Capítulo III — The 'Me' From Within me ♡
Um espirro. Seguido por outro. E outro.
Como conseguiria se concentrar assim?
Armin aceitava o lenço que seu irmão lhe oferecia sem nem ao menos olhar para este.
"Tem certeza que não quer ir lá na enfermaria?" perguntou Alexy pela milésima vez em alguns minutos.
Estavam na aula de artes, e como ninguém ligava muito para aquela aula (nem mesmo a professora), o gêmeo de cabelos escuros estava tentando jogar em seu PSP enquanto o irmão, ao seu lado, falava sobre qualquer coisa sem sentido.
A verdade era: Armin se sentia como lixo naquela manhã. Depois de ter chegado encharcado em casa, pegou uma forte gripe. Além de sentir seu corpo quente e alguns enjôos. Porém, sua mãe insistiu que fosse á escola nem que fosse para responder á chamada.
"Tenho! Quantas vezes tenho que te dizer que estou ótimo?"
O azulado suspirou.
"Não sei o que diabos você tinha na cabeça pra sair de casa logo antes de começar a chover."
"Se eu ficasse lá eu ia morrer de tédio! Aí fui naquele café com wi-fi perto do centro."
"E não podia ficar lá até a chuva passar?"
Armin virou a cabeça um pouco envergonhado.
"E-eu ia acompanhar uma pessoa até em casa, e como só eu tinha um guarda-chuva..."
Naquele momento, os olhos de Alexy quase saltaram das órbitas. Segurando o rosto do gêmeo, o fez olhar em seus olhos.
"É ele, não é?!"
Armin suspirou, fechando os olhos.
"Cala a boca." murmurou. "Os outros estão olhando."
"Olha pra mim!" o azulado apertou as bochechas do irmão até que forçasse um biquinho a aparecer nos lábios do mesmo, que se rendeu e abriu os olhos. "Estava com ele? Estava, não é?"
"Ei, não foi intencio–"
"Ah! Estavam em um encontro!" Alexy o soltou, abrindo os braços. "Aposto que ficaram abraçados o tempo todo... e próximos... como naquele dia, em que você estava em cima dele na cama, e..."
Á medida que o irmão falava e falava, o rosto de Armin esquentava e esquentava; e seus pensamentos ficaram cada vez mais embaralhados.
'Eu estou mesmo assim tão próximo de...'
Antes que pudesse concluir seu pensamento, uma onda de tontura e enjôo o atingiu, e a próxima coisa que ouviu foi o som mais agudo que já chegou a seus tímpanos.
"Era minha jaqueta nova!"
♡
Armin suspirou antes de abrir a porta da enfermaria.
Após ter vomitado nas roupas novinhas em folha de Alexy, apenas para este ter gritado e atraído a atenção da sala inteira, não teve como ele não vir para a enfermaria.
Quase ninguém ia até ali, pois só era usada em casos não tão graves, como quando algum aluno só tinha que tomar um remédio para dor de cabeça, ou quando alguém passasse mal pudesse pegar as dispensas médicas para poder ir pra casa.
E foi por isso que não pôde estar mais surpreso ao ver outra pessoa ali.
'O destino só pode estar zoando com a minha cara...'
Lysandre estava sentado em uma das macas, perto da janela, com uma bolsa de gelo na cabeça. Estava sem o casaco, o colete e as botas, ficando apenas com a camisa social e a calça, e aos olhos de Armin, parecia muito mais leve assim.
Sentou-se ao lado dele na maca, encostando-se na parede e tirando o fino cachecol que adornava seu pescoço. Estavam quase no inverno, e mesmo assim sentia um calor dos infernos!
O outro garoto abriu os olhos, encarando Armin pela primeira vez desde que entrara na sala.
"Parece que aquela chuva caiu tão mal pra você quanto caiu pra mim." disse ele, sua voz saindo com dificuldade. "Seu rosto está vermelho. Febre também?"
"Sei lá."
Lysandre ofereceu a ele um termômetro, assim como alguns remédios e um copo d'água.
"Foi o que a moça da enfermaria me mandou tomar, antes de sair faz um tempo."
Armin aceitou quietamente, enquanto colocava o termômetro para medir a temperatura. 39 graus. Suspirou novamente, tomando o remédio e devolvendo para o maior.
Ficaram em silêncio, um do lado do outro. Os olhos do menor esquadrinhavam a pequena sala. Paredes brancas. Lençóis brancos. Cortinas brancas. Ah, toda aquela claridade estava começando a dar dor de cabeça. Fechou as cortinas, o que diminuiu a luz, mas não tanto, considerando que as cortinas também eram da cor clara.
Soltou um grunhido, colocando as mãos na frente dos olhos.
"Algum problema?" questionou o albino.
"Luzes, elas me cegam."
Lysandre riu baixo.
"Eu, hein. Você é algum tipo de vampiro gótico ou..."
"Igual aquele cara aqui da escola que fica sempre perto do cemitério?" Armin deu uma risadinha.
"Ei, ele é amigo do meu irmão, tá?" respondeu, sorrindo. "Além disso... Não sei se poderíamos chamar ele de vampiro ou de gótico sem antes perguntar pra ele. Nunca se sabe. Não se julga um livro pela capa."
O moreno tirou as mãos dos olhos para observá-lo.
"Você realmente se importa com essas coisas, né?"
"Você não?"
Nenhum deles falou nada depois disso. Era incrível como a atmosfera entre eles conseguia mudar de descontraída para pesada com tanta rapidez. A tensão entre eles era quase palpável.
As coisas com Lysandre estavam indo tão fáceis nos últimos dias que quase havia esquecido o quanto eram diferentes um do outro.
Ficaram em silêncio pelo que pareceu uma eternidade, até que Armin foi surpreendido pelo outro garoto, que havia oferecido um lado de um fone de ouvido. O outro já era usado pelo albino, que parecia relaxado com a cabeça encostada na parede.
Um pouco hesitante, aceitou o fone, encostando a cabeça na parede também e fechando os olhos.
As músicas que Lysandre escutava iam das mais calmas e relaxantes até as mais altas e barulhentas. Nunca imaginaria que uma pessoa tão quieta tivesse gostos tão distintos. De vez em quando, o albino cantarolava alguns trechos, com sua voz serena.
Armin sentiu seu peito apertar, como se tivesse um nó ali. Era uma sensação de calmaria, uma que já conhecia por ter sentido há uns dias atrás. Aquela que o fazia querer sorrir e chorar.
Pegou o fino cobertor que estava dobrado no canto e embrulhou-se, deixando-se ser embalado pela sonolência e a doce voz que agraciava seus ouvidos, carregando-o pra longe, longe dali...
♡
E a última coisa que queria era ser trazido de volta pelos cutucões de seu irmão.
Abriu os olhos lentamente após literalmente sentir a mão do gêmeo na sua cara, olhando-o com irritação.
"O que você quer?"
Parou um pouco para inspecionar a situação. Alexy estava inclinado sobre a maca, com uma expressão cautelosa. Notou também Kentin encostado perto da porta, provavelmente querendo sair dali logo. Porém, a coisa mais importante na cena era o fato de estar dividindo o cobertor com Lysandre, a cabeça encostada no ombro do maior enquanto o braço deste o rodeava.
"Já acabou o horário de aulas." murmurou o azulado. "Como você não tinha mandado notícias desde que saiu, fiquei preocupado. Mas parece que você está bem agora."
Alexy sorriu minimamente e antes que Armin pudesse retrucar, a porta foi aberta de supetão.
"Lys!"
Leigh entrou em passos largos e agarrou os ombros do irmão, que despertou com uma expressão desnorteada, provavelmente por mal acordar e já ver tanta gente em um lugar só.
"Quer me matar? Não volta pra casa e nem me avisa nada, eu disse que não era pra ter vindo pra escola doente!"
O mais velho, que geralmente era pacífico e neutro, parecia realmente preocupado, além de parecer não notar que haviam mais pessoas ali.
"Ei. Eu tô bem, ok? Acho que já sou bem grandinho pra cuidar de mim mesmo." disse o albino, com um sorriso calmo.
"Tem razão."
Alexy suspirou entediado e dirigiu-se novamente ao gêmeo.
"Eu vou sair hoje, então vê se tenta não morrer sozinho em casa."
"Eu não preciso de você." Armin mostrou a língua e o irmão fez uma careta.
Era quase fascinante o quanto a relação dele com Alexy era diferente da de Lysandre com o próprio irmão.
O azulado saiu praticamente pendurado no braço do namorado, e Armin estava se preparando para ir pra casa quando escutou Leigh dizendo que estava tendo problemas na loja e ia precisar ficar lá pelo resto do dia, e que o mais novo teria de ficar sozinho.
Estremeceu. Iria ficar sozinho aquela tarde. Lysandre também iria. Se ficasse sozinho, poderia jogar seus jogos em paz, e... e...
'Eu nunca me importei em estar sozinho... então... por que sinto tão inquieto?'
"Ei..."
No instante que se virou para chamar o vitoriano, sentiu este passar um braço por seus ombros, se dirigindo à porta.
"Precisa de alguma coisa?"
"Hã... o que está fazendo?"
Viu o lábio de Lysandre se contorcer um pouco, como se estivesse nervoso ou incerto.
"Bem, eu... só pensei que talvez você pudesse me fazer companhia. Tudo bem, se não quiser."
Afastou-se vagarosamente, e Armin sentiu o estômago se revirar.
Como se um 'eu' dentro dele — seu 'eu' mais profundo, que já deveria ter morrido há muito tempo — tivesse despertado.
Estava com medo. Ele não queria ficar sozinho.
Agarrou o braço de Lysandre, fechando os olhos com força sem acreditar que estava realmente fazendo aquilo.
"Vamos." resmungou.
Sendo guiado pelas ruas como uma dama de época, um Armin acanhado e pensativo inconscientemente liberava um grande peso de suas costas.
♡
Se pouco tempo atrás lhe dissessem que naquele dia estaria na casa de Lysandre, em sua cama, comendo biscoitinhos de açúcar; ele tinha 100% de chance de rir alto e ainda acompanhar o indivíduo até a clínica psiquiátrica mais próxima. No entanto, nada descrevia sua situação atual melhor que isso.
Parece que, mesmo sem terem planejado nada, haviam feito um combinado silencioso de que fariam algo como um "dia da gripe". Algo como o "dia da depressão" quando as garotas terminam com o namorado e comem toneladas de sorvete e chocolate assistindo filmes tristes o dia inteiro, porém com espirros, lenços, e o pior, nada de sorvete.
O maior havia trazido um potinho de biscoitos, e contou que Leigh nunca o deixava comer por terem açúcar demais — e provavelmente porque presenteava Rosalya com eles —, mas deduziu que não fazia mal cometer o crime com Armin.
"Como assim você nunca assiste televisão?" o garoto de cabelos pretos encarava o outro indignado, enquanto apertava um travesseiro. "Nem fica horas na internet?"
"Não tenho um computador, e perco meu celular quase sempre." Lysandre deu de ombros, soltando um leve riso quando Armin levou o travesseiro ao rosto para sufocar algo como um grito de frustração.
"O que você faz da vida?!"
"Leio." deu de ombros. "Escrevo. Canto, trabalho com música."
O menor balançou a cabeça violentamente.
"Vamos assistir. Agora."
Foi até a sala do pequeno local onde Lysandre e o irmão viviam, levando o edredom, os lenços e os biscoitos, não dando ao outro muita escolha a não ser segui-lo.
Discutiram brevemente entre um filme de romance barato ou um de ação que havia estreado naquele mesmo ano, mas como não havia levado a nada, acabaram assistindo um filme de princesa, resultando em um Armin emburrado e Lysandre estranhamente interessado e prestando atenção.
O moreno cruzou os braços, afundando no sofá. Já havia assistido aquele filme centenas de vezes, pois era o favorito de Alexy quando eram crianças, até as falas já sabia, porém ele meio que gostava das músicas também.
"Cante uma canção..." repetiu com Branca de Neve, mal reparando o olhar surpreso do albino sobre si.
Naturalmente, murmurava a música com os olhos entediados grudados na TV, até que percebeu que Lysandre havia parado de prestar atenção no filme e agora olhava fixamente para ele.
"O que—"
"Belo."
"H-hã?"
"Quis dizer... bela. A sua voz."
Armin franziu a testa.
"Tem maconha nisso?" murmurou, indicando os biscoitos.
Por mais que houvesse tentado uma brincadeira, Lysandre permanecia sério. Olhava em seus olhos com uma expressão tão profunda que até assustou o garoto menor.
No próximo instante, uma mão macia acariciava as mechas escuras de Armin, fazendo-o arrepiar-se por completo.
'Não pode ficar pior.' pensou, estremecendo. 'Essa situação, não pode—'
"Desculpe." disse o outro baixinho, parecendo desconcertado. "Mas eu preciso fazer isso."
E então estava nos braços de Lysandre. Apertado contra o corpo dele. Sentindo sua respiração e seu coração bater.
Queria questionar. Perguntar, 'Precisa? Precisa pra que?'. Talvez até empurrá-lo e sair dali.
Mas não o fez. Ficou ali, quieto, e sem reação. Nenhum dos dois disse nada após isso.
Porém, Armin não parava de pensar. Talvez, não tivesse problema ter companhia ás vezes. Conversar com alguém que não fosse ele mesmo, assistir coisas tolas, talvez até socializar (um pouco!). E foi ali, naquele momento, que deduziu que não ficaria mais sozinho.
'Não foi Lysandre quem causou isso. Se as vadias da escola chegassem e pedissem pra assistir Barbie comigo eu também aceitaria.'
Certo?
Queria muito conseguir acreditar naquilo.
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