— Ren, Você é mesmo péssimo nisso — comentou Mirian Ramos com seu sorriso congelado e seco. Estava ficando desgastante esperar que o irmão mais velho tirasse a selfie perfeita. Sua precisão era um desastre.
— Jesus, eu sei que posso fazer isso — defendeu-se Rene, seguido de um riso nervoso. — Pronto.
— Amém! — saudou a matriarca, Pacqi, tomando o aparelho dourado das mãos do filho e analisando a tela. Os demais presentes acomodavam-se pela enorme sala de estar. — Maravilhoso — pontuou —, eu só não consigo ver Sergio.
— Sergio é uma sombra — Mirian disse em desdém enquanto sentava-se ao lado de seu belíssimo noivo de olhos azuis. Os mesmos gelidos olhos que miravam no grandalhão na extremidade mais distante do cômodo, com braços cruzados e um semblante mal-humorado.
Sergio era assim: nas fotos de família era imperceptível; nos jantares importantes, era apático e indiferente; e nunca, nunca mesmo estava puxando assunto, exceto por uma vez naquela noite, mas isso meio que foi acidentalmente, então não deve ser levado em consideração. Entretanto, isso não quer dizer que ele fosse desanimado ou preguiçoso, muito pelo contrário, Sergio cozinhava, oferecia-se para acender a lareira e recolhia a mesa sempre que acabava o jantar. O seu grande problema é que ele nunca comentava nada. Era tão fechado que às vezes era irritante.
— Certa vez Sergio me contou como foi suas férias de inverno na América, o que foi um milagre. — Comentava Jose, olhando e sorrindo diretamente para a filha, que naquela noite tornava-se noiva. Ao seu lado, Gerard Piqué girava a aliança no dedo, vascilante com aquela decisão. Aquele era o jantar de seu noivado, eles já haviam acabado a refeição e agora compartilhavam as coisas da família. Em meses ele estaria se casando e mudando-se para Barcelona. Isto era certo. Ele havia escolhido esse caminho e não iria, de forma alguma, arrepender-se. Mas só de pensar nisso seus sensores o levavam a olhar novamente para o homem encostado no batente, fitando tudo e todos rudemente. Por que Sergio era assim? Ele quis saber.
— Isso certamente não se vê todo dia.
— Vocês o julgam mau — defendeu Pacqi, sorrindo gentilmente para o filho.
Por que ele não se defendia? Por que ele não dizia qualquer coisa? Houve uma noite, ali mesmo em Sevilla, no final de Setembro — na comemoração do aniversário de namoro de Miriam e Gerard — que Sergio pela primeira vez saiu da toca de um jeito muito inesperado. Estavam em uma residência de eventos contratada pela família para realizar a festa da forma mais impecável possível, pois a família Ramos era cheia de caprichos. Especialmente quando se tratava da caçula.
Gerard estava evitando beber mais do que deveria por simplesmente sentir que não poderia cometer nenhum deslise diante da família em que estava prestes a entrar. Mas Miriam estava mesmo disposta a aproveitar o máximo da festa.
— Sabe o que mais me faria feliz nesse momento? — perguntou a morena à Gerard, que estava envolvido por seus abraços pelo pescoço. Eles estavam próximos e o hálito de álcool dela atingia-o rigorosamente no rosto.
— O quê?
— Nós dois lá em cima — ela soltou, mordendo o lábio inferior e olhando intensamente para ele.
— Aqui? — ele questionou. Havia muitos convidados pelo local: amigos, parentes distantes e parentes próximos como seus próprios pais e irmãos.
— Qual é o… problema? — sua voz embargada já demonstrava um tanto considerável de embriaguez. — Vai me dizer que está com vergonha?
— Não, não é nada disso — ele falou, procurando se havia saída. O que foi perda total, pois não havia. Agora ele teria que fazer aquilo. — Quer saber de uma coisa? Por mim tudo bem.
Ele passou os braços pela sua cintura e a pegou no colo, enquanto risos exagerados ecoavam dos lábios da morena. Lá em cima o corredor estava pouco iluminado, dificultando bastante o trabalho de levá-la até um quarto, sobretudo pelo esgotamento de ter subido vários degraus com a namorada nos braços. Mas tudo valeria a pena, já que teria sua devida recompensa. No entanto, quando ele a comodou devidamente na cama, um sentimento de decepção o acometeu. Sua vívida namorada já ressonava como uma criança em um sono profundo.
Fora uma experiência meio frustante. Ele caminhava de um lado para outro pelo quarto apenas ouvindo a música abafada que vinha lá de baixo sem saber que rumo tomar, até que seus olhos pousaram em algo curioso. Vinha de debaixo da porta, naquele ínfimo espaço. O corredor estava escuro, então era certo que a claridade do quarto tramitisse luz para o lado de fora. No entanto, algo estava bloqueado a passagem.
Gerard cortou o espaço silenciosamente e tocou na maçaneta, primeiramente com bastante cautela. Ele era um cara receoso e prudente. Quando ele girou a maçaneta e a porta abriu-se lentamente, um homem alto, moreno e inflexível, eclodiu.
— Sergio? — fora a única coisa que ele consegira dizer antes de Sergio segurar duramente em suas mandíbulas e grudar seus lábios nos dele. Levou segundos, que foram verdadeiras eternidades para que tudo parecesse real: os lábios másculos porém macios, a pegada forte em sua pele facial e até mesmo aquele calor conflitante que vinha do corpo do outro. Era tudo diferente e irregular, mas quando a língua de Sergio pediu por espaço, Gerard simplesmente cedeu.
Sergio beijou Gerard, e ele o beijou de volta. Em uma linguagem simplificada, aquilo fora no mínimo, estranho "pacas". Mas muito singular também. Ele ainda não havia notado que Sergio poderia estar interessado em sua pessoa, mas em si, tinha total conciência de que não parava de estudar o comportamento do cunhado desde que o viu pela primeira vez.
Aquilo provavelmente era uma grande merda. Ele não tinha o direito de errar com Miriam desse jeito, e Sergio sabia disso melhor do que ninguém, e mesmo que fosse "puta" excitante beijá-lo, ele nem mesmo estava certo de que curtia esse tipo de aventura.
Ele afastou-se, subitamente envergonhado. — Sergio, por que você fez isso?
Sergio, inexpressivo, tocou com o polegar direito em seus lábios, massageando-os de leve.
— Relaxa, isso não é nenhum crime nem nada. — Sergio disse, traquilo como uma alma inocente. Em seguida deu meia volta e marchou pelo corredor até desaparecer no escuro.
Agora a cabeça de Gerard doía com a lembraça daquela noite. Ele nem mesmo esforçou-se para estar inserido na algazarra da família no coquetel especial que se seguiu. No ato, ele percebeu o olhar de Sergio em sua direção, sempre perspicaz, embora excluso. Seus olhares, naquele momento, estavam cruzados.
Algo remexeu-se em seu estômago. Culpa? Desejo impróprio? Arrependimento? Ele estava totalmente perdido agora, e diferente de qualquer coisa em que já esteve envolvido, ele não conseguia visualizar uma saída. Gerard gostava de Miriam por ela ser quem era: engraçada, extrovertida, espontânea. Era algo justificável. Mas Sergio… ele era grosseiro, marrento, antissocial e totalmente enigmático. Era como um quebra-cabeça bastante complicado de ser resolvido, um daqueles que você só consegue dormir tranquilamente após concluir peça por peça.
Miriam era um livro aberto, aberto até demais. Mas Sergio, ele era instigante.
— Está tudo bem, amor? — Miriam perguntou ao seu lado, visivelmente preocupada.
— Sim, claro. — Ele formulou rapidamente. — Eu, bem, preciso de um pouco de água.
— Eu posso pegar para você, se quiser.
— Não, não é necessário. Eu posso fazer isso sozinho. — Ele selou seus labios com gentileza e levantou-se de seu lugar. — Já volto!
Ele caminhou meio desajeitado para a cozinha, sentindo que todos os olhares estavam sobre si. Quando irrompeu no cômodo afastado, permitiu-se respirar mais abertamente. Ele foi até a geladeira e abriu a porta, encarado tudo o que havia dentro sem saber exatamente o que de fato veio fazer. Que merda de homem havia se tornado?
Apos bebericar o líquido, ele bateu a porta com toda a força que pode reunir, e em seguida viu seu coração quase escapar pela boca ao notar um homem de postura rígida no batente da entrada. Sergio o encarava com um sorriso travesso nos lábios. Aquele mesmo Sergio que meses atrás veio e beijou-lhe, e, desde então começou a habitar em todos os seus pensamentos.
— Meus parabéns, noivo. — Sergio disse, caminhando sorrateiramente até ele.
Piqué levantou as mãos. — Sergio, por favor, afaste-se de mim.
— Você está com medo. — Sergio afirmou, ainda brincando com o sorriso nos lábios. — Que noivo mais frouxo.
Ele tocou-lhe no pescoço e vários arrepios se seguiram pela pele do outro. O olhar dele era algo surreal de ser decifrado: era desejoso e provocante. Quase indecente.
— Sergio, eu vou me casar com sua irmã — alertou o de olhos azuis.
— Shiii! — Sergio pôs o indicador em seus lábios. Em seguida segurou novamente em suas mandíbulas como da outra vez e o direcionou quase rudemente até que a sua bunda se chocou contra a bancada americana. Por nenhum instante seu contato visual foi partido. — Esse seus olhos, eles são muito bonitos. — Sussurrou com sua voz grave e áspera muito próximo dos lábios do outro.
Gerard celeremente desviou seu olhar para a entrada, apanhado pelo medo.
— Não se preocupe, ninguém irá nos ver. — Afirmou Sergio, seguindo o olhar do noivo de sua irmã. — Apenas me deixe provar de seus lábios mais uma vez.
As mãos de Gerard estavam cerradas no abdômen rígido do cunhado. Ele sentia-se acuado pelo medo, pela pressão que Sergio impôs e até mesmo pela sua própria vontade.
— Por que você faz isso comigo? Por quê?
Sergio o beijou com calma no início, fazendo pequenas pausas. — Eu gosto de você. — Piqué apenas ouvia e se deixava levar, rendido. — Gosto dessa boca gostosa, desse seu corpo magro e definido, desse seu jeito amedrontado.
Gerard estava ficando excitado com aqueles sussurros seguidos de beijos superficais e ao mesmo tempo intrusivos. Ele já não estava tentando expelir Sergio, suas mãos o agarravam com urgência e apelo, enquanto a língua do outro acomodava-se dentro de sua boca. Era ótimo sentir aquilo de novo, aquela forma rígida e inclemente que Sergio tinha de explorá-lo com um beijo.
Estava tudo bem naquele momento. Era errado, especialmente por ser o dia de seu noivado, mas seu cunhado tinha uma forma incomum de convencê-lo de que era possível. No entanto, houve um ruído pelo cômodo. Seguido de um movimento. E um arfar de susto.
Quando a conexão foi desfeita, Gerard estava certo de que tudo estava perdido.
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