha bochecha um tanto sem graça, até que me toco de uma coisa - Ei, você me copiou!
Huali: Copiei sim - ela ri, abafando seu riso com ambas as mãos.
Balanço a cabeça levemente com um sorriso bobo no rosto, tentando afastá-lo com os movimentos enquanto me levantava do chão, o que fez a sátiro olhar para mim com curiosidade, sendo que apenas ofereço minha mão “boa” para ela.
Mikazuki: Que tal darmos uma volta por aí? Talvez encontremos alguma coisa - por mais que estivesse adorando conversar com ela, precisava focar no nosso problema, ainda estamos presos aqui.
Huali: Ah sim, claro!
Quando Huali toca minha mão, uma sensação familiar a percorre completamente, subindo por todo o meu braço que eu sentia queimar levemente, como se algum tipo de energia estranha estivesse o atravessando… era a mesma que eu sentia quando Izuku me atacava com os ataques de fogo diferenciados dele. Fora que parecia que a Huali também havia sentido algo também, pois ela me olha surpresa e solta minha mão rapidamente assim que se colocou de pé, olhando um tanto confusa para a sua própria, observando se havia acontecido algo com ela.
Mikazuki: Você também sentiu algo estranho?
Huali: Sim… era como se minha mana estivesse passando por você assim que eu te toquei, isso nunca aconteceu antes - espera, mana causava aquela sensação de queimação? - Eu nunca consegui conduzir ela numa corrente antes, é como se estivesse amarrada o tempo todo, mas pude senti-la se afrouxar um pouco… - pude ver um brilho de curiosidade e anseio em seus olhos, que se cravaram nos meus num instante, sendo que eu podia ver exatamente o que ela queria.
Ofereço minha mão a sátiro mais uma vez, que havia tirado as luvas que cobriam suas mãos e a segurou, trazendo a sensação de queimação até mim mais intensamente do que antes, que percorreu todo o caminho do meu braço até meus ombros, se espalhando pelo meu pescoço ao mesmo tempo que fazia um arrepio surgir em meu corpo. Mal percebo quando Huali solta minha mão, a sensação de queimação se pendurou por alguns instantes até que se amenizou, sendo que tomo um susto quando olho para a azulada, que tinha fios de lágrimas caindo de seus olhos, além de estar com suas mãos juntas se firmando fortemente em seu peito, aonde deveria ser seu coração.
Mikazuki: Huali? Você está bem?
Quando eu me aproximo dela, mal vejo suas mãos se aproximarem da minha novamente, ela simplesmente a agarra e trás para perto de si, a colocando em seu peito. No momento que a toco, posso sentir toda a energia dentro dela se movimentando em várias correntes, que saiam de todas partes de seu corpo e se encontrando exatamente aonde eu a tocava. Contudo, a sensação de queimação nunca me deixou, que se tornou mais intensa conforme a energia dentro de Huali se expandia e soltava, tanto que eu estava começando a me assustar, naquele ritmo talvez ela…
Mikazuki: “Merda” - eu reconhecia aquela sensação, já havia acontecido algo parecido comigo antes, ela iria… - HUALI!
Huali: … - a sátiro apenas olha para mim assustada, seus olhos lacrimejavam e ela abriu sua boca, contudo, antes que pudesse dizer algo para mim, ocorre exatamente o que eu temia.
A energia que acumulava em seu peito se expandiu abruptamente, explodindo para fora… o que me atingiu em cheio. Um som gravíssimo invade meus ouvidos ao mesmo tempo que sou empurrado com uma força tremenda, me arrancando do chão e me lançando para trás numa velocidade assustadora. Eu consigo sentir as flores batendo nas minhas costas por alguns instantes, até que minhas pernas passam por cima da minha cabeça e eu giro em pleno ar, atingindo o chão logo em seguida e capotando de forma descontrolada.
Mikazuki: HOLY SHIT!!! - uso minha mão direita para agarrar o chão, fincando meus dedos nele para desacelerar, o que acaba acontecendo rapidamente por causa da minha individualidade.
Paro de bruxos contra o chão, sentindo o gosto amargo das flores que entraram na minha boca, acho que engoli algumas nesse trajeto insano que tomei. Consigo me levantar parcialmente ao ajoelhar e esticar meus braços contra o solo, o qual encarei por alguns segundos antes de finalmente me colocar de pé. Olho em volta para me localizar e acabo tendo uma surpresa, eu consigo achar a árvore aonde eu e a sátiro estávamos antes da explosão, contudo, a distância era impressionante.
Mikazuki: “Isso deve dar no mínimo uns 100 metros… melhor eu me apressar” - penso, para então cuspir no chão, o gosto das flores era uma merda.
Corro em direção a árvore, procurando a sátiro pelo caminho, varrendo o campo de flores com meus olhos numa atenção que normalmente não tenho, o expurgo de energia havia sido forte demais, Huali pode ter se machucado seriamente. Só que, graças a Deus, ela parecia estar bem, pois a vejo deitada sobre o chão logo ao lado da árvore que, por um milagre, também se encontrava intacta… como isso era possível?
Mikazuki: Huali, você está bem? - eu a chamo, mas ela não responde, ela havia apagado - Huali!
Eu toco o seu braço com cautela, tremendo que algo parecido acontecesse novamente, contudo, nada ocorreu, então a seguro em meus braços rapidamente para vê-la melhor. Sinto que sua respiração estava calma e suave, como se estivesse a dormir, sendo que também escuto seu coração bater num ritmo parecido ao colocar meu ouvido em seu peito.
Mikazuki: Mas que merda que eu fiz? - sussurrei, puxando para o lado alguns fios de cabelo dela, que caiam sobre sua face - Vou tirar a gente daqui, Huali.
POV Narrador
O moreno olhava para todos os lados, tentando buscar desesperadamente algum ponto de referência, qualquer coisa que pudesse lhe trazer de volta para a árvore caso se afastasse demais, a última coisa que queria era se perder nesse campo de flores aparentemente infinito. Contudo, o único lugar que ele poderia achar qualquer referência era o que ele justamente não estava olhando… o céu, o qual brilhava com as mais diversas estrelas… contudo, apenas uma constelação, essa que olhava para o “casal” abaixo com atenção, impressionada com o que estava presenciando.
???: “Depois de todo esse tempo, foi um deles que nos libertou?... isto era inesperado”
Descendendo dos céus, a constelação brilhou fortemente uma última vez no céu noturno, chamando a atenção de Mika que estava logo abaixo, observando o conjunto de estrelas despencar rapidamente em sua direção, o que o fez se afastar assustado. As estrelas da constelação se juntaram num único ponto brilhoso acima das nuvens, às atravessando com velocidade ao mesmo tempo que puxava parte delas consigo.
Mikazuki: Pelo amor de Deus, não me fala que isso é um OVNI, não to afim de lutar contra o ET - o mesmo sussurrou, trazendo Huali para mais perto de si, a segurando com firmeza.
Conforme o enorme ponto luminoso descia, sua luz se enfraquecia e a “nuvem” que a rodeava começava a tomar uma forma familiar pelo rapaz, que olhava para aquilo com descrença. Diminuindo até ficar com um tamanho relativo ao casal abaixo de si, a constelação chega no solo num forte baque, fazendo as flores ao seu redor perderem as pétalas, que saíram voando pelo ar e se envolvendo nas nuvens que rodeava a constelação. Mikazuki olha para a figura com surpresa e receio, levando Huali mais para sua lateral, expondo o máximo possível do seu corpo para a figura a sua frente caso ela o atacasse, contudo, algo dizia que isso não iria acontecer.
Mikazuki: Você… quem é você?
???: “Olá… esta não esperava que um aspecto viesse aqui, ainda mais que protegesse a sua progênie” - uma voz fina e suave adentrou os ouvidos do rapaz, uma que se parecia extremamente com a de Huali
A figura havia tomado a forma de um animal que não era totalmente estranho para o Mika, ele podia jurar que já havia visto em algum lugar, mas o que estava mais chamando sua atenção era os detalhes que ela ostentava, os chifres negros com a mesma tonalidade de cores do que a sátiro que carregava, a cor das “nuvens” que formavam seu corpo dia de um azul extremamente claro até tons mais escuros, criando uma vibração que lembrava o cabelo de Huali, como também sua forma lembrava muito de uma cabra ou bode, só que o que mais o surpreendeu foram os olhos, um tom vermelho tomava conta de suas pálpebras como se fosse uma sombra e ela não os abria, mesmo quando estava a falar.
Mikazuki: Progênie? Huali é sua filha? - o moreno olha para a sátiro e para a criatura, notando mais ainda suas semelhanças - Mas ela é um sátiro e você parecer ser uma Qilin… ah não ser que…
???: “Huali é a receptáculo desta, a última dos Qilin… você tem bons olhos, aspecto, mas esta há uma questão a você” - a qilin dá passos devagar em direção a Mika, que a acompanha atentamente com os olhos - “Porque você nos libertou das amarras dos cosmos? O que pretende com isso?”
Mikazuki: Libertei vocês do que? E o que quer dizer com Aspecto? - o moreno estava confuso com aquela conversa, a qilin falava de um jeito muito zoado, contudo, o mesmo acaba se lembrando do que seu “demônio” havia lhe dito no dia do festival - “Espera, aquele cara falou que eu era aspecto dele… Mas o que isso quer dizer?” -
???: “Sua confusão não responde a pergunta desta, você não sabe de nada ou quer transparecer que não sabe… esta não reconhece se isso é uma benção ou uma maldição… só o futuro irá dizer, pois apenas outro asura poderia liberar o selo” - Mika conseguia sentir o ar ficar mais gelado conforme a qilin se aproximava, podendo observar os cristais de gelo se formando no espaço ao redor dela - “Você tem alguma ideia de onde você está?” - ao receber um aceno negativo como resposta, a qilin continua - “Aqui é o jardim das constelações, o local aonde esta e meus irmãos nos encontrávamos a muito tempo, antes da guerra… mas, agora, há apenas a mim. Esta foi selada aqui nu último esforço do Flagelo dos Cosmos, antes que ele recuasse por causa de suas feridas, esta esteve presa nos últimos milhares de anos, vendo os Qilins morrerem um a um durante a guerra… agora há apenas a Huali, a única que consegue acessar o poder desta”
Mikazuki: Eu… eu sinto muito por sua família - a fala de Mika acabou surpreendendo um pouco a constelação, que ajeitou sua postura - Não vou fazer mal nenhum a Huali, ela é a única que lhe resta, não é? Você vai dar seus poderes a ela?
???: “Esta agradece sua compaixão… contudo, há dúvidas sobre suas intenções” - a Qilin para a poucos metros de Mika, abrindo os seus olhos e revelando que eram idênticos aos de Huali - “Seu asura não lhe enviou aqui? Porque o Aspecto do Fim libertou a última constelação?”
Mikazuki: Eu não sei o que significa ser um aspecto, mas sinceramente, não quero me envolver nos assuntos daquele maluco que fica de bobeira na minha individualidade - o rapaz entra um pouco na defensiva, sem saber ao certo o que a Qilin esperava dele - E eu não vou definir minhas ações no que as pessoas acham ou esperam que eu seja, não vou machucar uma garota por causa de uma guerra que não é minha.
???: “Mas agora ela é sua, aspecto, o asura que você carrega vai lhe arrastar até a guerra… você é inimigo desta, inimigo de Huali. Nosso destino é lutar até que um de nós caia, ou ambos.” - a fala da constelação assombrou Mika, que olhou preocupado para a moça dormente em seus braços.
Mikazuki: Inimigo? Pelo amor de Deus, nós nos conhecemos hoje!! Huali nunca fez mal nenhum para mim, fora que estávamos trabalhando juntos para entender o que estava ocorrendo aqui, nos conhecemos e… ela é incrível. E eu não acredito em destino, eu faço meu próprio futuro! - os olhos do moreno caem mais uma vez para a Qilin em seus braços, a qual ele aperta contra si - E que tipo de demônio faria algo ruim com ela?
???: “O seu faria, aspecto, ele e seus irmãos mataram todas as constelações, só restou esta… - Mikazuki volta seu olhar para Qilin, que se aproximou mais uma vez, parando logo a frente dele - “Você se voltaria contra eles para protegê-la? Lutaria contra a sombra que carrega dentro de si?”.
Mikazuki: … - a pergunta pega Mikazuki de surpresa, que olha para a Huali dormindo tranquilamente em seus braços, para então dar um suave suspiro - Sim, eu vou protegê-la… matarei todos eles se for preciso.
???: “...” - aquilo realmente havia surpreendido a Qilin, a qual começou a flutuar ao fazer suas pernas sumirem, - “Então dê a esta sua progênie, vou prepará-la para a luta que irá vir, os asuras já devem saber que esta foi libertada e irão começar a se mover” - a Qilin se aproximou ao ponto de quase tocá-lo, sendo que Mika hesitou por um momento antes colocar Huali sobre ela, que se aninhou tranquilamente no corpo gélido da constelação, que parecia uma nuvem ao flutuar - “Esta não sabe o porque de um Asura escolher um aspecto como você, mas esta é grata a ti, Mikazuki”
Mikazuki: Cuide bem dela, ela está precisando… - a voz de Mika fica incerta, seu olhar se intercala entre a Huali e a constelação - Eu a verei de novo?
???: “Por mais que não acredite, seus destinos estão entrelaçados agora, o futuro de ambos será o mesmo, agora, qual rumo irá seguir, vai depender apenas de vocês… rogo que as estrelas lhe guiem para o futuro que desejem, mas agora seu mundo lhe chama”
Ao dizer isso, uma porta branca, a mesma que havia trazido Mikazuki até o jardim, reaparece logo atrás dele, se abrindo num rangido bem longo que o assustou um pouco, o fazendo olhar para trás. Assim que o moreno nota sua volta para casa, ele olha mais uma vez para as Qilins, dando um meio sorriso para elas, se despedindo ao observar Huali uma última vez, cravando a aparência dela e os momentos que passaram ali em sua memória antes de partir, atravessando a porta e deixando aquele mundo para trás.
???: “Este foi um encontro inusitado…” - suspirou a Qilin, olhando para sua descendente descansando junto a si, para então apoiar cabeça sobre a dela, acariciando seus cabelos com o focinho - “Cativar o coração de um demônio não é tarefa fácil, pequena, mas você o fez… será que uma união será os frutos de hoje?”
Enquanto a constelação descansava junto a sua progênie, Mikazuki voltava para Asuraragūn, batendo de frente com o asura que carregava, esse que estava um tanto curioso para onde o rapaz havia ido, afinal de contas, ele parecia profundamente irritado consigo, mais do que o normal.
Mikazuki: Você - sua voz saiu fria enquanto apontava o dedo para a sombra - Vai me responder algumas perguntas.
???: Eu tenho escolha?... parece que não - um sorriso debochado surge em seu rosto, o que será que o pirralho queria saber?
Mikazuki: Você lutou numa guerra contra criaturas mágicas? Já matou algum Qilin?
???: Olha só, isso foi bem específico, moleque - debochou, ficando de pé e se esticando - Eu lutei contra os dragões e as criaturas mágicas a muito tempo atrás, matei diversos deles… mas nunca um Qilin, isso é coisa do meu irmãozinho, nunca gostei de matar as crias de Gaia… principalmente as mais belas - a sombra fita Mika, que parecia pensativo com aquela questão - Porque a questão? Encontrou algum do outro lado? Achei que a esse ponto todos tinham sido mortos.
Mikazuki: Não foram, eu me encontrei com a última deles, libertei o selo que impedia sua constelação de se manifestar ou algo assim, agora ela está de volta com a família… mas irão atrás dela.
???: … Espera aí, você libertou a última constelação de seu jardim? Você soltou a capricórnio?! - Mika acena um sim confuso com a cabeça, o que faz a sombra gargalhar fortemente, quase como se tivesse se divertindo com a ideia - PUTA MERDA MOLEQUE, VOCÊ TEM IDEIA DO QUE FEZ?! VOCÊ COMEÇOU UMA GUERRA! MEUS IRMÃOS IRÃO DIZIMAR MORTHAUL INTEIRA PARA MATÁ-LA!
Mikazuki: Não, não irão - mantendo a calma, Mika afirma aquilo friamente, surpreendendo a sombra - Essa guerra ocorreu há milhares de anos, porque continuar a matança? Qual o sentido? Não tem como falar para seus irmãos pararem?
???: E porque eu o faria, rapaz? - sua indagação faz Mika ranger os dentes, oque lhe arrancou outra risada - Mas sério, mesmo se eu o fizesse, eles não me escutariam, as criaturas mágicas, os dragões e os humanos devem perecer para Gaia poder sobreviver, algo que nós iremos fazer de bom grado… ao menos era assim.
Mikazuki: Então vou precisar de seu auxílio para vencê-los… não quero que ela morra, ninguém mais tem que morrer nessa luta sem sentido, e porque Gaia não faz algo a respeito?! Quem quer que ela seja.
???: Parece que você não sabe como as guerras funcionam, moleque, fora isso, está realmente pedindo para que eu traia meus irmãos? - a sombra ignora a pergunta sobre Gaia de propósito, algo que não passa despercebido por Mika.
Mikazuki: Quero que faça a coisa certa, droga! - grita o rapaz, lançando seu braço para o lado, fazendo a água do lago se mexer violentamente - Qual o sentido nisso?
???: E o que você sabe sobre certo e errado? Você não sabe metade do que ocorreu a milhares de anos atrás… você é muito jovem para isso - explica a sombra, observando a calma do rapaz desaparecendo cada vez mais - Está tentando achar uma solução para um problema que mal conhece.
Mikazuki: É! Porque vocês não conseguiram achar uma em milhares de anos, e aqui estou eu, nessa bagunça infernal que vocês me meteram e que terei que resolver - vociferou, achando que estava começando a ficar maluco - Vai fazer sua parte para ser a solução ou não?
???: … - a sombra cruza os braços, olhando o rapaz de cima a baixo - Will, você tem ideia no que está se metendo?
Mikazuki: Não muita, mas sei que é algo que precisa ser feito e que tenho parte da responsabilidade, querendo ou não… e então, o que vai ser?
???: Vai ser o'que tem sido, moleque, quando você for capaz de compreender e usar meus poderes, poderá fazer o que quiser… mas antes, terá que se provar para mim.
Mikazuki: Muito bem então, que seja - quando fala isso, uma luz brilhante começa a surgir no horizonte… era o alvorecer de um outro dia - Mais uma noite sem dormir, parece que não tenho sorte.
???: Já está reclamando?!
Mikazuki: GO FUCK YOURSELF!
A sombra gargalha com a reação de Mika, esse que vai se esvaecendo do lago, voltando para seu corpo no mundo real, deixando a sombra sozinha em sua individualidade, essa que fecha seu semblante assim que fica só, olhando para a escuridão deixar o lago mais uma vez. Já em outro lugar, uma Qilin ajeitava os papéis em cima da mesa de seu escritório, que estava finalmente organizado, a bagunça que a azulada havia feito de madrugada nem pareceu que sequer esteve ali.
Yuriko: Então você sonhou que encontrou um humano num jardim de flores, ele era um tipo de herói da terra, te deu conselhos, além de que parece ter te ajudado com sua magia? - a Kitsune comentou sentada no sofá num dos lados da sala, refletindo sobre o assunto que a azulada estava falando nos últimos minutos.
Huali: Se for resumir, foi praticamente isso… se bem que eu não sei se foi só um sonho, foi tudo tão vívido e me lembro com tantos detalhes, parecia que eu realmente estava lá, sabe?
Yuriko: Se não foi só um sonho, o que mais poderia ser? - indagou a rosada, se levantando do sofá e indo até a “sátiro”, que pegava mais algumas folhas - Algo está me dizendo que você não quer que seja só um sonho, desembucha.
Huali: É que… bem… - a Huali fica visivelmente sem graça, apertando suavemente os papéis que carregava - Eu não quero pensar que o Mika seja apenas fruto da minha imaginação.
Yuriko: Mika?
Huali: O humano, Mikazuki Williams Oze, Mika é como ele pediu que eu o chamasse…
Yuriko: Ah sim! Eu deixei passar batido, me desculpe - a kitsune dá leves tapinhas nas costas da garota, que a olha com curiosidade - Agora está na hora de você ir fazer seus afazeres, chô chô, não vai ficar sonhando acordada em!
Huali: Está bem! Eu sei!
Um tanto confusa por ser expulsa de sua própria sala, Huali sai para os corredores do santuário, deixando Yuriko sozinha no local, essa que dá um longo suspiro e cruza os braços, os apertando suavemente enquanto soltava grunhidos como uma raposa inquieta.
Yuriko: “Eu desconfiei quando a vi chegar, sua magia estava diferente em vários aspectos e mais estável… Huali despertou, o humano era um aspecto? Não sabia que existia um que conseguiria resistir a influência de um Asura… fora isso ele a encontrou e libertou sua constelação, será que realmente foi um acidente?... Se bem que isso não importa, a monarca deve saber… a segunda guerra santa começou.”
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