Depois de passar a tarde inteira andando, finalmente achamos uma biblioteca onde passaríamos a noite. Vou para minha cama improvisada ao lado de Glenn que tinha Maggie em seu outro lado.
- Hey. - eu digo.
- Oi.
- Maggie está acordada? - pergunto me ajeitando ao seu lado.
- Não, dormiu faz um tempo.
O silencio invade o ambiente e uma pergunta ocupa minha mente.
- Por que quis vir com eles?
Glenn suspira e pensa por alguns segundos.
- Rick estava pronto pra briga, e Abraham também. Os grupos iam acabar brigando e você já sabe qual ganharia. Só escolhi não ver mais ninguém morrer.
- Acha que foi a escolha certa?
- Eu não sei.
- Será que vamos vê-los de novo?
- Sim, nós vamos. Talvez amanhã de manhã eles já estejam por perto.
Assenti e ficamos os dois em silêncio até eu lembrar da nossa tarde cheia de pitis. Dou risada.
- Sabe, eu gosto do Abraham, apesar dele estar nos levando pra morte. - digo.
- Não vamos morrer. - Glenn não mudara nisso, ele continuava o que sempre foi, esperançoso.
- Você não pode falar isso, ninguém está a salvo. Pelo que eu sei o resto do grupo pode estar morto agora.
- Ele não estão mortos, sobrevivemos a coisas piores.
- Se negar a algo não é bom mas não te culpo, também me nego a aceitar algumas coisas.
- Aceitar o que? - pergunta.
- Que um dia vamos poder ser felizes de novo. - assumi.
- Nós vamos conseguir. - insistiu. - Vamos achar um lugar, um lugar que acreditamos, um lugar seguro.
- Esse lugar não existe. Não seria mais fácil se estivéssemos mortos? Não teríamos que sentir fome, não teríamos que sentir frio, não teríamos que sentir dor ou andar até cair de joelhos.
- Sim, seria mais fácil, mas seria desistir. Temos que ter um motivo pra viver, o nosso motivo é acreditar em um mundo que seja mais que só a morte.
- O meu motivo não é esse.
- E qual é? - pergunta.
- Você. Você merece a vida.
Ele ficou em silêncio, sem esboçar nenhuma reação por alguns segundos. Até que veio até a mim e e me deu um beijo na testa.
- É melhor irmos dormir, temos um longo dia amanhã. - diz ele. - Boa noite Nina.
- Boa noite Glenn.
[...]
- O que vamos fazer? - pergunto.
- Vamos procurar um veículo, e seguir o mais rápido possível até Washington.
- Ei, aquilo pode servir. - aponta Rosita pela janela.
Todos nos viramos, vendo um enorme caminhão que identifiquei ser de bombeiro pela cor vermelho brilhante. Ouço Abraham comemorar.
- Vamos! - diz ele.
Desço as escadas que levavam para o estacionamento abandonado. Um arrepio percorreu minha espinha. Abraham se senta ao banco do motorista enquanto esperávamos. O caminhão arranca, andando somente dois metros até parar novamente.
- Que ótimo. - reclamo.
- Merda! - berra Abraham.
Ele tenta novamente ligar o motor.
Um pneu passa ao meu lado caindo perto de minhas pernas, estranho.
- Nina! - grita Maggie.
Me viro rapidamente e vejo zumbis andando em minha direção, tiro minha faca do bolso e antes que pudesse o acertar um deles cai por cima de mim, me levando para o chão. Levo uma de minhas mãos até sua cabeça tentando manter seus dentes afastados de mim, foi quando ele para.
Suspiro e o empurro pro lado vendo Maggie me estender a mão. Me levanto e continuamos a mata-los até que um jato de água extermina todos rapidamente.
- Eugene! - diz Tara um pouco desacreditada.
- Eu tô toda molhada. - reclamo.
- Acho que já sei o problema. - começa Abraham. - Vou checar a saída de ar.
Assentimos. Depois de desentupir a saída de ar e bebermos um pouco de água entramos todos no caminhão. Me sentei no chão, encostada nos bancos da frente e respirei fundo. Washington lá vou eu.
A viagem foi um tédio total. Eugene falava sobre átomos e coisas do tipo, Abraham fazia piadas indecentes, e meu estômago se revirava a cada curva. Fecho meus olhos e a primeira coisa que me vem à cabeça é Carl. Não sabia se ele estava bem mas com todas as minhas forças eu queria que ele estivesse, queria poder abraçá-lo, não posso.
Não sabia o que estava acontecendo comigo, eu me perdia completamente perto dele, não sabia como agir. Eu me importava demais com ele, isso não era normal, não podia ser normal, não pra mim. Soquei o chão com força, merda.
- Está tudo bem? - perguntou Glenn.
- Só estou passando um pouco mal, você sabe.
- Se quiser podemos parar. - sugere ele e Abraham balança a cabeça negando.
- Vou vomitar aqui dentro, e a viagem não vai ser agradável com cheiro de bile.
Ele para o ônibus.
- Cinco minutos.
Assinto e todos descemos do ônibus. Corro até a parte com grama e sinto meu estômago revirar, vomito uma espuma branca.
- Está melhor? - pergunta Maggie.
- É, eu acho que sim.
Ela sorri.
- Ah mas o que é isso? - reclama Glenn com a mão no nariz.
Vou até ele e logo entendo o que quer dizer, um cheiro angustiante fazia meu nariz arder me estômago revirar se possível ainda mais. Sigo pela rodovia com a mão em meu nariz, eles me seguem. Andamos por algum tempo até que vi a pior visão até hoje, a visão do quanto realmente estávamos ferrados. Um mar de zumbis cobria a entrada pra Washington.
Olho para os lados vendo todos estáticos, talvez querendo dar o fora dali o mais rápido possível. Dou meia volta e Glenn me acompanha.
- Vamos. - diz ele - A gente tem que voltar.
Todos vem em nossa direção menos Abraham.
- Esperem.
- Temos que voltar. - diz Maggie.
- Não podemos, não podem nos ouvir daqui. - insiste.
- Deve existir um desvio. - sugere Glenn.
- Não, foram vários desvios de Houston a Geórgia. Não vamos fazer de novo.
- A GENTE NÃO VAI ATRAVESSAR, ISSO NÃO VAI ACONTECER! - grito.
- Não vamos voltar. - fala Abraham.
- Não estamos falando em voltar, mas quem sabe ir alguns quilômetros para o sul. - diz Glenn.
- Não.
- A gente já parou por um filtro de ar cheio de entranhas. - diz Eugene - Vai acontecer de novo.
- Temos a água.
- O tanque secou.
- Vamos acelerar.
- Vamos bater neles, eles vão agarrar nas rodas e vamos parar! - fala Glenn.
- Não precisamos ir reto.
- Mas essa é uma estrada reta. - falo.
- Podemos atravessar, eu sei! - ruge Abraham.
Um silêncio mortal se instala. Eu não iria atravessar aquilo, nem que tivesse que voltar a pé. Não vou me colocar em risco de novo, não vou colocar meu irmão em risco de novo.
Abraham simplesmente agarra Eugene pelo braço e o arrasta tentando leva-lo para o caminhão. Todos vão até ele e tentam o impedir, me permaneço longe. Ele tinha força de vontade, tinha que admitir. Com uma só mão conseguiu afastar a todos.
- Não sou cientista. - grita Eugene. - Não sou cientista. Eu menti.
O sangue pulsou em meu cérebro e por um segundo podia jurar que ouvi meu coração bater.
- Não sei como curar isso. - continuou.
- Quer dizer que abandonamos nosso grupo pra nada? - falei entredentes. - Eu quase morri por isso, meu irmão quase morreu.
- Eu só sei coisas.
- Você só sabe... coisas? - pergunta Glenn ainda desacreditado.
- Sei que tenho que chegar a Washington.
- Por que? - pergunto.
- Acredito que aquele lugar tem melhores chances de sobrevivência, eu quero sobreviver. Só enganei algumas pessoas pra isso.
- Pessoas morreram para te trazer aqui. - diz Rosita.
- Eu sei. Rex, Roger, Josefine, Bob...
Eugene se vira para Abraham e continua:
- Eu sou mais inteligente que você então...
Em um centésimo de segundo um soco é dado na cara de Eugene, seguido por outro que o faz cair com a cara no chão. Permaneço em pé enquanto Abraham se afastava e Maggie, Rosita e Tara tentavam acordar Eugene. Eu queria mais que ele explodisse.
Ando em direção a Abraham.
- Nina, é melhor não. - me alerta Glenn.
- Sabe, eu sempre odiei esse seu modo super-protetor.
- Ele precisa pensar.
- Só vou ajudar ele. - disse e continuei andando parando bem ao lado de Abraham.
- Todos já perdemos coisas, não imagino o que perdeu para trazê-lo aqui. Mas tem que saber que agora não é mais só você, você juntou um grupo. - me agacho ao seu lado mas não encaro o mesmo - Pessoas que queriam ajudar, pessoas que viraram sua família, seus amigos e se importam com você. Sem contar que precisamos de um líder, eu amo meu irmão mas ele não nasceu pra isso. Então por favor, não nos deixe agora. Precisamos de você, precisamos que mesmo que tenha perdido tudo continue tendo esperança, não podemos desistir agora. Estamos em guerra, desistir seria perder. - cito o que ele repetiu milhares de vezes desde que o vi. - Não podemos perder.
Continuo parada ao seu lado esperando alguma reação mas, nada. Suspiro e me levanto indo até Maggie, Tara, Rosita e Glenn.
- Ele te ouviu? - perguntou Glenn.
- Ouvir ele ouviu, mas não se mexeu. Ele está em choque por causa desse infeliz.
- Ele ainda não acordou - diz Maggie, ela parecia preocupada.
- Por mim deixaríamos ele aí. Quem sabe seria devorado e pagasse um terço da vida de alguém que morreu pra protegê-lo.
- Nina. - me repreende Glenn.
- Nina uma ova. Ele não merece a nossa ajuda, se vocês vão ser idiotas e ajuda-lo tudo bem mas eu não movo um dedo por ele.
Tara da uma risada desacreditada e meu irmão muda de assunto.
- Precisamos de mais água. - diz ele.
- Tem um riacho aqui perto. - fala Rosita.
- Podem ir, eu fico aqui com ele. - sugere Maggie.
- Vou ficar aqui também. - digo.
- Sério?
- É, vou ficar de olho pra que Maggie não surte e mate Abraham. Sabe como é, você não é um líder nato. - brinco e ele sorri.
- Tome cuidado.
- Eu não tenho 10 anos! - reclamo.
- Eu sei, mas continua sendo minha irmã mais nova.
Bufo. Ele tem que parar de se achar o bonzão.
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