Londres, Inglaterra
• Junho de 2024 •
Point Of View: Sophie Jennifer Windsor
— Anda mamãe, senão vamos nos atrasar pro jogo!
— Você tem certeza que vai com essa camisa?
— Óbvio! Eu não vou trair meu papai.
Suspiro enquanto ela parece lembrar de algo e corre em direção à seu quarto vestindo a tradicional camisa branca merengue com o número 4 gigante estampado atrás.
Cinco anos e meio desde que minha vida virou de cabeça para baixo e eu fui obrigada a tomar diversas decisões que eu não estava preparada no momento. Tudo começou ao ver o resultado do exame, saber que eu estava carregando um bebê dentro de mim depois de tudo o que eu havia passado foi surreal e eu inclusive demorei pra acreditar ou, até mesmo, aceitar. Mas era tudo bem real, tanto que na consulta com meu médico eu fiquei sem chão quando ele disse tudo que eu não queria ouvir: a gravidez era de alto risco por conta dos meus problemas e em suas próprias palavras “Eu te aconselho a não levar a gestação adiante”, eu sai do consultório aos prantos. Em um dia eu não poderia ter filhos, no dia seguinte eu milagrosamente estava grávida, depois eu teria que escolher entra minha vida e a do meu bebê? Era inacreditável. Eu ainda recebi a notícia com 11 semanas de gestação, ou seja, eu tinha uma semana pra estragar a minha vida não importava como fosse.
Mas eu não aceitei, fui atrás de outros médicos e o meu de Londres disse que eu conseguiria ter minha filha, mas minha vida iria mudar e muito para eu conseguir ter uma gestação saudável.
Falar com um clube que você acabou de assinar que você está grávida também não é nada fácil e o pior? Pedir para eles não darem a notícia.
Eu ainda joguei 3 jogos, no terceiro eu sofri uma lesão que não estava nos planos, uma torção de tornozelo junto com uma lesão muscular na coxa o que já me deixaria fora das quadras por um bom tempo, porém entramos em um comum acordo e para a mídia a minha lesão era apenas muito pior do que se imaginava e eu seria obrigada a me afastar do vôlei por tempo indeterminado. Eu ainda não voltei.
Até hoje não sei bem o porque de eu ter preferido não contar para o Sérgio, Daniela sabe quem é o pai dela e é completamente apaixonada pelo Real Madrid. No fundo eu não estava pronta para voltar para ele e também não estava madura o suficiente para manter uma relação cordial então eu resolvi criá-la sozinha e, modéstia à parte, posso dizer que já o fiz e faço da melhor maneira possível. Claro que já tiveram diversas vezes em que eu quis contar para ele, no fim eu nunca tive coragem e fazia minha cabeça que se eu nunca contei é porque realmente não era para ter contado.
Hoje é a final da champions league, Chelsea x Real Madrid no Wembley e como presente de cinco anos minha filha escolheu ir ao jogo. Não posso negar que eu estava nervosa, primeiro porque depois de tanto tempo meu time estava novamente na final do campeonato de clubes mais importante do mundo, segundo que depois de tanto tempo eu iria vê-lo mais perto do que nunca. Só espero que ele não me veja.
Mas ele não vai, hoje é seu último jogo com a camisa do Real Madrid e como jogador profissional. Ele anunciou isso às lágrimas logo após o último jogo da la liga e eu quase não acreditei. Ele pode ter baixado o nível para um clube como o Real Madrid e fica no banco durante várias partidas, mas preferiu parar de jogar do que se aposentar em um clube que não seja o que ele mais ama na vida. Achei uma atitude honrável.
Dirigindo por àquelas ruas londrinas um filme dos últimos anos passava em minha cabeça, minha mãe sempre me apoiou então eu vim morar com ela enquanto ainda estava grávida e só me mudei quando minha filha tinha três anos e foi quando eu finalmente entendi o que é ser mãe, quais eram minhas responsabilidades porque eu não podia mais viver com minha mãe sendo mais mãe pra minha filha do que eu mesma. Ela estava cansada demais pra isso.
Nunca foi do meu feitio, mas eu agora era apenas mãe, poderia estar morando em um castelo que meu pai falou que era pra mim porém eu preferi um apartamento em uma região mais calma de Londres onde eu conseguiria morar sozinha e não me perder dentro da minha própria casa.
Harry foi provavelmente quem mais me ajudou nisso tudo, pois desde que eu tomei minha decisão ele e a Meghan me apoiaram e sempre me ajudaram para tudo. Nossas filhas tem basicamente a mesma idade e são, além de primas, melhores amigas tanto que frequentam o mesmo colégio e passam 90% do tempo juntas. Eles já tiveram outro filho, que tem dois anos e eu sou uma das madrinhas, no fim a família deles era maravilhosa e eu sabia que poderia contar com eles para tudo.
Eu também decidi largar o vôlei de vez, me ausentei da vida pública e estou tirando esse tempo só pra mim e pra minha família, o Zé Roberto mostrou-se um pouco triste quando eu falei pra ele, mas eu não poderia continuar nem em clubes muito menos na seleção. Eu estava bem como eu estava agora, sem vida pública para me preocupar.
Me sentia culpada às vezes, já que grande parte das minhas finanças acabavam vindo da pensão do meu pai pois o meu trabalho se resumia a tomar conta da agência da minha mãe quando ela viajava, mas mesmo assim era apenas isso que eu precisava, estava feliz assim, sem ninguém para me abalar.
Quando cheguei ao estacionamento segui em direção aos camarotes já mostrando minha credencial, do Real Madrid apenas Marcelo sabia de tudo e eu havia dito que estaria hoje aqui. Espero que ele não abra a boca pra quem não deve.
Quando o jogo começou eu estava tremendo e sentia cada pelo do meu corpo se arrepiar todas as vezes em que o Real rondava a área dos blues, mas o primeiro tempo não passou muito disso, nem o segundo onde os times pareciam que estavam se preservando.
Eu provavelmente tive um mini ataque cardíaco quando percebi que haveria prorrogação, se tivessem pênaltis eu ia morrer aqui.
Os jogadores pareciam ter ouvido minhas preces e o jogo novamente ficou muito movimentado, mas infelizmente não da forma que eu gostaria quando o Real e ainda por cima meu ex fez o primeiro gol do jogo, minha filha comemorou muito ao meu lado e eu fiquei apenas com uma cara de frustada quando vi que o primeiro tempo havia acabado ainda em 1x0.
Mas não demorou muito para as coisas mudarem e no primeiro lance do segundo tempo o chelsea empatou e, por incrível e inacreditável que pareça, virou no último lance do jogo.
Eu poderia explodir de tanta felicidade no momento.
Mas toda àquela alegria foi pelos ares quando eu me virei e encontrei minha filha sentada no chão no canto do camarote toda encolhida e notavelmente chorando.
Mas por futebol? Isso nunca havia acontecido.
— Filha, se acalma. No esporte é assim, nem sempre nosso time ganha e temos que nos acostumar a perder também.
— Não é isso mamãe.
Ela diz levantando o rosto e enxugando os olhos com a palma das mãos. Me sentei ao seu lado e a puxei para o meu colo.
— O que é então, meu amor?
— Quando um time ganha um campeonato assim as famílias dos jogadores vão pra dentro do campo, eu já vi e é sempre assim. Achei que se eles ganhassem eu ia poder conhecer meu papai.
Doeu, tanto quanto um tiro e mais que tortura. Lágrimas brotaram em meu rosto e eu não sabia o que responder para ela que ainda se desculpou achando que tinha falado algo que me chatiou. Mas ela apenas estava sendo uma criança como outra qualquer e eu que estava sendo a pior mãe de todas por ter privado ela de algo assim.
Não é justo forçar uma criança á crescer sem um pai quando você não sabe se ele a rejeitaria ou não simplesmente pelo fato que ele não sabe da existência dela.
Fiquei um tempo para me recuperar e esperei até a premiação terminar e acabei tomando uma atitude um tanto quanto impulsiva devido aos últimos acontecimentos.
Peguei minha filha e segui pelos corredores do estádio em direção aos vestiários, minha credencial que Marcelo havia conseguido obviamente me dava acesso á todos os locais daquele lugar e rapidamente eu já estava em frente á uma porta escrito “visitante” com Daniela em meu colo e meu pés batendo freneticamente no chão.
Era tarde demais pra desistir?
Quando esse pensamento passa pela minha cabeça vejo Casemiro sair do local e se espantar ao me ver ali.
— Sophia? Quanto tempo! E quem é essa coisa linda aqui?
Nos abraçamos e ele pegou Sophia do meu colo que o abraçou e sorriu pra ele, ela era uma criança muito amável.
— É a minha filha, Daniela.
Ele se assustou quando eu falei mas eu tentei ignorar.
— Parabéns Casemiro, vocês jogaram muito bem hoje, fiquei muito triste que vocês não ganharam.
— Então você torce pro Real? – ela afirma com a cabeça – Que legal, que tal eu conseguir autógrafos de vários jogadores pra você? – ela concordou completamente animada e por um momento eu esqueci dos problemas e foquei naquele momento. – não sabia que você estava casada ou sequer namorando, Sophia.
— Eu não estou.
Antes que ele pudesse falar ou perguntar qualquer outra coisa, Isco e Asensio saem lá de dentro e quando me veem ambos literalmente pulam em minha direção me abraçando ao mesmo tempo.
— Eu estava morrendo de saudade vagabunda! Você não podia ter sumido assim.
— Verdade, já faz anos e não tem um dia que eu não sinto tua falta em Valdebebas, você deixava aquele lugar bem menos chato do que pode ser.
— Eu sei que vocês me amam muito, mas porque você sumiu assim? A gente mal se fala por mensagem.
— Vida de mãe é bem ocupada.
Os dois não acreditam e se viram vendo minha filha em uma conversa muito animada com Casemiro ao meu lado.
— Sua filha?
Afirmei e Isco ainda parecia digerir a mensagem enquanto vai em direção ao companheiro de time junto com Asensio e ficam mimando um pouco minha filha.
Eu não consigo descrever os minutos seguintes.
A porta se abre e dela sai um indivíduo com uma cabeleira que esconde o que vem atrás, ele abre um sorriso vindo me abraçar que por um segundo eu nem vejo o que, ou melhor, quem estava bem atrás dele.
Quando vi aquele zagueiro todo tatuado aparecer no lugar eu senti tudo em mim tremer, mas a nossa tensa troca de olhares teve fim quando minha filha viu o Marcelo e gritou já pulando para o colo do “tio” que ela adora.
Naquele momento eu prestei atenção na cena e me permitir sorrir pelo pouco tempo que me sobrava.
Eu precisaria ser forte.
Daniela repetiu com Marcelo o que já havia feito com os outros, tentando consolá-lo. Eu estava me derretendo com a cena, minha filha era a coisa mais fofa do mundo.
Não demorou muito para Casemiro, Isco e Asensio seguirem seus caminhos e logo depois Marcelo fez o mesmo não sem antes lançar um olhar intimidador para mim quando me entregou minha filha.
Eu sabia muito bem o que ele queria dizer.
Olhei para frente e Sérgio permanecia no mesmo ligar, completamente imóvel e naquele momento eu também fiquei assim, até que finalmente Dani percebeu a presença dele no recinto.
Ele se aproximou sem dizer nada, encantado com a criança em meu colo e muito provavelmente tentando entender porque eu tinha comigo uma mini pessoa que era basicamente a cópia do Sérgio quando mais novo, o cabelo era provavelmente a única e mais notável diferença. E eu infelizmente não estava exagerando, Daniela era idêntica ao pai.
Quando ele notou sua aproximação rapidamente estendeu os bracinhos e como um reflexo Sérgio a pegou, eles ficaram se olhando por longos minutos e eu fiquei ali parada sem saber o que dizer.
Eles também pareciam estar na mesma situação.
Do nada ela começou a consolá-lo pela derrota e ele continuava ali, admirando-a como se ela fosse uma jóia rara que ele havia acabado de descobrir.
Bom talvez ela realmente fosse.
— Dani, faz um favor pra mamãe? Fica com seus tios um pouco que daqui a pouco eu te busco.
— Agora não mamãe, por favor.
— Prometo que vai ser rápido, filha.
— Porque eu não posso ficar aqui com o papai?
Eu travei, Sérgio também. Ele poderia estar desconfiando a esse ponto mas eu não esperava que a revelação concreta viesse dessa forma.
— Porque agora eu preciso conversar com ele.
— Ta bem, mas não demora.
Eu apenas concordei e vi os seguranças levarem ela para perto do meu irmão para tentar distraí-la junto com a prima.
— Eu sei que você tem várias perguntas.
— Então você pode começar a respondê-las logo. Como assim eu tenho uma filha?
Eu respirei fundo: a noite seria longa.
Contei tudo pra ele, ou pelo menos tudo o que eu sabia, Sérgio escutou atentamente não me interrompendo nem uma vez.
Assim que eu acabei ele ficou sem palavras, olhando pro chão e tentando entender tudo o que havia acabado de ouvir.
Nesse tempo em que ficamos apenas nos encarando em um completo silêncio, ouvi a porta ser aberta e dois meninos não tão pequenos adentrarem o local. Ainda sentia falta deles.
Ambos quando me viram correram para me abraçar, ignorando por um tempo a presença do pai no recinto.
— Senti muito sua falta mãe!
— Eu também Marco, mas como vai a escola? Superou seus problemas com a matemática?
— Superar? Ele vive me pedindo pra explicar tudo pra ele, as vezes dá raiva!
— Sérgio, sobre o que nós conversamos?
— Desculpa, tia.
Sérgio encarava a cena intrigado e ai eu percebi que mentia pra ele muito mais do que eu havia percebido.
Puta que pariu.
— Meninos! Graças a Deus, eu procurei vocês em todo canto!
— Desculpa vó, estávamos procurando o papai.
— Tudo bem, mas lembrem de me avisar. Sophia, como está?
— Muito bem Dona Paqui e a senhora?
— Cada dia melhor minha filha, e sua pequena? Onde está?
— Com meu irmão.
— A gente pode ir brincar com a Dani?
— Eu já levo vocês lá, dei...
— Como caralhos os meus filhos e minha mãe sabem da existência da Daniela? E porque eu sinto que você viu eles há pouco tempo pela última vez e não há tipo? Seis anos atrás?
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