- Acho que você me precisa me contar alguma coisa, não é? – Julieta disse com uma fúria que o fez estremecer.
Aurélio se virou de costas, cruzando os braços de forma defensiva. Impaciente, ela se adiantou até ele e o fez encará-la. Ele estremeceu diante daquele olhar furioso. E, dolorosamente, decepcionado.
- Foi você? – ela insistiu.
Com um suspiro, Aurélio deu de ombros.
- Eu não consegui parar de pensar em tudo o que você me contou – ele confessou, culpado. – Você não pode me julgar por...
- Por agir como um selvagem? – ela perguntou.
- Não coloque as coisas dessa forma.
- De que forma devo colocar?
- Eu só...
- Você foi completamente irresponsável – Julieta exclamou, antes que ele pudesse terminar a frase. – Você enlouqueceu, Aurélio? Que atitude mais... – Ela parou, balançando a cabeça. – Mais selvagem, mais vil.
- Vil foi tudo o que ele fez com você, Julieta – Aurélio bufou. – Ele mereceu. E eu fui muito generoso por deixá-lo vivo.
Horrorizada, Julieta tapou a boca com a mão.
- Você não seria capaz...
- Eu não sei – Aurélio disse, sinceramente.
- Oh, por Deus, Aurélio!
Ele tentou puxá-la para perto, mas Julieta se desvencilhou de seus braços.
- Você está exagerando – Aurélio tentou remediar.
- Exagerando? – Julieta perguntou, ferida. – Você agiu... Agiu como ele.
Atônito, Aurélio ficou em silêncio. Sentiu-se tão ofendido por aquele comentário que se virou, incapaz de continuar encarando-a.
Julieta, rapidamente, se arrependeu do que disse. Havia ficado tão nervosa com aquela atitude absurda que acabou se exaltando, talvez mais do que devia.
Receosa, se aproximou e o abraçou pelas costas. Sentiu-o rígido entre seus braços e fechou os olhos.
- Eu não quis dizer isso – ela murmurou.
Aurélio continuou em silêncio. Sua garganta ardia e ele permaneceu imóvel.
- Aurélio...
Lentamente, ele se virou. Julieta viu a mágoa que preenchia aqueles olhos azuis e se afastou, culpada.
- Sei que errei – ele disse. – Mas não me arrependo. Não porque seja como ele, mas porque o que ele te fez passar é imperdoável.
Julieta abaixou o olhar.
- Não deveria ter sido você a julgá-lo. Esse não é o nosso papel – ela o repreendeu, com um olhar cansado.
- Então é papel de quem? – ele perguntou. – Não existem leis que punam homens como ele. Não existem leis que protejam mulheres de monstros como Osório. Ninguém parece se importar, Julieta – ele disse, um tanto exaltado.
Julieta fechou os olhos, engolindo em seco. Aquela verdade a machucou.
- Quero acreditar que um dia as coisas serão diferentes – ela murmurou.
- Eu tenho certeza de que serão. Sempre que te olho, que olho para Ema, penso que vocês, mulheres como vocês, mudarão o mundo. As coisas vão melhorar, as coisas precisam melhorar. Mas agora... Oh, ele tinha que pagar, de alguma forma.
Julieta tentou conter as lágrimas que a queimavam por dentro e se manteve em silêncio. Aurélio, ainda ressentido, se afastou, deixando-a sozinha.
Depois de uma breve reflexão, Julieta despertou e o seguiu. Aurélio estava no quarto e procurava por algo no armário.
- O que você está fazendo? – ela questionou.
- Preciso ir para a cidade – ele disse depois de alcançar um casaco e vesti-lo.
Quando ia recuar, Julieta o segurou.
- Vamos conversar – ela pediu.
- Acho que você precisa de um espaço para pensar – Aurélio disse. – E talvez eu também precise disso.
- Não, eu não preciso – ela rebateu. – Nós precisamos conversar.
- Eu preciso – ele disse com impaciência, ainda visivelmente ferido. – Mais tarde falamos.
Antes que ele pudesse se afastar, Julieta o prendeu com suas mãos. Colando seu corpo no dele, afundou a cabeça no peito arfante do homem, que engoliu em seco.
- Não faça isso, Aurélio – ela murmurou.
- Julieta, por favor.
Levantando o olhar, ela suspirou, encarando-o. Enquanto seus olhos buscavam pelos dele, suas mãos apertaram as costas largas que se curvaram. Delicadamente, fez seus dedos se afundarem na camisa de flanela que ele vestia por baixo do casaco e, ficando na ponta dos pés, roçou seus lábios nos dele.
- Eu não quis dizer aquilo – ela sussurrou.
Aurélio tremeu, mas manteve-se imóvel.
- Não seja tão duro – ela insistiu. Provocativamente, fez seus corpos se colarem ainda mais, antes de, com um movimento rápido, entreabrir os lábios dele com a língua.
Aurélio, surpreso, gemeu e, sem se conter a enlaçou. Julieta, satisfeita, o beijou com fervor, deixando suas mãos percorrerem toda a extensão das costas do homem, que a apertou contra si com ainda mais força.
- Pare, Julieta – ele pediu, embriagado quando a sentiu beijando seu pescoço. – É melhor darmos um tempo. Para... Pensar.
Julieta aspirou o aroma doce e característico daquela pele morena, roçando os lábios em cada milímetro dela.
- Não precisamos de tempo – ela disse. – Precisamos só ficar juntos. Assim.
Aurélio gemeu e apertou os quadris de Julieta, fazendo-a sorrir, enquanto a sentia lamber seu pescoço com uma ousadia impensável.
- Oh, Julieta...
- Eu amo você, Aurélio – ela disse.
Soltando um gemido de irritação por ter seu plano de se afastar frustrado, Aurélio a puxou para si, beijando-a de forma intensa. Julieta sorriu e correspondeu, deliciando-se com aquelas mãos que passeavam por seu corpo com calor e desejo.
Ao ser empurrada em direção à cama, ela se deitou, encarando-o enquanto ele a observava, hipnotizado. Erguendo os braços, implorando para que ele se aproximasse, ela suspirou. Aurélio pegou em sua mão e a beijou lentamente antes de se deitar sobre ela. Com agilidade tirou o casaco e depois a camisa. Julieta fincou suas unhas nas costas nuas e gemeu ao sentir que ele beijava seu colo, enquanto buscava pelo zíper do vestido. Ao abri-lo, ele suspirou, encantando com a visão que se revelava. Julieta sorriu alagada e o puxou para outro beijo quente. Suas línguas se cruzaram e se reconheceram. Com as mãos, Aurélio terminou de tirar o vestido do corpo trêmulo de Julieta e, ao voltar a encará-la, sorriu extasiado enquanto puxava a combinação branca que tapava sua pele. Ao libertar seus seios, ele os massageou com as mãos, tão lentamente, que ela fechou os olhos, jogando a cabeça para trás enquanto mordia o próprio lábio, imersa em um prazer inebriante. Quando sentiu a língua quente em sua pele, ela gritou, puxando os cabelos de Aurélio, que sorriu satisfeito e repetiu os movimentos sensuais no outro seio. Julieta, impaciente, levou as mãos até a calça dele, tentando tirá-la. Ele sorriu e a beijou, enquanto a ajudava na tarefa. Ao ficar nu, ele puxou a última peça que ela ainda vestia e se demorou admirando aquele corpo completamente exposto. Julieta corou, mas não ousou interrompê-lo, sentindo que aquele olhar a deixava ainda mais acessa e desesperada pelo corpo que, só depois de uma longa contemplação, postou-se sobre ela.
- Eu não aguento mais – ela murmurou.
Ele sorriu e mordiscou seu queixo, enquanto deslizava uma das mãos até a intimidade de Julieta, que arregalou os olhos ao senti-lo tocando-a de forma inesperada.
- O que... – ela tentou dizer.
- Está tudo bem – ele murmurou.
Julieta gritou ao sentir aquele toque tão intenso. Ele a tocava com cuidado, delicadeza e paciência. Ela arqueou o corpo, tentando abafar os gritos que lhe cortavam a garganta, mordendo os lábios até sentir que eles doíam. Aurélio, satisfeito, continuou a massageá-la até sentir que ela quase explodia. Assim, voltou a beijá-la e tocá-la pelo corpo, enquanto permitia-se afundar no interior quente da mulher que movia o corpo em desespero para aplacar a urgência que a consumia.
- Oh, Aurélio.
Lentamente, ele a preencheu. Julieta, aflita, o apertou contra si, enroscando o corpo másculo com as pernas até que ele passasse a se movimentar. Aurélio, que queria prolongar o máximo aquele prazer, movimentou-se lentamente, pressionando seu corpo contra o dela. Julieta insistia, implorava por mais. Ele sorriu quando a sentiu dançar por debaixo de seu corpo e, sem conter o próprio desejo, intensificou os movimentos mais e mais. Com um grito que ele abafou ao colar suas bocas, ela chegou ao êxtase. Ele também alcançou o clímax e tremeu ao cair sobre ela, exausto e satisfeito.
Julieta agarrou-se a ele, soltando o ar lentamente. Seu peito ainda arfava, mas sentia-se leve e fechou os olhos tentando absorver aquela paz.
Com cuidado, Aurélio se deitou ao seu lado, cobrindo-os delicadamente. Julieta agradeceu e apoiou o queixo em seu peito.
- Bela forma de encerrar uma discussão – ele murmurou, tentando parecer enfezado.
Julieta sentiu que seu rosto ficava vermelho, mas deu de ombros.
- Você estava impossível – ela fez uma careta.
Aurélio a abraçou, sorrindo levemente.
- Sinto muito – ele murmurou, ao alisar seu cabelo. – Eu não devia ter agido daquela forma.
- Eu não devia tê-lo comparado a Osório – Julieta disse.
Aurélio deu de ombros.
- Talvez você tenha razão. Senti prazer ao vê-lo em sofrimento... – Aurélio confessou. – Talvez eu seja mesmo como ele.
Julieta negou, beijando o peito em que se apoiava.
- Você não é nada como ele – ela disse, com veemência.
- Será? – Aurélio sorriu triste, ajeitando uma mecha do cabelo castanho atrás da orelha de Julieta.
- Não seja tolo – ela esbravejou. – O que vejo em seus olhos é tão diferente do que via nos olhos dele – ela murmurou, alisando o rosto bronzeado. – Nunca imaginei que pudesse haver tanto amor em uma pessoa. Nunca pensei que pudesse me sentir tão cuidada, tão amada como me sinto quando você está perto. Eu fiquei nervosa – ela disse, suspirando e dando de ombros. – Não deveria ter dito aquilo.
Aurélio a apertou contra si.
- Desculpe – ele repetiu. – Uma violência não deveria ser paga com mais violência.
- Eu sei – ela concordou, beijando-o. – Prometa que não fará mais loucuras como essa.
Aurélio revirou os olhos.
- Preciso mesmo prometer?
Julieta o olhou zangada. Ele, finalmente, sorriu e suspirou.
- Tudo o que você me pedir – ele disse, beijando-a. – Eu prometo.
Satisfeita, Julieta sorriu e se deixou envolver por aqueles braços que a fizeram se deitar sobre ele. Com um suspiro, ela virou o rosto, deixando-o explorar sua pele com os lábios e a língua. Ela gemeu baixinho e se agarrou a ele, deliciada. Quando sentiu que as mãos dele desciam de suas costas em direção às suas nádegas, se sobressaltou e se afastou com rapidez.
- Ema – ela disse, assombrada. – Ela deve estar voltando com Camilo.
Aurélio riu do nervosismo da mulher e tentou puxá-la, com provocação.
- Basta trancar a porta – ele disse, roçando seus lábios no rosto corado.
Julieta, apesar de sentir-se em chamas com aquelas mãos que tentavam tocá-la intimamente, se desvencilhou, levantando-se e buscando pelas roupas jogadas ao chão. Com rapidez, passou a vesti-las sob o olhar divertido de Aurélio, que apoiava o corpo pelos cotovelos.
- Você fica linda assim – ele disse.
Julieta, que vestia apenas a combinação branca e se preparava para colocar o vestido, corou, sorrindo inevitavelmente.
- Pare de bobagem – ela grunhiu. – E vista-se.
Aurélio se levantou, deixando o lençol cair. Ao tê-lo de frente, Julieta precisou conter um suspiro maravilhado com a visão daquele corpo inacreditável.
- Ou poderíamos ignorar o mundo lá fora e passar o resto da vida trancados nesse quarto – ele sugeriu, enlaçando-a pela cintura. Julieta soltou o ar e o vestido, que caiu de suas mãos, deixando-as livres para trazê-lo para si, abraçando-o e apertando o rosto no peito quente. Aurélio sorriu.
- Eu adoraria – ela murmurou em uma confissão baixa. Seu corpo colou-se ao dele, suas pulsações misturavam-se com as dele, seu fogo o queimava e o dele a ela. Ela sorriu e levantou o queixo para beijá-lo com leveza. – Mas não podemos.
Aurélio suspirou, frustrado, apertando os quadris delicados de Julieta, que gemeu baixinho.
- Pare – ela pediu, com um sorriso cálido. – Temos a noite toda – ela sussurrou.
Aurélio tremeu e, enlouquecido, a trouxe para si, beijando-a com fervor. Julieta correspondeu à altura, mas o afastou quando sentiu que estava prestes a perder o controle. Ele parecia irritado pela interrupção e ela alargou um sorriso trêmulo.
- Vista-se – ela repetiu.
Ele soltou o ar com chateação, fazendo-a rir, enquanto procurava pelas roupas. Os dois se vestiram, trocando olhares cúmplices e carinhosos. Ao terminar a tarefa, ele voltou a se aproximar. Julieta ajeitou a gola da camisa de flanela que ele vestia, enquanto ele a ajudava a fechar o zíper do vestido.
- Como está se sentindo? – ele perguntou. – Está confortável?
Julieta o encarou com carinho. Sabia que ele perguntava por ter dito, na primeira vez em que estiveram juntos, que ainda sentia o peso dos anos que vivera com Osório em seus ombros, mesmo quando achou que esse passo a redimiria. Naquele momento, ela não se sentiu violada, porque havia desejado, porque havia permitido. Apesar disso, uma sensação angustiante a fez questionar a própria ferida. A fez perguntar a si mesma se, afinal, algum dia se livraria da bagagem que carregava na própria pele, na própria mente. Sua dor era como as velhas cicatrizes em seus braços e costas. Elas haviam feito morada em seu corpo, viviam ali como hóspedes silenciosas. Antes achava que elas existiam apenas para lembrá-la de que era uma vítima, mas agora pensava que elas eram a memória viva de sua própria sobrevivência. A dor que carregava em seu peito, o trauma de uma violência tão sutil, quase imperceptível para uma sociedade que tolera tanto se escondido atrás de paredes que não falam, ainda a traziam uma sensação amarga e, mesmo naquele momento, nos braços daquele homem gentil, que amava e por quem era amada, era confrontada por um arrepio involuntário de uma lembrança vívida, fresca e inapagável. Ainda assim, agora sabia, que caminhava em direção à uma cura possível. Haveria um dia em que, ao estar nos braços de Aurélio, não questionaria a si mesma, seu comportamento, não julgaria, mesmo que tão silenciosamente, o próprio prazer. Porque agora ela sabia que o merecia.
- Estou bem – ela disse, com um sorriso e um suspiro. – Me sinto segura com você.
- Você está segura – ele afirmou, abraçando-a. – Ah, Julieta, eu amo você.
- Eu também amo você. – Ela o encarou, com um sorriso. – Você me faz acreditar que tudo vai ficar bem.
- Porque vai – ele disse, apertando-a contra si.
- Eu sei – ela respondeu. – Achei que tudo o que eu poderia ser era o retrato da violência que sofri, mas você sempre me mostra que há muito mais além disso.
- Um passo de cada vez, lembra?
- Obrigada – ela murmurou, voltando a abraçá-lo. Aurélio correspondeu, beijando seus cabelos, de olhos fechados e com o coração agitado.
Ao se separam, ela sorriu.
- Você precisa ir para a cidade.
Aurélio confirmou, enquanto alisava seus cabelos, ajudando-a a prendê-los em um coque baixo.
- Coma algo antes de ir – ela sugeriu, com preocupação.
- Mas é claro – ele disse, com um semblante sério, voltando a enlaçá-la. – Preciso repor todas as forças que você me tirou.
Julieta corou e deu um tapa no ombro de Aurélio, que riu, voltando a beijá-la.
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