- Foi um prazer conhecer a irmã da Bliss – Charles um homem alto de cabelos loiros e olhos azuis claros diz enquanto estende sua mão em minha direção, não demoro em aceita-la e aperta-la.
- O prazer foi meu... – Olho para Vagner, um homem tão alto quanto o primeiro, ele tinha cabelos pretos e olhos verde escuro, uma barba por fazer e dentes amarelos por causa do fumo em excesso –... Em conhecer os pais da minha irmãzinha... Obrigada por cuidarem dela.
- Isso não é nada para eles – Bliss se pronuncia em um tom brincalhão – Eles amam cuidar de mim.
- Com certeza! – Vagner lhe abraça e bagunça seus cabelos.
Solto a mão de Charles e sorrio para aquela cena de família feliz, eu fico contente em saber que a pequena encontrou seu lugar feliz. Benny passa o braço esquerdo por meu pescoço me puxando para perto de si, ele sorri e posso ver no seu olhar o tanto de felicidade que eu senti ao ver Bliss sorrir.
Despedimo-nos na porta do hotel, Bliss abraça-me e chorosa diz que sentirá saudades, essa semana que passamos juntas foi muito boa e aposto que ela se divertiu tanto quanto eu, digo para ela ser forte e que nos veremos na próxima. Ao sair de lá desabo em lágrimas, Benny ri com meu jeito de tentar ser durona e me abraçando diz que vai ficar tudo bem e que logo nos veremos novamente.
- E entregue! – O ruivo estaciona o carro frente ao prédio em que moro.
Olho para a janela do meu apartamento, mamãe espia da janela e ao ver que a observo fecha a cortina rapidamente. Suspiro, nosso relacionamento está ficando difícil a cada dia que se passa, ela insiste em me empurrar aqueles malditos remédio alegando que me fará bem, arruma sempre motivos para falar mal de Benny e ainda tenta me controlar.
- Não queria ter que subir agora, mas estou muito cansada.
- Você está bem? Isso não é normal sabe, você anda cansada, tem dores de cabeça frequentes e enjoos. Posso te levar a um médi-
- Você, sempre tão preocupado – Lhe interrompo, antes de sair do carro lhe dou um selinho demorado – Até mais.
Ele espera-me entrar antes de sair com o carro. Dirijo-me até o elevador, dentro tem uma adolescente mexendo em seu celular, os fones de ouvido no máximo me fazem acompanhar a clássica música de Evanescence, saio primeiro que ela que segue para o próximo andar, ao entrar no apartamento sou recebida por Brute me lançando um olhar que dizia que eu estava encrencada. Reviro os olhos já imaginando o que me aguardava.
- Onde esteve o dia todo?
- Não sou mais uma criança mãe – Respondo apenas.
- Você insiste em voltar a se envolver com esse garoto – Olha-me desaprovadora.
- A senhora não deveria estar no trabalho? – Caminho para o meu quarto.
- Não ouse me ignorar Berserk – Segue-me raivosa.
- Mamãe, não estou com cabeça para brigas hoje – Tento fechar a porta do quarto porém ela segura deixando-me claro que daquilo eu não iria escapar nem tão cedo.
- Está começando a agir como o desgraçado do seu pai! Falta apenas nos abando-
- NÃO OUSE ME COMPARAR A ESSE MALDITO!
Grito em ódio, novamente me comparando a esse merda. Ultimamente era apenas isto que ela fazia reclamar e me comparar a ele, porém mamãe sabe o quanto odeio que me comparem a um puto como o papai e estou começando a creditar que ela faz isto de proposito, pois até o momento isto foi à única coisa que realmente me triou do sério em todas as nossas discussões.
- Acho que esta discussão está saindo do controle – Brute tenta intervir, porém fecho a porta em sua cara e na de mamãe trancando-a logo em seguida – Tudo bem, eu entendi o recado.
E em fim o bendito (E quase inexistente nos últimos dias) e merecido silêncio que me leva a dormir e não querer acordar mais. Acordo-me de madrugada, suando e quase sem enxergar nada, olho para a porta e peço por ajuda.
Porra!
Lembro-me que a porta estava trancada então com muito esforço levanto-me da cama e me apoio na parede, arrasto-me vagarosa até a porta, minha mão treme e o suor começa a aumentar, caio no chão tendo espasmos assim que param sinto dor, volto a focar na porta, destranco-a, a luz do corredor estava acesa, mamãe acaba de sair do escritório.
- Berserk?
Olho-a desesperada, caio novamente tendo convulsão e então tudo escurece. Acordo-me horas depois em uma cama hospitalar, mamãe faz alguns cálculos em uma agenda, o dia está começando a amanhecer, pisco algumas vezes e movo meus dedos, eles doem não tanto como o meu corpo, porém incomodam. Percebo que estou conectada a uma maquina de batimentos cardíacos ao seu lado uma bolsa de soro pinga de certa forma rápida, passo a língua nos lábios antes de falar e perceber que minha garganta estava seca.
- Mãe – Ela larga rapidamente sua agenda e aproxima-se.
- Oi filha... Está se sentindo melhor?
- O que aconteceu comigo?
- A falta dos remédios, eu falei que não poderia parar você teve algumas efeitos colaterais por parar o tratamento tão bruscamente.
Penso em como ela estava certa e em como fui uma tola por não acreditar, essa merda toda de perda de memória fez-me regredir para uma adolescente me deixando com um pensamento de menina rebelde.
Idiota, Berserk, Você é uma i-di-o-ta
- Mãe desculpe por não acreditar em você.
- Oh minha pequena – Abraça-me com os olhos cheios de lágrimas. Mamãe era como a Brute, não demonstrava tanto seus sentimentos então me surpreendi ao vê-la chorar – Tudo bem, que bom que você está bem – Beija o topo de minha cabeça – Fiquei tão preocupada, pensei que...
- Mamãe, eu estou bem – Sorrio para lhe mostrar de que falava a verdade.
- Eu te amo tanto.
- Também te amo mamãe!
E então fizemos as pazes ou era o que eu achava até exatos trinta segundos quando a porta abriu-se passando por ela aquele ser tão desprezível por nós.
- Berserk!
Minha voz demonstrava todo ódio que sentia.
- Pai.
[...]
Mamãe estava encostada na parede ao lado da porta, carregava no rosto uma expressão mais do que irritada, mais a frente papai acendia um cigarro e soltava a fumaça pela janela, eu tentava não perder o controle e sair por aquela porta, odiava quando papai resolvia simplesmente fazer o papel que sempre fizera tão mal: Ser pai.
-É proibido fumar aqui.
- Não me encha o saco Antônia.
- Não ouse falar assim com ela! – Me surpreendo em como posso perder a paciência em segundos apenas com uma fala dele.
- Tudo bem percebi que não sou bem vindo – Traga metade do cigarro e joga o resto pela janela.
- Nunca foi... – Confirmo.
- Eu só vim ver se estava bem.
- Como soube? – Mamãe pergunta e ele a ignora.
- E também vim agradecer.
- Agradecer?
- Sim Berserk, você cuidou da Bliss mesmo me odiando – Olha-me melancólico, ignoro a vontade de dizer que não o odiava – Eu queria visitar ela, se possível.
- Não acho que está no direito de pedir isso, você a abandonou.
Mamãe escuta a conversa com uma expressão curiosa, porém não diz nada sei que logo chegara a uma conclusão e começará a fazer suas perguntas, ela é muito inteligente.
- Você sabe meus motivos...
Olho-o assustada, não poderia ser, mais uma memória perdida, puta merda! O que será que levou a ele fazer tudo aquilo? O que merda eu fiz para aceitar a cuidar da Bliss? Não que eu me arrependa disto, claro.
- Merda... – Sinto minha cabeça latejar de dor, eu só queria um pouco de paz – Eu perdi a memória pai.
- Como?
- Perdi a memória, os oito anos que se passaram foram praticamente apagados da minha mente. Não me peça para explicar é uma história longa e sei que entende.
Encara-me curioso, mas não faz perguntas. Alguns segundos de silêncio enquanto ele puxa o celular do bolso do blazer e confere algumas mensagens, bebo um copo d’água e quando termino sua voz preenche o ambiente novamente.
- Como bem sabem eu era alcoólatra e isso me levou a certos caminhos que me arrependo amargamente, um deles foi o de ter que deixar vocês.
- Conta outra – Mamãe revira os olhos achando tudo aquilo uma grande besteira.
- Não de você Antônia nunca me arrependi de ter deixado você.
- Digo o mesmo Rafel, apenas doeu no meu bolso ter que criar as meninas sem sua ajuda você e o nada é a mesma coisa.
Estranho àquela troca de farpas sabia que eles brigavam, porém agora me parece que nunca gostaram um do outro. De repente eu já não existia para ambos.
- Sabe que só me casei com você por que engravidou das meninas.
- Isso não teria acontecido se você não tivesse me convencido a beber tudo aquilo.
- Não te forcei a nada, apenas queria me vingar por ter me sabotado no projeto da escola.
- Então era isso? Você é mesmo infantil, sempre foi um inútil tanto que nem conseguiu fazer sua vingança, bebeu mais do que eu naquele dia.
- Ainda bem que encontrei uma mulher melhor que você.
- E onde está ela?
Eles se odiavam, nunca pensei por esse lado, ficaram nove anos de suas vidas tendo que aturar um ao outro, isso explica eu nunca ter visto uma demonstração de carinho entre eles. Mamãe nunca contou como se apaixonou pelo papai, e hoje entendo o porquê, ela nunca se apaixonou, ao menos não por ele.
- Volte a contar sua história – Me pronuncio quando noto que ele não responderia mais nada a ela.
- Certa vez no bar, eu encontrei a mulher mais linda que vi na vida – Mamãe revira os olhos novamente e ele não nota por estar perdido em suas lembranças – Passamos a nos encontrar frequentemente, ela me convenceu a fugir com ela, eu não tinha nada a perder, era o que achava. Fomos embora na mesma hora em que me fez a proposta, fomos para a Rússia aonde nos casamos e tivemos nossa filha. Eu trabalhava em um laboratório do governo e ela se virava como podia limpando casas de ricos, um dia ela pediu para eu levar a Bliss para o laboratório, pois o novo patrão dela não gostava de crianças. Eu estava ocupado com algumas anotações e não notei quando Bliss derrubou um frasco de um experimento fracassado sobre sua cabeça, seus cabelos mudaram de loiro para azul fiquei fascinado com aquilo então fui fazer novos experimentos, perdi a noção da hora, quando cheguei em casa já era tarde de mais...
- O que aconteceu? – Perguntei entretida totalmente na história.
- A minha esposa não trabalhava limpando casas, ela trabalhava para a máfia Rússia e devia bastante por ter deixado um fugitivo escapar apenas por ele também ter uma família. A casa estava uma bagunça, ela tinha resistido antes deles a levarem presa, voltei para Townsville com a Bliss, eles queriam que eu pagasse o resgate, eu não podia deixar a Bliss sozinha então liguei para você, achei que seria a única que compreenderia meu lado, logo depois voltei para a Rússia atrás de formas de pagar a divida, há dois anos voltei e mesmo tendo pagado a divida, eles mataram ela na minha frente.
Não havia palavras para aquilo, papai fora um desgraçado com a gente, mas pagou por isso ao abandonar a filha e ver sua esposa morta, é lamentável. Olho para mamãe que parecia um tanto comovida com a história.
- Eu só queria agradecer por ter cuidado dela.
Silêncio.
- De nada.
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