Diverti-la.
Você não precisa ser um gênio em fazer piadas para arrancar uma risada dela, mas também não se esqueça de ser equilibrado. O humor precisa ser uma pontada sutil de interação.
Espere uma oportunidade para fazê-la sorrir.
Não vou te dizer coisas como esses outros blogs da internet que costumam citar "não seja um babaca" porque caso você seja, isso irá aparecer alguma hora.
Mulheres são observadoras o suficiente para reconhecerem um idiota de primeira linha antes que ele saiba. Seja você mesmo e sincero, o humor virá a calhar por conta própria.
***
Martin pisou na grama verde e bem cortada, olhando ao redor. Não se lembrava de qual era a última vez em que estivera no Central Park. O lugar estava silencioso e bem menos populoso do que costumava ser naquele horário da noite.
Sutilmente nervosa, ela passou uma língua pela boca seca e virou-se para trás. Encontrou Stiles com os pés firmes no chão, as mãos enfiadas nos bolsos frontais da calça jeans e um sorriso torto e fascinado em um dos cantos dos lábios. Sua habitual postura viril e dócil ao mesmo tempo.
Stiles carregava consigo uma espécie de aura de confiança que ela nunca havia reparado. Não sabia se por nunca ter se importado de fato ou por ele ter a escondido aquela característica, mas sua repentina evidência havia despertado um choque em sua pulsação e Martin estava aprovando o sentimento. Era bom estar ao lado de alguém que dominava a situação e atraia todos os holofotes.
– Qual é a pegadinha? – Perguntou ela, levantando uma sobrancelha.
Sem responde-la, ele encurtou a distância, aproximando-se. Com uma malícia silenciosa e divertida nos olhos, pescou uma mecha do cabelo dela e enrolou-a no dedo. Martin o observou em silêncio, sentindo o movimento macio contra seus fios ruivos.
De perto, reparou em todos os tons de castanhos claro que banhavam os olhos do melhor amigo. Gostou de observar sua expressão séria e relaxada.
– É tão difícil assim acreditar que você vai sair comigo?
Ela pigarreou, sentindo a língua derreter.
– É um pouco. – Confessou. – Nós moramos juntos, Stiles.
– Isso não importa. – Disse ele, dando de ombros.
Os dedos que brincavam com a mecha de cabelo deslizaram e se encaixaram no maxilar feminino de uma forma muito leve, como uma pena que pousava.
Os olhos verdes foram banhados por uma expectativa não percebida enquanto em seus pensamentos, alguma racionalidade tentava atingi-la, como se uma neblina fraca descesse sobre sua cabeça. Ela não cogitava se envolver com o Stilinski de nenhuma forma por vários motivos mas o principal deles era, sem dúvida, o fato de se conhecerem desde a adolescência.
O homem suspirou, acariciando a pele macia da melhor amiga. Faíscas de afeto estilhaçaram-se em suas pupilas dilatadas.
– Errei com você, não foi? – Disse ele, engolindo em seco em seguida. Alguma vergonha estampou rosado por segundos em suas bochechas. – Só estou tentando me redimir. E garanto que até o final da noite terei feito isso.
Lydia levou alguns segundos para deixar a curiosidade de lado e assentir, ainda que relutante.
– Vamos? – Chamou ele.
Ela foi surpreendida quando Stiles a puxara pela mão e, um segundo depois, entrelaçou os dedos quentes nos seus. Ele os guiou pelo parque.
Lydia resumiu-se em uma massa móvel de vulnerabilidade e deleito. Ao mesmo tempo que aproveitava a proximidade física, a leveza do encontro e a confiança que mantinha no melhor amigo, precisava lidar com o sentimento estranho e novo que sentia arranhando seu corpo.
Sentia-se anestesiada, querendo pensar em tudo ao mesmo tempo em que não pensar em nada era convidativo. Por reflexo, apertou a mão do melhor amigo na sua e concentrou-se nele quando se deu por conta que a voz masculina estava entrando em seus ouvidos.
– Você está bem?
Martin o olhou de relance. Um instante depois, um dedão raspando nas costas de sua mão a trouxe de volta a realidade.
– Estou. – Respondeu, embora existisse uma agonia sutil em sua voz. Ela olhou ao redor do parque, em alerta. – Não está preocupado com o fato de estar segurando a minha mão em público?
Stiles levantou uma sobrancelha para ela. Em seguida, uma risada baixa e quente mergulhou sobre a pele de Lydia.
– Oh, desculpe, lindinha. – Brincou ele, uma leve expressão de deboche no rosto. Aproximou-se da orelha dela, sussurrando: – Eu me esqueci que isso é como fazer sexo.
A menção despertou rubor nas bochechas femininas, mas o estresse dominou todos os instintos da Martin em poucos segundos. Nervosa, ela puxou a própria mão para si e as apertou em punho de imediato. Ainda que fosse pequena, ela encarou o melhor amigo de baixo para cima com uma ferocidade quase animal nos lindos olhos verdes, parando de andar.
– Só estou dizendo que as pessoas não sabem do que estamos fazendo, podem achar que estamos juntos. – Baixinho, tentando não soar ríspida, explicou.
Foi encarada por um conjunto fascinante de dentes brancos e covinhas. Ele riu dela, um som leve e tão charmoso que quase intimidou sua avalanche de emoções atreladas com a realidade. Ele observou os detalhes do rosto da mulher, aproveitando cada segundo daquela reação de autopreservação.
– Nossa... – Sussurrou, ainda sorrindo. Martin piscou, tentando lembrar a si mesma de se manter séria. – Adoro quando você fica brava. Já te disse isso antes?
Ela gemeu baixinho. No fundo de seu peito, sentiu o coração ser banhado por mel fervente. Stiles conteve um novo sorriso. Ele arranhou a garganta e tocou-a nos ombros, deslizando as mãos centímetros para cima, rumo ao pescoço feminino.
– Por favor, só relaxe. – Pediu em quase um sussurro. – Só quero aproveitar com você e fazer você esquecer da merda de dia dos namorados que você teve por culpa minha. Talvez se você parar de agir como se eu tivesse uma doença contagiosa, poderíamos nos divertir hoje.
Ela respirou fundo, absorvendo as palavras de Stiles. Tinha consciência de que não podia relaxar demais, de fato, pois sabia que se esquecer de prestar atenção no próprio corpo não era confiável. Mas, ao mesmo tempo, concordava que Stiles parecia estar se esforçando para se redimir e aproveitar o tempo que iriam ter juntos.
Guiada pelo carinho que sentia pelo melhor amigo, ela se enroscou no corpo forte, rodeando a cintura masculina com as mãos e pousando a cabeça no peito dele. Inalou o perfume bom da roupa dele.
– Desculpe. – Pediu ela, relaxando quando os braços dele a rodearam de volta. O toque quente irradiou conforto para seus músculos.
– Isso. – Aprovou ele, baixinho. Beijou-a no cabelo. – Essa é a Lydia que eu quero comigo essa noite.
***
– Nós éramos mesmo dois idiotas. – Martin riu, lambendo seu sorvete italiano.
Com os pés enfiados na grama úmida, ela se permitiu pensar nos bons momentos que tivera no colégio. Ainda que estivessem sentados no chão, a fonte jorrando água atrás deles acabava por despejar gotas ao redor e, de forma inevitável, ambos estavam com as roupas sutilmente molhadas e com cabelos com pingos gelados. Porém, a Martin não se lembrava de quando tivera um momento tão leve com Stiles antes.
Ainda que morassem juntos e passassem algum tempo comendo uma besteira, assistindo documentários do Discovery – porque ela o obrigava – e conversando, estavam sempre fechados no apartamento. A sensação de respirar ar puro e olhar para algo natural era diferente e especial.
Ao lado dela, Stiles ainda estava com um sorriso no rosto, quase terminando de tomar seu sorvete. Enquanto a Martin se mantinha de pernas cruzadas, ele estava com uma das mãos para trás, apoiando o tronco com as pernas esticadas na grama.
– Éramos uma dupla e tanto. – Disse ele, piscando para ela.
Ela riu, e seus olhos verdes brilharam com uma pureza que encantaram Stiles.
– É verdade. Ainda somos.
– Se lembra de quando invadimos a sala do Bobby para xeretar nos cadernos dele?
Martin gemeu com desgosto.
– Para você xeretar, não é? – Corrigiu ela, com tédio. – Você só me pediu para vigiar a porta.
– Pode ser, mas eu precisava saber se estava escalado para a semifinal do campeonato.
– Você era titular, idiota. Por qual motivo não estaria escalado?
Stiles deu de ombros, lambendo seu sorvete.
– Eu tinha machucado meu braço. Eu podia jogar, mas Bobby disse que talvez fosse melhor eu ficar de repouso. Enchi tanto o saco dele que fui ameaçado de ser suspenso das aulas só por estar matriculado no colégio.
Lydia gargalhou baixinho, balançando os ombros.
– Você sabe ser insistente quando quer.
– Não é bem assim.
Os olhos verdes dispararam para ele, sobrecarregados de convicção.
– É exatamente assim, na verdade. – Ela se ajeitou de lado, sentando de pernas cruzadas, mas de frente para ele dessa vez. – Se lembra da minha aventura com o jornal online da escola? Aquilo foi culpa sua.
– Você fala como se eu tivesse te amaldiçoado. – Ao terminar de tomar seu sorvete, Stiles bateu as mãos na calça jeans, observando a Martin lamber o dela preguiçosamente devagar nos intervalos da conversa.
– Bom, não foi exatamente uma coisa boa.
– Isso é porque você quis ver dessa forma. – Deu de ombros. – Já te disse outras vezes, o pessoal adorou o manual de encontros e eu achei um desperdício você não ter postado mais nada depois dele. Viu os comentários na época?
Lydia corou, as bochechas a traindo só com cogitar mentir ao responder que não. Seu silêncio e o sutil alarde em seus olhos verdes foi o suficiente para Stiles nem esperar sua resposta.
– Eu sei que você viu. – Denunciou ele. – Já encontrei meninos do time discutindo sobre o post no vestiário da quadra, conversando sobre as dicas. Você ajudou muita gente. Deveria ter usado sua popularidade na época.
Ela sorriu com desdenho.
– Eu não teria nenhum tipo de credibilidade. Todo mundo sabia que eu nunca tinha visitado a sala do Bobby durante nenhuma aula, como iriam me levar a sério?
– Em primeiro lugar, não ter visitado a sala do Bobby não foi nenhuma desvantagem. – Pontuou ele. – Dar uma amasso em alguém naquele lugar era nojento. Em segundo, você teve alguns encontros. Isso iria contar como experiência.
– Você sabe que eu saia com um garoto por semestre e olhe lá. – Ela suspirou, a nostalgia lançando imagens desautorizadas em sua mente. – Allison era um pouco mais ativa do que eu, por isso me baseei nela.
– Você só ia a poucos encontros porque queria, Martin. Você sabe disso.
– Não é verdade. – Com alguma vergonha, ela abaixou a visão para o próprio sorvete.
– Acontece que é verdade sim. – Disse ele. Sem nenhum tipo de permissão, pegou o sorvete da mão dela. – Me deixe te ajudar a comer isso, você está muito devagar.
A Martin não protestou, embora um fio de estresse tenha se enrolado em seus ossos.
– Muito cavalheiro. – Provocou ela. – Rouba comida de todas as garotas com quem você sai?
– Você é a exceção. – Ele deu duas longas lambidas no sorvete e logo devolveu a ela. – Já está derretendo.
Lydia voltou a degustá-lo, mas assim que desocupou a boca outra vez, deu continuidade ao assunto:
– Sendo sincera, eu era muito romântica na época. Você vai me achar uma idiota, mas não gostava da ideia de sair com qualquer um. Não que eu pudesse escolher muito, mas pensava assim.
– O que quer dizer com “não que eu não pudesse escolher muito”? – Ele franziu a testa.
A vergonha repentina inchou o sangue nas bochechas da mulher. Intimidada, a Martin piscou algumas vezes, balbuciando sozinha, tentando encontrar uma resposta que ela sabia que não iria surgir. Nunca confessaria – embora não fosse difícil que o amigo tirasse suas próprias conclusões – que não se achava atraente no ensino médio e muito menos em sua fase adulta.
– Ah. – Soprou ela, pairando o sorvete derretendo na altura do peito. – Bem... eu... – Em um movimento lento, ela deu de ombros como se pudesse se explicar daquela forma.
– Está insinuando uma baita idiotice. – Disse ele, convicto. – E o sorvete vai pingar na sua roupa.
Assim que Stiles terminou de falar, duas gotas de sorvete caíram na jardineira de Lydia. Ela se apressou em erguer a mão, tirando o alimento de perto do próprio corpo enquanto murmurava um palavrão baixo. Em uma tentativa inútil de se limpar, levou por reflexo a mão até a lambança em sua roupa, mas paralisou ao ouvir a voz do Stilinski.
– Deixa que eu limpo.
Cogitou questioná-lo, mas o melhor amigo mostrou-se tão prático e eficiente sozinho que ela acabou por não reagir. Permaneceu parada, concentrando-se em evitar que o sorvete começasse a escorrer por seu antebraço.
Stiles se inclinou um pouco para a frente, aproximando-se da Martin. Estendeu o antebraço até a coxa feminina e, devagar, passou o tecido de sua flanela sobre as gotas de sorvete.
O movimento lento e calculado não permitiu que a Martin pudesse sequer pensar no que fazer com o próprio corpo. Perdera rápido demais a atenção do sorvete que tentava manter erguido, os olhos verdes caindo para os cabelos escuros e penteados perto de suas pernas, enquanto os dedos finos ajudavam a retirar a sujeira em sua roupa.
Quando terminara, Stiles olhou para cima. Encontrara os olhos verdes com as pupilas dilatadas e sobrecarregadas de uma devoção silenciosa, um conflito árduo e afetivo e, ainda, alguma parcela estranha de esperança.
Martin sempre fora transparente para Stilinski. Ele não se recordava de existir um só momento em tantos anos de amizade que nunca tivesse a entendido antes de ela mesma.
Exceto por aquela noite.
Ao engolir em seco, a pulsação do homem tremulou contra seu pescoço. Em silêncio, os dois continuaram se olhando, dividindo a energia extasiada que seus olhos compartilharam. E então, como se o ar acabasse de ser quebrado e estilhaçado ao redor deles junto com o oxigênio, uma buzina ao longe os trouxeram de volta à estranheza antes ignorada do momento.
Ambos olharam em direção ao som, que viera da rua próxima ao parque. Com um arranhar de garganta, Stilinski ignorou a balbúrdia contida em seu peito e se recompôs ao sentar-se como antes, afastando-se da melhor amiga. A briga inevitável entre seus hormônios e cérebro ameaçou se alastrar por seu íntimo como abelhas que zuniam em suas veias, mas Stiles não permitiu que seus pensamentos o dominassem. Ele era prático demais para perder tempo com especulações.
Martin era quem sofria por ser emotiva, intensa demais, torturada por conclusões precipitadas. E, naquele momento em questão, teve consciência do quanto aqueles meros dez minutos despretensiosos tinham potencial para serem muito mais catastróficos do que todos os seus últimos três dias dos namorados que fracassaram.
Porquê Stiles era seu melhor amigo de anos.
Porquê alguma coisa dentro dela havia gostado de suas mãos, de observá-las de cima, de senti-las mesmo com duas camadas de roupas as separando de seus poros.
E porquê, para o seu azar, Stiles era atraente de uma forma proibida, perturbadora e deliciosa.
Ela observou os traços do rosto do melhor amigo, captando rasas nuances de nervosismo. A tensão nos lábios sutilmente abertos. A dureza das sobrancelhas contra a pele. O piscar incessante dos olhos.
No fundo, sentiu-se aliviada por saber que não era a única enfrentando algum tipo de conflito.
– Obrigada. – Tardiamente, agradeceu em um quase sussurro.
Stilinski engoliu em seco uma nova vez. Arranhou a garganta e acenou, reintegrando-se na imagem habitual que a melhor amiga já conhecia e convivera por anos. A postura de um homem tranquilo, sem grandes – ou quase nenhum – problemas afetivos.
Com as emoções revestidas em repressão, ela respirou fundo e o ofereceu um sorriso tenso, incapaz de assimilar todo o contraste de sentimentos que os olhos castanhos poderiam estar evidenciando. Em um silêncio borbulhante, a Martin terminara de tomar o seu sorvete. Sua língua não parecia disposta a iniciar uma conversa e, para sua sorte, a de Stiles também não.
Quando ela finalmente terminara o sorvete, o melhor amigo se colocou de pé. Bateu as mãos molhadas da grama na calça jeans e as estendeu para Lydia que, tímida, agradeceu com um sorriso e permitiu que ele a ajudasse a se levantar.
Juntos, eles começaram a caminhar em direção ao carro e, dessa vez, ela certificou-se de guardar as próprias mãos para si, unindo-as em frente ao corpo. Não queria dar chance para que o Stilinski a conduzisse em público com uma demonstração tão clara de afeto outra vez. Entendia que Stiles provavelmente não oferecia tanta intimidade para as outras mulheres com quem saia, mas, mesmo que tivessem o vínculo da amizade, Martin não ansiava dar brechas para contatos desnecessários.
Ser tratada como um dos encontros avulsos de Stiles era bem menos confuso e complicado do que ser sua melhor amiga durante o encontro.
– Foi uma noite ótima. – Disse ela, olhando-o de relance. – Obrigada.
– Você acha que nosso encontro acabou? – Ele franziu o cenho para ela, e seus lábios formaram uma curva sedutora e convencida.
Os olhos verdes viajaram para o lado, carregados de dúvida e curiosidade. Ao olhá-lo outra vez, ela levantou uma sobrancelha em uma pergunta muda.
Sem nenhum tipo de permissão, o Stilinski alcançou uma das mãos femininas e entrelaçou os dedos, puxando-a para caminharem em direção ao carro. Confusa e com uma emoção inexplicável escorrendo pela pele, como se mel morno estivesse banhando-a de dentro para fora, ela engoliu seco e o seguiu.
A expressão no rosto masculino era tão tranquila que beirava a perturbadora. Lydia, aparentemente, era a única que sentia sua consciência ameaçada pelo gesto.
– Comprei vinho para nós, e algumas outras coisas. Tudo bem por você? – Questionou ele.
– Claro.
Com um suspiro de alívio, a Martin entrou no carro. Estava realizada por finalmente poder ir para casa, aonde estaria separada de Stiles por paredes e uma porta. A melhor maneira de evitar que uma situação fosse criada era fugindo de seu problema e, claro, naquela noite, ele era o Stilinski.
Ela cruzou os dedos ansiosos em cima das coxas, pressionando as costas no estofado do banco. Começara a raciocinar quais seriam suas desculpas para dispensar a comida. Ao seu lado, Stiles dirigia relaxado, cantarolando baixinho a música que vinha do alto falante do veículo. Perdida em seus pensamentos, tentando listar todas as coisas que precisaria fazer no trabalho no início da semana, Lydia só voltou a prestar atenção ao redor quando o carro estacionou.
Curiosa, ela inspecionou toda a rua ao redor e ainda espiou a traseira do carro. Com a testa franzida, encarou o melhor amigo que havia acabado de desligar o veículo.
– Aonde estamos?
– Surpresa.
A mulher bufou, observando Stiles sair do carro e bater a porta. Quando ela levou a mão à maçaneta, a porta se abriu pelo lado de fora. Ele sorriu e esticou a mão, observando o misto de gratidão e fascínio nivelado brilharem nas pupilas de Lydia. Ela agarrou a mão dele, levantando. Ao fechar a porta para ela, o Stilinski a puxou para caminharem novamente.
– Estou realmente preocupada com a possibilidade de você estar me levando à um bordel ou coisa parecida. – Ela expulsou o pensamento, olhando ao redor da rua desconhecida e pouco movimentada.
Uma risada curta escapou da garganta masculina.
– Sempre tive curiosidade de ir em um, sabia?
– Típico. – Murmurou ela.
Sem olhá-lo, ela sentiu os olhos castanhos e cerrados e ofendidos pairando em seu rosto. Controlando uma risada, Lydia apertou a mão masculina na sua, o cabelo solto cobrindo o sorriso que surgira em sua boca. Provocá-lo e ser provocada continuava divertido exatamente como na época do ensino médio.
Após subirem alguns degraus, Stiles abriu uma porta para a Martin. Ela entrou primeiro, deparando-se com um corredor e uma escada ao lado. As paredes eram preenchidas por um verde musgo e gasto, mas o chão, o corrimão e a mesinha redonda, composta por um abajur, estavam limpos e conservados.
Atrás dela, ao bater a porta, Stiles seguiu para as escadas sozinho, chamando-a ao passar por ela. A mão feminina formigou em uma saudade precoce e incomum, mas Lydia ignorou o sentimento. Ela caminhou atrás dele, subindo dois lances de escadas até passarem uma nova porta.
Os olhos verdes examinaram as estantes enfileiradas de livros, e um misto de poeira e folha nova invadiu seu nariz. A biblioteca possuía uma iluminação fraca e amarelada, as estantes de madeira como a mesa que viu ao fundo do corredor.
Ela olhou para Stiles, com dúvida. Ele estava mordendo o lábio inferior, os olhos sobrecarregados de receio e expectativa, tentando descobrir se ela tinha aprovado a ideia.
– Acredito que essa seja a primeira vez que você entra em uma biblioteca.
Stiles riu baixinho.
– Eu me superei, não acha?
– Acho sim. – Ela acenou, sorrindo.
Um instante depois, foi puxada pela mão. Passaram pelo corredor de estantes e, ao chegarem no centro da sala, a Martin olhou para a esquerda. Existia um tapete preto e felpudo no chão, grande o suficiente para caber duas pessoas deitadas.
Duas almofadas estavam do lado, junto com uma pequena mesa redonda que possuía sushi e algumas porções de uva e morango, chocolate derretido e uma garrafa de vinho, junto com duas taças. No chão, a Martin reconheceu o notebook de Stiles aberto. Ao redor, existiam outras estantes de livros.
Ela o seguiu, aproximando-se do tapete. O melhor amigo sentou primeiro, ajeitando uma das almofadas nas costas contra a estante que estava atrás, e puxou o notebook para o colo. Lydia olhou ao redor, curiosa, o coração transbordando de um afeto antigo. Perceber que Stiles havia planejado aquilo tudo somente para fazê-la feliz, desmontou todas as preocupações que estavam tomando conta de sua cabeça. Lembrou-se que, acima de qualquer coisa, ele era alguém conhecido e amado por ela há muito tempo.
Lydia sentou ao lado dele, imitando sua posição ao amparar a almofada na estante atrás. Ansiosa e com algum nervosismo, seus dedos batucaram contra o tapete. Já estiveram próximos várias vezes, mas, aquele dia, algo em sua pele, em seu estômago, em sua garganta, estava experimentando um sentimento diferente.
Seus poros queriam encostar nos dele.
Seu estômago armazenava mil e uma borboletas ferventes que se debatiam como loucas.
Sua garganta estava emocionada demais para produzir palavras.
Stiles pegou um controle que a Martin não tinha reparado que existia. De repente, uma imagem se projetou na estante de livros há frente, fazendo Lydia perceber que existia um projetor numa mesa a frente.
– Separei um dos seus filmes favoritos.
– Um dos? – Perguntou ela, olhando a tela do notebook com curiosidade.
– Peguei você assistindo “Como eu era antes de você” pelo menos cinco vezes em menos de um ano.
– Você estava contando? – Com as bochechas coradas, os olhos divertidos de Stiles encontraram os seus.
– Não, mas reparei. E me planejei para assistir com você.
– Mas você já viu?
– Não.
– Sério? Todo mundo já viu esse filme.
– Se lembra do meu filme favorito?
Lydia revirou os olhos.
– “Clube da luta”?
– Exato. – Disse ele, mexendo na Netflix. – É um clássico.
Ao lado dele, a mulher suspirou.
– Não precisa assistir a uma coisa que não quer por minha causa. – A voz baixa e quase envergonhada murmurou.
Os olhos castanhos buscaram o rosto culpado da melhor amiga.
– E quem disse que não quero assistir?
Ela bufou, observando as próprias mãos que trouxe para cima da barriga, cruzando-as. Estava sem graça com a possibilidade de incomodá-lo, de fazê-lo se sentir obrigado a fazer algo que não queria só para consertar o problema entre eles.
– Tem certeza?
– Claro que sim. – Disse ele, projetando a tela do notebook no aparelho acima. A imagem do filme foi direcionada para a estante de livros a frente. – Quem sabe assim não descubro porque você sempre chora.
– Isso não é verdade! – Com uma risada baixa, ela o acertou uma cotovelada leve no braço, ouvindo-o rir enquanto suas bochechas coravam.
Ao dar play no filme, o Stilinski colocou o notebook ao lado e puxou para perto a mesa de petiscos. Congelada em expectativa, a Martin se esforçou para focar toda a atenção nas imagens projetadas na estante, mas os primeiros segundos de filme não foram absorvidos. Assim que a primeira cena começou, a voz do melhor amigo a alcançou:
– O que você quer comer primeiro?
– Doce. – Com a ansiedade vibrando em sua pele, respondeu. Sempre que se via nervosa, a Martin adquiria uma vontade especial de ingerir açúcar.
Ela se ajeitou mais para a cima, colocando-se mais sentada para se servir, mas, antes que pudesse fazê-lo, Stiles trouxe uma uva banhada em chocolate derretido até a sua boca. Uma sugestão silenciosa e ousada.
Lydia piscou, confusa, surpresa, os bonitos olhos verdes oscilando entre o rosto masculino e a uva. Stilinski permaneceu sério por alguns instantes, mas não demorou para seus lábios moldarem um sorriso carregado de pura diversão.
– Você vai... me alimentar? – Perguntou ela, incrédula com a proposta e com o formigar que estava contaminando suas coxas. A sensação era ridícula, indesejada e intensa.
Stiles deu uma risada morna, leve e confiante. A consciência de Martin sussurrou um palavrão em um gemido.
– É uma tática Stilinski. Muito antiga e eficiente. – Brincou ele, uma seriedade fingida dominando os traços do rosto.
– Aposto que sim. – Respondeu, e suas palavras eram mais verdadeiras do que Stiles podia imaginar.
Ela sabia que, com certeza, Stiles deveria ser charmoso em qualquer movimento durante um encontro. Sabia que ele não estava tentando seduzi-la, então não conhecia todo o seu potencial de fato. Entretanto, julgando pelo o que mãos unidas e tentativas brincalhonas de flerte estavam causando em sua cabeça, Martin preferia não descobrir o quão realmente conquistador Stiles poderia ser. Um encontro real com ele deveria ser muito intenso.
– Não quer aproveitar? – Stilinski ofereceu de novo.
Ele observou as bochechas de Lydia ficarem vermelhas. Alguns segundos depois, com receio, os lábios femininos entreabriram. Devagar, a uva encontrou os dentes de Lydia. Em uma mordida demorada, a Martin se deliciou com a explosão de sabor na língua. Ela fechou os olhos e, por impulso, um gemido baixo vibrou na garganta satisfeita.
Stiles sorriu sozinho, comendo o resto da uva. Ao lado dele, quando a consciência de Lydia invadiu o pequeno acesso de prazer em sua língua, ela levou às mãos a boca e engoliu nervosa, os olhos verdes e arregalados em direção ao amigo. Ela viu os ombros fortes tremendo, denunciando a risada abafada.
– Idiota. – Ela murmurou, envergonhada.
– E você, Martin, é mais divertida do que eu pensava. – Disse ele, oferecendo-a mais uma uva enquanto sorria.
Com as bochechas coradas, ela aceitou o alimento sem hesitação daquela vez, mas focou toda a atenção em não fazer sons indesejados novamente. Pouco depois, tornaram a se concentrar no filme.
Naquele momento, eles não eram nada além de melhores amigos que dividiam o apartamento e passavam tempo juntos. Apesar de uma pretensão sedutora nos gestos, Martin estava inegavelmente se divertindo e, mesmo que ela não soubesse, Stiles também. Mais do que até ele mesmo sabia.
Quando os petiscos acabaram, Stilinski serviu vinho aos dois. Em algum momento enquanto o álcool descia pela garganta, Martin observou o melhor amigo acomodar as costas na estante atrás e, de repente, um braço masculino se infiltrar atrás de sua cabeça. Os dedos dele roçaram seus braços, fazendo-a engolir, os dentes apertados enquanto o nervosismo desencadeava um tornado em sua pulsação.
Stiles Stilinski estava abraçado com ela, como em um encontro real.
Seu corpo era firme.
Seus gestos eram silenciosos e incisivos.
Seu cheiro era letal.
O coração de Lydia rodopiou em suas artérias, incerto do que sentir. Realização, receio, medo, deleite... ainda que morassem juntos, Stiles e Lydia nunca haviam ficado naquela posição. Intimidade e contato físico nunca foi um problema entre os dois.
Passavam horas jogados no chão da sala assistindo televisão, conversavam deitados na cama um do outro, faziam as refeições juntos na mesa todo fim de semana, mas com um acordo mútuo e silencioso de seus espaços pessoais. Eram amigos sendo amigos e nada mais.
Ao abraça-la daquela forma, Stiles estava ultrapassando um limite. Naquele momento, ainda que fossem amigos sendo amigos, seus corpos insinuavam outra coisa.
E Lydia estava preocupada com o fato de estar gostando do que estava acontecendo.
Ela ficou petrificada o resto do filme. Ao seu lado, o Stilinski continuou tranquilo, alheio a aproximação, e não pode negar para si mesmo que, no fundo, ter Lydia mais perto foi uma boa novidade. Gostou de como suas alturas favoreciam que seu nariz pudesse sentir diretamente o cheiro do cabelo ruivo, ou como os ombros pequenos e femininos pareciam perfeitamente desenhados para o encaixe do seu braço.
Apreciou que existia um nível diferente de intimidade entre ele e Lydia no encontro, e gostou do sentimento.
Os minutos se estenderam dentro da biblioteca. Quando o letreiro final do filme começou a subir, Stiles suspirou. Sentiu-se genuinamente triste pela história, mas não estava disposto a revelar a informação até que escutasse Lydia com algum indício de lágrimas. Pouco tempo depois, quando o silêncio pareceu muito longo, ele espiou a cabeça da Martin que em algum momento, escorregou e deitou em seu ombro.
Ela estava dormindo, completamente pacífica e silenciosa. Stiles sorriu, contente por vê-la descansando. Com uma mão, sem se mexer muito, ele alcançou o notebook e desconectou do projetor, desligando-o. Em seguida, se ajeitou na posição e, por instinto – ou um mero afeto escondido em seu peito – depositou um beijo breve no cabelo ruivo da melhor amiga.
Encarou o teto da biblioteca, a cabeça vaga e o coração cheio. Por algum motivo, estava feliz. Poucos minutos depois, com a quietude e o cheiro do creme do cabelo da Martin invadindo seu nariz, o Stilinski adormeceu.
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