2009
Já estava começando a anoitecer, a lua crescente inclusive já aparecia timidamente naquele misto de azul claro e escuro do céu. Nesse horário as ruas de Los Angeles costumavam ficar lotadas de pessoas, mas ali perto da quadra de basquete não havia mais ninguém, pois já era hora das crianças e adolescentes irem para casa... E isso incluía Kagami Taiga e Himuro Tatsuya.
— Tem certeza que podemos fazer isso? — Kagami perguntou inseguro, olhando para os lados com uma expressão envergonhada.
— Sim. Somos irmãos agora, lembra? — Himuro sorriu de forma suave e convicta ao mesmo tempo. Para os seus 12 anos de idade ele era extremamente maduro... Bem mais do que Kagami, que era apenas um ano mais novo.
— Claro que lembro! — O ruivo sorriu de volta, fitando o anel que trocaram há algum tempo. Voltou o olhar receoso para o rapaz em sua frente. — É que eu nunca fiz isso antes, sabe... E somos dois meninos.
— Eu também nunca fiz. — O outro simplificou timidamente, fechando os olhos, apesar de que apenas um deles aparecia por entre sua densa e escura franja. — E mesmo que você seja um menino, eu gosto muito de você Taiga.
— Eu também gosto de você, Tatsuya! — Kagami sorriu, sendo sincero. Não tinha nem noção do que essa frase desencadeara no interior do irmão, mas a expressão dele ficou radiante ao ouvir aquilo.
— Feche os olhos então! — Himuro sussurrou, brincando distraidamente com a barra da camiseta branca que usava.
Kagami engoliu em seco e obedeceu, cerrando lentamente as pálpebras enquanto sentia as borboletas preencherem seu estômago. Involuntariamente apertou a bola de basquete com mais firmeza contra seu corpo na intenção de sentir-se um pouco mais seguro, mas ainda assim suas pernas tremiam.
Não demorou muito para os lábios finos e macios de Tatsuya tocarem os seus, brevemente. Kagami sentiu as bochechas esquentarem na hora, mas ergueu-se minimamente na ponta dos pés e retribuiu o gesto com carinho, pois ele era seu irmão mais velho — não de sangue — mas de coração. Assim que se afastaram, ambos abriram os olhos e ficaram se encarando por um bom tempo, corados e com um sorriso inocente nos lábios.
— Isso foi... Legal! — O ruivo comentou satisfeito com o selo da irmandade. Era uma forma de ficarem mais próximos ainda.
— Foi sim! — Tatsuya disse logo em seguida com um enorme sorriso nos lábios, andando apressado na direção oposta. — Tchau Taiga, até amanhã!
— Até amanhã! — Kagami sorriu também, acenando de longe.
Assim que Himuro virou a esquina, o ruivo fechou os olhos e levou os dedos aos lábios, tentando refazer o gesto em sua mente... Não conseguiu chegar nem perto do que sentiu.
Foi algo bem inesperado, mas foi bom.
***
2010
— Vamos fazer o que depois? — Tatsuya perguntou de forma animada, pegando mais uma colherada de seu sundae de morango.
— Jogar basquete, ué! Agora que aprendi direito preciso treinar! — O ruivo respondeu como se fosse óbvio. Sua voz saiu enrolada devido a enorme quantia de sorvete de flocos que tinha na boca, mas mesmo assim já levava outra colher cheia do doce gelado para o mesmo lugar.
— Ok! — Himuro sorriu tristemente, movimentando a colher dentro do pote de vidro na intenção de derreter o sorvete.
— Ou você quer fazer outra coisa hoje? — Kagami perguntou a contragosto.
Desde cedo sabia que o Tatsuya queria fazer algo diferente, pois era o dia de seu aniversário de 13 anos. Para comemorarem, Kagami o trouxera até a sorveteria e ainda por cima quebrou seu cofrinho para pagar o sundae dele como presente! Agora queria jogar basquete...
— Vamos ao cinema! — Tatsuya falou prontamente, erguendo o rosto animado.
— Eu não tenho mais dinheiro! — O ruivo exasperou-se, fazendo uma quantia de sorvete cair sobre seu lábio.
— Monte! — Tatsuya riu, inclinando-se com a intenção de limpá-lo.
Kagami riu também e fechou os olhos, esperando... Só não contava que ele fosse tirar o sorvete com os próprios lábios gelados, que tinham um leve sabor de morango. Pareceu um gesto tão natural para o irmão, mas Kagami paralisou no ato e sentiu o coração descompassar brevemente.
— Vamos à locadora e pegamos um filme por lá então! — Himuro disse ao se afastar. — Quero assistir “Como Treinar o Seu Dragão”.
— O-Ok! — O ruivo balbuciou em afirmação, ainda sentindo a leve coceira que a franja negra fez em sua bochecha.
O contato dos lábios dele permanecia queimando em sua boca, por isso Kagami esquecera-se momentaneamente do basquete. Sentia-se assim ao lado de Himuro às vezes, ele fazia seu coração bater mais rápido, e um sorriso bobo surgia em seus lábios quando ele o beijava.
Eram muito unidos, verdadeiros irmãos! Gostava disso...
***
2011 - Verão
— Sabia que ela iria morrer! — Tatsuya falou com um bocejo, pegando mais uma boa quantia de pipoca do enorme pote que Taiga segurava entre as coxas. — Esses filmes são sempre iguais...
— Sim, são! — O ruivo riu nervoso, desviando brevemente o olhar da tela da TV da sala para o irmão quase deitado ao seu lado no sofá. Para sua surpresa, ele o encarava com um meio sorriso. — Que foi?
— Você tem medo de filmes de terror. — O sorriso dele se ampliou quando afirmou isso.
— Não tenho! — Kagami retrucou irritado, estreitando os olhos e pegando mais um punhado de pipocas.
— Tem sim, olha sua cara! — Himuro riu, estendendo o braço e dando-lhe repetitivos petelecos na bochecha, apenas para provocar.
— Não tenho medo de nada, só acho os filmes de terror um saco! — Kagami irritou-se com o gesto, encarando-o de forma séria enquanto tentava afastar a mão dele de sua face.
— Você fala muito alto, Taiga! — Tatsuya disse, desviando-se da mão de Kagami e tapando seu lábio com o dedo indicador, o mesmo que o atingia no rosto instantes atrás.
Eles ficaram se encarando por um bom tempo, sem nada a dizer. Tatsuya ainda mantinha o dedo em sua boca e o movia quase imperceptivelmente, provocando uma leve cócega na fina pele. A respiração foi facilmente esquecida pelo ruivo naquele momento, seu coração já batia rápido.
Himuro soltou uma breve risada ao notar a inquietação de Taiga. Calmamente, deslizou a mão gelada até os fios ruivos de sua nuca, diminuindo a distância entre os lábios até não sobrar nada.
Após os primeiros segundos de surpresa, o beijo foi correspondido por Kagami. Começou de forma inocente, apenas um toque quente de lábios se movendo com calma, mas logo a língua de Tatsuya pediu passagem. O ruivo cedeu com um pouco de insegurança, não sabia como fazer... E, céus, nunca sentira aquilo antes.
Seu corpo se arrepiou por inteiro com aquele novo contato, com aquelas novas sensações, com o gosto salgado da pipoca misturando-se com o doce da boca de Tatsuya... Era bom, apesar de ainda ser um pouco atrapalhado.
Irmãos não faziam aquilo, Kagami sabia disso... Não queria misturar as coisas!
***
2011 - Outono
— Mãe...
— Sim, Taiga? — A mulher disse de forma mecânica, sem desviar atenção de seu tablet, na mesa do café da manhã.
— Meninos podem gostar de outros meninos? — Kagami perguntou com a voz baixa e preocupada, pegando mais uma colherada de seu cereal matinal.
Para a surpresa do ruivo, a mulher desviou imediatamente o olhar da tela em suas mãos e o encarou por alguns longos instantes, como se o avaliasse. O silêncio surgiu e se tornou desconfortável por um bom tempo. Kagami estava começando a pensar que falara algo errado e já preparava-se para pedir desculpas, mas a mãe finalmente respondeu.
— Podem sim! — Ela disse, ajeitando uma mecha ruiva que escapava de seu penteado. — Muitas pessoas não consideram algo normal, mas é, e muito comum! Por quê, meu anjo?
— Ah, por nada... — Ele se exasperou, sentindo uma gota de leite escorrer pelo canto dos lábios, que se repuxaram em um leve sorriso.
— Está gostando de alguém? — Ela perguntou, encarando-o por cima dos óculos ovais.
— Não sei. — Ele suspirou, decidindo abrir o jogo com a mãe, já que ela finalmente prestava atenção em si. — Não vejo muitos meninos andando com outros meninos... E não sei o que pensar sobre isso.
— Sabe Taiga, você é muito novo para entender como o mundo funciona, principalmente se tratando desse assunto! — Ela disse, surpreendentemente deixando o dispositivo de lado. — Algumas pessoas não consideram um relacionamento de dois iguais como uma coisa boa, mas é tão natural quanto um casal de meninos e meninas. Não se preocupe quanto a isso. — A mulher o tranquilizou, sorrindo de canto. — É o Himuro-chan, não é?
— Hm... É... Mas eu não sei. — O ruivo sentiu as bochechas esquentarem. — Somos muito amigos. Irmãos na verdade, mas a gente... Bem... — Kagami desviou o olhar para os flocos boiando no leite. — A gente se beijou algumas vezes... Na boca. Isso está me deixando bem confuso.
— Ah, Taiga! — Ela ergueu as sobrancelhas bem desenhadas, ligeiramente surpresa. Demorou alguns instantes para continuar a falar, como se escolhesse as palavras certas. — Bem, vocês são muito novos para se preocupar com essas coisas.
— Eu sei mãe. — Kagami concordou, olhando para a mulher com uma expressão culpada. — Eu não sei o que está acontecendo.
— Conversaremos a noite com o seu pai sobre o assunto! — Ela disse, entrelaçando os dedos ao redor de sua xícara. — Mas agora vocês devam se preocupar com os estudos, acima de tudo. São muito novos para isso, Taiga!
— Mas... É errado? — Kagami perguntou, inseguro.
— Não! — Ela riu da atitude do filho, removendo um peso enorme de suas costas. — Só deve cuidar para não confundir amizade com paixonite! Parece que é isso que está acontecendo. — Ela ergueu as sobrancelhas, de forma séria. — Deve estudar agora! É o mais importante.
— Hm... Ok... — O menino voltou a encarar os cereais. — Obrigado mãe.
— Meu bebê! — Ela o fitou com carinho, mas olhou para o relógio em seu pulso e já pegou novamente o tablet. — Hora de escovar os dentes, hoje é o seu primeiro dia de aula. A noite conversaremos mais sobre isso, ok?
— Sim! — Ele sorriu.
Ao mesmo tempo que se sentia aliviado por ter contado aquilo para a mãe, sentia-se mais confuso ainda por estar misturando amizade com "paixonite", como ela dissera. Teria que pôr um fim nisso.
***
2011 - Inverno
— Em que ano iniciou a Guerra Civil Americana? — A voz de Himuro soou de algum ponto atrás do ruivo.
— Não faço a mínima ideia... — Kagami resmungou sentado ao chão, apoiando as costas na madeira da cama com umas anotações parcas na mão.
— 1861! — Himuro respondeu com uma risadinha. — Qual é, você vai se dar mal na sua prova assim.
— Dane-se... — O ruivo riu, jogando a cabeça para trás, apoiando-a no colchão. Dessa forma conseguia ver Tatsuya de ponta cabeça, e ele parecia se divertir com a situação, já que era inteligente e estava um ano em sua frente. — Quando chegar a parte de Segunda Guerra Mundial eu vou me redimir nas notas.
— Claro que vai, quando você reprovar! Você já estudou sobre a Segunda Guerra mundial esse ano, Taiga! — Tatsuya riu mais ainda, batendo com o caderno na cabeça de Kagami antes de voltar a olhar as anotações. — Próxima pergunta: O que Abraham Lincoln fez quando assumiu a presidência, depois da Guerra?
— Morreu? — O ruivo riu, virando o corpo para se apoiar com os braços na cama, de joelhos no chão.
— Também! — O outro ponderou com um aceno de cabeça. — O que mais?
— Me matou de tédio? — Suspirou, escondendo o rosto entre os braços, sentindo a colcha da cama roçar seu nariz.
— Não Taiga, ele aboliu a escravidão, modernizou a economia e ainda por cima fortaleceu o governo nacional!
— Beleza! — Disse com a voz abafada, sem levantar o rosto, erguendo apenas o polegar.
O silêncio reinou pelo quarto de Tatsuya por longos segundos, até Kagami olhar para cima procurando entender o que estava acontecendo. Assustou-se silenciosamente ao perceber o rosto do irmão bem próximo ao seu. Sentia o cheiro de sua pele e conseguia ver cada detalhe nos olhos dele, ou apenas no único que aparecia através da franja densa... Tinha uma cor tão bonita, variava entre o verde e o cinza, era quase hipnotizante. Nunca tinha reparado tanto naquilo.
— Taiga, eu não te vejo apenas como um irmão... — Tatsuya sussurrou, fazendo seu hálito bater no rosto do ruivo.
— Como assim? — Kagami perguntou com o mesmo tom de voz, sentindo o coração descompassar e acelerar.
— Irmãos não fazem o que nós dois fazemos! — Ele explicou, acariciando suavemente os cabelos ruivos. — Você sabe disso...
— Somos irmãos sim, não misture as coisas! — Tentou desconversar, engolindo em seco.
— Então por que a você me beija daquele jeito? — Ele sussurrou, aproximando um pouco mais o rosto.
— Porque é bom... — O ruivo simplesmente respondeu após alguns segundos, sentindo a ponta dos narizes se encostarem.
— Você sabe que isso deixou de ser uma coisa entre irmãos faz tempo, não sabe? —Tatsuya perguntou, descendo a mão por entre os fios vermelhos, em direção à sua nuca. — Eu gosto de você Taiga, de verdade...
O ruivo engoliu em seco novamente, sentindo as mãos suarem. O que precisava fazer agora? O que sentia por Himuro estava ligado à sua irmandade, apesar de que ultimamente vinha pensando nele com muita frequência. Pensava em coisas que não deveria pensar... Será que estava gostando dele também?
Não queria misturar as coisas, mas era tarde demais.
— Tatsuya... — Sussurrou, diminuindo a distância entre os lábios de ambos.
Era a primeira vez que tomava a iniciativa, e sabia que com esse beijo talvez estivesse selando alguma coisa que não pudesse corresponder de imediato. Por Kami, tinha apenas 13 anos e ele 14... Não era idade de se preocupar com isso. E acima de tudo eram irmãos! Sim... Ainda eram irmãos, independente de qualquer coisa!
***
2012
— Droga... — Kagami sussurrou, fechando os olhos novamente enquanto virava para o outro lado da cama. Não conseguia dormir, estava perturbado demais para isso. — Dro-ga!
Estava extremamente confuso com tudo o que passava por sua mente e por seu coração. Era muita coisa ao mesmo tempo, muita informação à ser processada... Isso sem falar que Tatsuya já não estava mais por perto para responder às suas dúvidas, o que piorava tudo.
Himuro agora se formara no ginasial e estava estudando em outra escola, por isso não faziam mais as coisas juntos o tempo todo. Claro, ainda se encontravam com frequência para jogar basquete, mas não do mesmo lado. Viviam se enfrentando com seus respectivos times de rua, mas sempre acabavam em um empate.
Era divertido jogar contra ele, mas as coisas já não eram como antes. Não passavam mais tanto tempo um ao lado do outro, apenas em lados opostos de uma quadra de basquete. Ele parecia tão diferente... E indiferente.
Sentia falta daquele antigo Tatsuya, da risada gostosa que ele dava quando assistiam um filme engraçado, das tardes que gastavam apenas falando bobeira e comendo tudo o que viam pela frente, das noites que dormira na casa dele sentindo os fios da franja escura entrarem em seu nariz quando respirava... Do beijo dele... De tudo!
— Droga...
Kagami não tinha mais para onde fugir, não tinha mais como camuflar: Estava apaixonado por seu irmão. Ou pelo menos por aquele alguém que um dia veio a ser seu irmão mais velho... Tatsuya mudou bastante.
***
Outono 2012
— Alô? — A voz de Himuro soou do outro lado da linha.
— Oi Tatsuya, sou eu, o Taiga! — Kagami sorriu, feliz por ouvir a voz do irmão.
— Hey, Taiga, tudo bem? — Aquilo costumava ser um cumprimento animado, mas o ruivo o conhecia, ele estava sorrindo de forma um pouco forçada.
— Mais ou menos. — O ruivo admitiu, engolindo em seco. — Desculpe por não ter atendido sua ligação mais cedo, eu estava jogando basquete com os garotos.
— Eu sei, relaxa Taiga! — Ele disse. — Não é a primeira e nem a última vez que isso vai acontecer! Logo me acostumo!
— Achei que estava bravo comigo. — Kagami arriscou, coçando a nuca enquanto girava-se no acento da cadeira.
— Não consigo ficar bravo com você!
— Fico feliz com isso! — Kagami sorriu, tamborilando os dedos na coxa, de forma impaciente. — Quer vir aqui em casa hoje? Podemos assistir Star Wars ou algo assim!
— Hm, estou um pouco cansado... Pode ser numa próxima?
— Ahn, ok... — O ruivo disse, franzindo a testa um pouco confuso e triste.
Himuro estava bravo. Ele nunca fora tão frio assim...
***
Inverno 2012
— Desculpe querido, mas Tatsuya pediu para dizer que ele não está! — A gentil mãe de Himuro disse para Kagami com um sorriso triste, encostando-se à enorme grade do portão. — Ele parece bem chateado e chegou chorando. Aconteceu alguma coisa?
— Aconteceu, e eu preciso muito falar com ele justamente sobre isso! — Kagami insistiu de forma quase suplicante, olhando para a janela do quarto e vendo-o parado ali, o encarando por detrás da cortina.
— Ok meu anjo, entre! Vou conversar novamente com ele. — A mulher sorriu fracamente, abrindo o portão para que passasse. — Vocês dois sempre foram como unha e carne, não sei o que deu nele hoje.
Kagami sabia. A culpa foi sua.
***
— Taiga, você errou aquela cesta de propósito, já falamos sobre isso mais cedo e não quero mais te ver! — Tatsuya suspirou enraivecido, evitando contato visual. — Jogamos incontáveis vezes, empatamos todas... E justo quando apostamos nossa irmandade você faz isso? Erra de propósito?
— Eu só não quero que você deixe de ser meu irmão mais velho! — Kagami se defendeu pela décima vez, cerrando os punhos sem encontrar outro argumento. — Que droga, Tatsuya, eu quero ficar perto de você!
— Quer ficar perto de mim? — Ele disse, virando-se incrédulo. — Taiga, você me trocou pelo basquete!
— Claro que não! — Kagami disse, negando com a cabeça. — São coisas completamente diferentes! Basquete é basquete, nós somos irmãos! Não misture, por favor!
— Taiga, quantas vezes você se recusou a vir até aqui porque estava com o seu time, jogando? — Himuro perguntou com um tom de voz baixo, aproximando-se a passos lentos. — Quantas vezes você deixou de ir ao cinema comigo apenas para passar mais tempo treinando com a Alex? Você nem veio mais estudar aqui em casa... Nunca mais fomos à sorveteria... Taiga, você me trocou pelo basquete.
— Nunca... Eu não faria isso! — O ruivo disse, segurando o punho de Tatsuya com firmeza, encarando-o. — Caramba, eu tenho 14 anos, não sei como funcionam essas coisas. Eu estou confuso! Achei que o basquete também te deixava feliz... Que nos aproximava... Ainda mais agora que você se afastou de mim!
— Sim, foi a forma que encontrei de estar perto de você, Taiga! — O outro disse, puxando o braço com força, desfazendo o contato. — Eu faço de tudo para estar com você e aprendi a amar mais ainda o basquete por isso. Antes era só diversão, mas hoje eu vejo isso como um verdadeiro desafio! Um desafio pra te alcançar, te vencer e provar que posso chamar sua atenção também.
— Não! — O ruivo balançou a cabeça, sentindo a face esquentar, a mesma face que fora atingida por um soco de Himuro mais cedo. — Você não precisa disso para chamar a minha atenção. Você já tem minha atenção há anos... Eu gosto de você, droga!
— Taiga... — Ele o encarou um pouco perplexo.
— Você vai ser meu irmão para sempre, mas... Eu realmente gosto de você! — O ruivo disse, aproximando-se de Himuro, olhando para baixo, em direção ao seu rosto. — Quando você mudou de escola a gente se afastou, mas eu nunca quis ficar longe de você. Eu sinto falta.
— Você acha que não sinto falta de você também? — Tatsuya perguntou, franzindo a testa. — Eu gosto de você desde sempre Taiga, desde sempre! Mas acabou... Eu não consigo mais confiar em você, não depois do que você fez hoje. Você me fez passar por fraco!
— É tão errado tentar te manter por perto? — Kagami perguntou inconformado, abraçando-o num impulso. — Eu só não quis te perder...
— Você já me perdeu, Taiga! — Ele disse com a voz firme, empurrando-o para longe com aquele rosto inexpressivo, que era cada vez mais comum. — Você se rebaixou hoje, e pisou em mim. Mesmo tendo potencial para me vencer, decidiu errar e acabou com tudo! — Tatsuya ergueu a mão, em um sinal para Kagami não interrompê-lo. — Sabe, esqueça isso tudo, não adianta ficar repetindo porque nada entra em sua cabeça dura! Um dia jogaremos de novo, e então voltaremos a apostar nossa irmandade. E só, acabou Taiga!
— Desde quando você mudou tanto comigo? — Kagami perguntou, enxugando as lágrimas que começavam a aparecer.
— Quando eu percebi que estava sozinho nisso tudo! — Himuro esclareceu com a voz baixa, também lacrimejando. — Taiga, você me vê até hoje apenas como um irmão... Eu te vejo como algo além disso há anos, e cansei de não ser correspondido. Simplesmente cansei!
— Tatsuya, eu não te vejo apenas como um irmão. — Kagami admitiu, em uma última esperança, aproximando-se de novo. — Eu estou começando a entender o que sinto por voc...
— Agora é tarde. — Ele interrompeu, desviando o olhar indiferente para a janela.
Aquilo doeu em Kagami. Doeu muito mais do que o soco em seu rosto.
***
As pessoas costumam dizer que onde existe desejo, existe uma chama, e onde existe uma chama você está sujeito a se queimar. Mas só porque machuca não significa que é o fim... Você precisa erguer a cabeça e seguir em frente!
E foi exatamente assim que Kagami fez quando concordou em voltar ao Japão.
***
Inverno 2014 - Pós Winter Cup
— Droga, porque estou lembrando de tudo isso? — Kagami perguntou para o ar, sentando-se na cama, inconformado.
Hoje já estava com 16 anos, indo para os 17, já vencera Himuro Tatsuya no Winter Cup, já refizeram sua irmandade depois de uma conversa e juntos decidiram deixar aquele relacionamento "estranho" exatamente no lugar onde ele pertencia... No passado! Superaram. Fim. Não tinha porque as lembranças invadirem sua cabeça dessa forma.
— Droga...
Um pouco sonolento, o ruivo foi até a cozinha, acendendo todas as luzes pelo caminho — apenas por precaução. Com calma, encheu e tomou dois copos d'água com grandes goles, como que para engolir aquele pequeno nó que se formou em sua garganta... O nó que supostamente deveria ter ido embora há alguns dias! Não queria mais nada de Himuro, apenas esquecer o passado e seguir em frente de cabeça erguida. Já era maduro o suficiente e tinha capacidade para isso!
Olhou para o relógio na parede da cozinha e deduziu que já era bem tarde e o certo seria realmente tentar dormir. Não fazia sequer duas semanas desde que Seirin fora campeã da Winter Cup, precisava descansar muito para recuperar-se de toda a carga física e emocional que sofreu ao lado de seu time. O pensamento o fez sorrir.
— Campeões, porra! — Vibrou sozinho enquanto voltava ao quarto. Em seu trajeto, ia apagando as luzes que acendera, mas sempre correndo no escuro para alcançar o próximo cômodo iluminado.
Ao chegar no quarto, trancou a porta como de costume. Morava sozinho, mas se sentia mais seguro assim... Novamente, apenas por precaução. A verdade é que era um medroso e odiava o silêncio!
Cantarolando uma melodia qualquer de Linkin Park, olhou com uma careta para a cama. Perdera completamente o sono durante esses segundos de adrenalina por correr no escuro, e além de tudo, ainda era sábado! Teria tempo para dormir no dia seguinte!
O ruivo sentou-se na frente do notebook e fez o mesmo itinerário de sempre. Vasculhou o site da NBA do início ao fim pela terceira vez naquela noite... Em seguida foi verificar a situação dos Los Angeles Lakers — o que resultou em uma careta desanimada pelo péssimo desempenho do time na temporada... E por fim entrou em seu perfil na rede social, esperando encontrar apenas as habituais teias de aranhas.
Ergueu uma das sobrancelhas, evidentemente surpreso ao ver que alguém o enviara uma mensagem há mais ou menos uma hora. Só poderia ser sua mãe...
Quando clicou no ícone, estranhou infinitamente a pessoa que entrara em contato, mas sorriu de forma desafiadora após algum tempo. Só de olhar a foto já batia aquela imensa vontade de jogar basquete!
Aomine Daiki: Tá aí?
— O que esse idiota quer? — Taiga resmungou para si mesmo, vendo a hora no relógio no canto inferior da tela: 01h22min.
Involuntariamente seu olhar se direcionou ao tênis Air Jordan bem conservado no canto do quarto. Foi um inusitado "presente" dele. Com uma risada abafada, Kagami voltou a encarar a tela e começou a digitar a curta resposta.
Kagami Taiga: Agora sim.
O ruivo não esperou que aquele cara idiota realmente fosse procurá-lo algum dia... E esperou muito menos que ele estivesse online naquele momento para respondê-lo.
Aomine Daiki: Quero meu tênis de volta!
Kagami Taiga: Por...?
Aomine Daiki: Você ñ merece!
— Como assim não mereço, porra? — Kagami indignou-se, olhando novamente para os sapatos no canto do quarto.
Ganhara o tênis do moreno durante a Winter Cup, mais precisamente antes de seu jogo contra Kaijo.
Na manhã da partida contra Kise Ryouta, Kagami descobriu que seu Air Jordan — lindo, preto e vermelho, modelo único, de estimação — perdeu a sola do dia para a noite, sabe-se lá como. Sem pensar duas vezes, Taiga saíra desesperado para comprar outro par, mas não encontrou nada nas lojas! Por sorte ou coincidência, Aomine calçava o mesmo número que o seu e tinha vários pares... Aproveitando a deixa, o moreno desafiara Taiga para um rápido mano a mano, e se Kagami vencesse, poderia ficar com o tênis. Simples! O ruivo aceitou prontamente e até tentou, mas no final foi simplesmente destruído pelo oponente. Entretanto, Aomine concordou em emprestar o tênis mesmo assim, com a promessa de que jogariam outro dia para ele se redimir.
Essa atitude ainda era um mistério para Kagami, já que Aomine Daiki costumava ser um babaca de primeira!
Kagami Taiga: Claro que mereço. Já ouviu falar que fomos os campeões da WC?
Aomine Daiki: Pura sorte. Vc ainda ñ me venceu no 1x1.
— Ok, filho da mãe! — Kagami sorriu enquanto digitava, sentindo-se desafiado.
Kagami Taiga: Amanhã, 15h, quadra do Maji Burguer?
Aomine Daiki: Ñ. 17h. Acordo só depois das 15h no fds!
— Preguiçoso de merda! — O ruivo estreitou os olhos, mas sorriu por fim. Finalmente iria acabar com aquele idiota... Seus dedos já coçavam de ansiedade!
...
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