Chegou em casa e foi para o quarto, fechou as cortinas e se encolheu na cama. Seu coração mais parecia ter sido esmagado, ja que as coisas tinham saído do lugar. Só queria que seu conto de fadas com T3ddy tivesse um final feliz
Se lembrou do que Dado havia dito a ele anos atrás, no meio de uma das agressões.
“Acha mesmo que algum dia alguém vai te amar? Você é um nada...”
Ele estava certo.
Achava mesmo que poderia ser feliz ao lado do melhor amigo? Por que passou de um quase filho de Vera e Paschoal para um garoto problemático? Talvez eles tinham razão em querer proteger o filho.
Luba não quis conversar com ninguém, Carminha questionou, mas ele se calou, agradecendo a mãe por ter respeitado o seu espaço.
T3ddy ligava o dia todo, no celular, no telefone fixo, tocou aquela campainha por diversas vezes. Luba pedia para a mãe dizer que não queria ver ninguém, principalmente ele. Lucas se magoava pelo fato do seu garoto preferir mantê-lo afastado. O rosado achava pior ter que encarar os olhos castanhos. Talvez um tiro doeria menos.
Por outro lado, T3ddy não estava muito diferente, não se conformava em ter sido deixado, depois de tudo o que passaram juntos, já não conseguia mais imaginar sua vida longe do amado. Não se despediu dos pais quando, naquela mesma noite, viajariam novamente a trabalho.
“— Vocês são egocêntricos, egoístas e não agiram como pais de verdade. A minha felicidade acabou de escapar de minhas mãos por culpa de vocês. Espero que estejam satisfeitos com isso, mas não esperem que eu perdoe e muito menos que eu fale com vocês ate se derem conta da merda que fizeram na minha vida.”
Mesmo sem ter dito nada, Vera e Paschoal sabiam que tinham passado dos limites ao ver os olhos vermelhos do filho. Sentiram o peso das palavras do caçula e apenas digeriram aquilo com dificuldade.
Ricardo passou aquela semana tentando reanimar o irmão, fez companhia a ele e ate lhe arrancou algumas risadas. Na quinta-feira, ele partiu e Lucas se viu sozinho naquela casa enorme. A solidão talvez o ajudasse a esquecer, mas na verdade ela só piorava as coisas.
O martírio começou naquela segunda-feira feira, ambos se viam na escola, mas so de longe. Luba não passava mais os intervalos com os amigos no pátio, preferia se isolar na biblioteca. Gabbie e Karen tentavam puxar assunto, mas ele desviava da conversa ou simplesmente se afastava. Depois de tanto insistir, a azulada se deu por vencida e acabou por desistir, ficando apenas do lado dele em silêncio. Luba era grato por isso. Os amigos viam Lucas sentado, cabisbaixo na mesa, sempre olhando para o nada ou brincando com a comida no prato, e não lembrava em nada aquele garoto alegre e cativante. Gustavo tentava lhe importunar com as suas provocações, mas não surtia efeito como das outras vezes. Lucas mal falava e só respondia quando falavam com ele. Maju tentava se aproximar do moreno, mas ele se retirava e deixava a morena falando sozinha, ela havia se dado por vencida após aquele episodio na casa de T3ddy, mas tudo saiu ao contrario do que imaginou. O rapaz só fazia se afastar e ignorar a garota como se fosse um nada. Por outro lado ela se consolava ao ver que Luba estava na fossa e bem longe do ex. Em seu ponto de vista, tudo estava perdido.
***
Duas semanas depois...
– Por que o deixou?
– Não quis complicar a vida dele, sabe? Já basta ele se manter do meu lado depois do que me aconteceu, não quis causar mais um problema na vida dele dando continuidade a um relacionamento que não era bem visto pelos pais.
– E como acha que ele se sente?
– Péssimo... Mas, ele logo supera, assim como eu sei que vou... algum dia, talvez – pigarreou nervoso, olhava para o chão, balançando a perna direita, enquanto brincava com seus dedos.
– Eu não teria tanta certeza, vocês tem uma história de anos, isso não se apaga assim tão facilmente, especialmente agora que os sentimentos foram confessados. – Shophia afirmou. – Esta se sentindo pressionado, apenas isso. Já parou para pensar que pode ter se precipitado, terminando tudo com ele? Pelo que me disse, ele afirmou que estaria disposto a ficar com você, apesar das dificuldades pelo caminho.
Luba considerou que Sophia poderia ter razão. Gostava do otimismo da psicóloga, foram poucos os atendimentos, mas já se sentia um pouco mais a vontade com ela.
Otto resolveu conversar com Sophia, psicóloga e amiga de longa data da família. Ela tinha visto Luba crescer e por isso seus pais acharam que fosse uma boa opção ter uma profissional de confiança para atender o filho, visto que era evidente que ele não estava nada bem. Luba estava emagrecendo um pouco rápido demais, em duas semanas era visível a perda de peso, seu apetite havia diminuído consideravelmente. Se sentia mais cansado e menos motivado também.
Os pais do garoto pensaram em conversar com seus amigos e T3ddy, mas Luba prometeu ser mais receptivo a terapia se não envolvessem mais ninguém nos seus problemas, principalmente se esse alguém fosse Lucas. O diagnostico foi preciso quando Sophia afirmou que se tratava do início de um quadro da depressão, receitou antidepressivos, calmantes e remédios para dormir. O horário de cada remedio era supervisionado por Carminha e o esquema parecia estar funcionando.
– Eu só queria que ele fosse feliz, eu sou um peso e sempre fui. Desde que fui machucado, parece que ele só vive pra mim. – se lamentou, lembrando das vezes em que acordava e o moreno estava sempre por perto, estudando com os livros da escola e fazendo lições, estampando uma feição cansada.
– Quem faz isso por outra pessoa sem que esteja apaixonado? Não é só pela amizade, o amor também conta muita nessas horas. Você é um menino de sorte e sempre foi por ter o Lucas ao seu lado, quer mesmo ignorar isso? O preconceito existe e ainda vai ser bastante presente na sua vida, cabe a você saber lidar e conviver com ele.
– Eu acho que doeu mais por ter sido com pessoas que sempre considerei como minha família. Eu não esperava ser humilhado por eles daquela forma. Tem noção do que é isso? Duas pessoas que você ama tanto quanto os seus próprios pais, te olharem como se fosse uma pessoa ruim? Não sou bom o suficiente para o filho deles por ser um garoto. E se, por um lado eu me frustro por não ter sido aceito, por outro eu me frustro por ser um garoto problemático.
– Não diga isso, você não e problemático. É natural que se sinta dessa forma pelo trauma que sofreu, a maioria das vitimas de abusos sexuais entram em depressão por conta disso. E sobre o Lucas, seria melhor conversar com ele, você saiu daquela casa e têm evitado o rapaz sem lhe dar chance de dizer o que sente. – aconselhou, enquanto fazia anotações.
— Talvez eu deva... — considerou, apesar de estar receoso.
– Como estão os cortes?
– Cicatrizando. – disse baixinho, desviando o olhar.
– Fez outros?
– Eu... Sim. — não viu razão pra mentir.
Nos últimos dias tinha sido assim, Luba usando blusas de mangas longas, sua sorte é que o tempo estava frio naquela primavera e ninguém desconfiava. Havia quebrado a promessa que fez pra T3ddy, ate chegou a ligar restrito para o rapaz, mas assim que ele ouviu aquela voz melodiosa e o silêncio se instaurou se, surpreendeu ao que o moreno perguntou: "É você, Luba? Se for, por favor fale comigo, amor." Desistiu e desligou. E então, toda a coragem do rosado se esvaiu e desligou.
– Por que continua se cortando?
— Porque eu acho que mereço, não sei... É como uma punição por talvez ter feito tudo errado e eu ainda me culpo por tudo, sabe? É difícil. Sinto tanto a falta dele que dói e eu fico querendo causar uma dor em mim mesmo pra talvez... anular outra... – esfregou a mão no peito e chorou.
Luba não queria chorar na frente de ninguém, mas Sophia estava ali para tocar nas suas feridas e ajudá-lo a encontrar o caminho para curá-las
– Eu sinto vontade de me jogar em seus braços, mas quando cogito me aproximar recordo de todas as coisas que me disseram, a fala dos pais dele, e de outras pessoas se misturam na minha cabeça e eu travo no lugar. Eu simplesmente não consigo chegar perto, porque me lembro que preciso deixar ele livre. Preciso parar de ser tão egoísta.
Apesar de achar que tinha feito a coisa certa, Luba tinha medo de fraquejar e do que podia se tornar sem T3ddy.
***
Seu pai lhe buscou após a consulta e perguntou como havia sido, Luba apenas respondeu que Sophia lhe receitou mais remédios, pois os seus já estavam quase no fim. Carminha já tinha ido para o trabalho e deixou um bilhete na geladeira, avisando que o almoço estava pronto junto as recomendações da sua próxima medicação. Luba subiu para o seu quarto e ao menos se deu ao trabalho de trocar de roupa, o quarto continuava do jeito que deixou, a cama bagunçada e as cortinas escuras fechadas. Se deitou encolhido, lembrando de toda a conversa que teve com Sophia, a parte pior era relembrar das coisas ruins, das ofensas, dos julgamentos, dos olhares desconhecidos, das insinuações. Seu cérebro filtrava as coisas ruins, as boas pareciam ter sido esquecidas ou apenas guardadas bem no fundo de sua mente, exceto T3ddy. Ele era a única coisa boa no meio desse caos e bagunça dentro de si, mas não estava ali, não estava ali porque não tinha obrigação de estar.
Percebeu seu rosto molhado e mal se deu conta das lagrimas, descendo de seus olhos com toda a força. Aquilo havia se tornado parte da rotina do rosado, se remexia inquieto na cama sentindo seu peito doer e aquela horrível sensação de sufoco lhe dominar outra vez. Talvez ele merecesse toda a angustia e sofrimento.
Quando foi que chegou naquele ponto? Estava alem do fundo do poço, não tinha forças para subir, nem sentia que podia... Não queria, não tentava... Estava confuso... Estava caindo naquela imensa escuridão. Nada mais parecia lhe fazer sentido, nem as batidas do seu coração.
– Por que não passa? Por que essa dor não passa? – murmurou, com a voz afetada pelo choro.
Seus soluços eram o único som existente naquele quarto, seu choro era sofrido, chegou a puxar alguns tufos de cabelo pra tentar se acalmar, cogitou quebrar alguns objetos, mas sabia que chamaria a atenção do pai. Olhou cada um dos cortes em seus braços e sentiu raiva de si mesmo. Raiva por se maltratar. Raiva por ter mandado T3ddy embora. Raiva pela confusão de sentimentos em sua cabeça. Raiva por não ser bom o bastante para a sua pessoa.
Se levantou e quase caiu, suas pernas fraquejaram. Desceu as escadas, segurando no corrimão e enxugando o rosto, se esforçando a não deixar mais nenhuma lágrima cair. Estava cansado de chorar por pena de si mesmo.
Foi em busca de água na cozinha, seus remédios estavam em uma caixa em cima do armário. Seu pai não havia notado o filho na cozinha, estava numa ligação do lado de fora. Ouviu o soar de uma buzina e imaginou que a mãe havia chegado a tempo para almoçar com a família.
Encheu um copo com água e colocou sobre a pia, pegou a caixa de remédios dentro do armário. Ao invés de pegar só um, pegou quatro e mais alguns que não eram dele. Despejou os frascos com comprimidos sobre a bancada e engoliu a seco cada um deles, se engasgou com os primeiros que ingeriu e um gemido sôfrego escapou ao sentir o seu peito queimar. Soluçou, tomando os últimos que restavam e apoiou suas mãos sobre a bancada.
Sentiu pontadas no peito e na cabeça, sua respiração estava desregulada. No que tentou se sentar na cadeira mais próxima, cambaleou na cozinha e sua visão ficou embaçada. Seu corpo pendeu para frente, derrubando o copo d’água no chão. O som do vidro se quebrando despertou a atenção de Otto, que ainda estava numa ligação, mas dispensou ao ouvir a campainha. Além da voz da mãe, Luba pôde ouvir a voz familiar cumprimentando o seu pai, ele sabia quem era, mas não acreditava que ele estava mesmo lá.
Sua linha de raciocínio foi interrompida, quando seu corpo se chocou contra o chão. Estava caído, começou a se movimentar sozinho, queria gritar por T3ddy, mesmo que não fosse ele ali queria chamar seu nome, mas não conseguiu.
Uma grande quantidade de saliva saia por sua boca e seu corpo tremia, balançando cada vez mais. Escorria saliva pelo canto de sua boca, dificilmente moveu a cabeça de lado. Sua língua estava se enrolando, foi quando viu a porta ser aberta com velocidade.
Carminha tinha uma feição surpresa e indescritível no rosto, ela parecia chamar por alguém desesperada e com as mãos sobre a boca em estado de choque. Otto correu quando escutou o grito da mulher e ao chegar se jogou próximo ao filho, pondo sua cabeça em seu colo, tentando segurar sua língua. Luba sentiu enjôo e começou a vomitar ainda com a cabeça de lado e o pai o ajudava. Carminha estava ao telefone ainda com as mãos trêmulas e desesperada tentando chamar por ajuda.
Luba viu o melhor amigo se aproximar e começar a chorar, viu o desespero tomar conta daqueles olhos castanhos. As mãos dele seguravam as suas, mas não sentiu seu toque. Não queria que T3ddy chorasse por ele, não queria fazê-lo sofrer, mas a imagem do moreno desesperado, pedindo para que não o deixasse era a ultima coisa que viria.
Estava arrependido do que tinha feito, apesar de ser tarde demais
Logo, sentiu seu rosto molhar e a visão ficou turva, enquanto a queimação em seu peito aumentava. Seus olho se fecharam e tudo havia ficado negro e silencioso.
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