A conversa ao telefone com o “alfa” misterioso deixou Jonathan tão animado que ele mal conseguiu se reconhecer.
Desde que conhecera Dio naquele dia, seu coração foi tomado por um turbilhão de sentimentos bons e ruins, completamente misturados uns aos outros.
Isso porque, de alguma forma, ele sentia que enfim conseguiria ser plenamente feliz com a pessoa que seu alfa interno escolhera, sem se render a pressões familiares ou a convenções sociais; porém, por outro lado, Jonathan tinha total noção de que seria bastante complicado para Dio adentrar o coração de George, supondo que o ômega tivesse tal intenção.
Afinal, lidar com uma criança enlutada que o via como uma ameaça terrível soava como um problema que Dio decididamente não acrescentaria à imensa lista de preocupações que ele já possuía.
No entanto, a despeito de tudo isso, a empolgação por sentir instintivamente que estava mais próximo de Dio o fez deixar a “questão George” de lado por ora, já que realmente não tinha muito o que fazer.
E foi tentando não demonstrar ao filho que o abalo pela briga que tiveram no dia anterior estava sob controle graças à ligação que recebera do suposto “benfeitor” de seu ômega destinado que Jonathan se portou naquela manhã, o que deixou George de sobreaviso.
Ainda que fosse criança, aquela “animação” súbita de seu pai não passou despercebida ao seu jovem instinto de alfa, o que o fez puxar assunto com Jonathan a contragosto.
— Por que tá contente? — Perguntou sem encarar o pai, picando o pão italiano em pedacinhos pequenos em cima de seu prato, apenas para implicar — O que aconteceu?
Percebendo pelo tom do filho que ele estava prestes a ser submetido a um interrogatório, Jonathan resolveu colocar seu plano em prática, quanto mais cedo, melhor.
— Aconteceram umas coisas e vou precisar ficar uns dias fora — optou por omitir parte da verdade, já que sua personalidade não lhe permitia mentir — Mas não se preocupe, não devo demorar muito… Você vai ficar com o tio Speed enquanto isso e poderemos conversar todos os dias pelo telefone, se quiser.
George franziu a testa, levemente apreensivo.
— Vai cavar alguma múmia…?
Jonathan sorriu, embevecido com a curiosidade do filho.
— Não é nada tão emocionante assim… — respondeu pensando nas outras acepções da palavra, já que ele tinha certeza de que o encontro com Dio seria muito mais do que simplesmente emocionante — Mas não menos importante, por isso, quero que você seja um bom menino e obedeça ao tio Speed enquanto eu estiver fora, pode me prometer isso?
O pequeno alfa suspirou, tentando não deixar o medo tomar conta de si.
— Mas… você vai voltar, né…? — Indagou quase num sussurro, externando seus temores infantis — Você ficou bravo porque falei que odeio aquele ômega… e vai embora…?
As suposições de seu filho único provocaram um aperto no peito do alfa mais velho, que tratou de se levantar da mesa e abraçá-lo apertado, esforçando-se para transmitir segurança pelo vínculo dos dois.
— Eu jamais iria embora sem você, meu filho… — optou por responder só a parte verdadeira, já que não podia negar que tinha ficado bastante aborrecido com as palavras de George, ainda que a maior parte desse sentimento ruim tenha vindo de seu instinto — Apenas calhou de eu precisar ficar um tempo fora e não poder te levar junto. Não posso permitir que você falte às aulas, então o tio Speed vai tomar conta de você para mim enquanto isso, entende? E é como eu te falei, pode me ligar sempre que quiser. Se eu não atender por estar ocupado, retorno assim que for possível, tudo bem?
Ao sentir que George retribuíra a intensidade do abraço, Jonathan respirou fundo, beijando o topo da cabeça do filho.
E enquanto torcia para conseguir resolver as coisas em Canterbury o mais rápido possível, pensou o que Dio estaria fazendo… e se sentia esse comichão no peito a cada vez que se lembrava do breve encontro que tiveram.
XxX
— Bronquite…?
Dio Brando encarava o pediatra com um ar inquisitivo, como se não aceitasse o diagnóstico que acabara de receber.
— Para ser mais exato, seu sobrinho tem um quadro de bronquite asmática — o homem de cabelos loiro-escuros e penetrantes olhos verdes respondeu sem sorrir, claramente preocupado com o garotinho miúdo sentado no colo do tio — Ele pode ter desenvolvido alergia a alguma coisa e isso se manifestou em forma de uma leve crise de asma, já que o peito dele não está chiando tanto. De qualquer forma, vou prescrever a medicação e você precisa ficar de olho nele, já que a crise pode voltar a qualquer momento…
O ômega mordeu os lábios, claramente aflito.
— Então ele vai sofrer disso pelo resto da vida?
— A asma é uma doença crônica, ou seja, ainda não possui uma cura definitiva — o pediatra começou a responder, ao mesmo tempo que preenchia o receituário médico com a ajuda de um computador — No entanto, se tomar alguns cuidados, ele pode ter uma vida praticamente normal e livre de crises. Como Ungalo tem quase dois anos de idade, será mais fácil evitar que ele faça atividades físicas intensas… Além disso, é importante que ele se alimente de forma balanceada e nutritiva, isso fortalece bastante o sistema imunológico e previne doenças oportunistas, que podem agravar o quadro da asma… Também é ideal manter a casa sempre limpa, livre de poeira e de agentes que possam proporcionar o aparecimento de ácaros, como por exemplo bichinhos de pelúcia e até mesmo carpetes e cobertores… E evitar fumar ou usar produtos químicos com cheiro muito forte em casa. Mas não se preocupe, vou imprimir junto da receita um guia que vai ajudá-lo a prevenir as crises desse garotinho!
Pensando que não podia haver momento pior para Ungalo desenvolver tal doença — afinal, Dio não tinha ideia de que tipo de esconderijo Abbacchio arranjaria e eles não podiam se dar ao luxo de escolher — o ômega limitou-se a assentir, dando graças aos céus por Rikiel e Donatello se manterem sentadinhos comportados no consultório, embora curiosos com a infinidade de quadros e instrumentos interessantes que havia naquele local.
— Prontinho! — Dando uma última revisada no que tinha escrito, o pediatra mandou imprimir a receita e o guia, carimbando e assinando as folhas em seguida e entregando-as a Dio, que passou os olhos bem rápido por elas, antes de guardá-las na pasta que fizera para Ungalo — Não se preocupe, senhor Brando. Pode ter certeza de que Ungalo vai tirar essa asma boba de letra, não é, campeão?
— Boba! — O menino estendeu os bracinhos e sorriu, arrancando sorrisos de Dio e do loiro-escuro, que visivelmente adorava crianças — “Peão”!
— Crianças são mesmo uma graça, não…? — O pediatra falou, sorrindo — São tão inocentes, merecem o mundo…
Dio deu de ombros, ele não entendia muito de crianças, mas decerto achava que os sobrinhos dele mereciam o mundo.
De preferência, um em que o pai alfa delas não estivesse.
— Tem filhos… — Dio baixou os olhos para ler o nome no carimbo que estampava a receita — …doutor Zeppeli?
Zeppeli negou com a cabeça, coçando o queixo estilosamente barbeado.
— Ainda não… Meu marido teve umas complicações na juventude e isso acarretou em dificuldades para engravidar… Já passamos por diversos tratamentos e nenhum teve resultado, então meio que deixamos por conta do destino… Eu já disse a ele várias vezes que podemos adotar um ou dois moleques, mas ele insiste que quer ter um filho meu… Embora isso não tenha importância. Para mim, basta que possamos criá-lo juntos, independentemente de sangue…
Dio suspirou, a vida era mesmo engraçada.
Ele, que nunca pensou em ter filhos, de repente se vira com três crianças sob seus cuidados e, desde então, não media esforços para que Donatello, Rikiel e Ungalo tivessem uma vida minimamente decente.
Enquanto isso, aquele pediatra simpático e seu companheiro ômega tentavam desesperadamente ter uma criança e não foram agraciadas com nenhuma, o que só fazia Dio pensar que realmente era impossível entender os desígnios divinos, se é que existia algo do tipo.
E então, ao olhar o carimbo do loiro-escuro mais uma vez, algo lhe chamou a atenção.
— Que coisa… Eu achei que tivesse vindo ao consultório do doutor Gregório, mas… Seu nome é…
— Gyro — O pediatra respondeu com um sorriso nos lábios, achando graça de Dio só ter notado aquilo agora — O velho Gregório é meu pai, faz cerca de um ano que ele deixou de atender neste consultório… Mas não se preocupe, sou um médico tão bom quanto aquele velhote sisudo, eh?
O ômega deu de ombros, aquilo não tinha a mínima importância.
Desde que seu sobrinho fosse bem-atendido, tanto fazia quem era o médico.
— Imagino que sim… Bom, então vou indo, dr. Gyro. Comprarei os remédios no caminho para casa…
— Ah, só um minuto, já ia me esquecendo… — Gyro se levantou da mesa e foi até um gabinete posicionado ao lado de uma das estantes do consultório, tirando dali um pote cheio de pirulitos de toda sorte de cores — Como se comportaram direitinho durante a consulta, vão ganhar docinhos, podem pegar!
Os olhos dos meninos mais velhos se arregalaram diante daquela visão que mais lhes parecia o paraíso, mas ambos se contiveram e pegaram apenas um cada, deixando para Dio pegar o que cabia a Ungalo.
— Não pode comer muito doce… Senão engorda e não pode subir no cavalo… — Rikiel lamentou, ainda namorando um pirulito amarelo que parecia ser de abacaxi.
Entortando os lábios, Gyro pegou um punhado de pirulitos e colocou sobre as mãozinhas estendidas de Rikiel, que surpreendeu-se quando Dio acenou positivamente com a cabeça, como se não tivesse problema em aceitar tantos doces.
Satisfeito por ver que Dio não dera mostras de que repreenderia o menino, Gyro continuou, dando uma piscadela marota.
— É verdade que todo exagero faz mal, mas todo mundo precisa comer uns docinhos de vez em quando… Meu esposo adora marshmallows, devora vários deles sempre que tem chance e nunca deixou de montar por causa disso… O importante é não exagerar todos os dias, eh?
Sorrindo, Dio acariciou os cabelos do sobrinho e perguntou, atencioso.
— Como se diz, Rikiel?
— Obrigado, tio Zeppeli! — Rikiel agradeceu com um sorriso enorme, empolgado por ter ganhado um monte de doces.
— Nyo, ho, ho! — Gyro bagunçou as madeixas do garoto, contente por ter sido promovido de “médico” a “tio” — De nada, Rikiel! Voltem sempre!
Feliz por ter encontrado um pediatra decente, Dio fez uma leve reverência com a cabeça e então conduziu os dois mais velhos para fora do consultório com Ungalo em seus braços, pensando em quais seriam seus próximos passos.
Provavelmente, assim que chegasse em casa, tentaria ligar para Abbacchio de novo, para perguntar se havia alguma possibilidade de ele conseguir um esconderijo em algum lugar que tivesse ar puro em abundância.
Afinal, embora ele duvidasse que a causa da bronquite asmática de Ungalo fosse física, não seria ruim prevenir outras crises… e ele também não fazia objeção a um pouco de natureza.
Para ele, a residência dos Pucci não passava de um mausoléu desagradável cheio de recordações horríveis… e tudo que Dio queria era poder esquecer que um dia esteve sob aquele teto.
xXx
“Deite-se aqui, Diego… Agora… eu vou te purificar, meu ômega… Com o meu corpo… e tudo o que tenho para você…”
O ômega acordou de um sobressalto, a impressão do sonho vívido que acabara de ter se refletindo na ereção visível sob as cobertas que ele nem lembrava como tinham ido parar ali.
Sentando-se na cama, o loiro tentou controlar a respiração pesada, sentindo um calafrio passar por todo seu corpo e uma dor insuportável na região de seu baixo ventre.
— Uh… — Gemeu, levando automaticamente a mão ao membro para tentar se aliviar de alguma forma — Ahn… O… O que é isso… Uh…
Apesar de se tocar com bastante intensidade — e com um pouco de urgência — não demorou muito para que o ômega percebesse que aquilo não o levaria a lugar algum.
De certa forma, ele percebeu que seria incapaz de alcançar seu alívio sozinho, o que indicava que seu corpo se acostumara completamente a receber prazer pelas mãos de outra pessoa, provavelmente a que tinha aquele cheiro doce como o dos caramelos que Ferdinand lhe oferecera.
— Quem… — O ômega esfregou os cabelos com as unhas, como se naquele gesto pudesse arrancar à força o nome e o rosto da pessoa de quem seu coração sentia tanta falta — Quem me disse essas palavras…? Não consigo me lembrar…
Frustrado, o loiro tentou se recompor de alguma forma, sentindo certo alívio por não ter conseguido ir muito adiante, já que não sabia como se explicaria para Ferdinand quando este encontrasse a cama toda suja do seu prazer.
Um pouco envergonhado, livrou-se das cobertas devido ao calor excessivo que sentia e logo se arrependeu, pois seu corpo parecia um pouco fora de controle.
— Mas que saco… — Reclamou, o suor escorrendo pela sua testa e a dor no baixo ventre piorando, deixando-o quase incapaz de raciocinar — Por que eu…
— Meu caro? — Ferdinand surpreendeu o ômega ali sentado e logo ergueu uma sobrancelha, entendendo imediatamente o que estava acontecendo ali — Bem que desconfiei… Você está no heat.
Os olhos verdes se arregalaram àquela informação e um medo irracional tomou conta do ômega, que logo levou a mão à marca na nuca, como se ela fosse a culpada por ele estar passando por aquela situação.
— Acalme-se… — Ferdinand pediu em um tom suave, temendo que o ômega se descontrolasse e acabasse se machucando novamente — Isso é sinal de que seu corpo está se recuperando dos maus-tratos sofridos… Ômegas saudáveis têm períodos de heat, isso é normal, meu caro…
— Diego — O ômega despejou de repente, sem encarar o médico — Acho… que meu nome é Diego. Ouvi… alguém me chamando assim em um sonho…
Ferdinand suspirou, pelo visto, seu paciente estava começando a se lembrar do passado.
— Entendo… Prefere então que eu o chame assim…?
Diego deu de ombros, ele não sabia ao certo o que queria.
Apenas que aquela sensação dolorida e que aquele calor insuportável desaparecessem imediatamente.
— Certo… — O médico ponderou, esforçando-se para não irritar o ômega confuso — Vou continuar te chamando como sempre e você me diz depois se prefere que eu use o nome de que se lembrou, tudo bem?
O loiro assentiu apressadamente, puxando uma das cobertas para perto de si e se enrolando nela, conquanto o calor ainda o incomodasse bastante.
— Escute, meu caro — Ferdinand chamou a atenção de Diego, que fazia de tudo para não sucumbir à dor — Eu tenho alguns bloqueadores de heat comigo no laboratório, eles vão te ajudar a suportar os sintomas desagradáveis… Espere aqui, vou buscá-los para você.
Diego acenou com a cabeça em concordância, abraçando o próprio corpo sob a coberta mal posicionada.
Respirando fundo, o médico se aproximou e o cobriu corretamente, tomando cuidado para não encostar diretamente nele e o deixar ainda mais sensível à dor.
— Pronto, agora sim! — Sorriu, tentando tranquilizar o ômega — Agora vou lá buscar os remédios, quer mais alguma coisa?
O ômega pareceu refletir por alguns instantes e então pediu, determinado a recuperar um pouco mais de sua memória.
— Ainda… tem daqueles caramelos?
Sentindo seu peito apertar, Ferdinand respondeu, se esforçando para não deixar sua dor transparecer.
— Claro… Quantos você quiser, meu caro. Prometo que não vou demorar.
Deixando para trás um ômega agradecido, Ferdinand saiu do quarto sem saber exatamente como se sentia em relação àquela situação.
Pelo visto, seu paciente estava se lembrando do passado e ele não tinha a menor ideia de como deveria lidar com aquilo.
No entanto, não podia negar que estava intimamente feliz… por “Diego” não tê-lo proibido de usar o apelido que lhe dera quando não sabia exatamente de que forma deveria chamá-lo.
E aquilo… lhe deu uma esperança que ele decididamente não queria alimentar.
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