Além dos pesadelos, eu também comecei a ter crises de pânico.
A minha primeira crise forte foi assustadora tanto pra mim mesmo, como para os dois rapazes que moram comigo.
Já tinha se passado um mês que eu estava na casa de Ravi e eu já estava praticamente recuperado fisicamente, só sentia algumas dores nas costelas de vez em quando.
Eu e Hongbin passamos a fazer as tarefas de casa pra ajudar Ravi que mal tinha tempo pra nada desde que viemos pra sua casa.
Era um feriado e Ravi estava em casa assistindo TV. Nós estávamos cozinhando e Hongbin cortou o dedo com a faca quando preparava a carne. Eu corri pra ajuda-lo. O corte foi fundo e ao ver o seu sangue escorrendo eu me senti estranho, veio repentinamente à minha cabeça a lembrança do dia em que Leo me torturou pela primeira vez e minha visão começou a escurecer.
Hongbin percebeu que eu estava prestes a desmaiar e segurou firme em meus braços pra não me deixar cair, mas no momento em que ele fez isso um pavor tomou conta de mim e eu comecei a gritar pra ele me soltar.
Eu não sei como explicar. Sentir que alguém prendia meus braços fez despertar em mim um medo irracional. De repente era como se eu estivesse revivendo na minha cabeça toda aquela tortura, eu sentia dores terríveis pelo corpo exatamente como naquele dia e não conseguia fazer aquilo parar. Eu gritava desesperado, queria que a dor fosse embora, queria parar de sentir medo, mas minha cabeça gritava que eu tinha que fugir, que eu não devia deixar ninguém me tocar. Eu olhava ao meu redor e enxergava a minha antiga casa, tinha medo de ver Leo aparecer pra me pegar. Meu estômago revirava e eu não conseguia conter o desespero.
Me encolhi no canto da cozinha chorando compulsivamente e senti alguém me abraçar firme. Tentei me livrar dos braços que me rodeavam e gritei alto, mas fui abraçado com mais força.
-Não, por favor... Me solta... Não me machuca...
Minha cabeça doía e tudo parecia rodar.
-Calma Hakyeon. Sou eu.
Eu sabia que era Ravi que me segurava, mas algo me dizia que ele queria me machucar, que eu não devia deixar ele me tocar. Sentia meu corpo inteiro tremer e o medo me dominava. Começo a bater em seu peito com os punhos fechados.
–ME DEIXA EM PAZ.
-Está tudo bem, ele não está mais aqui. Ele nunca mais vai te machucar. Eu estou com você. Vai ficar tudo bem.
Ele falava calmo sem me soltar, quando eu parei de tentar me livrar de seus braços ele aliviou um pouco o aperto e passou a acariciar meu cabelo com uma das mãos.
-N-Não... Isso dói... Por quê?... –Eu não conseguia dizer o que estava sentindo, só conseguia gritar coisas sem sentido. Levei as mãos à cabeça e puxei meus próprios cabelos com força. Minha mente estava confusa e eu sentia meu corpo doer mesmo sem estar machucado. Eu queria que isso parasse.
-Eu estou aqui, não vou deixar ninguém te machucar. Está tudo bem, calma. -Sua voz me transmitia tranquilidade e segurança e a sensação de pânico começou a diminuir, eu parei de gritar e encostei a cabeça em seu peito.
-Olhe pra mim. –Ele se afasta um pouco segurando meus ombros. Com certo esforço eu levantei a cabeça e olhei em seus olhos, ele seca algumas lágrimas em meu rosto com as mãos depois segura firme as minhas mãos entre as suas. –Respire comigo... Inspire fundo pelo nariz e solte o ar pela boca. Isso mesmo... Junto comigo, mais uma vez... Muito bem...
Fui acompanhando a sua respiração por alguns minutos e aos poucos comecei a me acalmar.
-Você está seguro agora Hakyeon. Eu vou te proteger. - Ele se sentou no chão e encostou-se à parede pra que eu pudesse me apoiar em seu peito. –Continue respirando fundo.
Eu olhei em volta e reparei que tudo tinha voltado ao normal. Vi Hongbin parado na porta da cozinha. Parecia um pouco assustado, mas ao mesmo tempo estava morrendo de ciúmes pela forma que Ravi me tratava.
Depois de um tempo eu me acalmo e minha respiração volta ao normal.
-Vamos pro quarto? Você precisa descansar. –Ravi fala ainda calmo, eu apenas concordo e me deixo ser levado. Ele me carrega até a cama e fica segurando minha mão até eu dormir.
Apesar de todo o tratamento psiquiátrico e o auxílio de remédios, às vezes eu não consigo me controlar e machuco a mim mesmo. Eu tenho pesadelos quase todas as noites e acordo assustado, tremendo.
Eu me sinto culpado por perceber que Ravi não dorme direito por minha causa. Ele sempre acorda com meus gritos, corre pro quarto e fica conversando comigo, segurando a minha mão até eu cair no sono novamente.
Eu tinha muito medo de sair de casa, não saía sozinho de jeito nenhum. Da única vez que saí sozinho com Hongbin tive uma crise de pânico no meio do mercado e ele não sabia o que fazer. Ravi teve que sair do trabalho pra nos buscar.
Sempre que eu tinha uma crise e Ravi não estava por perto eu passava horas chorando até me acalmar, mesmo Hongbin tentando me ajudar a respirar eu não me sentia seguro com ele.
Percebi que essa situação toda abalava a relação deles. Mas eu não fazia nada de propósito, não estava fazendo drama ou cena de coitadinho. Eu simplesmente não conseguia me controlar, mas aos olhos de Hongbin eu estava tentando roubar seu namorado.
Eu quero me recuperar rápido e parar de ser um peso pra eles, principalmente pra parar de atrapalhar o relacionamento dos dois. Mas uma parte de mim não quer seguir em frente.
Um dia eu estava me sentindo muito mal. Tinha me esquecido de tomar os remédios no dia anterior.
Saindo do banho eu paro pra me olhar no espelho. Vejo as cicatrizes em meu corpo e começo a sentir o estômago embrulhar. Eu olho cada marca me lembrando da dor que eu senti em cada sessão de tortura que Leo me fez passar.
Eu começo a sentir uma raiva incontrolável, raiva inclusive de mim mesmo por ser um fraco, por ter deixado ele fazer tudo aquilo comigo. Eu não quero mais ter que me encarar no espelho. Eu não quero mais ter que conviver com essa dor.
Dou um soco quebrando o espelho. Pego um dos cacos de vidro e golpeio meu próprio pulso com violência, provocando um corte profundo. Mas assim que vejo o sangue escorrendo entro em desespero. Eu não suporto ver sangue.
Eu começo a gritar, de dor e de medo. Ouço alguém bater na porta, mas não consigo entender o que estão dizendo. Minha cabeça está cheia de vozes e imagens confusas.
A porta é aberta e Ravi corre em minha direção me levantando do chão, eu estou sem roupas e quando sinto ele me tocar, algo ruim desperta dentro de mim. Eu ainda estou com o pedaço de vidro na mão e tento golpeá-lo gritando.
-TIRE AS MÃOS DE MIM.
Ele se assusta, mas consegue se afastar a tempo. Segura meu braço, mas eu continuo tentando atingi-lo e acabo fazendo um corte em seu rosto.
De repente sou jogado com violência contra o chão e vejo Hongbin subir em cima de mim. Ele dá um forte soco em meu rosto e eu sinto tudo rodar ao meu redor.
As vozes ainda ecoam pela minha cabeça, mas consigo ouvir os dois gritando.
-Não precisa bater nele. Saia daqui.
-Ele tentou matar você.
-Ele não sabe o que está fazendo. Vá ligar pra ambulância.
Ouço a porta bater.
Ravi me ajuda a sentar no chão e enrola uma toalha pressionando o corte em meu pulso.
Eu olho pro seu rosto e vejo que ele está com um ferimento do lado esquerdo desde a metade da bochecha até a ponta do queixo. O corte sangrava.
-D-Desculpa... Desculpa... -Eu choro sem controle.
-Está tudo bem, não foi nada grave.
-Eu não queria... Te machucar... Desculpa... –É cada vez mais difícil de controlar a respiração. Sinto falta de ar.
-Vai ficar tudo bem. Olha pra mim. Respire comigo...
Depois de algum tempo a ambulância chega e sou levado ao hospital. Fico internado em observação por dois dias.
Quando volto pra casa sinto uma tensão por parte dos dois rapazes. Talvez eles estivessem com medo que em mais um surto eu pudesse tentar feri-los novamente.
Na verdade eu também sentia esse medo.
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