História Jardim dos Pecados - Único

_Você ainda pode ver um coração em mim? Me salve do meu medo… Não arranque tudo o que ainda me resta...Eu sinto as trevas em meus ombros. - Implorou Kahlil aos espiritos antigos sem sucesso.

No jardim dos pecados cada rosa é perfeita e única assim como as almas quando se encontram e no lapso temporal se tocam, delicadamente deslizam dentre nuvens de volúpia e se aconchegam em lençóis de imortalidade. Tudo seria doce, tudo seria belo, se não fosse unilateral, ou mesmo dicotômico, porém momentâneo. A imortalidade bem como outras obrigações nobres podem ser um fardo pesado.

Kahlil naquela manhã teve de partir, sem saber se voltaria. Da porta da cabana no acampamento ele olha Andora enquanto dormia. Os primeiros raios de sol lampejavam acima das colinas no horizonte e a brisa soprava como numa doce e triste melodia de despedida.

_Se eu tivesse lhe dito algo, certamente não aceitaria o meu adeus. Preciso ir... Tenho de achar uma maneira de não sacrificá-la, mesmo que isso implique em perdê-la para todo o sempre. Prefiro observa-la de longe, apenas lhe vislumbrar em meus pensamentos do que pensar na possibilidade de ferí-la. - Sussurrava ele em tom de lamento.

O orvalho ainda vestia a relva, Kahlil suspira e lança seu olhar tristonho uma última vez sobre Andora. Em completo silêncio ele então parte deixando a cabana e o acampamento. Existe dentro de todos nós um lugar obscuro, um lugar bem profundo onde guardamos todos os nossos medos e pecados, Kahlil já não podia mais conter tantos anseios e segredos para Andora e Nephys, somente ele possuia o real conhecimento da tradução do Osírico Antigo cunhado no livro de seu pai, nem mesmo seu irmão conseguira realizar uma tradução tão completa e precisa das profecias como ele. O que o demônio pálido de cabelos negros havia vislumbrado com seus olhos congelantes acinzentados não era algo belo e muito menos agradável em seu futuro.

Grandes resultados vem de grandes sacrifícios e o príncipe de Osír estava prestes a fazer o seu em troca da liberdade do destino de Andora e de Nephys, bem como de todos os demais Cavaleiros da Resistência. A alma de Kahlil era muito mais preciosa para a Feiticeira Sombria do que qualquer outro sacrifício.

_Eu me perdi em minha busca por sabedoria e me esqueci de onde vim. - Balbuciou o cavaleiro negro de Osir, trajando sua armadura de trevas e lágrimas, partindo para o sacrifício nas colinas Morthis.

Nas mãos de Kahlil o medalhão de seu pai e em seu dedo o anel de sua mãe, a quem a Feiticeira Sombria odiava com todas as forças... Mas em seu coração, junto dele iam Andora e Nephys, sem medo, sem dúvida, Kahlil partia rumo à morte como o cavaleiro que marcha para a sua última batalha.