Quando Morgan Stark se deu conta, havia passado em altura o Empire State Building, ou seja, estava há mais de 350 metros do solo e não parava de subir. Sentia um impulso muito grande a empurrando pelas botas do traje, os jatos propulsores estavam a toda, mas de alguma forma havia controle para manter o corpo ereto, sem perder equilíbrio. Mesmo assim a sensação era de que estava num elevador sem estar num elevador. Nada a segurava a não ser o vento, e quando olhava para baixo e enxergava as ruas movimentadas de Nova York diminuindo aos seus pés, uma tenebrosa vertigem assolava sua cabeça enquanto AC/DC ainda tocava.
--- SEXTA-FEEEEEEEEEEEIRA?!
--- Os propulsores estão em 5% de seu potencial, deseja aumentar, senhorita?
--- Eu quero descer!
--- Sinto muito, senhorita. Parece que o programa da máscara hackeou os meus comandos principais. Mas ainda posso realizar leituras e análises de perigo. Devemos terminar os testes antes de descermos, porém aconselho a simulá-los.
--- Parece uma ótima ideia. Que teste em que estamos no momento?
--- Verificação de altitude máxima.
--- SIMULE ISSO! E PARE ESSA MÚSICA.
De repente Morgan cessou a subida com um solavanco e passou a flutuar no céu com os propulsores das pernas e braços ainda ativos, mas em menor potência. As nuvens e alguns pássaros lhe fazendo companhia. Tudo aquilo parecia surreal demais. No visor do capacete, Sexta-Feira começou a produzir uma simulação ligeira sobre a altitude máxima da armadura. O HUD informava que a capacidade de limite de altura estava maior do que um caça americano.
--- 50.000 mil pés, senhorita.
--- Nada mal, mas prefiro estar em solo.
--- O próximo teste envolve a velocidade e precisamos estar no ar para melhor leitura de simulação. Não se preocupe, a energia do reator está em pleno funcionamento, não há perigo aqui. Deseja que eu comece a simulação de velocidade?
Morgan fitou a cidade com mais calma. Sabia que podia se arrepender daquela decisão, mas a altura podia a incomodar, já a velocidade, isso nunca.
--- Como será feito essa simulação?
--- Vou simular em quanto tempo atravessamos a ilha de Manhattan de ponta a ponta.
--- Acho... acho que podemos fazer isso.
--- Tem certeza, senhorita?
--- Sim.
--- Tudo bem. Vou auxiliar no controle computadorizado, então não tenha medo de realizar manobras, essa armadura foi feita para ser a mais ágil de todas. Em todo caso, ainda não lhe darei o controle total.
--- Outra ótima ideia. Apenas comece.
Pôde sentir a energia dos propulsores serem carregados nas botas do traje, em seguida tombou o tronco para frente em um leve arco, e manteve os braços colados junto ao corpo. Exatamente como um caça de última geração, Morgan cortou os céus em alta velocidade, manobrando para baixo quando o HUD avisou que seria mais seguro por conta do espaço aéreo. Ela se viu nos vidros espelhados das janelas dos prédios em que passava por perto, sentindo-se tão livre e rápida como jamais se sentiu numa pista de atletismo. Por mais que estivesse longe do chão, seus desejos mais profundos para ir além se afloraram.
--- Mais rápido...
--- Entrando em velocidade supersônica, senhorita --- informou Sexta-Feira.
Seus olhos mal puderam acompanhar a mudança repentina de velocidade. Os arranha-céus ao redor se tornaram borrões acinzentados, a adrenalina preencheu seu corpo como o vento uivante que vinha de encontro, e em segundos havia atravessado a ilha por completo, cessando o voo e o teste com esse professo finalizado.
--- Velocity 1 acaba de se tornar a armadura mais veloz já criada por 13,2 segundos de diferença. Seu ficaria orgulhoso, senhorita.
--- Uau. Acho que... nossa...
--- Senhorita, estou obtendo batimentos cardíacos acelerados. Devo me preocupar?
Morgan sorriu. O que era aquela sensação? Sentia o coração palpitar a ponto de querer sair do peito, seu corpo todo levemente trêmulo pelo feito que acabara de realizar. Voou. Simplesmente voou pela cidade de Nova York sem estar num avião ou algo parecido. Nunca pensou que fosse possível. Não para ela.
--- Senhorita?
--- Não se preocupe, estou ótima. Só preciso me sentar um pouco.
Sexta-Feira ajudou no controle de voo, e Morgan pousou sobre uma cobertura solitária de um prédio.
--- Ok. O que devemos fazer agora?
“Uma escolha.” As palavras holográficas surgiram de novo. Morgan entendeu onde queriam chegar, fosse quem fosse o autor delas, mas apesar de estar lhe agradando voar, um sonho a frente de qualquer habilidade humana, não via mais nada além disso para si. O que devia ser? Uma heroína? Não, isso nunca esteve em seus planos.
--- Não sou o meu pai.
“Seja você mesma. Faça sua escolha.”
O mundo havia mudado depois de Thanos. Vigilantes antigos se foram, vigilantes novos surgiram. Os Novos Vingadores possuíam um novo líder com novos membros. Haviam Mutantes espalhados entre as pessoas normais, e até mesmo uma escola que ajudava esses seres especiais a se encontrarem em meio a uma sociedade preconceituosa. Por mais que os crimes banais tivessem diminuindo e vilões poderosos derrotados com o passar do tempo, as coisas não eram nada fáceis para os mascarados bom samaritanos. Morgan entendia o sacrifício, sempre entendeu. Mesmo assim, estava longe de ser uma segunda Tony Stark. Não era disso que precisavam. Mas seria disso que ela precisava?
--- Por que meu pai escolheu ser um super-herói? Por que alguém escolhe ser isso?
“Não há resposta para essa questão.”
--- Imaginei que não. Acho que não quero mais brincar disso. Seja lá qual é o segredo por trás dessa máscara, pode ficar com ele, papai. Essa é a minha es...
Algo começou a piscar no HUD do visor. Um ponto vermelho que se locomovia rapidamente pelas regiões de Soho.
--- O que é isso, Sexta-Feira?
--- Acho que é a solução encontrada pela máscara para sua questão anterior. Devemos averiguar.
A garota suspirou.
--- Leve-nos até lá.
Com rápida impulsão, velocity 1 disparou novamente pelas construções da cidade, levando algum interesse das pessoas que caminhavam pelas calçadas lá embaixo. A última vez que viram uma armadura desse tipo voando por aí foi com Máquina de Combate, mas aquilo era muito menor e esguio para ser comparado a monstruosidade bélica do Vingador conhecido como James Rhodes.
Para surpresa de Morgan, o sinal que o HUD indicava se localizava no alto de um edifício. E, para ainda maior surpresa, indicava ser uma pessoa, mas não qualquer pessoa. Sentado na beira da cobertura com as pernas balançando para fora do limite enquanto devorava um pedaço de pizza da maneira mais despreocupada possível, Homem-Aranha observava a cidade com a máscara levantada até metade do rosto.
Como o pouso do traje não era nada suave, o aracnídeo tomou um susto tão grande que deixou o pedaço de pizza cair. Com uma rápida jogada de mão, lançou suas teias para grudar a comida na vidraça do apartamento debaixo, o que deixou um cachorro salivando de vontade na parte de dentro.
Encarou Morgan com aqueles enormes visores brancos depois de abaixar a máscara por completo.
--- Seja quem for, está me devendo uma pizza.
--- Desculpe-me pelo susto... na verdade... eu não esperava que fosse tão facilmente surpreendido.
--- Que? Não, eu não... Digamos que sei quando o perigo se aproxima, posso sentir. Então quando não é nada, eu... e por favor, estava no meu horário de lanche da tarde.
--- Não sente nenhum perigo vindo de mim?
--- Nenhum pouco. Espere... quem é você mesmo? Isso é o que acho que é? Uma Armadura de Ferro? Isso é tecnologia Stark? Pepper?
--- Conhece minha mãe?
--- Sua... mãe?
--- Ah, claro, como não conheceria, né? Desculpe-me de novo. Não tô acostumada com esse tipo de conversa.
Morgan levantou a máscara para revelar o rosto. Ela não pôde ver a expressão atônita e confusa de Peter por causa da máscara, mas o jovem não pôde esconder a falta de palavras que aquela revelação o causou.
O silêncio foi meio embaraçoso.
--- Não me conhece, né? Eu sou...
--- Morgan... Morgan Stark, sim... eu conheço.
De testa franzida, a garota sentia uma familiaridade estranha vinda do Amigão da Vizinhança, um dos muitos nomes de como era conhecido aquele vigilante. Claro, o que não fazia sentido, já que nunca antes conversaram. Ele era um dos mais experientes super-heróis da cidade, lutou na grande batalha contra Thanos, e depois disso fez parte dos Vingadores. A sociedade amava e odiava aquela figura que se movia como uma aranha humana, se pendurando com teias pelos prédios dos arredores de Manhattan. Muitos o chamavam de oportunista, outros de herói do povo. Morgan tinha ciência que o pai fora um grande mentor para o mesmo, sua mãe sempre falava bem de seu caráter e independência, por isso o respeitava como merecia, e jamais acreditou nas mentiras criadas em grande parte pela mídia local, tomando-os como os oportunistas da questão, e não o Cabeça de Teia. Ainda assim, não o conhecia muito bem. Pelo menos pensava que não.
--- Por que está vestindo isso? --- ele perguntou.
--- É uma longa história. Antes de eu explicar, quero lhe fazer uma pergunta.
--- Uma pergunta?
--- Algum problema?
--- Não, claro que não. Vá em frente.
--- Vai parecer um pouco estranho e profundo, acabei de pensar nisso, mas... Por que você quis ser um vigilante? Um herói... sabe... porque quis essa vida? Enfrentar o crime, vilões, perigos diários. Por que você ajuda as pessoas, salva quem nem conhece? Por que... Por que quis ser o Homem-Aranha?
Com certeza esse não era o final de tarde que Peter esperava ter. Morgan Stark em uma armadura lhe fazendo uma pergunta desse tipo? Uma pergunta que Tony Stark já havia lhe feito há muito tempo. Mas isso foi há muito tempo mesmo. O mundo mudou. Aquele jovem Peter cresceu e mudou junto. Mas será que o Homem-Aranha também havia mudado?
--- Eu...
Antes que pudesse responder, o Teioso recebeu uma comunicação em seu ponto eletrônico interno, uma linha direta com os Vingadores. De lá, obteve orientações para seguir ao leste da cidade, onde se localizava a central de geração de energia elétrica.
--- Eu queria mesmo te responder, mini-latinha, mas o dever me chama! --- disse e lançou uma teia, mergulhando da cobertura com uma acrobacia aracnídea. --- Se quer um conselho, volte para a escola!
Morgan tentou argumentar, mas nada pôde fazer para impedir ser deixada para trás. Ativando manualmente os propulsores das mãos e pés, a garota planou para fora do edifício, tentando seguir o Aranha.
--- Senhorita?
--- Vamos segui-lo.
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