J-Hope me odeia. Eu apenas queria entender o porquê de toda essa maldade que ele usa para me atingir. Amanheci na cama dele, rodando de um lado para o outro, sem conseguir pregar os olhos, apenas pensando naquele maldito selinho que ele me deu. Quer dizer, não apenas pensando, às vezes eu enterrava meu nariz no travesseiro para sentir o cheirinho cítrico e refrescante típico dele que eu tanto gosto.
Eu pensei muitas vezes em me levantar e ir embora, já que era mais que óbvio que ele havia descoberto sobre a minha mentirinha do desmaio, no entanto, eu não queria sair de dentro desse quarto, não queria ter o azar de dar de cara com ele enquanto eu estivesse saindo – fugindo – do apartamento.
Fiquei muito tentado a sair de lá correndo, escancarar a porta do quarto em que Suga estava dormindo tranquilamente e acordá-lo gritando “POR QUE O SEU AMIGO É UM MONSTRO?” e receberia em troca um par de olhos arregalados do branquelo que logo em seguida diria “porque você mereceu, é um idiota”. Está bem, ele não falaria isso para mim, pelo menos não diretamente, mas essa era a resposta que meu cérebro formulava em uma tentativa falha de explicar o motivo daquele beijinho.
Infinitas dúvidas surgiam uma atrás da outra na minha cabeça de forma desordenada, eu não conseguia organizá-las o suficiente para tentar decifrá-las. A mais recorrente era: “por que eu fui um idiota?”. Um idiota por ter deixado tudo isso acontecer, um idiota por ter deixado essa paixão por ele florescer, um idiota por ter deixado ele brincar comigo, dando um selinho insignificante nos meus lábios desmaiados. Mas a maior dúvida era: J-Hope é esse tipo de pessoa? Que sai beijando qualquer um só para brincar? Ele me beijaria só para me desmascarar? Ele gosta de mim também? Mas por que ele iria me beijar e depois rir da minha cara se ele sente algo por mim? Que corta clima!. Agora eu compreendo o JiMin com a sua paixão unilateral por esse monstro, estou compartilhando do mesmo sofrimento. Eu o entendo por se sentir mal pensando que teria um encontro romântico com ele para, no fim, ter que cozinhar para Deus e o mundo só porque o insensível do J-Hope não foi capaz de recusar diretamente. Agora, pensando no Park... será que Hobi o beijou também?.
Argh! Cansei.
Me levantei da cama, criando toda a coragem que eu podia para, finalmente, sair daquele quarto. O sol já nascia e o céu estava limpo, parecia que seria um lindo domingo de primavera. Eu teria que sair e me recompor para aproveitar o dia que viria. Sem mais pensamentos ruins!
Antes que eu pudesse girar a maçaneta, a porta do quarto se abriu tão rapidamente que quase não tive tempo de me afastar para evitar o choque da madeira contra a minha cara. Foi por pouco.
– O que faz aqui? – Suga perguntou espantado, os olhos arregalados em um rosto inchado e amassado pela noite de sono que ele, ao contrário de mim, teve – Vocês...? – Ele esticou o pescoço, tentando erguer a cabeça para enxergar além de mim, para constatar que Hope não estava lá como a mente suja dele pensou – Cadê o Hope?
Revirei os olhos impaciente.
– Eu vou saber onde está aquele burro idiota? – Respondi mal-humorado – Eu só dormi aqui, ele sumiu – cruzei os braços sobre o peito – e você? Vai entrando assim no quarto dele, sem bater? Ele poderia estar pelado!
– Que nada, Hope não liga se eu vejo ele pelado! – Ele riu e eu lhe dirigi um olhar enojado – Qual é? Somos amigos, quase irmãos! Não precisa ficar com ciúme, Tae!
– Pfffff, ciúme – resmungo desinteressado – óbvio que não!
– É, claro que não – Ele riu e puxou a manga da minha blusa, me arrastando novamente para dentro do quarto – eu vim pegar umas roupas emprestadas. Vou te emprestar algumas também.
– Não precisa, já vou para minha casa – falei, não queria mais nada vindo do J-Hope.
– E você vai sair todo amarrotado? – Ele me analisou dos pés à cabeça e franziu o cenho quando seus olhos pararam na barra da minha camiseta – e o que é isso? Sangue? O que aconteceu ontem depois que eu fui dormir?
Olhei para onde ele olhava e verifiquei que havia algumas gotículas de sangue ali. Com certeza era do machucado no meu dedo, mas a mancha estava quase imperceptível.
– Ah, não é nada, eu só fiz um cortezinho no dedo enquanto secava a louça de ontem – Falei enquanto entrávamos no closet repleto de peças de roupas e pares de sapatos. Era um espaço pequeno, mas ainda assim guardava inúmeras peças e acessórios de marca – para que tanta roupa cara se ele nem usa? Ele nem sai para esbanjar tudo isso aqui! – Soltei em um tom inconformado.
– Ele não liga para essas coisas – Suga respondeu – e você tem razão, Hope nem as usa, ele doa muitas também. Todas essas roupas ele ganha de parentes que fingem em se importar com ele. Às vezes JiWoo dá algumas também, mas ela, ao contrário dos outros parentes, se importa.
Quando ele falou isso me senti mal pelo Hope, queria entender porque ele era afastado da família. Não gostava de pensar que ele era um rico solitário.
– Ele não tem muito contato com a família? – Perguntei, não queria ser intrometido, mas queria saber mais sobre o Hobi.
– Claro que tem! – Suga virou e sorriu sincero para mim – Eu sempre estou aqui com ele e JiWoo sempre manda notícias! Nós somos a família dele e ele a nossa! E acho que agora você também é – sorri, não entendi direito, mas sorri.
– Mas e o pai? Ele disse que ligaria para ele me demitir...
– Hope nem deve ter o número dele mais – Suga suspirou – eu falei pra você que ele estava mentindo quando te ameaçou... Anda, pode escolher a que quiser.
– Mas... – eu iria continuar a conversa sobre o pai do Hope, mas o Min me cortou, se fazendo de desentendido.
– Já disse, não se preocupe, Hope não se importa, escolha a que quiser. Logo ele ganha mais – ele riu, mas eu apenas fiquei com a cara emburrada, enquanto eu procurava por uma roupa bonita. Ele não vai usar mesmo, eu vou aproveitá-las mais do que ele – dormiu mal? Não me diga que ficou pensando em mim a madrugada toda?!
– Atá! Vai sonhando – Ele riu e eu o acompanhei.
Suga começou a se despir ali mesmo, sem se importar com a minha presença. Aish, que cara mais sem vergonha! Comecei a me trocar também, já que ele não se importava comigo, por que eu iria me importar com ele? Suga não veria nada além da minha cueca preta. Eu já estava tirando a calça pelos pés quando a porta foi deslizada subitamente. O susto foi tão grande que eu caí para trás, batendo com bunda não chão.
J-Hope estava de boca aberta, tentando emitir algum som, mas parecia que nada queria sair dali. Sei disso porque estava acontecendo a mesma coisa comigo. A diferença era que ele estava de pé e vestido e eu sentado no chão, peladinho. Que constrangedor! Minha vida não poderia piorar!
– Desculpe – finalmente falou, voltando a fechar a porta rapidamente.
Ouvi um barulho estranho ao meu lado e quando virei para olhar, vi que era Suga gargalhando, arreganhando todos aqueles dentes e gengiva, já estava todo vestido.
– Precisa de ajuda para se vestir, Tae? – Lancei um olhar mortal para ele, que fez com que ele risse ainda mais – vou te dar mais privacidade – falando isso, abriu a porta do closet e saiu.
– Aish, que vergonha! – Pensei alto, voltando a me vestir – de todas as pessoas no mundo, tinha que ser logo ele a me ver todo despencado só de cueca?!
***
– Nossa como meu amiguinho é bonzinho – Eu havia acabado de chegar na cozinha e vi quando Suga falou provocativo, fazendo beicinho para J-Hope, que estava sentado na bancada – foi até comprar nossa comida! Vem, Tae! – Acenou quando me viu parado no batente – Uau, que bad boy!
Eu já estava todo vestido, montei um look completo. Uma jaqueta de couro preta no estilo anos oitenta, ornamentadas de pins de bandas de rock, uma calça escura listrada e sapatos estilo Oxford com solados grossos. Eu realmente me orgulho do meu senso de moda, passo horas lendo blogs desse assunto, só não tinha dinheiro disponível para comprar todas as roupas que eu queria. Foi muita sorte meu autor ter praticamente as mesmas medidas que eu e ter várias peças de roupas à sua disposição e não querer nenhuma delas.
– Bom, já que jantei aqui ontem, dormi e me apropriei das roupas do proprietário, tomar café da manhã aqui também não deve ser muita coisa – os outros dois riram, mas J-Hope não me encarava em nenhum momento.
Me aproximei da bancada em que eles estavam beliscando pedacinhos de algum bolinho frito que eu não saberia dizer do que era feito.
– Você fica muito bem nessas roupas, Tae – YoonGi deu uma cotovelada no Hobi tentando chamar a atenção dele – Agora você já sabe para quem doá-las, Hope.
J-Hope deu um sorriso mínimo, levantando, pela primeira vez, a cabeça para me encarar. Mas dessa vez foi eu quem não consegui fazer contato visual e, antes que nossos olhos se encontrassem, eu os abaixei, olhando para o bolinho que parecia ser muito apetitoso.
– Tem razão, Suga – Hobi respondeu – pode escolher todas que quiser, TaeTae.
– Hum – falei balançando a cabeça, sem muito entusiasmo – pode deixar, vou escolher mesmo.
Depois do nosso pequeno diálogo, e o primeiro depois da noite de ontem, comemos em silêncio. Estava divagando sobre qual parte da fala do Suga J-Hope se referiu dizendo que ele tinha razão, se era sobre eu ficar bem nas roupas ou sobre agora ele ter alguém para dá-las. Gosto mais da primeira opção, mas minha experiência com Hope me dizia que era a segunda.
– O que aconteceu com vocês dois? – YoonGi quebrou o silêncio – brigaram? – Perguntou olhando para J-Hope e depois para mim.
– Não aconteceu nada – respondi calmamente – absolutamente NADA – dessa vez, olhei para Hope e disse com uma entonação irritada.
Vi ele trancar o maxilar e se voltar para mim.
– Exatamente! – Falou – Nada, nada mesmo, nunca nada significou nada como nada está significando nesse momento.
– Que? – Indagou Suga com uma cara enorme de interrogação – Tenho certeza que brigaram. O que tá acontecendo com vocês dois?
– NADA! – Hope e eu gritamos em uníssono.
– Parece que voltamos ao início... tsc-tsc – YoonGi balançou a cabeça negativamente, fingindo descontentamento – só por que ele te viu seminu, Tae? Eu também vi e voc...
– YAAAA – gritei – cala a boca! Não tem nada a ver com isso! – Minhas bochechas esquentaram automaticamente. Justo agora que eu já estava esquecendo daquela situação embaraçosa, Suga fez questão de me lembrar. Às vezes fico me perguntando se ele é meu amigo também ou se está mancomunado com J-Hope para acabar com a minha vida.
– Aigoo, tudo bem, se não quer falar não fala... – Suga sorriu maldoso – depois o Hobi, meu amiguinho, me fala – provocou.
Cerrei os olhos, pronto para atacar.
– Primeiro, pare de me irritar! – Falei exaltado e depois me direcionei para o outro, que parecia estar sonhando acordado, apoiado no cotovelo, olhando para mim – Segundo, pare de ser uma banana, Hope, e nos defenda, obrigado, de nada. Terceiro – tomei ar para falar, porque havia soltado tudo aquilo de uma vez só. Voltei para o Suga novamente – só eu chamo ele de Hobi! Nem se atreva!
– Você está muito agressivo hoje, Tae! – Suga riu – Sobrou até para o Hope que está quietinho.
– Você está vendo essa olheira aqui? – Apontei para a região abaixo do meu olho esquerdo – E essa? – Disse apontando dessa vez para a direita – Essas amiguinhas aqui surgiram porque não consegui dormir a madrugada inteira e sabe por que? – Perguntei desafiando-o – porque eu estou com raiva desse seu amiguinho aí – apontei Hope com a cabeça – Ele me odeia e fez algo que me magoou! Talvez seja esse o motivo do meu mal humor!
Me arrependi de falar daquela maneira sobre ele, porque quando olhei para encarar J-Hope, ele me olhava atônito, seu rosto não expressava nada além de surpresa, porém ele piscava várias vezes, parecia evitar... lágrimas?... Não, acho que não. Impossível!
Impossível!
– Eu... – Hope começou, falando baixo – me desculpe... me desculpe, por favor – ele apertou os lábios um contra o outro em uma linha fina antes voltar a falar – eu pensei que... digo, não pensei que fosse te magoar, sinto muito – ele se levantou do banco que estava sentado – não vai acontecer novamente – disse por fim e saiu apressado da cozinha, deixando um Suga com uma cara interrogativa e um TaeHyung completamente desesperado por dentro.
“Não vai acontecer novamente”, ele disse...
– Sabe... – ouvi YoonGi falar, mas a voz dele soava distante de mim, mesmo que ele estivesse exatamente na minha frente – vocês são dois bunda-moles...
Suspirei.
– Você é tão sábio, Suga... sempre tem razão em tudo o que diz – falei olhando para ele – Tem razão, sou um idiota.
– Eu nunca disse isso – ele franziu a testa pensativo – disse?
– Não, mas o YoonGi da minha cabeça disse – Desencostei da bancada e me afastei em direção à porta, pronto para sair, mas não sem antes ver a expressão confusa no rosto do outro. Pobrezinho, deve estar achando que sou louco. No entanto, a voz da razão na minha mente, aquela que tem a mesma voz do Suga, acha a mesma coisa.
Estou enlouquecendo e é tudo por sua causa, Hobi... porque eu realmente gosto de você. Muito.
***
J-Hope
Para J-Hope, na noite anterior, tudo levava a crer que TaeHyung queria o beijo tanto quanto ele. As carícias, os sorrisos que trocavam, os olhos fechados e a boca entreaberta, o desmaio – que HoSeok já desconfiava há muito tempo ser fingido –, as bochechas coradas e os xingamentos que Hope recebeu do mais novo pareciam ser a confirmação que precisava. No entanto, o medo que sentia em ser rejeitado foi o que se concretizou. TaeHyung não queria o beijo. Hope não saberia então explicar o comportamento estranho do garoto na noite de ontem, mas o comportamento dele hoje de manhã demonstrou tudo. J-Hope enxergou o desespero do Kim nos olhos dele quando, sem querer, o viu só de cueca, sendo que antes estava confortável na presença de Suga.
Tudo que menos queria era que TaeHyung não se sentisse mais à vontade em sua presença ou que não fossem mais amigos.
Agora, o maior temor de HoSeok era TaeHyung sentir repulsa por ele. Só de pensar isso, sentia vontade de chorar.
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