Aurora Grace.
Northwestern Memorial Hospital, Chicago - Illinois.
00:32 a.m, 17/08/2015.
Ofegante e com os olhos vermelhos arregalados, Celeste me olhava desesperada após a sirene alertada, logo em seguida alguns enfermeiros corriam em direção ao quarto do paciente com parada cardíaca.
A garota permaneceu no mesmo lugar, enquanto eu corria para prestar socorro, empurrei algumas pessoas que atrapalhavam meu caminho e ao chegar no quarto encontrei Flore colocando uma máscara de oxigênio em Charlie, enquanto outra enfermeira arrumava a maca para tentar reanimá-la.
— Saiam da frente! - gritei e algumas pessoas se afastaram. - Preparem o desfibrilador! Rapidamente estenderam a placa do aparelho para mim, a lubrificaram com um gel condutor e retiraram a blusa da menina.
— 100! - a enfermeira gritou.
— Preciso de 200, carregue mais. - esfrego uma placa na outra para espalhar o gel. - Ande mais rápido com isso, Flore! Vamos, mais rápido! - pedi
— 200, Doutora Grace. Estamos prontos. - respondeu.
— Afastem-se! - gritei e respirei fundo.
Os enfermeiros ali presentes se afastaram e a única pessoa que restou perto de Charlie era eu. Preparei as placas e as pressionei em seus tórax, fazendo o garotinha pular da cama.
— Vamos lá, Charlie! - falei baixo. - Você consegue, vamos, me ajude com isso.
Pressionei mais uma vez e a máquina de batimentos cardíacos não voltava a apitar.
— Carregue em 300! - falei desesperada após a garota não reagir. - Vamos Flore, 300 agora!
— Aurora, desista. A menin…
— Eu não vou desistir! - a interrompi. - Faça o que estou mandando e carregue em 300.
Após o aparelho carregado pressionei as placas mais duas vezes e os batimentos de Charlie voltaram, me fazendo suspirar aliviada. Essa garota não podia morrer agora, não sem ter tido a chance de uma cura!
— Nunca… Nunca desista dos seus pacientes, Flore. Nunca desista de salvar uma vida.
Ela, assim como eu já fui, é uma interna, acredito que assim como eu ela ainda teria muita coisa para aprender. Após o aviso ela assentiu e me olhou compreensiva, voltei minha atenção para outros enfermeiros e comecei a falar.
— Quero algum de vocês em observação com Charlie. - pedi. - Essa garota não pode morrer agora, não quando a cirurgia dela está marcada para algumas horas. - disse firme. - Me entenderam?
— Sim. - responderam em um coro.
— Ótimo. Alguém?
— Eu. - um homem lá atrás levantou a mão.
— Qualquer emergência mande me chamar ou algum outro médico próximo. - falei suspirando e sai.
Olhei para meus saltos enquanto andava sem rumo pelos corredores e de relance vi que dezenas de pessoas atraiam suas atenções para alguém a minha frente juntamente com alguns cochichos. Levei minha mão para alguns fios curtos e os empurrei para trás da orelha, levantei a cabeça e rapidamente senti meu corpo chocando-se devagar com o de alguma pessoa. Justin Bieber.
Mas o que diabos esse garoto estava fazendo fora da cama?
— O que faz fora da cama? - levantei uma das sobrancelhas curiosa, enquanto pessoas enxeridas ao nosso lado passavam.
— O que houve? - direcionou seu olhar para o quarto de Charlie enquanto segurava-se no suporte de ferro do soro que estava interligado a tubos, indo para sua veia. Acabei notando que a única vestimenta que estava no mesmo era sua calça de lavagem escura, até mesmo seu tênis foi retirado.
— Não responda minha pergunta com outra pergunta. - respondi firme usando as palavras de Celeste e dirigindo meu olhar para seu rosto, ele arqueou as sobrancelhas surpreso e deu de ombros.
— Quis ver o que estava acontecendo de errado.
— Cuide do seu próprio nariz, Bieber. - rebati e ele riu. - Vamos, temos que voltar para a cama. Você não está em boas situações para perambular por todo o hospital.
— Não sei, mas não fui muito com a sua cara. - enrugou o nariz dando meia volta e eu o segui.
— Sinto muito, por você. - ironizei. - É uma pena, pois terá que me aturar durante todo seu exame. - ri baixo e mais alguns passos chegamos no quarto.
— Droga! - xingou baixo brincando e eu ri o acompanhando. - Braun deixou alguns seguranças? - perguntou com o cenho franzido, enquanto sentava-se com cuidado na cama.
— Desculpe, quem? - falei tocando a sua pele e conectando todos os fios a seu corpo.
— Scooter. - respondeu e eu assenti lembrando do homem.
— Não sei, ele não avisou nada. Mas provavelmente sim. - suspirei baixo após conectar todos os fios transparentes em sua pele.
Puxei meus cabelos rebeldes e irritantes para trás enquanto bufava irritada por ser a quarta vez que eu fazia isso durante vinte minutos. Merda de cabelo! Olhei de relance para Justin e ele fazia o mesmo com o seu cabelo, porém sua mão direita era ocupada por um celular, onde ele digitava sem parar. Após alguns segundos ele ergueu o olhar e me observou parada a sua frente, sem falar e fazer absolutamente nada.
— O que foi? - disse rindo e eu neguei.
— Nada. - respondi sincera. - Apenas o fato de que pessoalmente você não parece tão estúpido. - dei de ombros.
— Porra! Obrigada pela intensa parte que me toca. - xingou enquanto colocava a mão no coração fingindo ter sido acertado. - Mas relaxa, você não foi e nunca será a única a me dizer isso. - deu de ombros me confortando e eu fiz pouco caso. - As aparências enganam, minha cara. - completou formal.
— E em certos casos, assustam. - rebati rápido e ele riu alto, mas parou assim que sentiu alguma dor no peito, espremendo os olhos logo em seguida. - Como o seu, por exemplo. - caçoei semicerrando os olhos e chegando mais perto, observando toda sua palidez.
— Debochada, engraçada e mau humorada. - ironizou. - Qual é a tua, Doutora! - jogou os braços no ar e toquei a região perto dos seus olhos.
Observei toda a região branca do mesmo e notei que além do rosto as veias sanguíneas dos seus olhos também estavam desaparecendo. Justin abriu a boca para falar algo e ao notar minha expressão fechou a boca.
Por Deus, que garoto tagarela!
— Doutorinha, tu não me falou o que aconteceu lá naquele quarto. - perguntou enquanto eu analisava seu problema.
— Dá para ficar quieto dois segundos? - respondi entre dentes anotando mais algumas coisas na prancheta de informações. Após exatos dois segundos ele começou a falar.
— Certo, fiquei. Agora me responda.
Revirei os olhos.
— Um ataque cardíaco.
— Sério? - exaltou-se. - Que foda! - disse rindo e eu o olhei incrédula.
Qual era o problema dele?
— Boquirroto de boca suja e sem noção - falei negando e ele franziu o cenho confuso.
— Que porra é boquirroto? - perguntou e eu revirei os olhos por ele xingar mais uma vez.
— Um pessoa que fala demais. - expliquei e ele semicerrou os olhos me olhando.
— Boca suja, sim. Sem noção, não.
— Fique qu… - não terminei pois de relance observei que Flore passava pelo corredor devagar, fazendo com o que eu a chamasse. - Flore! - gritei e ela voltou entrando no quarto.
— O que quer? - perguntou e logo olhou para Bieber deitado sob a cama. - Justin. - acenou educada e ele retribuiu do mesmo modo.
— Já prepararam todo o processo da tomografia? - questionei.
— Martin me disse que sim.
— Certo. - assenti. - E os exames de sangue?
— Ainda virão colher. - respondeu. - Não se preocupe, já, já estão aqui.
— Ok. - respirei fundo. - Peça por mim para que agilizem tudo, por favor. - pedi e ela assentiu saindo.
Me virei para Justin e ele me olhava inexpressivo, enquanto balançava sua perna por baixo dos lençóis brancos.
— Estou tão ruim assim? - enrugou o nariz ainda olhando para os cobertores.
— Como é?
— “Peça por mim para que agilizem tudo.” - tentou me imitar forçando uma voz fina.
— Sabe como é, precaução acima de tudo. - respondi simples. - Melhor prevenir o quanto antes.
— Ah, sei. - riu fraco enquanto deitava-se totalmente desajeitado no colchão fechando os olhos.
— Bom, mais tarde iremos fazer uma série de exames, então recomendo que durma e descanse. Seu dia será extremamente longo. - aconselhei e ele fez pouco caso, me fazendo ficar irritada. Eu odiava isso, era como se eu estivesse falando com as paredes. - Me ouviu, cara pálida?
— Cara pálida? - abriu os olhos e repetiu o que disse rindo seco. - Porra, Aurora.
— Você e sua boquinha suja. - revirei os olhos resmungando baixo. - Não sabia que ainda lembrava meu nome. - ri.
— Não é como se eu fosse um velho de sessenta anos com uma memória fraca, sabe? - caçoou. - Além do mais, você falou teu nome há menos de uma hora.
— Oh, é verdade. - ri sem graça e ele riu rouco rolando os olhos por todo o quarto.
— Sei que sou importante, mau humorada - apelidou-me enquanto falava brincalhão. - Mas isso não significa que vá esquecer o nome da médica que irá cuidar de mim.
— “Sei que sou importante.” - imitei-o em um tentativa falha de imitar uma voz grossa. - Parte bem irrelevante, Bieber.
— Apenas verdade, queridinha. - riu amarelo. - Isso precisa mesmo ficar grudado no meu peito? - referiu-se aos fios que mediam seus batimentos cardíacos e faziam a máquina apitar a todo instante.
— Se não precisasse, certamente não estariam aí. - ri nasalado e ele revirou os olhos. - Bom, tenho que ir. Se precisar de algo é só chamar apertando o botão deste controle. - apontei para um pequeno objeto e ele assentiu. - Ou se estiver sentindo dor, aperte este. - direcionei meu dedo para um botão vermelho próximo a cama e ele concordou.
— Certo. Obrigado. - sorriu sincero me lançando uma piscadela e eu assenti me distanciando.
Eu realmente estava cansada, tão cansada ao ponto de encostar em uma parede e dormir por lá mesmo. Fazia três horas que o meu plantão de vinte e quatro havia começado, certo, ainda estava no ínicio mas o grande x da questão é que noite passada eu mal havia dormido, me prejudicando totalmente nesta jornada de trabalho. Durante a semana eu tinha três plantões, dois de vinte e quatro horas e um de doze, ou seja, durante uma semana eu trabalhava sessenta horas . Era extremamente cansativo, mas eu gostava do que fazia, e de certa forma aquilo ajudava a me relaxar um pouco.
Celeste, diferente de mim, trabalhava apenas dois plantões de vinte e quatro e um de seis, assim como Flore e Martin. O fato de Kristen ter aumentando o número de horas por não gostar de mim realmente passou pela minha cabeça, até porque essa era a única lógica cabível por eu ter que trabalhar mais. Mal posso esperar a hora em que seu marido tenha descoberto que seus oito anos de casados estão sendo perdidos, afinal todos daquele hospital sabiam que aquela maldita o traía, exceto ele, que estava sendo um cego apaixonado. Após me livrar de todos os meus pensamentos dei mais alguns passos e empurrei minhas mãos para dentro dos bolsos, andando sem rumo por todo o hospital. Martin passou por mim em uma rapidez extrema e logo gritou um “Oi, Grace.” alto, fazendo todos ali presente o olhar estranho. Observei Kristen atrás de um balcão branco da recepção do segundo andar e com ela, de costas para mim, estava um homem com suas roupas diárias. Ele não me parecia médico.
Sua camiseta branca era justa e com ela estava acompanhada uma calça de lavagem clara e um tênis qualquer preto. Seus cabelos pretos organizados em um topete baixo davam destaque em toda a extensão do seu crânio, e observando um pouco mais detalhado alguns fios arriscavam-se a ultrapassar sua nuca. Kristen olhou para mim e com isso o homem ainda desconhecido dirigiu seu olhar para mim, me dando a visão perfeita de seu rosto magnífico. Por Deus! Uma barba rala preta preenchia toda a parte debaixo do seu rosto e de frente todo o seu cabelo era perfeitamente organizado. Um sorriso sacana ao me ver surgiu em sua boca e isso fez com o que seu dentes brancos e lábios rosados me chamassem atenção. Uma cor pouco bronzeada com um vermelho natural era estampado em toda a sua face e eu sorri de volta educada. Acho que estou passando mal.
Me aproximei de ambos e ele riu baixo enquanto passava a língua entre os lábios, colocando as mãos dentro do bolso da calça jeans.
— Grace. - Kristen acenou com a cabeça assim que me aproximei.
— Kristen. - fiz o mesmo gesto e sorri gentil.
— Conhece? - referiu-se ao homem a sua frente e eu neguei. - Jeffrey Caligary, Aurora Grace. - apresentou-nos e eu me virei para cumprimentá-lo. - Aurora Grace, Jeffrey Caligary.
— Prazer, Jeffrey. - sorri e levantei minha mão o cumprimentando.
— Muito prazer, Aurora. - riu sacana e segurou minha mão.
— O mais novo cirurgião chefe do Northwestern Memorial. - terminou.
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